UM CASO CONCRETO ENVOLVENDO MANDADO DE SEGURANÇA E ATO JUDICIAL
Rogério Tadeu Romano
Costuma‐se ainda dizer que o mandado de segurança é uma invenção brasileira, após a experiência com a chamada teoria brasileira do habeas corpus, diante da primeira carta republicana, de 1891 e que foi, ao final, posta ao final, em 1926, com a chamada emenda Bernardes.
Surgiu o mandado de segurança com a Constituição de 1934, desprezado pela Constituição de 1937, mas restabelecida pela Constituição de 1946(artigo 141,§ 24) e mantido pela de 1967(artigo 150, § 21), por sua Emenda Constitucional nº 01/69(artigo 153, §21) e pela atual Constituição da República.
No direito infraconstitucional a sua disciplina é traçada pela Lei 12.016/2009, que revogou, de forma expressa, a Lei 1.533/1951, repetindo, é certo, em longa medida, disposições da lei anterior, e positivando posições doutrinárias e jurisprudenciais já existentes na matéria.
Sendo assim a Lei 12.016/2009 disciplinou a matéria, de forma negativa, dispondo que não se concederá mandado de segurança contra ato judicial, nas seguintes hipóteses:
a) de ato de que caiba recurso administrativo com efeito suspensivo independente de caução, não sendo obrigatório que o impetrante tenha que exaurir as vias administrativas(todavia, ingressando com o recurso administrativo com efeito suspensivo, o cabimento do mandado de segurança ficará postergado até a resolução daquele);
b) de decisão da qual caiba recurso com efeito suspensivo, isto porque o mandado de segurança é ação de índole subsidiária;
c) de decisão transitada em julgado, como reza o enunciado da Súmula 268 do Supremo Tribunal Federal, que assenta não caber mandado de segurança contra decisão transitada em julgado.
Mas o uso correto do mandado de segurança se dá com relação as chamadas decisões teratológicas causadores de dano irreparável, onde não haja recurso com efeito suspensivo próprio para suspender esses efeitos e onde a ilegalidade é manifesta. É o caso de decisões extra ou ultra petita, que impõem sanção sem que haja o devido processo legal em discussão.
Segundo informou o site do STJ, em 26 de novembro do corrente ano, é inadmissível a impetração de mandado de segurança contra decisão interlocutória que havia sido objeto de anterior impugnação por agravo de instrumento interposto pela mesma parte e não conhecido.
O entendimento é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que fundamentou a decisão na Súmula 267/STF, segundo a qual "não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição". Para o colegiado, a previsão da súmula subsiste ainda que a impugnação só possa ser exercida posteriormente, na apelação ou em contrarrazões da apelação.
No processo analisado, após divergência entre dois laudos periciais contábeis produzidos no curso de embargos à execução e diante de dúvidas sobre o valor, o juiz determinou de ofício a realização de terceira perícia. Contra essa decisão, foi interposto agravo de instrumento e impetrado mandado de segurança pela mesma parte.
Em seu voto, a ministra relatora do recurso, Nancy Andrighi, destacou que o STJ já decidiu pela impossibilidade de uso do mandado de segurança como instrumento recursal em substituição ao agravo de instrumento ou à apelação, com o objetivo de impugnar decisões interlocutórias.
Contudo, no caso em julgamento, a magistrada destacou que a questão discutida é se é cabível a impetração de mandado de segurança contra decisão interlocutória quando houve a anterior interposição de agravo de instrumento pela mesma parte contra a mesma decisão.
Para a relatora, não há que se falar em admissibilidade de mandado de segurança impetrado contra decisão interlocutória que havia sido objeto de agravo de instrumento não conhecido.
"Não se está diante de decisão interlocutória irrecorrível, como querem sugerir os recorrentes, mas, sim, de decisão interlocutória cuja recorribilidade é diferida no tempo, ou seja, que será suscetível de impugnação no momento da apelação ou de suas contrarrazões."
"Conclui-se que é absolutamente impensável admitir que a mesma decisão interlocutória poderia ser contrastada, de forma concomitante ou sucessiva, pela mesma parte, por diferentes meios de impugnação e em prazos distintos, razão pela qual se deve aplicar à hipótese a Súmula 267/STF."
Para a relatora, a redação do artigo 5º, II, da Lei do Mandado de Segurança, ao prever que é inadmissível a segurança quando a decisão judicial puder ser impugnada por recurso com efeito suspensivo, pode conduzir à interpretação de que a segurança deveria ser concedida sempre que o recurso cabível não possuísse efeito suspensivo.
"O efeito suspensivo a que se refere o dispositivo legal não é somente aquele operado por obra da lei (ope legis), mas abrange também aquele que se concretiza por obra do juiz (ope judicis), o que, inclusive, melhor se coaduna com a excepcionalidade e com a restritividade de uso do mandado de segurança."
Ela afirmou ainda que "não há mais espaço no sistema para a impetração de mandado de segurança contra ato judicial pelas partes do processo".
Quanto ao mérito, a ministra destacou que, embora a determinação de realização de uma terceira perícia não seja comum, é algo possível, que se encontra no âmbito dos poderes instrutórios do juiz.
"A determinação de que seja realizada uma terceira perícia na hipótese, embora não seja corriqueira, está devidamente fundamentada no fato de que as duas outras anteriores foram inconclusivas", esclareceu.
O julgamento se deu no RMS 60.641.