O AGRAVO DE INSTRUMENTO E O AGRAVO NOS AUTOS DO PROCESSO NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1939
Rogério Tadeu Romano
Com a edição da Constituição de 1937, com o Estado Novo, e o fim da federalização que possibilitou a edição dos chamados Códigos de Processo nos Estados, veio editado o Código de Processo Civil de 1939.
Havia três formas de agravo: o agravo de petição, das chamadas decisões terminativas, não definitivas, que extinguiam o processo sem julgar o mérito; o agravo no auto do processo e o agravo de instrumento.
Discutiremos, ab initio, o cabimento do agravo de instrumento no sistema processual civil de 1939.
Implícito nele estava o grave risco de dano irreparável.
Naquele diploma legal, os agravos de instrumento só cabiam nos casos expressamente previstos em lei, diferentemente do sistema do CPC de 1973, que encontra-se também revogado. Os casos eram enumerados no artigo 842 e seus incisos e ainda em leis extravagantes.
Eram esses os casos:
Art. 841. Os agravos serão de instrumento, de petição, ou no auto do processo, podendo ser interpostos no prazo de cinco (5) dias (art. 28).
Art. 842. Além dos casos em que a lei expressamente o permite, dar-se-á agravo de instrumento das decisões;
I – que não admitirem a intervenção de terceiro na causa;
II – que julgarem a exceção de incompetência;
III – que denegarem ou concederem medidas requeridas como preparatórias da ação;
IV – que não concederem vista para embargos de terceiro, ou que os julgarem;
V – que denegarem ou revogarem o benefício de gratuidade;
VI – que ordenarem a prisão;
VII – que nomearem, ou destituirem inventariante, tutor, curador, testamenteiro ou liquidante;
VIII – que arbitrarem, ou deixarem de arbitrar a remuneração dos liquidantes ou a vintena dos testamenteiros;
IX – que denegarem a apelação, inclusive a de terceiro prejudicado, a julgarem deserta, ou a relevarem da deserção;
X – que decidirem a respeito de êrro de conta;
XI – que concederem, ou não, a adjudicação ou a remissão de bens;
XII – que anularem a arrematação, adjudicação ou remissão cujos efeitos legais já se tenham produzido;
XIII – que admitirem, ou não, o concurso de credores. ou ordenarem a inclusão ou exclusão de créditos;
XIV – que julgarem, ou não, prestadas as contas;
XV – que julgarem os processos de que tratam os Títulos XV a XXII do Livro V, ou os respectivos incidentes, ressalvadas as exceções expressas;
XVI – que negarem alimentos provisionais;
XVII – que, sem caução idônea, ou independentemente de sentença anterior, autorizarem a entrega de dinheiro ou quaisquer outros bens, ou a alienação, hipoteca, permuta, subrogação ou arrendamento de bens.
Art. 842. Além dos casos em que a lei expressamente o permite, dar-se-á agravo de instrumento das decisões: (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
I, que não admitirem a intervenção de terceiro na causa; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
II, que julgarem a exceção de incompetência; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
III, que denegarem ou concederem medidas requeridas como preparatórias da ação; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
IV, que não concederem vista para embargos de terceiros, ou que os julgarem; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
IV - que receberem ou rejeitarem “in limine” os embargos de terceiro. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.672, de 1965).
V, que denegarem ou revogarem o benefício de gratuidade, (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
VI, que ordenarem a prisão; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
VII, que nomearem ou destituírem inventariante, tutor, curador, testamenteiro ou liquidante; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
VIII, que arbitrarem, ou deixarem de arbitrar a remuneração dos liquidantes ou a vintena dos testamenteiros; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
IX, que denegarem a apelação, inclusive de terceiro prejudicado, a julgarem deserta, ou a relevarem da deserção; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
X, que decidirem a respeito de erro de conta ou de cálculo; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
XI, que concederem, ou não, a adjudicação, ou a remissão de bens; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
XII, que anularem a arrematação, adjudicação, ou remissão cujos efeitos legais já se tenham produzido; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
XIII, que admitirem, ou não, o concurso de credores, ou ordenarem a inclusão ou exclusão de créditos (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
XIV, que julgarem, ou não, prestadas as contas; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942). (Suprimido pelo Decreto-Lei nº 8.570, de 1946).
XV, que julgarem os processos de que tratam os Títulos XV a XXII do Livro V, ou os respectivos incidentes, ressalvadas as exceções expressas; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
XVI, que negarem alimentos provisionais; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).
XVII, que, sem caução idônea, ou independentemente de sentença anterior, autorizarem a entrega de dinheiro ou quaisquer outros bens, ou a alienação, hipoteca, permuta, subrogação ou arrendamento de bens.
A teor do artigo 843 daquele diploma legal, o agravo de instrumento não suspendendia o processo.
O agravo de instrumento, sob o CPC de 1939, dava origem a um instrumento, ou seja, a um autuado constituído de recurso e translado de todas as peças do processo importantes à solução do recurso, sendo que era essencial, dentre essas, a decisão recorrida e a respectiva intimação, se houvesse.
Formava-se o instrumento à parte, pois que esse recurso, de regra, não suspendia o curso normal do processo, onde tinha sido proferida a decisão da qual se estivesse recorrendo.
Em regra, o agravo de instrumento não suspendia o processo, à época, porque os parágrafos primeiro e segundo do artigo 843 abriam exceções.
O agravo de instrumento, no Código de 1939, que somente foi revogado pelo CPC de 1973, tinha cabimento de decisões interlocutórias com força de definitivas. Similarmente ao que ocorria com o agravo de petição, o agravo de instrumento também devolvia ao juiz de primeira instância o conhecimento da questão recorrida, ensejando-lhe reformar ou manter sua decisão.
No que concerne à sua forma continha: a) a exposição dos fatos e do direito; b) as razões do pedido de reforma da decisão e ainda, c) a indicação das peças do processo que devessem ser transladadas.
O agravo de instrumento deveria ser interposto no prazo de cinco dias(prazo preclusivo), contando-se o prazo a partir da intimação pessoal do advogado(Comarcas do interior), ou, então, a partir da intimação pelo Diário Oficial(Comarcas da capital), e recebido o recurso pelo juiz deveria o Cartório providenciar o translado. Para tal deveriam ser transladadas a decisão recorrida e a respectiva certidão de intimação.
Tinha o Cartório o prazo de cinco dias para a formação do instrumento, tendo em vista as peças indicadas pelo autor, e que deviam ser transladadas, sucessivamente, abria-se a vista do agravado para, no prazo de 48 horas, contraminutar o agravo de instrumento. Poderia o agravado, sob sua responsabilidade pecuniária, solicitar o translado das peças que entendesse necessárias à demonstração de suas razões, quanto ao improvimento do recurso. Para a finalidade de acrescentar tais peças ao instrumento, tinha o Cartório o prazo de três dias.
Se, porventura, o agravado instruísse a sua contraminuta com documentos novos, deveria ser ouvido a respeito dos mesmos, o agravante, no prazo de 48 horas, por aplicação deste dispositivo(artigo 848) também ao processamento do agravo de instrumento em primeira instância.
Tal como ocorria com o agravo de petição, artigo 849 do CPC de 1939, aludia a lei, para o de instrumento, a que os autos deveriam ser preparados e conclusos, em 24 horas depois da extinção do prazo para a contraminuta ou para o translado de peças requeridas pelo agravado. Havia, na verdade, dois prazos processuais para o prazo citado de 24 horas: a) a entrega da contraminuta pelo agravado; b) ou, se este tivesse requerido translado de peças, mais o prazo de serem as mesmas transladas(3 dias, na forma do parágrafo terceiro do artigo 845). O prazo de 24 horas somente poderia ser contado a partir da intimação da conta de custas do agravante.
Depois da intimação, na forma prevista nos parágrafos do artigo 845, e devidamente preparados, então, os autos do agravo de instrumento, surgia a oportunidade processual para a reforma ou manutenção da decisão agravada, sendo lícito ao juiz, se a mantivesse “ordenar a extração da juntada, no prazo de dois dias, de outras peças dos autos(artigo 845, § 5º).
Mantida a decisão, deveriam subir os autos à superior instância na forma do parágrafo sexto do artigo 845. Se, todavia, fosse a decisão reformada, e invertidas as posições, para aquele que era agravado(recorrido) caberia o direito de solicitar a subida do instrumento para o juízo ad quem(artigo 7º, do artigo 845), desde que, em virtude da reforma da decisão sofresse prejuízo e desde que coubesse ainda o recurso de agravo de instrumento, da nova decisão proferida.
Observa-se, por fim, que o agravo de instrumento servia, quer no CPC de 1939, como ainda, por exemplo, na Lei 3.396, de 2 de agosto de 1958, artigo 6º, como forma técnica de efetivar outro recurso, que tivesse sido admitido.
A forma técnica de esse evitar a preclusão era interpor tal recurso.
Passo ao agravo no auto do processo no CPC de 1939, como muitas semelhanças com relação ao agravo retido, que foi extinto diante da vigência do CPC de 2015, que revogou o CPC de 1973.
O agravo nos autos do processo, tal como o agravo retido, não implicava a paralisação ou procrastinação do desenvolvimento procedimental.
O agravo no auto do processo do CPC de 1939, tal como o extinto agravo retido do CPC de 1973, era um recurso que não tinha procedimento na instância, onde era interposto, devendo ser conhecido no órgão ad quem, como preliminar do julgamento de apelação(decisões definitivas de mérito).
Atendia o agravo no auto do processo a duas necessidades: a) a não interrupção do desenvolvimento procedimental; b) a indispensável necessidade de se recorrer das interlocutórias(decisões tomadas no curso do procedimento de primeiro grau). Não sendo interposto tal recurso incidia a preclusão.
A enumeração constante do artigo 851 do CPC de 1939 era taxativa.
Ditava o CPC de 1939:
Art. 851. Caberá agravo no auto do processo das decisões:
I – que julgarem improcedentes as exeções de litispendência e coisa julgada;
II – que não admitirem a prova requerida ou cercearem, de qualquer forma, a defesa do interessado;
III – que concederem, na pendência da lide, medidas preventivas;
IV – que considerarem, ou não, saneado o processo, ressalvando-se, quanto à última hipótese o disposto no art. 846.
Art. 852. O agravo no auto do processo, reduzido a termo, poderá ser interposto verbalmente ou por petição em que se mencionem a decisão agravada e as razões de sua ilegalidade, afim de que dela conheça, como preliminar, o Tribunal Superior, por ocasião do Julgamento da apelação (arts. 876 a 878).
Era considerado erro grosseiro ajuizar agravo no auto do processo ao invés do agravo de instrumento. Não cabia falar em fungibilidade recursal.
Os pedidos de retratação não suspendem nem interrompem prazo para recursos cabíveis.
A retratação não é recurso.
O agravo no auto do processo diferia, no que concerne ao seu fundamento, dos demais recursos, pela peculiaridade de admitir-se expressamente que a sua interposição se desse verbalmente também, como, por certo, era interposto mediante petição.
Para a o agravo que fosse interposto durante a audiência, a jurisprudência entendia que não era necessário o termo.
Observe-se o teor da Súmula 426 do STF:
A falta do termo específico não prejudica o agravo no auto do processo, quando oportuna a interposição por petição ou no têrmo da audiência.
Quanto a competência relativamente ao agravo no auto do processo, o que se pode dizer é que o Código de Processo Civil de 1939 não era expresso no que concerne à competência do juiz de primeiro grau para o recebimento do agravo. Entretanto, a competência deste para o recebimento defluía claramente do exame dos artigos 852 e 876 daquele diploma legal.
Forte corrente entendia que seria incabível ao juiz de primeiro instância(a quo) examinar o mesmo. O seu destino era o tribunal. Pela leitura dos artigos 852 e 876 ficava nítida a destinação do recurso ao Tribunal de segunda instância ao contrário do que se dizia com relação aos agravos de instrumento e de petição.
Mas, ainda entendia-se que o juiz de primeiro grau poderia conhece-lo e reformar a sua decisão.
O julgamento do agravo no auto do processo era necessariamente preliminar ao julgamento da apelação, ainda que, de um ponto de vista formal, constassem, ambos os julgamentos, de uma só decisão. Mas observe-se: no agravo, havia um pedido que envolvia uma decisão numa interlocutória; na apelação, discutia-se o mérito(lide, pedido) do processo.
Por fim, que falar de decisões que envolviam dano irreparável, mas que, no CPC de 1939, não estavam listados na lei? Os advogados, na sua função criativa do direito, trouxeram soluções para tal através: do pedido de reconsideração, da correição parcial ou a reclamação; o conflito de competência; a ação rescisória e o mandado de segurança contra ato judicial.