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Controle de constitucionalidade no direito brasileiro

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Agenda 27/04/2021 às 17:05

3. SISTEMA BRASILEIRO “MISTO”, “ECLÉTICO” OU “HÍBRIDO”

Conforme já observado alhures, o Brasil adotou em um primeiro momento, quando da Constituição de 1891, apenas o sistema difuso de controle de constitucionalidade, diante da forte inspiração norte americana.

Com o passar do tempo, já em meados da década de 1960, foi inserido também no ordenamento o controle concentrado, de modo que passaram a conviver os dois sistemas em terras brasileiras.

Foi com a Constituição promulgada em 1988 e algumas legislações posteriores que regulamentaram seus dispositivos que se vislumbrou aos olhos da comunidade jurídica o sistema de controle que conhecemos atualmente, que mantém traços do controle difuso, mas com forte presença e expansão do controle concentrado.

Alguns chamam o modelo de controle de constitucionalidade brasileiro de 1988 de eclético, híbrido ou misto, como é o caso de LUIS ROBERTO BARROSO e GILMAR MENDES.

O fato é que o sistema brasileiro é bastante peculiar sendo, de acordo com UADI LAMMÊGO BULOS, “um dos mais avançados do mundo, principalmente em matéria de fiscalização concentrada” De acordo com GILMAR MENDES , o controle de constitucionalidade brasileiro pode ser caracterizado por ser original e pela diversidade de instrumentos processuais destinados à fiscalização da constitucionalidade dos atos do poder público e à proteção dos direitos fundamentais.

Prossegue o Ministro ressaltando que essa diversidade de ações constitucionais próprias do modelo difuso é ainda complementada por uma variedade de instrumentos voltados ao exercício do controle abstrato de constitucionalidade observando que:

“O modelo brasileiro, sobre o qual nos cabe falar hoje, é um dos exemplos mais eminentes desse modelo misto. Se as influências do modelo difuso de origem norte-americana foram decisivas para a adoção inicial de um sistema de fiscalização judicial da constitucionalidade das leis e dos atos normativos em geral, o desenvolvimento das instituições democráticas acabou resultando num peculiar sistema de jurisdição constitucional, cujo desenho e organização reúnem, de forma híbrida, características marcantes de ambos os clássicos modelos de controle de constitucionalidade”.

Ressalta-se, pois, que com a Constituição de 1988 inaugurou-se um tipo de sistema de controle bastante específico, que mescla alguns institutos do modelo difuso com o predominante controle concentrado.

Por meio dele, tanto os legitimados expressamente pela Constituição no art. 103, bem como qualquer do povo que seja parte em um processo em andamento no Judiciário cuja causa de pedir seja a inconstitucionalidade de uma lei, podem levar a sua tese ao Supremo Tribunal Federal, por vias distintas e desde que cumpridos certos requisitos.

Referido sistema é adotado no Brasil e, também, com algumas distinções, em Portugal.

Em notícia veiculada no site do Supremo Tribunal Federal disponível na internet sob o título “Modelo híbrido de controle de constitucionalidade garante mais celeridade à Justiça brasileira”, datada de novembro de 2009, o modelo brasileiro é apontado como avançado por professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília:

“Segundo Paulo Blair, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB), o Brasil é um dos poucos países do mundo que utiliza um sistema híbrido de controle de constitucionalidade. Segue a tradição anglo-saxônica – cujo controle é feito por meio de atos da primeira instância, com a possibilidade de ingresso de recursos – e a tradição da Europa Continental – onde o controle é efetuado pelas cortes constitucionais, desde que o caso seja remetido pelo primeiro grau à corte suprema. Na visão do acadêmico, a aproximação desses dois modelos para promover o controle de constitucionalidade de leis e normas é uma evolução histórica. “No Brasil, o próprio Supremo pode originariamente declarar a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de uma norma. As leis são parte de regulamentação do sistema de controle concentrado. Mais e mais, os dois sistemas estão convergindo, com análise do caso concreto, que tem reflexo em casos posteriores”, destaca”.

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Apesar de alguns elogios tecidos por parte da doutrina, que encontra no sistema brasileiro características bastante próprias e vê utilidade em tal combinação, o fato é que ele não está imune a críticas.

Há quem afirme que o sistema misto instaurado no Brasil seja, em verdade, uma confusão entre os sistemas difuso e concentrado, deturpando-os e criando contradições.

Nesse sentido SÉRGIO RESENDE DE BARROS :

“Eis aí o nó górdio – o efeito meramente declaratório e necessariamente ex tunc – com o qual o Brasil atou o sistema europeu ao americano, deturpando-o. Infiltrou-se aí a contradição, que passou a atormentar o sistema misto brasileiro, que – além de misto – assim se tornou confuso. A confusão foi tanta, que até se exigiu a resolução do Senado para produzir o efeito erga omnes já inerente à ação direta e foi somente em 18 de junho de 1977 que o Presidente do Supremo Tribunal Federal determinou a restrição das comunicações ao Senado aos casos incidentais. Na realidade para desfazer a confusão – cortar o nó górdio – bastaria uma só norma constitucional, emendada à Constituição, assegurando ao Supremo a faculdade de regular no tempo e no espaço, bem como na compreensão e extensão, as decisões das ações diretas que propugnam ou impugnam a constitucionalidade das leis e atos normativos, incluindo no objeto dessas ações a resolução erga omnes, pronta e plena, de controvérsias judiciais de fundamento relevante sobre constitucionalidade”.

Com efeito, alguns problemas surgiram com a mescla de sistemas, podendo ser apontado, dentre outros, o debate acerca da vinculação ou não do Senado quanto às decisões proferidas em sede de controle difuso pelo Supremo Tribunal Federal, disso resultando a não obrigatoriedade em sustar a lei ou o ato normativo conflitante, tendo o Senado liberdade para cumprir – ou não – o previsto pelo art. 52, X, da Constituição Federal.


4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O constituinte originário de 1988 inovou ao incluir no sistema jurídico brasileiro, a um só tempo, o sistema de controle de constitucionalidade difuso e o sistema concentrado.

Já se reconheceu, inclusive, quanto ao sistema brasileiro, que “esta convivência não se faz sem uma permanente tensão dialética” (voto min. Sepúlveda Pertence, STF, ADC 1 QO, 1993).

Resta-nos observar que diante das análises dos prós e dos contras do sistema híbrido adotado pelo Brasil, o fato é que os sistemas de controle de constitucionalidade dos países são modelados e erigidos de acordo com as necessidades locais que caracterizam a região.

Disso decorre que um modelo que eventualmente tenha tido sucesso em determinado país não necessariamente terá o mesmo resultado em outro país.

Embora consignando-se que alterações de grande monta implicam em verdadeira descaracterização do sistema, soa previsível que ocorram adaptações locais.

E este parece ser o caso brasileiro, que, desde a promulgação da Constituição em 1988, vem sofrendo diversas modificações, seja por meio de leis, seja por meio de emendas constitucionais.

Como destaca JORGE MIRANDA:

“O sistema brasileiro compreende um acervo de meios de garantia de constitucionalidade quase sem paralelo noutros sistemas”.

Como se pode verificar, o Brasil vem criando, desde a promulgação da última Constituição Federal, um sistema de controle de constitucionalidade bastante próprio e que não apresenta sinais de estabilização – apesar dos mais de trinta anos de vigência –, sendo recorrentes as alterações realizadas no sistema, seja por meio de interpretação da própria Corte Constitucional, seja por meio de atividade legiferante.

O fato é que alguns alicerces parecem estar firmes, dentre eles a existência do controle concentrado de constitucionalidade exercido por uma Corte Constitucional, bem como a existência de ações diretas e abstratas para o exercício desta forma de controle.

Mas nem por isso o sistema brasileiro pode ser tido como acabado, tampouco pode ser definitivamente tachado como apenas concentrado, apenas difuso ou simplesmente híbrido, podendo ser ventilada a hipótese de, daqui a alguns anos, esteja caracterizado um novo sistema. Trata-se de verdadeiro sistema em evolução.


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Sobre a autora
Cláudia Regina de Azevedo

Mestranda em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Direito Constitucional pela Escola Paulista de Direito.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AZEVEDO, Cláudia Regina. Controle de constitucionalidade no direito brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6509, 27 abr. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/79357. Acesso em: 22 nov. 2024.

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