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O impacto das decisões cautelares no processo penal.

Análise de sua constitucionalidade a partir da duração razoável do processo

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O presente artigo se debruça sobre o necessário enfrentamento acerca da imposição de medidas cautelares na persecução penal e a possibilidade da instituição de medidas encarceradoras no âmbito da investigação criminal.

INTRODUÇÃO

O presente artigo analisará um pequeno fragmento que está presente na imensidão do campo das ciências criminais, que é o instituto das medidas cautelares no Direito Processual Penal, com foco nas prisões cautelares. Cabe salientar que o referido instituto entrou no ordenamento jurídico brasileiro desde a outorga do Decreto-Lei n.º 3.689, de 3 de outubro de 1941, o denominado Código de Processo Penal, com um viés ideológico e social muito distinto dos dias atuais.

Alvo de muitas alterações até o seu texto atual, passando até mesmo por uma redemocratização, com consequente promulgação da Constituição da República de 1988, trouxe diversas garantias ao cidadão visando coibir ilegalidades, arbitrariedades que foram cometidas no passado.

Assim, mesmo passando por constantes reformas em seu texto, este traz consigo resquícios autoritários e conta com soluções jurídico-penais ainda discutíveis e passiveis de ilegalidades e arbitrariedades por parte dos magistrados e tribunais.

O referido código passou por uma reforma recente, ocorrida em 2011, com a promulgação da Lei n.º 12.403/2011, que foi um grande avanço em relação ao tema, a referida lei teve como ponto de grande importância a criação de diversas medidas cautelares diversas da pena privativa de liberdade.

Portanto no decorrer do presente artigo será feita a análise sobre os reflexos jurídicos e sociais da pena privativa de liberdade e a eficiência da utilização da mesma na modalidade cautelar, para tanto será utilizado material teórico, legislação correlata, jurisprudência, e todo e qualquer material que se faça necessário para elucidação do tema e o estudo ordenado do mesmo.


TEORIA DA CAUTELARIDADE NO PROCESSO PENAL

O ordenamento jurídico brasileiro é alvo de grandes mudanças ao longo dos anos, essas feitas para que o direito possa se adequar a sociedade garantindo uma prestação jurisdicional efetiva sempre pautada no respeito a direitos e garantias fundamentais que surgem no decorrer da evolução do direito brasileiro. Contudo para que a prestação jurisdicional tenha efeitos positivos esta jamais poderia ser morosa, o que se mostra inverossímil nos dias atuais.

Em relação ao disposto acima, o legislador diante de tal impasse, criou uma série de medidas para que o jurisdicionado não seja afetado diretamente pela inoperância de um poder judiciário estagnado e seus direitos garantidos não fossem mitigados em razão disto. Para tal no judiciário moderno é comumente o utilizado o termo “cautelar”, que segundo Silva (2002, p. 526) a palavra quer dizer, “todo e qualquer ato forense ou processo intentado por uma pessoa, em justiça, para prevenir, conservar ou defender direitos”.

No processo penal, o instituto ora discutido passou por várias mudanças, para que seja aplicado com probidade e evidente respeito aos direitos protegidos pela Constituição da República de 1988, pois é inegável, que o direito penal lida com os bens jurídicos mais importantes para a sociedade extraindo assim o fato de que qualquer erro na aplicação de decisão cautelar poderia trazer consequências irreparáveis, indo na contra mão do objetivo para o qual foi criado.

No Brasil, a cautelaridade é aplicada de maneira equivocada no processo penal, dando margem para contestação da sua eficácia perante os objetivos para o qual foi criado. É notório o fato de que muitas vezes os padrões elencados pela doutrina e os mandamentos legais para que haja este provimento liminar não são respeitados na esmagadora maioria das decisões judiciais espalhadas pelo país.

Por fim, o uso indiscriminado de institutos como prisão preventiva, execução provisória da pena, mostra que o Brasil ainda precisa evoluir cultural e juridicamente afim de que a “cautelaridade” seja efetivada nos moldes para o qual foi criada sem qualquer viés ideológico e livre de vícios, com o fim de alcançar a tão almejada justiça penal.


A POSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DA CAUTELARIDADE DO PROCESSO CIVIL

A necessidade de um provimento cautelar no direito brasileiro, diferentemente do que muitos imaginam, tem origem no processo civil, tal instituto remete a ideia de prevenção, ou seja, é em regra um respaldo estatal antes mesmo do desenrolar natural do processo, afim de evitar maiores prejuízos sociais e ao indivíduo.

Segundo Igor Alves Noberto Soares (2018), as medidas cautelares no Direito Processual Penal não podem se confundir com os institutos próprios da processualidade civil, pois, na segunda área, a Tutela Cautelar, nomeada no Código de Processo Civil, possui natureza antecipatória e satisfativa. Ora, não é possível, por meio de uma medida cautelar, antecipar o juízo de culpa sem o devido processo, muito menos exigir decisão que manifeste sobre o mérito da ação penal.

Os parâmetros do Direito Processual Civil, por isso, não são aplicáveis aos procedimentos típicos da persecução penal, pois conforme Gomes e Marques (2011) afirmam,

“sobriamente, que a velha doutrina processual penal, seguindo as clássicas lições de Calamandrei, assinala que toda medida cautelar deve estar fundada em duas premissas: o fumus boni iuris e o periculum in mora. Todavia, estas terminologias são adequadas ao processo civil, mas não correspondem com as finalidades do processo penal.”

A garantia de uma prestação jurisdicional efetiva em casos envolvendo os bens jurídicos tutelados pela norma penal é sem dúvida um dos pilares da manutenção da vida em sociedade. É evidente o desejo do legislador e da sociedade em conciliar a resposta estatal ao ilícito de maneira célere mas em outro ponto é necessário resguardar os direitos e garantias fundamentais pertencentes a todos.

Em relação às garantias perpetradas pelo ordenamento jurídico brasileiro onde se destaca o princípio do devido processo legal, que pode ser extraído do art. 5º Inciso LIV da constituição Federal que traz “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal ;” fica então evidente que o legislador originário se preocupou em resguardar o cidadão de eventuais prejuízos decorrentes de decisões emanadas em sede cautelar, pois como é sabido de todos que o respeito ao devido processo legal incomoda alguns setores da sociedade bem como todos aqueles defensores de uma justiça penal mais severa ignorando todos os preceitos legais para a satisfação de uma cultura do encarceramento.

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Portanto a aplicação dos mesmo parâmetros oriundos do processo civil para o processo penal segundo Gomes Filho (1991, p. 57),

“Não se pode cogitar em matéria criminal de um “poder geral de cautela”, por meio do qual o juiz possa impor ao acusado restrições não expressamente previstas pelo legislador, como sucede no âmbito da jurisdição civil; tratando-se de limitação da liberdade, é imprescindível a expressa permissão legal para tanto, pois o princípio da legalidade dos delitos e das penas não diz respeito apenas ao momento da cominação, mas à “legalidade da inteira repressão”, que põe em jogo a liberdade da pessoa desde os momentos iniciais do processo até a execução da pena imposta.”

Por fim sua aplicação no processo penal devidas modificações acarretaria em flagrantes ilegalidades de difícil ou impossível reparação a depender do caso concreto, ficando muito distante do pretendido ao inserir a cautelaridade no processo penal.


MEDIDAS CAUTELARES E PROCESSO PENAL

As medidas cautelares foram incorporadas ao processo penal ao passo que a sociedade precisava de uma resposta mais célere do estado na repressão a ilícitos, sendo assim é possível ver hoje no Brasil reiteradas decisões em sede cautelar que tratam de matéria penal ou seja, da liberdade dos indivíduos, com o passar dos anos foram criados vários institutos para que a morosidade clássica do judiciário tivesse um menor impacto na sociedade como um todo. No decorrer dos anos vários destes institutos sofreram mutações seja para adequar o direito a modernidade ou mesmo para mitigar ilegalidades que viessem a ser cometidas, o que se sabe é, as medidas cautelares não resolveram antigos problemas sociais, como erro judiciário, morosidade na prestação jurisdicional, superlotação de presídios são apenas alguns dos problemas enfrentados atualmente pela população brasileira.

No processo penal as decisões cautelares tem um peso maior, pois coloca frente a frente o direito a liberdade e os anseios sociais por justiça, agravado pelo fato da desinformação alimentar discursos encarceradores sob a velha ótica do “bandido bom é bandido morto”. No Brasil existem vários institutos cautelares em uso no processo penal, onde se destacam a prisão preventiva e prisão temporária, além daquelas medidas cautelares diversas da prisão presentes também no Código de Processo Penal.

As medidas cautelares necessitam de aprimoramentos, pois é inegável seu uso indiscriminado em matéria penal, a mitigação do devido processo legal em resposta a uma cultura do encarceramento só deixa claro que uma reformulação pontual precisa acontecer.

Nos últimos anos ao instituir as medidas cautelares diversas da prisão, o número de ilegalidades cometidas por abuso de poder além do erro judiciário tiveram drásticas reduções, claro muito distante do ideal mas evoluindo. O código de processo penal com as alterações advindas da lei 12.403/2011, procurou modernizar o uso dos institutos cautelares e deixou clara a preocupação do legislador com o uso indiscriminado de prisões cautelares brasil a fora.

Com tal pensamento a referida lei alterou o art. 319 do CPP e instituiu várias possibilidades ao aplicador do direito que não fosse a prisão, como salienta Távora e Alencar (2012, p, 616),

“[...] A decretação da preventiva deve ser fundamentada na ideia de medida extrema, subsidiária, residual, que só terá lugar quando não suficiente e adequada outra medida cautelar diversa da prisão (artigo 319, CPP, com redação dada pela Lei 12.403/2011), e presentes os pressupostos gerais de decretação de medida cautelar dispostos no artigo 282, do CPP (com redação dada pela Lei nº12.403/2011).”

Portanto em apertada síntese as medidas cautelares no processo penal devem ser pautadas como medidas excepcionais pois, a lei veda o comportamento em sentido contrário e com isso seu uso de maneira regular e ética respeitando todos os parâmetros legais é o caminho para a mitigação de arbitrariedades e democratização da justiça.


OS CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES

Há, no ordenamento jurídico brasileiro, várias possibilidades de decisões cautelares em sede de direito penal como dito acima, ocorre que para sua utilização deve se seguir alguns padrões a fim de diminuir os impactos sociais da medida, além dos padrões legais trazidos pelo código de processo penal e a constituição federal há outros pontos a serem levados em conta.

A doutrina elenca três critérios essências para a aplicação das cautelares no sistema penal são eles a necessidade da medida, adequação da medida e a proporcionalidade da mesma. A necessidade e a adequação da medida, estão previstos no art. 282 inciso I e II do código de processo penal com a seguinte redação,

“As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:

I – necessidade para a aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais;

II - adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).”

O que se extrai do referido dispositivo é que só se pode fazer uso das medidas cautelares se pautadas em indícios concretos de necessidade da medida, ou seja jamais pode ser usada de forma a satisfazer anseios sociais e políticos, uma vez que seu uso fora da hipóteses previstas em lei desencadeia uma reação negativa de diversos setores da sociedade em destaque a população pobre e negra que sofre diuturnamente com a violência nas periferias.

Por outro lado, não basta medida ser necessária ela tem que ser adequada ao caso concreto, devendo o aplicador do direito fazer a seguinte indagação, a pena criminal é mesmo adequada? Ou seja, não se deve instituir medidas cautelares que vão contra princípios constitucionais e a função social da pena. Nítido o desejo do legislador ao instituir tal dispositivo, pois este procura não dar margem para a discricionariedade do magistrado para que tenha sempre suas decisões pautadas seguindo a ética e os princípios gerais de direito, mitigando qualquer possibilidade de cometimento de ilegalidades por parte dos aplicadores da lei.

O critério da proporcionalidade, não é previsto em nenhum dispositivo legal, mas é o princípio base para aplicação de medidas cautelares e engloba todos os outros requisitos acima uma vez que na seara penal todas as decisões em sede cautelar devem ter estreita relação com a proporcionalidade que é conceituada como:

O princípio da proporcionalidade exige que se faça um juízo de ponderação sobre a relação existente entre o bem que é lesionado ou posto em perigo (gravidade do fato) e o bem de que pode alguém ser privado (gravidade da pena). (FRANCO, Alberto Silva. Crimes hediondos. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 67.)”

Portanto, o magistrado deve se utilizar de critérios proporcionais para estabelecer qualquer tipo de decisão cautelar, uma vez que o não acolhimento dessa premissa gera danos irreversíveis a jovem república brasileira e a sociedade como um todo devendo sempre pautar sua atuação a margem da estrita legalidade sob pena de violar diversos princípios constitucionais consagrados além de sofrer outras sanções que foram intensificadas com o advento da lei 13869/2019 que institui a lei de abuso de autoridade que passa a prever pena privativa de liberdade para casos claros de arbitrariedades cometidas por agentes públicos no exercício de sua função.

Do outro lado da moeda está o legislador que também deve pautar sua atividade legislativa sob o prisma desses três critérios como dito por Humberto Avilla,

“O postulado da proporcionalidade exige que o Poder Legislativo e o Poder Executivo escolham, para a realização de seus fins, meios adequados, necessários e proporcionais. Um meio é adequado se promove um fim. Um meio é necessário se, dentre todos aqueles meios igualmente adequados para promover o fim, for menos restritivo relativamente aos direitos fundamentais. E um meio é proporcional, em sentido estrito, se as vantagens que promove superam as desvantagens que provoca”. (ÁVILA, Humberto, 2007. p. 158.)

Conclui-se, portanto que a atividade jurisdicional e legislativa deve estar em consonância com os anseios sociais, ao passo que não se pode mitigar direitos e garantias fundamentais apenas levando em conta a vontade da população, assim pautar suas respectivas funções sob o crivo da legalidade sem ofender aqueles que mais precisam da norma é o caminho.


AS PROPENSÕES COGNITIVAS

O sistema jurídico brasileiro é basicamente composto de 3 atores processuais, um julgador, um defensor e um acusador todos exercem sua função de maneira bastante técnica e seguindo a legislação vigente a época do fato isso não é novidade. O papel do julgador como ator processual é em apertada síntese aplicar a melhor solução para o caso concreto, sem qualquer margem para subjetividade que possa interferir na sua função de dizer o direito, concretizando assim o princípio da imparcialidade trazido expressamente em vários diplomas legais ao redor do mundo em especial a Declaração Universal de Direito Humanos que traz em seu artigo X o seguinte:

“Toda pessoa tem direito, em plena igualdade, a uma audiência justa e pública por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele. (PARIS, 1948).

Ou seja, todos sem exceção tem o direito reconhecido a ser julgado por um juiz ou tribunal imparcial livre de qualquer interferência, como por exemplo ideológica, política ou religiosa.

Partindo deste ponto surge inevitavelmente o seguinte questionamento, os aplicadores do direito penal são totalmente imparciais, ou seja não há qualquer interferência subjetiva do magistrado? Para responder essa pergunta o americano Kevin J. Lynch em sua pesquisa denominada propensões cognitivas, onde ele procura demonstrar que as decisões judiciais dos Estados Unidos em sede cautelar carregam consigo a subjetividade do julgador ao analisar o caso concreto. As propensões cognitivas foram conceituadas por Costa como:

“A propensão à confirmação é uma tendência irracional de buscar, interpretar ou recordar informação de uma maneira tal que confirme alguma de nossas concepções iniciais ou hipóteses.”

As propensões cognitivas nada mais são do que julgamentos preexistentes em todos os seres humanos em geral, como por exemplo um árbitro de futebol apitando o jogo do seu time do coração, ou seja ele pode até tentar ser imparcial, aplicar as regras do jogo, mas em algum momento suas propensões cognitivas vão se aflorar e contaminar suas decisões naquele instante, o mesmo ocorre com os aplicadores do direito penal segundo Peer e Gamliel [I1] p. 115 2013, que traz,

“Os juízes podem estar enviesados a favor de provas e evidências que confirmem suas hipóteses, bem como dar menor valor de prova a evidências que não correspondam à sua preconcepção acerca do tema.

E corroborada pelo percussor no tema Kevin Lynch que traz a seguinte afirmação

“Os juízes sofrem dos mesmos vieses de cognição que afetam todos nós. Juízes usam atalhos para ajudá-los a lidar com a incerteza e a pressão da falta de tempo, inerentes ao processo judicial.

Como visto acima os vieses cognitivos atrapalham a tomada de decisões dos magistrados que incumbidos pela carta magna a função de resolver conflitos acabam se deparando com certos obstáculos em seu exercício, afetando assim a efetividade da prestação jurisdicional ao mitigar princípios basilares importantes para a manutenção da ordem jurídica brasileira como o devido processo legal e a imparcialidade, cabe ressaltar o papel importante que exerce o julgador no estado democrático de direito ao lidar com questões importantes para a sociedade civil como um todo, no entanto o julgador deve se atentar para mitigar os efeitos que os viesses cognitivos possam trazer ao processo e julgar seguindo os parâmetros legais e as provas produzidas para que sua decisão seja pautada segundo parâmetros éticos e com respeito a todos os direitos e garantias fundamentais que são inerente a todas as pessoas, e não apenas ao grupo do qual o magistrado tem afinidade ou compactua do mesmo pensamento.


O EXCESSO DAS PRISÕES NO BRASIL

Há no ordenamento jurídico brasileiro várias modalidades de prisões mas o presente artigo se debruçara na análise da prisão cautelar, por estar ser muito utilizada nos dias atuais pelos tribunais e magistrados no Brasil, conceituada por Luiz Flávio Gomes (2011, p. 25) como:

“A prisão cautelar ou provisória é, dentre todas as medidas cautelares pessoais, a mais drástica (e problemática) porque implica a privação da liberdade do sujeito antes da condenação final, ou seja, ela significa o “roubo” da liberdade de quem é presumido inocente (Hassemer).”

O estudo tem seu foco voltado a prisão preventiva, o tipo de prisão cautelar mais utilizado nos dias atuais e alvo de várias controvérsias deixando assim margem para a discussão e entendimentos conflitantes, sendo conceituada por Mirabete (2001), como:

“A prisão preventiva, em sentido estrito, é a medida cautelar, constituída da privação de liberdade do acusado e decretada pelo juiz durante o inquérito ou instrução criminal, diante da existência dos pressupostos legais, para assegurar os interesses sociais de segurança.”

Portanto a prisão preventiva para ser decretada possui requisitos de cunho subjetivos e objetivos cumulativos, como pode se extrair do art 312 do Código de processo penal que traz requisitos subjetivos para decretação da medida proceder- se a leitura do dispositivo,

“Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).”

Podemos extrair do referido artigo uma certa discricionariedade rodeada de uma subjetividade para o magistrado decreta – lá, haja vista que não possuímos critérios definidos sobre o que seria “Garantia da ordem pública e econômica”, “conveniência da instrução criminal” ou mesmo para “Assegurar a aplicação da lei penal”, exatamente é ai que mora o problema, a falta de parâmetros legais concretos para que seja possível sua decretação, dá margem para a utilização de maneira desordenada, sintetizado dessa maneira:

“A prisão cautelar se caracteriza como uma providência urgente que objetiva uma prestação jurisdicional mais justa em prol do estado no processo penal. A prisão cautelar não pode ser decretada para dar satisfação à sociedade, à opinião pública ou à mídia, sob pena de se desvirtuar da sua natureza instrumental (Apud, LIMA, 2011, p.79)

Sua consequente utilização em nome do interesse público e para satisfazer os anseios da sociedade, pode com isso dar margem a regimes autoritários como bem explana André Nicolitt,

“A expressão ordem pública tem suas raízes no surgimento do nazismo, tendo sido utilizada para justificar grandes atrocidades”. (NICOLITT, André. op. cit. p. 447)

O entendimento que fica é que é necessário cautela como o próprio nome já diz, pois, sua aplicação gera efeitos negativos podendo dar margem para a ruptura do estado democrático de direito e a criação de um estado absolutista. Ademais a falta de parâmetros para sua aplicação tem desencadeado diversos efeitos negativos para a sociedade, e tem relação direta com a reincidência, erro judiciário e superlotação dos presídios além dos danos emocionais a saúde do indivíduo, sabendo destes efeitos o legislador ao atribuir a medida no ordenamento jurídico, cuidou para que esta apenas fosse utilizada de modo excepcional como podemos extrair da parte final do art. 310 inciso II do código de processo penal que traz,

“Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente:

II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão.”

Portanto seu uso deve ser pautado na sua excepcionalidade visto que são muitas as consequências que estão por trás de sua decretação como explica, Silvio Maciel (2011, p. 134),

“É claríssima, nesse sentido, a letra do art. 310, II. A prisão preventiva, como se verá mais detalhadamente, é a ultima ratio das medidas cautelares. Ela somente deve ser decretada quando todas as demais medidas cautelares se revelarem inadequadas e insuficientes para o caso concreto. Em outras palavras, a insuficiência das medidas cautelares diversas da prisão passou a ser mais um requisito para o cabimento da prisão preventiva.”

Passaremos agora ao estudo do dispositivo que traz os requisitos objetivos para a decretação da prisão preventiva, requisitos estes que garantem o mínimo de lisura na sua decretação e retira de modo significativo mas não o bastante a atuação discricionária do magistrado, o referido dispositivo traz:

Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

O dispositivo vem para tentar frear a atuação autoritária do estado, onde caso deixasse a cargo do magistrado definir quais os delitos comportariam a prisão preventiva poderíamos assistir a um show de horrores muito pior do que acontece nos dias de hoje.

Contudo é sabido pelo número de presos preventivos que o freio estatal não é completamente eficaz e ainda traz margem para sua aplicação desordenada, mas como salienta LOPES JÚNIOR (2011, p.31): “o problema não é legislativo, mas cultural”.

Sobre o autor
Farias Azevedo Advocacia e Consultoria Jurídica

Aprovado no XXIX exame de ordem.

Informações sobre o texto

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