INTRODUÇÃO
O objetivo geral do artigo é discorrer sobre as concessões de parcelamentos e reduções das multas e juros das dívidas tributárias junto à União e seus contrastes, através de Medidas Provisórias (MP).
Os objetivos específicos principais: Levantar como os benefícios concedidos nos últimos anos pelo governo federal auxiliaram contribuintes inadimplentes.
Identificar como as pessoas físicas e jurídicas aproveitam a opção do parcelamento para suspender a cobrança da dívida.
Apresentar os contrastes entre os principais beneficiados com os reais lesados que quitam em dia suas obrigações tributárias.
DETALHES
A Associação dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil - Unafisco disse que a MP 899/19 editada em 16/10/2019, apesar de ser denominada pelo governo federal de contribuinte legal, traz um contraponto à capacidade contributiva às avessas conforme expresso no Código Tributário Nacional, juntamente com outros REFIS que ocorreram em anos anteriores, cita ainda: “... a MP abre a possibilidade de tornar eternos os parcelamentos de grandes devedores, o que tem o poder de afetar de forma grave a capacidade de arrecadação do país”.
De acordo com o art. 171 do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/66), os optantes pelo REFIS ou parcelamentos suspendem a cobrança integral do crédito tributário, “A lei pode facultar, nas condições que estabeleça, aos sujeitos ativo e passivo da obrigação tributária celebrar transação que, mediante concessões mútuas, importe em determinação de litígio e consequente extinção de crédito tributário”.
Ainda segundo a agremiação dos Auditores, na Medida Provisória nº 899/2019 o governo evita chamá-la de renegociação da dívida, para não dar a ideia que é um novo REFIS como nos anteriores. Está previsto na MP que os descontos podem chegar até 50%, com prazo para pagamento até 84 meses. Micro ou pequena empresa e pessoas físicas podem parcelar de 84 a 100 vezes o seu litigioso tributário, com até 70% de desconto que sucedem de ação judicial, embargos à execução fiscal ou recurso administrativo ainda não julgados definitivamente.
Há várias Emendas de deputados federais propondo alterações à MP 899/2019 original. O parlamentar Tadeu assim justificou na Emenda 90 – MPV 899/2019:
Neste aspecto, a MP 899/2019 prevê a concessão de descontos ou redução do valor total dos créditos transacionados em percentuais bastante elevados (regra geral: até 50%, e para pessoas físicas e microempresas, até 70% de redução sobre o valor total dos créditos a serem transacionados), porém sem obrigação de atentar para as normas orçamentárias e financeiras, colocando-as como facultativas.
Inclusive na opinião de especialistas tributários há dúvidas na medida tomada pelo governo. De acordo com Sabbag (2009):
“...não se trata de providência que fique a critério da autoridade administrativa. Esta deve cingir-se aos motivos legais que dão ensejo ao perdão, como a situação econômica do sujeito passivo: erro ou ignorância escusáveis do contribuinte, quanto à matéria de fato; diminuta importância do crédito tributário, dentre outros (art. 172, inciso I a V, CTN).”
Vale ressaltar, conforme dados do Ministério da Fazenda, o saldo total da dívida federal está em torno de R$ 1,4 trilhão. Por outro lado, existe a expectativa do Ministério da Economia que haja regularização de 1,9 milhões de devedores. Numa entrevista pelo procurador-geral da fazenda nacional, Amaral Júnior (2019) afirmou: "Boa parte disso está em situação dificílima de recuperação (pelo governo). Imagina se a gente recupera 5% deste valor? Isso é praticamente tudo o que se tem em termos de gastos discricionários no orçamento anual"...
As vantagens apresentadas pela MP são: ter seus débitos prolongados com a instituição do governo; as multas reduzidas; substituição da correção dos débitos bem mais em conta, mudando de SELIC para TJLP, e o optante consegue a certidão positiva de débitos, com efeitos de negativa.
O último REFIS foi editado pela Lei nº 13.496/2017. O governo denominou de Programa Especial de Regularização Tributária (PERT). A corporação dos Auditores Federais entende a edição de nova MP ser de caráter institucional do governo, no entanto, disse:
O Fisco foi surpreendido com o anúncio da assinatura da medida sem que os Auditores Fiscais ou seus dirigentes fossem consultados a respeito do encaminhamento de um assunto de extrema relevância, com o poder de impactar de maneira profunda e irreversível o papel fiscalizatório e arrecadatório do órgão.
Saliente-se que, de acordo com os dados dos REFIS anteriores, a entidade Unafisco afirma que os maiores beneficiados são os que possuem vultosos faturamentos, por isso, seria necessário antes da edição da MP uma melhor análise. Disse ainda a agremiação: “permite que o contribuinte que abandonar o programa não sofra constrangimento, bloqueio de seus bens e a dívida fique suspensa até a palavra final, muitos anos depois”
Segundo a auditora Fiscal Natalie Nobre: “Esses contribuintes vão ter essa tendência a passar por todo o processo administrativo no âmbito da Receita sem efetuar nenhum recolhimento para, lá na frente, obter o benefício da PGFN”.
De acordo com a Procuradoria da Fazenda Nacional – PGFN, quando da vigência do programa REFIS da Crise em 2012, mais de 250 mil contribuintes do governo federal fizeram a consolidação dos débitos e opção de parcelamento. Cento e trinta mil foram excluídos por deixarem de pagar ou erros nos sistemas e mais de duas mil pleitearam na justiça o direito de permanecer no programa.Uma das razões de liminares concedidas pelo judiciário para esses 2 mil, que representa apenas 1% do total dos contribuintes, é o rigor da lei que cita prazos exíguos para a opção pelo programa.
Inclusive, cita que essa tolhida demonstra a força das entidades privadas e seus representantes no Congresso Nacional e no governo. Num dos discursos sobre a reedição da última MP 766/2007 no Congresso, o deputado federal Alfredo Kaefer em 2017 disse: "Não é bandido, não é sonegador, quem deve imposto. É o setor produtivo que paga o Congresso Nacional, paga os salários e sustenta o Estado".
Já o jornal Diário do Comércio:
Embora o número corresponda à metade do rombo fiscal estipulado para este ano, o nível de recuperação desses débitos é muito baixo. De 2014 a 2018, a União conseguiu reaver R$ 845 milhões aos cofres públicos de empresas nessa situação, pouco mais de 1% do montante.
O jornal Folha de São Paulo traz o destaque sobre os descontos que poderão ser concedidos de até 70% da dívida federal. Lima fez o seguinte comentário.
Aí o malandro faz uma péssima gestão, não repassa os tributos que já estão embutidos no preço dos produtos que vende, distribui tudo aos sócios e acionistas como lucro e dividendos e, quando tudo der errado, corre para o colo do Estado. Péssima a mensagem que passamos aos demais, que trabalham corretamente.
Por outro lado, a desembargadora Consuela Yoshida do TRF3 sobre o direito das pessoas cita: “O mero descumprimento de obrigação acessória não pode determinar a exclusão, sendo tal medida desproporcional e desarrazoada, ainda mais se for levado em consideração que o objetivo do parcelamento é possibilitar a regularidade dos débitos fiscais”.
CONCLUSÃO
É imprescindível que haja um maior esforço do governo federal para entender as consequências geradas pelas edições de Medidas Provisórias. Só para citar alguns exemplos: aqueles que já foram comtemplados inicialmente em edições anteriores e desistiram do pagamento sem justificativas plausíveis e voltam a solicitar o benefício; muitos entram no parcelamento, suspendem a exigência dos créditos e obtêm certidões para participarem de licitações públicas e depois voltam a dever; outros possuem capital financeiro para pagamento de dívidas e mesmo assim solicitam a benesse.
Ao se examinarem alguns fatos da atual MP 899/2019, verifica-se que ela não aponta qual tipo de autoridade ou tribunal, seja administrativo ou judicial, deve discutir o antagonismo legal, como o próprio Conselho de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda, TRFs, Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça ou Tribunais localizados nos Estados. Ainda contrariando o aspecto legal essa MP deixa para o executivo legislar sobre os descontos nos pagamentos que serão concedidos.
Com efeito, como a negociação dos parcelamentos passarão pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, os contribuintes, sabendo disso, apenas farão a declaração de débitos na Receita Federal sem realizar os pagamentos devidos e depois reivindicam com o governo outro REFIS.
Portanto, ainda que os atrasos nos pagamentos de tributos serem utilizados por necessidade ou se tornem como ferramenta de gestão das pessoas jurídicas e físicas, os maiores lesados são aqueles que cumprem suas obrigações em dia com o fisco, que muitas vezes deixam de receber os programas sociais de saúde, educação e segurança. Inúmeros lapsos cometidos nos REFIS anteriores poderiam ser evitados, obtendo maiores garantias nos recebimentos de tributos atrasados.
BIBLIOGRAFIAS
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