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Á extrema direita: uma comparação entre Brasil e Polônia

Agenda 29/04/2020 às 13:23

O Brasil e a Polônia são países com diversas particularidades, apesar de suas diferenças históricas, em ambos países, é perceptível o aumento do apoio a grupos e partidos políticos de extrema direita.

INTRODUÇÃO

É evidente o crescimento da extrema-direita no mundo, na Polônia, o PiS, partido de extrema direita e maioria esmagadora em toda a política nacional [1], por sua vez, propôs à sociedade polonesa a defesa de valores cristãos. Em consequência disso, impedimentos como a proibição do aborto mesmo em casos de má formação do bebê, restrição ao uso da pílula do dia seguinte e corte nos subsídios para programas sociais vem se tornando realidade no atual cenário político polonês.

Além dos fatos destacados, a Europa enfrenta hoje o aumento no número de refugiados sírios, o que fez surgir na Polônia, a mobilização contra as políticas de imigração impostas pela União Europeia, sendo assim, é comum movimentos de extrema direita organizarem marchas para defesa de seus ideais e para dar suporte ao atual Governo.

No Brasil, o que ocorre é semelhante, por ter a maior parte de sua população cristã, o PSL, partido pelo qual o Presidente da República foi eleito, que é majoritário no País, utilizou-se da defesa da família tradicional brasileira e dos bons costumes na eleição do ano de 2018. Além disso, assim como na Polônia, o Brasil passa por um momento de manifestações, porém, pedindo Intervenção Militar, e a implantação, mais uma vez, da ditadura que aqui perdurou por mais de vinte anos.

Porém, cada país tem a sua peculiaridade, e é imprescindível destacar e exemplificar os contextos históricos vividos em cada país, que talvez possam ser utilizados para elucidar o porquê do apoio ao extremismo.

 

I – Contexto histórico – Ditadura militar no Brasil apoiada pelos EUA

O ano era 1964, o mundo passava por um período extremamente delicado, tensões entre os Estados Unidos da América e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas aumentavam cada vez mais na Guerra Fria, sobretudo após a vitória das forças revolucionárias de Fidel Castro na Revolução Cubana [3], apoiadas pela União Soviética, e também pelo descobrimento de misseis nucleares na ilha caribenha por espiões americanos. Na América Latina, a empatia com o socialismo aumentava, e de maneira consequente, incomodava os norte-americanos.

O medo com o possível surgimento de novas “cubas” ocasionou no apoio norte-americano a ditaduras militares realizadas no continente Sul-Americano entre os anos de 1960 e 1980. No Brasil, João Goulart ocupava o cargo de Presidente da República, quando em 31 de março de 1964, ocorre o golpe militar no Brasil [4], apoiado pelos EUA com a arguição de que existia uma possível ameaça comunista no País. Então, em 15 de abril de 1964, o General Castelo Branco toma posse da Presidência da República, dando início ao período ditatorial conhecido como Ato Institucional 1, conhecido como AI-5, que foi a primeira das cinco fases da ditadura, deste modo, após o AI-1, foram implantados, respectivamente o AI-2, AI-3, AI-4, e o AI-5.

Durante todo o período ditatorial, houveram diversos exílios de artistas e de pessoas que se opuseram, ou que tinham ideais contrários aos dos governos militares [5], repressões aos meios de comunicação, tortura e morte de jornalistas e coações aos movimentos estudantis. Outrossim, não existia democracia, os Presidentes eram escolhidos através de eleições indiretas, além do fim do multipartidarismo, assim, o Brasil adotava, como os EUA, o bipartidarismo.

Porém, o período ditatorial, após vinte e um anos, chegou ao fim, em 15 de março de 1985, após intensas manifestações e com a vitória de Tancredo Neves nas eleições para Presidente da República, colocando fim em um dos piores momentos da história do Brasil. Três anos após o retorno da democracia, foi criada uma nova Constituição, que vigora até os dias atuais, onde são pregados princípios como a dignidade da pessoa humana, isonomia e outros direitos e garantias fundamentais criados para que o Brasil não passe por isso outra vez.

 

II – Contexto histórico – invasão da URSS na Polônia

Em setembro de 1939, durante a Segunda Guerra Mundial, a União Soviética, move tropas do exército vermelho e ocupa o leste da Polônia, dias após o oeste polonês ser ocupado por tropas de Hitler, e a partir desse período começava um dos piores momentos da história da Polônia moderna, a ocupação soviética. Após o fim da Segunda Guerra Mundial, a União Soviética anexou toda a área territorial da Polônia e de outros países a URSS, dando início a Cortina de Ferro, nome utilizado para designar a Europa em duas partes no pós-segunda guerra, Europa Oriental (países de domínio da URSS), e Europa Ocidental (países que constituíam a OTAN).

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Com isso, a Polônia sofreu durante anos um regime de repressão socialista [6], que, instituiu a nacionalização de empresas, repressão a pessoas que discordavam do governo e fraudes eleitorais, com a tentativa de simular uma possível democracia.  Nas escolas, crianças polonesas eram obrigadas a aprender russo e o ensino religioso foi retirado, além do racionamento, que limitava o quanto os poloneses poderiam comer. Além disso, uma grave crise econômica assolou a Polônia durante os anos 80, e diante dos protestos e da resistência das forças de oposição, foi declarada a lei marcial na Polônia e o toque de recolher.

Porém, em 1989, com a queda do muro de Berlim e o fim da cortina de ferro, o domínio Russo na Polônia, por fim, acaba. Em resultado disso, um ano após o fim da cortina de ferro, ocorre a primeira eleição por sufrágio universal na história moderna da Polônia, criando assim, um governo democrático, mudando de forma total o rumo do País.

 

III – Comparação entre o Brasil e a Polônia no cenário atual

Conforme é descrito nos textos acima, Brasil e Polônia são países que, apesar de estarem muito longe um do outro, tem muitas coisas em comum. Assim como o Brasil, a Polônia também passou por um momento de repressão, a única diferença foram os países que apoiaram e o sistema político vivenciado por cada país em sua época ditatorial e antidemocrática. Entretanto, no cenário atual, apesar de ambos os países estarem sob governo de direita, o contexto histórico mostra que a repressão ocorrida na Polônia teve muito mais impacto para o povo polonês, do que a ditadura ocorrida no Brasil para o povo brasileiro.

Nos dias atuais, o Governo da Polônia é de extrema direita e é apoiado pela maioria esmagadora do povo [7], que em sua maior parte é composta por cristãos católicos, que, pregam o antissemitismo, xenofobia e a homofobia, onde o governo limita programas sociais e suprime o direito das minorias, com a justificativa estarem defendendo a família e os ideais cristãos.

No caso do Brasil, é muito similar ao da Polônia, a maioria dos políticos presentes no cenário atual é de extrema direita, em um país onde a maioria da população também é representada por cristãos, que muitas das vezes pregam a intervenção militar no País [8]. A famosa bancada evangélica na Câmara dos Deputados, corresponde a um grupo de parlamentares que defende os ideais cristãos a qualquer custo, com o apoio da maior parte das pessoas, incluindo jovens.

Entretanto, observando o contexto histórico e atual dos dois países, apesar de estarem em situações totalmente similares, a conjuntura atual nos mostra um caminho oposto tomado por Polônia e Brasil.

A Polônia, que sofreu durante anos com uma ditadura de cunho socialista, carrega um enorme “trauma da revolução comunista”, e tenta, de todas as formas, retirar qualquer ideal ligado ao socialismo ou a extrema esquerda do seu país [9], tal fato explica a maioria esmagadora de apoiadores da extrema direita, todo esse conjunto é entendível pelo simples fato de tudo que os poloneses vivenciaram no passado.

Todavia, o Brasil vivenciou durante anos, um período de repressão, antidemocrático e de torturas, provocado pela extrema direita e apoiado pelos EUA por um possível “golpe comunista” no País, golpe esse, que nunca existiu e foi utilizado como “desculpa” para a implantação de uma ditadura militar. Portanto, mesmo com tudo o que o povo brasileiro sofreu, crises econômicas, escândalos de corrupção e exílios, ainda sim, o brasileiro continua a apoiar esse período.

 

CONCLUSÃO

O momento vivenciado por Brasil e Polônia é semelhante, ambos países tem governos de direita, onde a população é majoritariamente cristã e vive com o medo de uma possível ameaça que poderá colocar em risco os costumes cristãos e da família tradicional. Todavia, cabe destacar a diferença histórica vivenciada entre os dois países, onde a Polônia vivenciou um regime ditatorial de esquerda, com ideais socialistas e com sua integração á URSS, já o Brasil vivenciou um regime ditatorial de direita, apoiado pelos EUA, com ideais capitalistas.

Portanto, é totalmente compreensível o trauma que os poloneses ainda carregam de uma época onde sofreram com a fome, repressão e a recessão, e hoje tentam, a qualquer custo, proteger o seu País de pessoas que para eles podem possivelmente causar danos e levar, mais uma vez, a Polônia ao abismo.

Contudo, a situação no atual cenário político e social brasileiro não é passível de entendimento, pois, embora todos os anos de ditadura presenciados no Brasil, até os dias de hoje, pessoas defendem a volta dos militares e clamam por intervenção militar, que matou, torturou e reprimiu milhares de brasileiros. Assim sendo, resta claro que os erros do passado não conseguiram atingir o futuro, e com isso, estamos condenados a errar outra vez.

 

REFERÊNCIAS

[1]https://oglobo.globo.com/mundo/direita-ultraconservadora-vence-eleicoes-na-polonia-17875967

[2]https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2018/noticia/2018/10/28/jair-bolsonaro-e-eleito-presidente-e-interrompe-serie-de-vitorias-do-pt.ghtml

[3] SILVA, Daniel Neves. "Revolução Cubana"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiag/revolucao-cubana.htm 

[4] SILVA, Daniel Neves. "Ditadura Militar no Brasil"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiab/ditadura-militar.htm.

[5] SOUSA, Rainer Gonçalves. "General Medici"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiab/general-medici.htm.

[6] https://www.mises.org.br/Article.aspx?id=3030

[7] https://brasil.elpais.com/brasil/2018/07/07/internacional/1530989514_090493.html

[8]https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/04/19/bolsonaro-discursa-em-manifestacao-em-brasilia-que-defendeu-intervencao-militar.ghtml

[9]https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2018/05/04/para-esquecer-passado-comunista-polonia-manda-retirar-estatua-de-praca-publica.htm

Sobre o autor
Pedro Vitor Serodio de Abreu

LL.M. em Direito Econômico Europeu, Comércio Exterior e Investimento pela Universität des Saarlandes. Legal Assistant na MarketVector Indexes.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Devido ao recente aumento a grupos de extrema direita e ao iminente risco a democracia, é necessária a comparação entre dois países com histórias diferentes, mas que atravessam um momento similar.

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