Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Os influenciadores digitais e o limite da liberdade de opinião

Agenda 09/12/2019 às 18:06

Este artigo reforça a discussão sobre a liberdade crítica dos influenciadores digitais na esfera de suas atividades. Qual o limite da manifestação contrária a um produto ou serviço?

O exercício da influência digital é uma das atividades remuneradas que mais ganha mercado na atualidade, tanto em valores, quanto em número de influenciadores que buscam o sucesso neste nicho de mercado.

E abraçados na liberdade de expressão e de opinião, que vem prevista no Art. 5º, IV, da Constituição Federal, bem como na proximidade com os seus seguidores, os influenciadores já são o maior investimento de marcas e empresas visando captar clientes em meios virtuais, ocupando um percentual de 22% de todo o investimento identificado, conforme pesquisa da Consultoria Forrester1.

Esse elevado percentual se justifica no potencial desses influenciadores em formar opinião de seus fãs e seguidores, tanto positivamente, a favor de um produto, empresa ou marca, quanto negativamente. Com leve facilidade podem não apenas convencer terceiros de sua posição, mas também mudar radicalmente o posicionamento de quem os lê, ouve ou assiste.

A relevância da posição dos influenciadores pode ser sintetizada no excerto que segue:

“Esse tipo de publicidade desencadeia um comportamento no consumidor, em nível consciente e inconsciente, gerando uma resposta imediata devido ao conceito preexistente que se tem daquela pessoa ou grupo que está testemunhando a favor do produto, agregando-lhe valores como admiração, sucesso, riqueza, beleza, juventude, alegria, internacionalidade, tradição, notoriedade, etc.” 2

E considerando a força de suas posições, tanto favoráveis quanto contrárias, a reflexão que importa fazer nesse breve artigo é se existe um limitador para tais opiniões, ou mesmo qual seria esse limitador. Até onde pode chegar um influenciador sem sofrer consequências?

Este é um campo de grande subjetivismo e nebulosidade. Ao realizar pesquisa, espera-se encontrar inúmeras contendas nos tribunais, considerando que muitos dos criadores de conteúdo digitais têm por prática a exposição de opiniões fortes e radicais sobre empresas, marcas e produtos.

Todavia, surpreende o parco material encontrado sobre o assunto. Imagina-se que as marcas e empresas atingidas não demandem contra os influenciadores por receio de que a repercussão negativa seja ainda maior atacando aqueles que agem sob a confiança de milhares, ou milhões de pessoas. Se a opinião do influenciador for negativa, ataca-lo poderá agravar ainda mais.

Mesmo assim foi possível localizar uma decisão emanada do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que dá um norte interessante para a discussão, contribuindo efetivamente para uma maior reflexão sobre o assunto. Assim constou da decisão:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. INFORMAÇÃO. DIREITOS DA PERSONALIDADE. POSTAGEM EM REDE SOCIAL. PONDERAÇÃO. ART. 300. DO CPC. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS. DECISÃO MANTIDA.

1. Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que indeferiu a tutela de urgência, a fim de determinar ao demandado a retirada das publicações feitas em sua conta na rede social Instagram, a respeito dos produtos comercializados pela autora.

2. A liberdade de expressão não se restringe ao direito de opinar, abarcando, ainda, outras garantias que lhes são correlatas, tais como os direitos a criticar, informar, reclamar e se exprimir de modos diversos .

3. Verificado o confronto entre a liberdade de expressão e os direitos da personalidade da pessoa jurídica envolvida, cabe ao Magistrado, por meio da ponderação, avaliar qual deve liderar no caso concreto.

4. In casu, conquanto se avalie não possuir o direito de manifestação caráter absoluto , tem-se que a publicação realizada na rede social Instagram, apesar de negativa ao interesse da recorrente, possui caráter preponderantemente informativo/educacional , encontrando respaldo em artigos científicos, sendo benéfica à difusão de ideias perante a sociedade.3 (destacado)

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

O posicionamento exarado acima é pertinente, porque reconhece o confronto de princípios constitucionais, o que deve ser sopesado caso a caso pelo julgador.

Enquanto a liberdade de opinião explanada com teor crítico, mas informativo e educativo, visando contribuir de alguma forma para a sociedade, parece não ter um limitador restrito, essa mesma liberdade não é absoluta.

E não sendo absoluta, parece que o seu limitador é ultrapassar o limite da razoabilidade e da proporcionalidade, a exemplo de ofensas cruéis ou até mesmo com cunho preconceituoso, por qualquer de suas espécies. Opinar não pode ser sinônimo de ofender.

Ainda que frágil o leque de decisões sobre a matéria, o excerto acima parece definir provisoriamente o limite a ser tolerado, porquanto respeita, ainda que não absolutamente, ambos os princípios constitucionais, preservando a liberdade de expressão, e também não violando de forma flagrante os direitos da personalidade.

Ademais, qualquer restrição além do exposto poderá inclusive inviabilizar a atividade, atingindo ainda, reflexamente, o princípio constitucional da livre iniciativa.

Por fim, cabe ressaltar que a constitucional liberdade de expressão só poderá ser abraçada se o influenciador tiver sua identidade reconhecida, já que é vedado o anonimato (Art. 5º, IV, da CF). Ou seja, não há liberdade de opinião aqueles que se escondem em perfis ocultos.


Notas

1GASPARATTO, Ana Paula Gilio; FREITAS, Cinthia Obladen de Almendra; EFING, Antônio Carlos. Responsabilidade Civil dos Influenciadores Digitais. V. 19, n. 01, 2019. Revista Jurídica Cesumar, p. 65-87.

2CAMPOS, Maria Luiza de Sabóia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo: Cultura Paulista, 1996. p. 222.

3AGRAVO DE INSTRUMENTO 0708626-68.2018.8.07.0000 - TJDF. Rel. Des. SANDOVAL OLIVEIRA, j. 29/08/2018.

Sobre o autor
Vinícius Uberti Pellizzaro

Advogado Sócio da banca "Leandro Bernardino Rachadel Advogados", onde é responsável pela Arbitragem. Presidente da CMACIP (Câmara de Mediação e Arbitragem ACIP). Membro da Comissão Estadual de Arbitragem da OAB/SC e do Comitê de Arbitragem do CESA/SC (Centro de Estudos das Sociedades de Advogados). Conselheiro da OAB, Subseção Palhoça, para a gestão 2019/2021. Ex-Presidente da Comissão OAB Jovem, Subseção Palhoça, na gestão 2016/2018. Membro efetivo do IASC (Instituto dos Advogados de Santa Catarina). Bacharel em Direito pela Universidade do Contestado - UnC. Pós-Graduado em Direito Constitucional. Pós-Graduado em Mediação, Conciliação e Arbitragem. Participou e ocupou cargos de diretoria em diversas instituições, organizações e comissões relacionadas à Advocacia e à sociedade civil. Possui materiais jurídicos publicados e participa como palestrante, debatedor ou membro da comissão organizadora de eventos em geral relacionados a sua atividade profissional.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!