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Do processo administrativo tributário no Estado do Ceará

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Agenda 12/04/2006 às 00:00

Resumo: O direito de defesa do contribuinte em face da atuação tributária do Estado do Ceará é o tema principal do presente trabalho. A fase oficiosa é essencial para conferir exigibilidade ao crédito tributário. Após a formalização do crédito tributário, caso haja lavratura do auto de infração, o processo poderá prosseguir com a instauração do litígio entre o Fisco e o contribuinte. A resistência ativa do contribuinte é uma forma de provocar a Administração Pública para revisão dos seus próprios atos. A atividade desenvolvida pelo Contencioso Administrativo Tributário, denominada processo administrativo tributário, consiste principalmente em analisar as impugnações, apresentadas pelos contribuintes, aos créditos tributários exigidos. Na condução do processo, devem ser observados os princípios informadores do processo administrativo, bem como os princípios gerais da Administração Pública. Analisamos também os reflexos da discussão do crédito tributário em instância administrativa na atividade jurisdicional. O processo administrativo tributário não pode ser considerado opção excludente da jurisdição por conta da princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, muito embora represente uma vertente do acesso à justiça no seu sentido mais amplo e também seja um instrumento facilitador da composição de litígios.

Palavras-chave: Competência tributária dos Estados. Processo administrativo tributário. Contencioso Administrativo Tributário.


Sumário: 1 Introdução; 2 Fase oficiosa; 3 Princípios do processo administrativo tributário, 3.1 Princípio do devido processo legal, 3.2 Princípio do contraditório e da ampla defesa, 3.3 Princípio da legalidade objetiva, 3.4 Princípio da publicidade, 3.5 Princípio da oficialidade, 3.6 Princípio do informalismo, 3.7 Princípio da verdade material, 3.8 Princípio da revisibilidade; 4 Do Contencioso Administrativo Tributário, 4.1 Estrutura do Contencioso Administrativo Tributário, 4.2 Processo no Contencioso Administrativo Tributário, 4.2.1 Auto de infração, 4.2.2 Impugnação e revelia, 4.2.3 Instrução processual, 4.2.4 Julgamento em primeira instância, 4.2.5 Recursos, 4.2.6 Julgamento em segunda instância, 4.2.7 Nulidades, suspensão e extinção, 4.2.8 Efeitos da decisão final; 5 Da inafastabilidade do controle jurisdicional; 6 Conclusão; 7 Referências bibliográficas.


1 Introdução

Nas palavras de Láudio Camargo Fabretti (1998, p. 95), obrigação é "a relação jurídica que se estabelece entre um sujeito ativo (credor), que pode exigir de um sujeito passivo (devedor) uma prestação de caráter patrimonial (objeto), em virtude de uma causa que pode ser a vontade das partes (ex voluntate) ou a vontade da lei (ex lege)". (grifo original)

O fato jurídico tributário estabelece um vínculo entre a Administração Pública, como credora, e o contribuinte (devedor), tendo como objeto uma prestação pecuniária compulsória.

Obrigação tributária é uma obrigação de direito público e tem como objeto sempre uma prestação tributária cuja natureza poderá consistir numa obrigação de dar uma soma pecuniária ao sujeito ativo, fazer ou não fazer algo de conteúdo relacionado ao tributo. A origem da obrigação tributária é a própria lei instituidora do tributo.

Hugo de Brito Machado (2004, p. 123) define a obrigação tributária como

[...] relação jurídica em virtude da qual o particular (sujeito passivo) tem o dever de prestar dinheiro ao Estado (sujeito ativo), ou de fazer, não fazer ou tolerar algo no interesse da arrecadação ou fiscalização dos tributos, e o Estado tem o direito de constituir contra o particular um crédito.

A obrigação tributária principal surge com a ocorrência do fato gerador, tendo como objeto o pagamento do tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se no mesmo momento em que se extingue o crédito dela decorrente. Por sua vez, a obrigação tributária acessória, no dizer de José Eduardo Soares de Melo (1997, p. 155) "decorre da legislação tributária e tem por objeto prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos [...], tendo a natureza de obrigação de fazer, não fazer, ou mesmo de tolerar, desprovida do timbre da patrimonialidade."

O objeto da obrigação principal será sempre o pagamento de tributo. Por sua vez, a obrigação acessória consiste em deveres administrativos cuja inobservância gera imposição de multa. O descumprimento da obrigação acessória acarreta sua conversão em obrigação principal, no que concerne ao pagamento da multa. A multa, mesmo quando convertida em obrigação principal, não pode ser confundida com tributo. Ainda que ambas sejam prestações pecuniárias compulsórias, a multa consiste em sanção de ato ilícito, o que desautoriza por completo sua inclusão no rol da espécies tributárias.


2 Fase oficiosa

A existência pura e simples da obrigação tributária não autoriza a cobrança do tributo, devendo, outrossim, proceder à constituição do crédito tributário pela via do lançamento. Lançamento tributário, como bem define Paulo de Barros Carvalho (2002, p. 383) é

[...] o ato jurídico administrativo, da categoria dos simples, constitutivos e vinculados, mediante o qual se insere na ordem jurídica brasileira uma norma individual e concreta que tem como antecedente o fato jurídico tributário e, como conseqüente, a formalização do vínculo obrigacional, pela individualização dos sujeitos ativo e passivo, a determinação do objeto da prestação, formado pela base de cálculo e correspondente alíquota, bem como pelo estabelecimento dos termos espaço-temporais em que o crédito há de ser exigido.

O lançamento poderá ser efetuado em três modalidades: de ofício, por declaração e por homologação. O lançamento de ofício é procedido por iniciativa da autoridade administrativa competente, independentemente da colaboração do contribuinte, na situação em que este ato é requisito necessário para exigibilidade de obrigação tributária. O lançamento por declaração é feito com base em declaração fornecida pelo contribuinte ou por terceiro, quando um ou outro presta informações, à autoridade administrativa, quanto à matéria de fato indispensável à efetivação deste lançamento. O lançamento por homologação é procedido quando a legislação atribui ao contribuinte o dever de antecipar o pagamento, sem prévio exame da autoridade administrativa para sua determinação. Ao tomar conhecimento da determinação feita pelo contribuinte, a autoridade administrativa expressamente a homologa.

Na maioria dos tributos, a obrigação tributária é liquidada sem que haja lançamento, ainda que em momento posterior. Nestes casos, o contribuinte efetua o recolhimento do valor correspondente sem prévia participação, anuência ou conhecimento fazendário. Tomando como exemplo o ICMS, vemos que o contribuinte registra suas operações mercantis ou prestações de serviços em notas fiscais, indicando o valor do tributo, escritura seus livros ficais, apura o quantum devido a título de tributo, e, após certo período de tempo, procede ao seu recolhimento.

Considerando o surgimento concomitante da obrigação - em virtude da ocorrência do fato gerador - e do crédito tributário, podemos conferir caráter declaratório ao lançamento. Este lançamento não tem o condão de criar o crédito tributário, tendo como finalidade declarar todos os aspectos do tributo, indicando o sujeito ativo e passivo, materialidade, base de cálculo, alíquota e montante devido. O referido ato administrativo, por conferir liquidez e certeza, autoriza a exigibilidade do crédito tributário mediante a inscrição do título na dívida ativa.

Ainda que se considere a consumação do lançamento com a lavratura do auto de infração, o crédito tributário tem existência somente formal, portanto a decisão administrativa irreformável que reconhece como indevida a exigência do Fisco tem caráter meramente declaratório. Acerca da natureza declaratória, manifesta-se Hugo de Brito Machado (2004, p. 215) que "o lançamento em efeito declaratório positivo, enquanto a decisão que o desfaz tem efeito declaratório negativo relativamente à obrigação tributária."

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A regra contida no artigo 143, do Código Tributário Nacional, reforça o caráter declaratório do lançamento, uma vez que este se presta à quantificação do crédito tributário no dia da ocorrência do fato gerador. A autoridade administrativa deve aplicar a legislação válida e eficaz no momento em que ocorreu o fato gerador tributário, podendo considerar legislação editada posteriormente somente nos casos de irretroatividade benigna, conforme comando contido no caput do artigo 144 combinado com o artigo 106, ambos do Código Tributário Nacional.

A obrigação tributária e o crédito tributário não constituem realidades jurídicas distintas, uma vez que não é possível existir obrigação tributária sem crédito tributário, ou ainda que o crédito tributário ocorresse em momento ulterior.

A obrigação tributária não será modificada pela ocorrência do fato gerador, o crédito tributário é que sofre alterações em razão de procedimentos e situações de natureza fática ou jurídica. A possibilidade de modificação do crédito tributário ou a exclusão do crédito tributário só se relaciona com aspectos de eficácia de sua realização pela Administração Pública.

Com a notificação se consuma o lançamento, havendo a constituição do crédito tributário. A notificação representa ato administrativo dirigido ao contribuinte, para que este tome ciência do ato de lançamento e dos termos da exigibilidade do crédito. Após isto, o sujeito passivo da obrigação tributária poderá, caso queira, tentar alterar o entendimento fiscal (Código Tributário Nacional, artigo 145, inciso I).

Em virtude do controle administrativo da legalidade dos atos da Administração Pública, é permitido ao contribuinte peticionar aos poderes públicos, entendimento corroborado por Luciano Amaro (2002, p. 368), ao afirmar que "diante de uma exigência fiscal que lhe pareça ilegítima, por qualquer motivo, o indivíduo nem é obrigado satisfazê-la, nem tem como única opção o ingresso em juízo, com o uso dos vários remédios que o direito processual oferece."

A exigibilidade do crédito tributário regularmente constituído será suspensa se verificada qualquer das hipóteses previstas no artigo 151, quais sejam: a moratória; o depósito do seu montante integral; as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo; a concessão de medida liminar em mandado de segurança; a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial; e o parcelamento. Qualquer uma das situações elencadas, resguarda o contribuinte da cobrança do tributo enquanto subsistir a causa suspensiva.

Limitaremo-nos à análise das reclamações e recursos administrativos por guardar estreita relação com o objeto deste trabalho.

Cada ente federativo, no exercício de sua competência tributária, regulará o processo administrativo tributário, nas diversas fases de julgamento que serão proferidos em razão dos litígios tributários. Conquanto possa dispor sobre o processo administrativo tributário, as respectivas leis federais, estaduais e municipais não poderão obstar o efeito suspensivo, hipótese impeditiva da exigibilidade do crédito.

Este entendimento foi inclusive sumulado pelo extinto Tribunal Federal de Recursos, conforme transcrito a seguir:

Súmula 153-TFR (Tribunal Federal de Recursos): Constituído no qüinqüênio, através do lançamento, o crédito tributário, não há que se falar em decadência, fluindo, a partir daí, em princípio, o prazo prescricional, que, todavia, fica em suspenso, até que sejam decididos os recursos administrativos.

Caso a decisão administrativa mantenha a exigência fazendária é permitida a interposição de recurso à instância administrativa superior para julgamento definitivo. Somente a manutenção do crédito tributário, em decisão definitiva, prejudicará a suspensão de sua exigibilidade, autorizando a inscrição do mesmo na dívida ativa com posterior ajuizamento da execução fiscal.

Entre as modalidades de extinção do crédito tributário, encontramos: o pagamento; a compensação; a transação; a remissão; a prescrição e a decadência; a conversão de depósito em renda; o pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos termos do artigo 150, § § 1º e 4º, do Código Tributário Nacional; a consignação em pagamento nos termos do disposto no artigo 164, § 2º do mesmo Código; a decisão administrativa irrevogável, qual seja a decisão administrativa definitiva que não possa ser objeto de ação anulatória; a decisão judicial passada em julgado; e a dação em pagamento de bens imóveis, na forma e condições estabelecidas por lei.

Portanto, a decisão administrativa definitiva, favorável ao contribuinte, com a negação da existência da obrigação tributária, opera a extinção do crédito tributário, desconstituindo o lançamento, nos termos do artigo 156, inciso IX do Código Tributário Nacional.


3 Princípios do processo administrativo tributário

O processo administrativo tributário que não observar as garantias constitucionais do contribuinte, como as do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, da ampla instrução probatória, será considerado inválido.

1. Princípio do devido processo legal

A garantia do devido processo legal, prevista no ordenamento jurídico brasileiro como norma constitucional contida no artigo 5º, inciso LIV, assevera que ninguém será privado de sua liberdade ou de seus bens sem que haja um processo regulado por normas legais previamente estabelecidas que garantam a igualdade das partes envolvidas no conflito.

O devido processo legal constitui uma garantia dúplice ao indivíduo, pois possui duas vertentes: uma no campo material, que protege o direito de liberdade e de propriedade; outra no campo formal, que confere plenitude de defesa e igualdade de oportunidade às partes dentro do processo.

A respeito do devido processo legal, Alexandre de Moraes (2003, p. 361) explica que este

tem como corolários a ampla defesa e o contraditório, que deverão ser assegurados aos litigantes em processo judicial criminal ou civil ou em procedimento administrativo, inclusive nos militares, e aos acusados em geral, conforme o texto constitucional expresso. Assim, embora no campo administrativo não exista necessidade de tipificação estrita que subsuma rigorosamente a conduta à norma, a capitulação do ilícito administrativo não pode ser tão aberta a ponto de impossibilitar o direito de defesa, pois nenhuma penalidade poderá ser imposta, tanto no campo judicial como nos campos administrativos ou disciplinares, sem a necessária amplitude de defesa.

Diante do exposto, temos a garantia do devido processo legal como autêntica fonte dos outros princípios constitucionais, sejam eles explícitos ou implícitos, que regem o processo administrativo tributário.

2. Princípio do contraditório e da ampla defesa

O contraditório denota um dos desdobramentos do princípio do devido processo legal, cuja finalidade é viabilizar a necessária participação dos envolvidos na contenda. Por seu turno, determina que o processo não poderá ser realizado de forma que impeça o direito da parte adversa de se manifestar. A existência do contraditório entre os princípios do processo administrativo impõe, por si, a condução dialética do processo como requisito mínimo de validade deste.

A ampla defesa consiste na oportunidade para contestar e contraditar, na produção de provas, no acompanhamento da respectiva instrução e na faculdade de utilizar os recursos cabíveis. Ainda citando Alexandre de Moraes (2000, p. 116), ao delinear o conceito de ampla defesa como

o asseguramento que é dado ao réu de condições que lhe possibilitem trazer para o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade ou mesmo de omitir-se ou calar-se, se entender necessário, enquanto o contraditório é a própria exteriorização da ampla defesa, impondo a condução dialética do processo (par conditio), pois a todo ato produzido pela acusação caberá igual direito da defesa de opor-se-lhe ou de dar-lhe a versão que melhor lhe apresente, ou ainda, de fornecer uma interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor. (grifo original)

Hugo de Brito Machado Segundo (2004) enumera os aspectos que envolvem a ampla defesa, quais sejam: os meios necessários à articulação das pretensões das partes, comprovação dos fatos em que se fundam as referidas pretensões, bem como a reforma de decisões eventualmente incorretas.

Embora possa haver diversidade de recursos no âmbito dos diversos entes tributantes, devem ser observados os princípios do contraditório e da ampla defesa, sob pena de nulidade do julgamento administrativo.

3. Princípio da legalidade objetiva

Segundo o princípio da legalidade objetiva, a autoridade administrativa deve aplicar a lei de ofício, cumprindo-a ou fazendo cumpri-la, de modo objetivo e desinteressadamente, agindo em prol do interesse público, em detrimento de qualquer direito subjetivo ou interesse próprio.

Funciona, outrossim, como princípio da Administração Pública, obrigando o administrador a agir, ainda que no exercício de sua discricionariedade, em consonância com a lei e demais espécies normativas. É defeso ao administrador público agir orientado pela sua vontade subjetiva, haja vista que sua conduta deve ser direcionada ao atendimento do interesse público, este representado pela vontade da Administração.

No processo administrativo tributário, a Administração compele o contribuinte a cumprir a lei, ao passo que o contribuinte terá seus direitos constitucionais protegidos, uma vez que a autoridade administrativa atuará dentro dos limites das previsões legais.

A previsão constitucional é um forte supedâneo para a atividade da Administração Pública, conforme as palavras de José Afonso da Silva (2001, p. 430), considerando que

o regime de garantias constitucionais condiciona a atividade administrativa, prescrevendo uma série de normas que procuram dar efetiva consistência ao princípio da legalidade, desde sua expressa e específica previsão no art. 37 em relação a toda e qualquer Administração Pública, direta, indireta ou fundacional, correlacionado aos princípios da impessoalidade, moralidade e publicidade, que o reforçam, até a afirmação dos princípios do ‘devido processo legal’ (art. 5º, LIV) e do contraditório ‘em processo administrativo’ (art. 5º, LV)

4. Princípio da publicidade

A observância do princípio da publicidade não é exclusividade da esfera judicial, uma vez que a Fazenda Pública é parte integrante do Estado e o poder deste último emana diretamente do povo.

Como princípio democrático, a publicidade se presta a levar as ilegalidades ao conhecimento de todos os cidadãos, para que estas sejam impugnadas e desfeitas. Vislumbramos a importância deste princípio por sua ampla previsão constitucional, especialmente nos seguintes dispositivos: artigo 1º , inciso II; artigo 5º , inciso LX; e artigo 37, caput.

Ademais, a previsão da publicidade compreende não apenas os processos judicias como também os administrativos, com o fim precípuo de viabilizar a participação das partes e o controle da função de julgar por parte da opinião pública.

O princípio da publicidade é condição de validade indispensável ao processo administrativo e sua inobservância acarreta nulidade do processo. Entendimento este já manifestado pelo Superior Tribunal de Justiça [1] e trazido à colação, ipsis litteris:

Administrativo – Direito de defesa – Impossibilidade de acesso aos autos – Ineficácia. I – No processo administrativo, a intimação para defesa visa três objetivos: fixar o início do prazo; delimitar a matéria a ser impugnada e, finalmente, determinar o local em que se encontram os autos, para exame. II – É ineficaz a intimação, se o intimado não tem acesso aos autos porque eles foram remetidos a outro local que não aquele indicado.

Os atos processuais podem ser conhecidos por todos, até mesmo por aqueles que não sejam partes no processo. Consiste na liberdade dos manuseio dos autos, direito de assistir audiências e sessões de julgamento, o que colabora diretamente para a consecução do princípio da ampla defesa.

A publicidade do processo administrativo tributário no âmbito do Estado do Ceará é prevista expressamente no artigo 24 da Lei Estadual nº. 12.732/97, transcrito a seguir: "os atos serão públicos, exceto quando o sigilo se impuser por motivo de ordem pública, caso em que será assegurada a participação da parte ou do seu advogado."

O Decreto Estadual nº. 25.468/99, regulamentou a supramencionada Lei, nos termos de seu artigo 44, in verbis: "os atos serão públicos, exceto quando o sigilo se impuser por motivo de ordem pública, caso em que será assegurada a participação do contribuinte ou responsável ou do requerente, quando for o caso, ou do seu advogado."

Entretanto, existe uma exceção à regra geral da publicidade dos atos processuais. No processo administrativo tributário, os atos processuais podem ter sua publicidade restringida para preservar o sigilo fiscal do contribuinte, ficando as informações processuais adstritas somente às partes.

5. Princípio da oficialidade

Consoante o princípio da oficialidade, temos que a Administração Tributária poderá instaurar, por iniciativa própria, procedimentos tendentes à realização de sua atividade, bem como praticar os atos propensos à finalização dos mesmos. Tal princípio é aplicado tanto em meros procedimentos quanto em processos administrativos contenciosos, muito embora a instauração dos processos administrativos tributários propriamente ditos (contenciosos) ocorra mais freqüentemente por iniciativa do contribuinte.

Iniciado o processo, a Administração, por dever de ofício, deverá impulsioná-lo e conclui-lo independentemente de provocação. A autoridade administrativa, por estar sujeita à legalidade estrita e à verdade material, deve concluir o processo com celeridade, apresentando o pronunciamento da Administração acerca do litígio trazido à análise.

O dever da Administração de movimentar o processo guarda, inclusive, correlação com o princípio do interesse público, que exige que o processo instaurado seja levado a termo, sem que fique parado ou seja dificultado pelos agentes públicos, sob pena de responsabilização diante da prova de negligência e má-fé.

Este princípio consiste num ponto importante de diferenciação entre o processo administrativo e o processo judicial. No processo judicial, o que impera é a inércia da jurisdição, de tal sorte que o titular de uma pretensão é que deverá vir a juízo requerer a prolação de um provimento que atenda aos seus interesses. De forma adversa, o processo administrativo dispensa o impulso das partes, sendo movimentado pela própria autoridade tributária.

A oficialidade implica também a retificação, correção ou anulação do ato, pela autoridade fiscal, de ofício, sem que haja provocação do interessado. Este aspecto da oficialidade tem relevância reconhecida pela doutrina, da lavra de Vitor Hugo Mota de Menezes (2002), que considera a determinação, ex officio, do cancelamento ou, em casos específicos, do refazimento de exigência infundada contra a qual o contribuinte tenha se oposto como medida de controle da legalidade.

6. Princípio do informalismo

No processo administrativo, não são necessárias formas rígidas para que o curso do processo se dê de modo simples. O princípio do informalismo possui estreita relação com os princípios da economia processual e da finalidade, uma vez que a imperfeição da forma dos atos processuais não prejudique a finalidade do processo.

A informalidade no processo administrativo tributário do Estado do Ceará está prevista na Lei Estadual nº. 12.732/97, ipsis litteris: "Os atos e termos processuais independem de forma determinada, senão quando expressamente exigida pela legislação.

Não obstante a previsão contida no dispostivo legal supracitado, o Decreto Estadual nº. 25.468/99, dispõe sobre a ausência de formalidade no processo administrativo tributário a seguir reproduzido: "Os atos e termos processuais independem de forma determinada, senão quando a lei expressamente exigir, reputando válidos os que, realizados de outro modo, preencham sua finalidade essencial."

São indispensáveis, portanto, apenas as formalidades essenciais à obtenção da certeza jurídica e da segurança processual, salvo nas situações em que a própria lei exija expressamente uma determinada formalidade. Verificado o descumprimento de alguma das formalidades essenciais, o processo poderá ser anulado, principalmente se gerar algum prejuízo aos outros princípios.

Tomamos como exemplo de formalidade indispensável a comunicação ao contribuinte da abertura do prazo para apresentação de defesa, se esta comunicação não for feita ou for feita de forma viciada, o processo estará prejudicado em razão do cerceamento do direito de defesa do contribuinte.

7. Princípio da verdade material

Diferentemente do processo judicial, onde vigora o princípio da verdade formal, no processo administrativo são consideradas todas as provas e os fatos novos, ainda que sejam favoráveis ao interessado, mesmo que não tenham sido alegados ou declarados. Pela orientação deste princípio, o órgão administrativo de julgamento deverá buscar a verdade objetiva dos fatos, independentemente de haver sido provado ou alegado pelas partes.

No processo administrativo tributário, a autoridade fiscal é quem deve provar a ocorrência do fato gerador, bem como todos os elementos constitutivos do lançamento tributário. Para tanto, o julgador poderá determinar diligências e perícias ou solicitar outras providências, se assim entender conveniente.

As autoridades administrativas na esfera tributária possuem liberdade para colher as provas que entenderem indispensáveis para verificar a ocorrência do ato jurídico tributário ora questionado, já que no processo administrativo tributário prevalece a verdade material.

Nos devidos termos de Vitor Hugo Mota de Menezes (2002, p. 22), o princípio da verdade material

deve ser buscado no processo, desprezando-se as presunções tributárias, ficções legais, arbitramentos ou outros procedimentos que procurem atender apenas à verdade formal, muitas vezes atentando contra a verdade objetiva, devendo a autoridade administrativa promover de ofício as investigações necessárias à elucidação da verdade material.

O Fisco não poderá se valer da presunção juris tantum da legitimidade de atos administrativos para se eximir de produzir a prova da ocorrência do fato gerador, da responsabilidade dos contribuintes, uma vez que o sistema constitucional vigente prevê expressamente a não confiscação de bens do contribuinte sem o devido processo legal, com contraditório e ampla defesa.

Não ficando provados os elementos constitutivos do crédito tributário, o lançamento poderá ser anulado se o contribuinte alegar a insubsistência do mesmo.

8. Princípio da revisibilidade

Nosso ordenamento jurídico alberga o direito do contribuinte submeter às autoridades hierarquicamente superiores a revisão de decisões administrativas. Portanto, da decisão do órgão de primeiro grau, geralmente monocrático, caberá recurso para órgãos superiores, na sua maioria organizados em colegiados.

Pelo comando contido nas linhas deste princípio, a parte descontente com determinada decisão possui a faculdade de recorrer a um segundo órgão julgador, com idêntico poder e amplitude de conhecimento do órgão recorrido, com o fito de pronunciar uma decisão que substitua a antecedente.

Este princípio guarda estreita relação com os princípios da oficialidade e da verdade material. No âmbito administrativo, funciona de maneira análoga ao princípio do duplo grau de jurisdição.

O princípio da revisibilidade não encontra previsão constitucional expressa, contudo podemos inferir a sustentação legal deste princípio a partir das normas que tratam do devido processo legal e da ampla defesa.

Na legislação que disciplina o processo administrativo tributário no âmbito do Estado do Ceará, encontramos a presciência da possibilidade de submeter a decisão proferida em primeira instância ao órgão colegiado superior, nos termos do artigo 64 do Decreto Estadual nº. 25.468/99, in verbis: "Das decisões proferidas em primeira instância, contrárias ao autuado ou ao requerente, no todo ou em parte, caberá recurso voluntário para o Conselho de Recursos Tributários, no prazo de dez (10) ou vinte (20) dias, conforme o caso."

Muito embora a doutrina faça referência o princípio da revisibilidade ou ao duplo grau de jurisdição, o entendimento do Supremo Tribunal Federal é de que tal faculdade não constitui uma garantia constitucional, legitimando, inclusive, o depósito no valor de 30% (trinta por cento) da exigência fiscal para exercício do direito de impugnar débitos de natureza previdenciária em instância administrativa.

Outros princípios como o da celeridade, da gratuidade processual, da necessária fundamentação das decisões, da economia processual, da isonomia, e também aqueles enumerados no caput do artigo 37 da Constituição Federal vigente, orientam o processo administrativo tributário desenvolvido perante o Contencioso Administrativo Tributário do Estado do Ceará.

Sobre a autora
Ana Paula Adriano

Profissional da área jurídica com experiência de mais de 13 anos no Poder Judiciário Estadual, tendo atuado como Diretora de Secretaria e Assistente de Unidade Judiciária, em Juizado Especial Cível e Criminal na Comarca de Fortaleza e Assistente de Apoio Judiciário em Vara Cível. Vínculo atual com Tribunal de Justiça do Estado do Ceará no cargo de Supervisora de Unidade Judiciária do 17º Juizado Especial Cível da Comarca de Fortaleza. Conhecimentos em Conciliação e Mediação Judicial, pelo Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará - NUPEMEC/TJCE e Formação de formadores no contexto da Magistratura pela Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará - ESMEC em convênio com a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados - ENFAM. Experiência com o Sistema PJe desde sua implantação no Sistema de Juizados Especiais do TJCE, em 2014. Integrante do Grupo de Apoio ao Trabalho Negocial do Sistema PJe do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (2020/2021). Graduação em Direito pela Universidade de Fortaleza (2005), Especialização em Processo Civil pelo Centro Universitário Farias Brito (2006) e em Docência no Ensino Superior no Centro Universitário Leonardo da Vinci - UNIASSELVI (2021) e MBA em Gestão Pública pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci - UNIASSELVI (2021).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ADRIANO, Ana Paula. Do processo administrativo tributário no Estado do Ceará. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1015, 12 abr. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8237. Acesso em: 23 dez. 2024.

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