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O CONTRADITÓRIO COMO GARANTIA NA ESTRUTURA CONSTITUCIONAL BRASILEIRA

O princípio constitucional do contraditório é uma das principais garantias do estado democrático de direito. O contraditório será tratado, no presente artigo, como integrante da natureza dos princípios fundamentais.

1. INTRODUÇÃO

O presente estudo visa, não de forma exauriente, relacionar importantes considerações sobre os princípios jurídicos, especificamente os constitucionais, e destacar aspectos relevantes do princípio do contraditório. 

O interesse sobre o tema nasceu da necessidade de se solidificarem conceitos básicos que são fundamentais para o Direito Constitucional e que, uma vez assentados, naturalmente estimulam a passar a indagações mais complexas e tão importantes quanto aquele.

O princípio do contraditório merece expressiva atenção porque dele decorre a garantia de manifestação das partes em diversas fases processuais com direito de defesa. É princípio que garante as partes tomar conhecimento da pretensão que existe sobre ela.

O Princípio do contraditório é princípio constitucional. Por isso, o estudo de tal preceito pressupõe considerações prévias do que seja princípio, qual o seu posicionamento no ordenamento jurídico, por fim definir as funções que eles desempenham. Pressupõe, ainda, análise das características dos princípios constitucionais.

Procurar-se-á estudar o princípio do contraditório a partir de seu significado, conteúdo e alcance, passando por brevíssima análise histórica, pelas peculiaridades do princípio, pela demonstração de seu respeito com a concessão das liminares, para concluir com algumas anotações sobre a posição ocupada pelo princípio na Constituição de 1988.

Os ensinamentos de jurisconsultos especializados servirão de guia para realizar o fim proposto, sendo de extrema valia.

 

2. PRINCIPIOS CONSTITUCIONAIS

2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Em sendo o processo instrumento público, permeado de regras rígidas e formais, constituindo hoje, verdadeira garantia fundamental de todo cidadão, deve ser realizado mediante a aplicação de todos os princípios e normas a ele pertinentes, de modo que a tutela jurisdicional final seja obtida sem qualquer violação ao conceito de devido processo legal.

Embora, com características estruturais bem diferentes da norma jurídica, os princípios constitucionais têm a sua natureza de lei, tendo em vista que formam a base, o guia pelo qual os atos jurídicos deverem seguir.

Ao serem postos no ponto mais alto da escala normativa (Constituição), os princípios se convertem em norma normarum, ou seja, norma das normas[1].

Auxiliam tanto na compreensão do conteúdo e extensão do comando inserido nas normas jurídicas quanto, em caso de lacuna, atuam como fator de integração da omissão acaso existente.

Para Miguel Reale ² os princípios são certos enunciados lógicos admitidos como condição ou  base de validade das demais asserções que compõem dado campo do saber ²[2].

Nos dizeres de Celso Antônio Bandeira de Mello, “ Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome de sistema jurídico positivo”[3]

 

2.2. CARACTERÍSTICAS E NATUREZA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

Verifica-se nos princípios constitucionais o caráter da generalidade e da primariedade. A generalidade destes princípios decorre das aspirações sociais, éticas e políticas da sociedade, vez que eles apenas direcionam o conteúdo de outros princípios e das regras constitucionais. São primários porque deles decorrem outros princípios.

Importante salientar que, apesar dos princípios constitucionais serem dotados de conteúdo ético, não constituem verdades absolutas e sujeitam-se sempre à mutabilidade ocasionada pela ação de movimentos constituintes. Além disso, a maneira de interpretar um princípio sofre variações, conforme o momento histórico em que tal interpretação se realiza.

Conquanto caracterizados pela generalidade de seus conteúdos, os princípios constitucionais são objetivos, ou seja, têm substância jurídica própria, cuja explicitação é tarefa do aplicador das normas nas quais eles se contêm. Não possuem conteúdos aleatórios, de forma que não é permitido a seus aplicadores criar sentidos contrários ao conteúdo próprio e a identidade singular que eles conferem à ordem jurídica.

Essa idéia de objetividade dos princípios constitucionais  vincula-se a idéia de segurança e certeza jurídica, pois impede que os aplicadores digam o direito segundo suas visões próprias, as quais, algumas vezes, podem se confrontar, drasticamente, ao texto constitucional.

Porém, no texto da Constituição, os conteúdos normativos dos princípios ultrapassam a literalidade de seus significados. Isso importa na atualização dos conteúdos principialistas, das normas constitucionais. Para se garantir eficácia e efetividade do sistema normativo constitucional, é necessário que haja sincronia entre as bases normativas  delineares deste sistema e o momento político e jurídico vivenciado pelos destinatários de suas normas.

Dessa forma, os princípios constitucionais tornam-se passíveis de serem mutáveis para se adaptarem às novas contingências sociais apresentadas e sedimentadas.

Nesse contexto, a plasticidade dos conteúdos principialistas constitucionais, “é que permite se mude o sentido dos textos constitucionais sem a alteração de seus enunciados normativos, garantindo-se a eficiência do ordenamento constitucional, que deve se plasmar às novas visualizações sociais do Direito”[4]

É óbvio, porém vale registrar, que a  produção normativa do Estado (leis, atos administrativos, etc.) ou da sociedade (contratos, convenções, etc.) não poderá ser oposta ao principiologicamente estabelecido na Constituição. Logo, conclui-se que os princípios constitucionais informam todo o sistema jurídico de um Estado.

Por fim, não há que se negar ao princípio constitucional a sua natureza de norma, ainda que com características estruturais e funcionais bem diferentes de outras normas jurídicas, como as regras de direito.

Essa característica de normatividade jurídica, vale salientar, foi construída a partir da idéia de que a Constituição é lei e de que seus enunciados têm força normativa.

 

3. PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO

3.1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Embora que com o passar dos tempos, os princípios tenham a mesma essência, o mesmo teor, a sua aplicação e extensão se molda ao momento em que a sociedade vive, sofrendo influências do meio social.

Com o princípio do contraditório não é diferente, uma vez que acompanha a evolução da sociedade, e  não foge dos valores e circunstâncias da época em que exercido.

Em épocas remotas, o juiz romano mostrava-se incapaz de julgar aquele que voluntariamente se recusasse a comparecer em juízo, se o autor não fosse suficiente para fazer com que se apresentasse.

Da mesma forma, ocorria com o antigo direito germânico que quando não dispunha de outro meio para obrigar o demandado a fazer as pazes com o Estado ofendido, embargava seus bens como forma de forçar o comparecimento.

Com o decorrer dos tempos, a cultura foi modificando e com o procedimento contumacial do direito romano pós-clássico, o tribunal podia promover atos processuais na ausência do demandado, desde que com a sua prévia cientificação.

O que acontecia, na verdade, era que o contraditório só ocorria com o comparecimento da parte passiva voluntariamente na demanda.

Por outro ângulo, “ no processo comum europeu, cujo esteio era precisamente o contraditório, revelava o princípio sentido totalmente distinto daquele hoje dominante no cenário jurídico processual. O processo, fartamente influenciado pelas idéias expressas na retórica e na tópica aristotélica, era concebido e pensado como ars dissedendi e ars oponendi et respondendi, exigindo de maneira intrínseca uma paritária e recíproca regulamentação do diálogo jurídico.”[5]

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A partir do século XVII, com a estatização do processo, o príncipe passa a reivindicar o monopólio da legislação em matéria processual, que se agravou com as idéias iluministas  e com o estouro da Revolução Francesa.

Sucessivamente, no século XX, com a ânsia da efetividade, outros valores passaram a atingir a garantia, a exigir mais do que a simples realização de um ato processual.

Era a tentativa de se fazer com que as partes figurassem igualmente no processo, de forma a se tornar acessível a todos na sociedade.

Por conseguinte, nos anos 50 deste século se recupera o valor essencial do diálogo judicial, da cooperação das partes com o órgão judicial e deste com as partes, em virtude das regras formais do processo.

Para Carlos Alberto Alváro “ com necessidade de uma solução mais eficiente e rápida do litígio, insere-se o valor da efetividade. O seu reflexo na extensão do contraditório é imediato e de largo espectro, porquanto encontra seu melhor instrumento técnico na possibilidade de concessão de medidas conservativas ou mesmo antecipatórias dos efeitos da futura sentença de mérito, antes do término normal do processo e até liminarmente, mesmo antes de ser ouvida a parte demandada sobre a pretensão exercida em juízo”[6]

 Dessa forma, tal evolução veio demonstrar a necessidade de respeito à dignidade humana e aos valores da democracia no âmbito processual, bem como veio exaltar o concreto exercício do direito de defesa da parte, objetivando a formação do livre convencimento do juiz.

No dias atuais, após grande percurso de luta, o princípio do contraditório conseguiu demarcar a sua importância, bem como estender o seu campo de atuação, inclusive, para o processo administrativo.

 

3.2. PREVISÃO LEGAL E CONCEITO

Em decorrência da complexidade da sociedade, vários conflitos surgem entre pessoas com mesmos objetivos e interesses. Tais conflitos buscam, no Estado, através da prestação jurisdicional, a solução para as mais variadas pretensões.

Para que o Estado solucione a lide da melhor maneira, resguardando e aplicando o direito de cada parte, faz-se necessária à manifestação de todos os componentes do litígio, seja do autor, ou seja, do  réu.

Essa participação ativa das partes no processo, faz com que a decisão terminativa reflita de maneira clara e precisa a realidade dos fatos objeto da relação existente, e é resguardada através de princípio constitucional, qual seja, do contraditório.

O princípio do contraditório, por sua vez, é decorrente da Constituição Federal quando dispõe que “ aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerente”( art. 5º, n. LV, da CF).

 Diferentes autores, conforme sejam também diversas fontes em que buscam seus conhecimentos, bem como diferentes sejam seus posicionamentos ideológicos e filosóficos que adotem, dão, com base nesses e noutros dados, sua visão a respeito do princípio do contraditório.

 Na realidade, o contraditório representa o complemento e o corretivo da ação da parte, uma vez que cada uma delas agirá de modo parcimonioso, visando o seu próprio interesse. Assim, a ação combinada dos dois leva à justa composição da lide.

Para Rui Portanova o princípio do contraditório é “ a ciência bilateral dos atos e termos processuais e possibilidade de contrariá-los com alegações e provas”[7]

Ada Pellegrini Grinover afirma que a tese e a antítese, no diálogo processual, são representadas exatamente pela ação e pela defesa – mais uma vez em seu sentido mais amplo – sendo esta correlata àquela, ou antes, justaposta, como força contrastante; que as partes hão de gozar de igual idoneidade técnica e dispor de situações subjetivas análogas, de modo que a função que exercem tenham a mesma eficácia dinâmica no plano dialético. E, finalmente, que o processo jurisdicional moderno não pode abrir mão daquele tipo particular de colaboração que se realiza por intermédio do contraditório, exatamente entendido como método de busca da verdade baseado na contraposição dialética.[8]

Luiz Guilherme Marinoni discorre que “o princípio do contraditório, na atualidade, deve ser desenhado com base na igualdade substancial, já que não pode se desligar das diferenças sociais e econômicas que impedem a todos de participar efetivamente do processo”.[9]

Ainda em relação ao princípio do contraditório, Liebman diz que “ a garantia fundamental da justiça e regra essencial do processo é o princípio do contraditório, segundo este princípio, todas as partes devem ser postas em posição de expor ao juiz as suas razões antes que ele profira a decisão. As partes devem poder desenvolver suas defesas de maneira plena e sem limitações arbitrárias, qualquer disposição legal que contraste com essa regra deve ser considerada inconstitucional e por isso inválida”. [10]

Enfim, verifica-se que a única forma de garantir e evitar restrições indevidas deve ser estruturar o processo sob a forma do contraditório, sendo que a bilateralidade da ação e da pretensão gera a bilateralidade do processo, e nisso reside o fundamento lógico do contraditório.

 

3.3 CONTRADITÓRIO, AMPLA DEFESA E IGUALDADE DAS PARTES

Entre  o princípio do contraditório, da ampla defesa e da igualdade das partes, existe um estreito elo de ligação decorrente da proximidade de seus conteúdos, essências e objetivos.

É em decorrência de todos serem iguais perante a Lei, que as partes no processo são tratadas da maneira mais homogênea possível, de modo a se manifestar contra a pretensão adversária não só no momento inicial do processo, mas também tomar conhecimento de todos os atos processuais.

Para Nelson Nery “ O princípio do contraditório, além de fundamentalmente constituir-se em manifestação do princípio do estado de direito, tem íntima ligação com o da igualdade das partes e do direito de ação, pois o texto constitucional, ao garantir aos litigantes o contraditório e a ampla defesa, quer significar que tanto o direito de ação, quanto o direito de defesa são manifestação do princípio do contraditório”[11].

A ampla defesa tem uma estreita conexão, já que é do contraditório que brota a defesa das partes, de maneira a possibilitar a realização das alegações e provas com intuito de demonstrar a verdade dos fatos e o direito.

Humberto Theodoro Junior entende que “ o principal consectário do tratamento igualitário das partes se realiza através do princípio do contraditório, que consiste na necessidade de ouvir a pessoa perante a qual será proferida a decisão, garantindo-lhe o pleno direito de defesa e de pronunciamento durante todo curso do processo”.[12]

Por fim, vale ressaltar que o princípio da igualdade das partes impõe  a bilateralidade da audiência, já que a possibilidade de reação de qualquer das partes em relação à pretensão da outra, depende sempre da informação do ato praticado. Daí o fundamento da citação da parte contrária, quando válida, estabelecendo a relação jurídica processual.

 

3.4 PECULIARIDADES DO CONTRADITÓRIO

 A Constituição Federal de 1988, inovou o princípio do contraditório no que tange ao seu alcance, tendo em vista que em outros tempos o respeito à contradição só era exaltada para o processo penal.

Porém, não obstante esse alargamento, o contraditório se adapta e restringe às peculiaridades do processo onde está sendo invocando, seja no processo civil, penal ou administrativo.

O princípio do contraditório, como visto, garante às partes o direito de manifestarem no processo, realizando os atos que se fizerem necessários para o deslinde da questão.

Gera, inclusive, maior facilidade para o julgamento da causa, eis que a tentativa de descaracterizar o direito da outra parte faz com que o maior número de informações sejam trazidas aos autos.

O multicitado princípio, se dá, inicialmente, quando a parte demandada toma ciência, através da citação, de que sobre ela existe uma lide para que possa se defender.

Essa oportunidade é obrigatória, sob pena de uma posterior anulação dos atos processuais e infração de princípio constitucional, devendo ser real e efetiva e não meramente formal.

Desse modo, a plenitude e a efetividade do contraditório devem indicar a necessidade de se utilizarem todos os meios necessários para evitar que a disparidade de posições no processo possa incidir sobre o seu êxito, condicionando-o a uma distribuição desigual de forças.

Para Nelson Nery, “essa oportunidade tem de ser real, efetiva, pois o princípio constitucional não se contenta com o contraditório meramente formal”.[13]

A atitude do réu pode ser externada de diversas formas, como por exemplo, não comparecer em juízo para se manifestar. Contudo, independente de qual seja a posição adotada, o princípio do contraditório foi cumprido a partir do momento em que a parte tomou ciência da existência da lide.

Sendo assim, não se pode falar que a revelia fere o princípio em tela, posto que a parte teve o seu direito resguardado, qual seja, o de ser comunicada de que sobre ela existe uma pretensão e que, portanto, poderia se defender através de suas alegações e provas. 

O contraditório não tem como alvo, o juiz , promotores ou peritos. Na realidade, está voltado para os interessados, ou seja, para as partes que vêm no processo, o meio pelo qual os seus objetivos serão alcançados ou os seus conflitos dirimidos.

Embora quando do julgamento, o juiz tenha se utilizado dos frutos que colheu da bilateralidade da audiência, da manifestação das partes, ainda assim, não usufruiu da garantia constitucional, já que essa é assegurada aos interessados.

A própria essência do contraditório exige que participem do processo pelo menos dois sujeitos.

 No que se refere às provas, “ o contraditório centra-se na necessidade de amplo debate e maior proximidade do juiz com a parte. Com isso, propugna-se mais pela oralidade do que pelo julgamento antecipado da lide, principalmente quando este implica indeferimento de prova”.[14]

O procedimento probatório deve desenvolver-se através do contraditório das partes, no diálogo constante entre as partes e o juiz. Nenhuma iniciativa de instrução, das partes ou do juiz, pode prosseguir sem que a parte, onerada pela iniciativa, tenha sido capacitada para defender-se e formular as suas contradeduções.

Não se pode dizer também que o julgamento antecipado da lide (art.330 do CPC) fere o contraditório,  uma vez que, quando o processo chega a esse momento, supõe-se que já houve a citação.

Faz-se necessário ressaltar, que o princípio do contraditório não termina após a sentença, tendo em vista que “se já na elaboração da inicial a idéia de bilateralidade tem seus reflexos, por igual a sentença, com a necessidade de motivação, é informada pelo princípio. Com efeito, ao julgar, o juiz reflete a importância que deu ao direito da parte de influir em seu convencimento e esclarecer os fatos da causa”.[15] 

O contraditório ainda se manifesta no processo executivo, a partir do momento em que á dada, a parte executada, a oportunidade de se manifestar através dos embargos, por exemplo.

Para Nelson Nery “o contraditório também se manifesta no processo de execução, embora de forma menos abrangente e incisiva do que nos processos de conhecimento e cautelar, pelas próprias peculiaridades do processo executivo. Com os embargos do devedor se instaura verdadeiro processo de conhecimento incidentemente ao processo de execução. Nos embargos, por óbvio, incide o contraditório amplo. No entanto, mesmo antes de opor embargos de devedor, o que somente pode ocorrer depois de seguro o juízo pela penhora, o devedor pode utilizar-se de outros instrumentos destinados à impugnação no processo de execução, notadamente no que respeita às questões de ordem pública, por meio da impropriamente denominada exceção de preexecutividade”.[16]

Assim sendo, percebe-se a evolução da postulação do princípio do contraditório e sua aplicação nos dias atuais. Realmente, às partes deve ser ofertada a oportunidade de intervirem, garantindo a contraposição dialética na busca da verdade, deixando a seu livre arbítrio exercer esse direito ou não.

 

4. TUTELA CAUTELAR, TUTELA ANTECIPADA E CONTRADITÓRIO

Existem algumas situações na sociedade, em que as partes não podem esperar o transcurso normal do processo para obter a prestação jurisdicional, pois corre o risco de perder o seu direito ou até mesmo o objeto do seu direito.

Por essa razão, a Legislação pátria, objetivando resguardar tais situações,  previu o processo cautelar, bem como o instituto da antecipação dos efeitos da tutela.

O processo cautelar  “ contenta-se em outorgar situação provisória de segurança para os interesses dos litigantes”. [17]

O juiz pode conceder liminarmente a medida liminar pleiteada, quando verificar que se a outra parte for citada, pode tornar a medida ineficaz. ( Código de Processo Civil, artigo 804).

Já o instituto da antecipação dos efeitos da tutela, tem como objetivo entregar a prestação jurisdicional no sentido de adiantar, total ou parcialmente, o mérito. ( Código de Processo Civil, artigo 273)

Em decorrência dessa antecipação e da concessão de liminar em cautelar sem o conhecimento prévio da outra parte, levanta-se a possibilidade de atentado ao princípio do contraditório.

Ocorre que, a concessão das liminares não fere o contraditório, tendo em vista que a parte demandada terá conhecimento da decisão e poderá, então, tomar as providências cabíveis para demonstrar o seu direito.

Para Marcus Orione, nesses casos pretende-se apenas, presentes os requisitos legais, que se evite o imediato perecimento do direito, devendo-se, logo a seguir, abrir oportunidade de manifestação à outra parte. O perecimento do direito implicaria a inviabilidade da própria instauração da relação jurídico-processual, sem que se pudesse sequer, no momento devido, ocorrer o contraditório”.[18]

Quando se trata de concessão de liminares, seja através de cautelar, de antecipação dos efeitos da tutela, de liminares em ação possessória, mandado de segurança ou até mesmo ação civil pública, há uma limitação a bilateralidade da audiência.[19].

Para Nelson Nery ainda, “ isto não quer significar, entretanto, violação do princípio constitucional, porquanto a parte terá oportunidade de ser ouvida, intervindo posteriormente no processo, inclusive com direito a recurso contra a medida liminar concedida sem a sua participação. Aliás, a própria provisoriedade dessas medidas indica a possibilidade de sua modificação posterior, por interferência da manifestação da parte contrária, por exemplo.”[20]

Tais medidas têm base no interesse superior de justiça, o qual poderia ser prejudicado caso a parte adversa tomasse ciência dos atos processuais antes de sua realização.

Ademais, vale ressaltar que presentes os requisitos para concessão das mencionadas medidas, o juiz fica obrigado a concedê-las, eis que não é uma faculdade e sim obrigatoriedade. 

 Rui Portanova, por sua vez entende que “ o Código de Processo Civil, como se verá, tem diversos dispositivos que permitem afastar toda sorte de surpresas e segredos que de forma alguma se compatibilizam com um processo democrático. Concede-se, contudo, a existência de provimentos liminares. As justificativas para tais exceções centram-se me razões de urgência e interesse público. Mesmo assim, o contraditório não fica afastado de todo, em face da posterior comunicação da decisão liminar. Ademais, o demandado se tiver conhecimento do processo antes da decisão do juiz poderá desenvolver atividade processual plena mesmo antes de efetivada a medida liminar [21]”.

 Enfim, haveria ofensa ao princípio do contraditório, se,  quando da concessão da liminar, não fosse dada a parte adversa a oportunidade de se defender ou de recorrer da decisão proferida.

 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os princípios possuem uma demasiada importância técnica e filosófica no âmbito jurídico, podendo ser definidos como verdade básica da ciência jurídica, funcionando como pilares fundamentais da construção de todo estudo doutrinário e de todo ordenamento jurídico positivo. A interpretação adequada a realidade, política, social, econômica e jurídica da época servem de fundamento ao direito positivo, orientam na busca de sentido e alcance das normas.

A Constituição é lei, logo não há como negar a normatividade jurídica dos princípios constitucionais, o contraditório se assenta em fundamentos lógico e político para proteger as partes no sentido de que sempre que existir sobre elas uma pretensão, lhes será dado o direito de defesa, estando o mesmo disseminado nas legislações extraconstitucionais como no processo civil, penal e administrativo.

A manifestação das partes no processo em decorrência do contraditório, ajuda no deslinde da questão e tem uma íntima ligação com o princípio da ampla defesa e igualdade das partes que deve se adaptar ao processo em que está sendo utilizado, ou seja, se estiver sendo utilizado no Processo Civil, deve perceber as peculiaridades da matéria.

 

REFERENCIAS

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THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 20 ª. ed. Rio de Janeiro:Forense,1997.v.1.


[1] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 1996, pp. 261.

[2] REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito, 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 1991. P.299.

[3] MELLO, Celso Antônio Bandeira. Elementos de Direito Administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. P. 230.

[4] ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de Princípios Constitucionais. 1ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999,p.81.

[5] OLIVEIRA, Carlos Alberto Alváro. “Garantia do Contraditório”. In Garantias processuais do processo civil Coordenação José Rogério Cruz e Tucci. 1ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais: 1999, p.134.

[6] OLIVEIRA, Carlos Alberto Alváro. “Garantia do Contraditório”. In Garantias processuais do processo civil Coordenação José Rogério Cruz e Tucci. 1ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais: 1999, p.137.

[7] PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 3ª ed. Porto Alegre: Do Advogado, 1999. P. 160

[8] GRINOVER, Ada Pellegrini. As garantias constitucionais do processo, in Novas tendências do direito.rocessual,2ª ed. Rio de Janeiro:  Forense, 1990.

[9] MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1996. P. 147.

[10] LIEBMAN, Enrico Tulli. Apud. MARCATO, Antônio Carlos. Preclusões: Limitação ao Contraditório?. Revista de Processo. São Paulo, ano V, nº 17, 1980. p 111.

[11] NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios de Processo Civil na Constituição Federal. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. P. 128.

[12]THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 20 ª . ed. Rio de Janeiro: Forense, 97.v.1

[13] NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios de processo civil na constituição federal. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. P. 131.

[14] PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 3ª ed. Porto Alegre: Do Advogado, 1999. P. 162.

[15] PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 3ª ed. Porto Alegre: Do Advogado, 1999. P. 163.

[16] NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios de Processo Civil na Constituição Federal. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. P. 136.

[17] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 20 ª . ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. V. II. p. 360.

[18] CORREIA, Marcus Orione Gonçalves. Direito Processual Constitucional. 1ª . ed. São Paulo: Saraiva, 1998. P. 15.

[19] NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios de Processo Civil na Constituição Federal. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. P. 140.

[20] NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios de Processo Civil na Constituição Federal. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. P. 141.

[21] PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. 3ª ed. Porto Alegre: Do Advogado, 1999. P. 162.

Sobre os autores
Paulo Joviniano Alvares dos Prazeres

Doutorando em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco UNICAP; Doutorando em Ciências da Educação pela Universidad Autonoma de Asuncion UAA; Doutorando em Direito e Ciências Sociais pela Universidad Nacional de Cordoba UNC; Mestre em Direito pela Faculdade Damas da Instrução Crista FADIC; Mestre em Ciências da Educação pela Universidad Del Sol UNADES; Mestre em Direito das Relações Internacionais pela Universidad de la Empresa UDE; Especialista em Direito Internacional pela Faculdade Católica Paulista FACAP; Especialista em Filosofia e Sociologia pela Faculdade Venda Nova do Imigrante FAVENI; Especialista em Direito Tributário pela Faculdade INESP; Especialista em Direito Publico pela Faculdade Mauricio de Nassau FMN; Graduado no curso de magistratura e demais carreiras jurídicas pela Escola de Magistratura de Pernambuco ESMAPE; Bacharel em Ciências Contábeis pelo Centro Universitário Cidade Verde UNIFCV; Bacharel em Relações Internacionais pelo Centro Universitário Internacional UNINTER; Licenciado em Pedagogia pela Faculdade FACESE; Licenciado em Filosofia pela Faculdade Entre Rios do Piauí FAERPI; Graduado em Teologia pela Faculdade de Teologia Integrada FATIN; Graduado em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco UNICAP; Pesquisador do grupo de estudos em Educação e Direitos Humanos da Universidade Federal da Paraíba UFPB; Membro Associado e Avaliador do Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito - CONPEDI; Presidente da Academia de Letras Jurídicas de Olinda; Advogado, Consultor Jurídico, Professor Universitário e de pós-graduações e cursos preparatórios, Presidente da Subsecção da OAB Olinda-PE.

Karla Luzia Alvares dos Prazeres

Bacharela em Direito pelas Faculdades Integradas Barros Melo. Mestranda em Direito pela Faculdade Damas da Instrução Cristã. Mestranda em Direito Internacional pela Universidad Autónoma de Asunción. Pós-graduada em Direito Público pela Faculdade Maurício de Nassau; Estudos de Perícias Forenses, Criminologia e Medicina Legal; Direito Tributário; e Saúde Pública com Ênfase em PSF pela Faculdade INESP. Aperfeiçoamento Jurídico no Curso de Preparação à Magistratura e Carreiras Jurídicas pela Escola da Magistratura de Pernambuco ESMAPE. Presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas de Olinda - AATO. Diretora Geral da Escola Municipal de Advocacia da OAB-OLINDA. Presidente da Comissão de Carreiras Jurídicas da Academia Brasileira de Ciências Criminais. Conselheira na Subseccional da OAB Olinda. Foi Vice-presidente da Comissão do Direito do Trabalho (2016-2018). Foi Representante da Caixa de Assistência dos Advogados de Pernambuco (CAAPE) na Subseccional de Olinda (2015-2018). Membro fundador da Academia de Letras Jurídicas de Olinda. Membro da Academia Brasileira de Ciências Criminais. Advogada, Consultora Jurídica, Professora Universitária e de Pós-graduações, Conciliadora e Mediadora inscrita no Cadastro Nacional de Conciliadores e Mediadores do CNJ.

Michele Del Pino

Bacharela em Direito pela Faculdade Marista do Recife. Mestranda em Direito pela Faculdade Damas da Instrução Cristã; Mestranda em Direito Internacional pela Universidad Autónoma de Asunción; Pós-graduada em Direito Público e Poder Legislativo pela UPE; Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, Faculdade Estácio do Recife; Direito Previdenciário pelo Instituto INFOC; MBA em Gestão Jurídica no Poder Judiciário pela Faculdade INESP; Estudos de Perícias Forenses, Criminologia e Medicina Legal pela Faculdade INESP; Gestão e Docência no Ensino Superior pala Faculdade Novo Horizonte. Presidente da Comissão de Direito do Trabalho da OAB Olinda. Conselheira na Subseccional da OAB Olinda. Advogada, Consultora Jurídica, Professora Universitária e de Pós-graduações.

Felipe Cesar Nascimento de Castro

Advogado e Professor. Mestrando em Direito Internacional pela Universidad Autónoma de Asunción - UAA, Compõe os quadros do Escritório Agostinho, Monteiro & Castro Advogados Associados (Recife - PE); Professor do Curso de Direito da Autarquia de Ensino Superior de Goiana; Secretário Geral da ANACRIM - Associação Nacional de Advocacia Criminal em Pernambuco; Especialista em Direito Público (Faculdade INESP); Especialista em Estudos de Perícias Forenses, Criminologia e Medicina Legal; Especialista em Gestão e Docência do Ensino Superior (Faculdade Novo Horizonte); Secretário Geral do IPANEC - Instituto Pan Americano de Educação, Ciências e Cultura, onde leciona as disciplinas de Constitucional, Direito Eleitoral, História do Direito, Ética, Direito Civil e Processual Civil, Direito Internacional e Direito Ambiental. Tem experiência em Direito Penal, Ambiental e Compliance. Membro da Academia Brasileira de Ciência Criminais - ABCCRIM, Diretor Cultural da Escola Municipal da Advocacia - OAB Olinda e Atualmente é Conselheiro e Coordenador de Comissões da Ordem dos Advogados do Brasil - Subseção Olinda-PE.

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