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Defesa para o Art. 38-A da Lei de Crimes Ambientais - Lei 9605/98

O crime ambiental de destruir ou danificar vegetação primária ou secundária do Bioma Mata Atlântica exige o preenchimento de dois requisitos.

Agenda 06/04/2020 às 07:55

Veja os requisitos para a configuração do crime ambiental do art.38-A da lei 9605/98.

 

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O crime ambiental do art. 38-A, da Lei 9.605/98, criminaliza a conduta de destruir ou danificar vegetação em Bioma Mata Atlântica:

Art. 38-A. Destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção: […]

Acerca do referido tipo penal, retira-se da doutrina de Guilherme de Souza Nucci:

O objeto protegido é a vegetação, primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica (é o conjunto de vegetação predominante na Mata Atlântica).
Para efeito de destruição ou dano não se envolve o estágio inicial de regeneração da vegetação […]
O tipo penal difere do anterior (art. 38), pois cuida não somente da floresta, mas da vegetação em geral existente na Mata Atlântica. Logo, não deixa de ser um tipo especial em relação ao anterior.
(Leis penais e processuais penais comentadas. 6. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 568).

Diante desse cenário, prevê o art. 2º da Lei 11.428/2006, sobre a utilização e proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica, e dá outras providências, considerando como integrantes as seguintes formações florestais nativas e ecossistemas associados, com as respectivas delimitações estabelecidas em mapa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, conforme regulamento:

 

Já o parágrafo único do referido artigo disciplina que somente os remanescentes de vegetação nativa no estágio primário e nos estágios secundário inicial, médio e avançado de regeneração na área de abrangência definida no caput deste artigo terão seu uso e conservação regulados por esta Lei.

Por sua vez, consta do art. 4º, § 2º, IX, da referida legislação:

Art. 4º A definição de vegetação primária e de vegetação secundária nos estágios avançado, médio e inicial de regeneração do Bioma Mata Atlântica, nas hipóteses de vegetação nativa localizada, será de iniciativa do Conselho Nacional do Meio Ambiente.
 O Conselho Nacional do Meio Ambiente terá prazo de 180 (cento e oitenta) dias para estabelecer o que dispõe o caput deste artigo, sendo que qualquer intervenção na vegetação primária ou secundária nos estágios avançado e médio de regeneração somente poderá ocorrer após atendido o disposto neste artigo.
Na definição referida no caput deste artigo, serão observados os seguintes parâmetros básicos:
I – fisionomia;
II – estratos predominantes;
III – distribuição diamétrica e altura;
IV – existência, diversidade e quantidade de epífitas;
V – existência, diversidade e quantidade de trepadeiras;
VI – presença, ausência e características da serapilheira;
VII – sub-bosque;
VIII – diversidade e dominância de espécies;
IX – espécies vegetais indicadoras.
Com efeito, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), editou a Resolução 4, de 4 de maio de 1994, para definir as vegetações primária e secundária nos estágios inicial, médio e avançado de regeneração da Mata Atlântica:
Art. 1º Vegetação primária é aquela de máxima expressão local, com grande diversidade biológica, sendo os efeitos das ações antrópicas mínimos, a ponto de não afetar significativamente suas características originais de estrutura e de espécies, onde são observadas área basal média superior a 20,00 m2/ha, DAP médio superior a 25 cm e altura total média superior a 20 m.
Art. 2º Vegetação secundária ou em regeneração e aquela resultante dos processos naturais de sucessão, após supressão total ou parcial da vegetação primária por ações antrópicas ou causas naturais, podendo ocorrer árvores remanescentes da vegetação Primária.
Art. 3º Os estágios em regeneração da vegetação secundária a que se refere o artigo 6º do Decreto no 750/93, passam a ser assim definidos:
I – Estágio inicial de regeneração:
a) Nesse estágio a área basal média é de até 8 m2 /ha;
b) Fisionomia herbáceo/arbustiva de porte baixo; altura total média até 4 m, com cobertura vegetal variando de fechada a aberta;
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c) Espécies lenhosas com distribuição diamétrica de pequena amplitude: DAP médio até 8 cm;
d) Epífitas, se existentes, são representadas principalmente por líquens, briófitas e pteridófitas, com baixa diversidade;
e) Trepadeiras, se presentes, são geralmente herbáceas;
f) Serapilheira, quando existente, forma uma camada fina pouco decomposta, contínua ou não;
g) Diversidade biológica variável com poucas espécies arbóreas ou arborescentes, podendo apresentar plântulas de espécies características de outros estágios;
h) Espécies pioneiras abundantes;
i) Ausência de subosque;
j) Espécies indicadoras:
j.1) Floresta Ombrófila Densa: Pteridium aquilium (Samambaia-das-Taperas), e as hemicriptófitas Melinis minutiflora (Capim-gordura) e Andropogon bicornis (capim-andaime ou capim-rabo-de-burro) cujas ervas são mais expressivas e invasoras na primeira fase de cobertura dos solos degradados, bem assim as tenófitas Biden pilosa (picão-preto) e Solidago microglossa (vara-de-foguete), Baccharis elaeagnoides (vassoura) e Baccharis dracunculifolia (Vassoura-braba), j.2) Floresta Ombrófila Mista: Pteridium aquilium (Samambaia-das Taperas), Melines minutiflora (Capim-gordura), Andropogon bicornis (Capim-andaime ou Capim-rabode-burro), Biden pilosa (Picão-preto), Solidago microglossa (Vara-de-foguete), Baccharis elaeagnoides (Vassoura), Baccharis dracunculifolia (Vassoura-braba), Senecio brasiliensis (Flôr-das-almas), Cortadelia sellowiana (Capim-navalha ou macegão), Solnum erianthum (fumo-bravo). j.3) Floresta Estacional Decidual : Pteridium aquilium (Samambaia-das-Taperas), Melinis minutiflora (Capim-gordura), Andropogon bicornis (Capim-andaime ou Capim-rabode-burro), Solidago microglossa (Vara-de-foguete), Baccharis elaeagnoides (Vassoura), Baccharis dracunculifolia (Vassoura-braba), Senecio brasiliensis (Flôr-das-almas), Cortadelia sellowiana (Capim-navalha ou macegão), Solanum erianthum (Fumo-bravo).
II – Estágio médio de regeneração:
a) Nesse estágio a área basal média é de até 15,00 metros quadrados por hectare;
b) Fisionomia arbórea e arbustiva predominando sobre a herbácea podendo constituir estratos diferenciados; altura total média de até 12 metros;
c) Cobertura arbórea variando de aberta a fechada, com ocorrência eventual de indivíduos emergentes;
d) Distribuição diamétrica apresentando amplitude moderada, com predomínio dos pequenos diâmetros: DAP médio de até 15 centímetros;
e) Epífitas aparecendo com maior número de indivíduos e espécies em relação ao estágio inicial, sendo mais abundantes na floresta ombrófila;
f) Trepadeiras, quando presentes, são predominantemente lenhosas;
g) Serapilheira presente, variando de espessura, de acordo com as estações do ano e a localização;
h) Diversidade biológica significativa;
i) Subosque presente;
j) Espécies indicadoras:
j.1) Floresta Ombrófila Densa: Rapanea Ferruginea (Capororoca), árvore de 7,00 a 15,00 metros de altura, associada a Dodonea viscosa (Vassoura-vermelha).
j.2) Floresta Ombrófila Mista: Cupanea vernalis (Cambotá-vermelho), Schinus therebenthifolius (Aroeira-vermelha), Casearia silvestris (Cafezinho-do-mato).
j.3) Floresta Estacional Decidual: Inga marginata (Inga feijão), Baunilha candicans (Pata-de-vaca).
III – Estágio avançado de regeneração:
a) Nesse estágio a área basal média é de até 20,00 m2 /ha;
b) Fisionomia arbórea dominante sobre as demais, formando um dossel fechado e relativamente uniforme no porte, podendo apresentar árvores emergentes; altura total média de até 20 m;
c) Espécies emergentes ocorrendo com diferentes graus de intensidade;
d) Copas superiores horizontalmente amplas;
e) Epífitas presentes em grande número de espécies e com grande abundância, principalmente na floresta ombrófila;
f) Distribuição diamétrica de grande amplitude: DAP médio de até 25 cm;
g) Trepadeiras geralmente lenhosas, sendo mais abundantes e ricas em espécies na floresta estacional;
h) Serapilheira abundante;
i) Diversidade biológica muito grande devido à complexidade estrutural;
j) Estratos herbáceo, arbustivo e um notadamente arbóreo;
k) Florestas nesse estágio podem apresentar fisionomia semelhante à vegetação primária;
l) Subosque normalmente menos expressivo do que no estágio médio;
m) Dependendo da formação florestal pode haver espécies dominantes;
n) Espécies indicadoras:
n.1) Floresta Ombrófila Densa: Miconia cinnamomifolia, (Jacatirão -açu), árvore de 15,00 a 20,00 m de altura, formando agrupamentos bastante densos, com copas arredondadas e folhagem verde oliva, sendo seu limite austral a região de Tubarão, Psychotria longipes (Caxeta), Cecropia adenopus (Embaúba), que formarão os primeiros elementos da vegetação secundária, começando a aparecer Euterpe edulis (palmiteiro), Schizolobium parahiba (Guapuruvu), Bathiza meridionalis (Macuqueiro), Piptadenia gonoacantha (paujacaré) e Hieronyma alchorneoides (licurana), Hieronyma alchorneoides (licurana) começa a substituir a Miconia cinnamomifolia (Jacutirão-açu), aparecendo também Alchornea triplinervia (Tanheiro), Nectandra leucothyrsus (Canela-branca), Ocotea catharinensis (Canela-preta), Euterpe-edulis (Palmiteiro), Talauma ovata (Baguaçu), Chrysophylum viride (Aguai) e Aspidosperma olivaceum (peroba-vermelha), entre outras.
n.2) Floresta Ombrófila Mista: Ocotea puberula (Canela guaica), Piptocarpa angustifolia (Vassourão-branco), Vernonia discolor (Vassourão-preto), Mimosa scabrella (Bracatinga).
n.3) Floresta Estacional Decidual: Ocotea puberula (Canela-guacá), Alchornea triplinervia (Tanheiro), Parapiptadenia rigida (Angico-vermelho), Patagonula americana (Guajuvirá), Enterolobium contortisiliguum (Timbauva). […]
Art. 5º Os parâmetros de área basal média, altura média e DAP médio definidos nesta Resolução, excetuando-se manguezais e restingas, estão válidos para todas as demais formações florestais existentes no território do Estado de Santa Catarina, previstas no Decreto no 750/93; os demais parâmetros podem apresentar diferenciações em função das condições de relevo, clima e solos locais; e do histórico do uso da terra. Da mesma forma, estes fatores podem determinar a não ocorrência de uma ou mais espécies indicadoras, citadas no artigo 3º, o que não descaracteriza, entretanto, o seu estágio sucessional. (grifado)

Ainda, o § 1º do art. 14 da Lei do Bioma Mata Atlântica determina que a supressão de vegetação primária ou secundária em estágio médio de regeneração dependerá de autorização do órgão ambiental estadual competente.

Como se vê, para a configuração do crime ambiental em tela, é necessário que a degradação ambiental ocorra em espécies vegetais pertencentes ao Bioma Mata Atlântica, assim como que a vegetação seja considerada primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração.

Não preenchidos os requisitos, não há que se falar em crime ambiental do art. 38-A da Lei de Crimes Ambientais. 


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Sobre o autor
Cláudio Farenzena

Escritório de Advocacia especializado e com atuação exclusiva em Direito Ambiental, nas esferas administrativa, cível e penal. Telefone e Whatsapp Business +55 (48) 3211-8488. E-mail: contato@advambiental.com.br.

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