4. Considerações finais sobre mudanças e permanências no mundo pós-covid 19
A despeito dos inegáveis impactos econômicos, políticos e sanitários, a crise ocasionada pela pandemia de Covid-19 não acarretará mudanças essenciais na dinâmica real das relações internacionais. A crise, entretanto, evidencia problemas de consistência e verossimilhança de parte do discurso em certas áreas. Para os adeptos incorrigíveis do multilateralismo, a pandemia e a parcial introspecção comercial de atores econômicos importantes indicam a forte dependência das instituições internacionais da diuturna cooperação entre os atores estatais. Mesmo instituições fortes e juridicamente consolidadas, como, por exemplo, a OMC, enfrentam graves problemas em zelar pela observância de suas regras, se não houver disposição dos Estados em cooperar.
Para os descrentes na globalização e defensores de perspectiva excessivamente arvorada na soberania dos Estados, entretanto, a pandemia revelou uma das faces não econômicas mais problemáticas da globalização. A despeito do fluxo de pessoas ser relativamente restrito se comparado a outros períodos, a disseminação do vírus foi claramente transfronteiriça e espalhou-se, com velocidade, por todos os continentes do mundo, se instalado, primeiramente, em cidades de grande fluxo turístico e, posteriormente, avançando para o interior dos países. Evidenciou-se, igualmente, a necessidade de cooperação e de harmonização de esforços no combate e na prevenção da disseminação do vírus.
A pandemia, apesar da gravidade para a saúde coletiva e para o funcionamento da economia, não mudará as estruturas das relações internacionais, nem será marco relevante como, por exemplo, as Guerra Mundiais e o fim da guerra fria. Em outros termos, a pandemia não provocará alterações permanentes na dinâmica das relações internacionais, pois esta conservará sua estrutura e seus elementos essenciais, os quais, por sua vez, não serão modificados. Entretanto, parte dos discursos que descreviam as relações internacionais de maneira oposta entre si, com ênfase excessiva do Estado ou no multilateralismo, serão problematizados em suas premissas. O multilateralismo e o estatismo, que descreviam de forma antagônica e, portanto, excludente, um mesmo objeto, foram ambos desafiados pela situação decorrente da pandemia. Consolida-se, por sua vez, a perspectiva de combina aspectos realistas, liberais/institucionalistas e jurídicos na compreensão das relações internacionais.
Referências
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Notas
[1] ARON, Raymond. Paz e guerra entre as nações. Brasília: Universidade de Brasília, 2002.
[2] MORGENTHAU, Hans. A política entre as nações: a luta pelo poder e pela paz, São Paulo: IOESP, UNB, IPRI, 2003.
[3] CARR, Edward. Vinte anos de crise: 1919-39. Uma introdução ao estudo das relações internacionais. Brasília: UnB, IPRI; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 2001.
[4] ARON, Raymond. Paz e guerra entre as nações. Brasília: Universidade de Brasília, 2002.
[5] MEARSHEIMER, John J. The False Promise of International Institutions. International Security, vol. 19, no. 3, 1994.
[6] WALTZ, Kenneth N. Man, the State, and War: A Theoretical Analysis. REV - Revised, 2 ed., Columbia University Press, 2001. WALTZ, Kenneth. Why Iran Should Get the Bomb Nuclear Balancing Would Mean Stability. Foreign affairs (Council on Foreign Relations), 2012.
[7] KEOHANE, Robert. International Institutions: Two Approach in International Studies Quarterly, vol. 32, n.º 4, pp. 379-396, 1988. Cf. KEOHANE, Robert. After Hegemony: Cooperation and Discord in the World Political Economy, Princeton, N.J.: Princeton University Press, 1984. Cf. KEOHANE, Robert e MARTIN, Lisa, The Promise of Institutionalist Theory. International Security, vol. 20, nº 1, 1995, pp. 39-51.
[8] KRASNER, Stephen. Causas Estruturais e Consequências dos Regimes Internacionais: Regimes Como Variáveis Intervenientes. Revista de Sociologia e Política, v. 20, n. 42, jun. 2012. Disponível em: <https://revistas.ufpr.br/rsp/article/view/31815>. Acesso em: 16 de dezembro de 2019.
[9] NYE, Joseph. Cooperação e conflito nas relações internacionais. São Paulo: Editora Gente, 2009.
[10] SLAUGHTER, Anne-Marie. International Law and International Relations Theory: A Dual Agenda. The American Journal of International Law, 1993.
[11] WORLD HEALTH ORGANIZATION. WHO Coronavirus Disease (COVID-19) Dashboard. Disponível em: https://covid19.who.int/. Acesso em: 16 jun. 2020.
[12] WORLD HEALTH ORGANIZATION. Coronavirus disease (COVID-2019) situation reports. Disponível em: https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/situation-reports. Acesso em: 16 jun. 2020.
[13] WORLD HEALTH ORGANIZATION. Country & Technical Guidance - Coronavirus disease (COVID-19). Disponível em: https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/technical-guidance. Acesso em: 16 jun. 2020.
[14] WORLD HEALTH ORGANIZATION. Coronavirus disease (COVID-2019) situation reports. Disponível em: https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/situation-reports. Acesso em: 16 jun. 2020.
[15] WORLD TRADE ORGANIZATION. Export Prohibitions and Restrictions. Disponível em: https://www.wto.org/english/tratop_e/covid19_e/export_prohibitions_report_e.pdf. Acesso em: 12 jun. 2020.
[16] WORLD TRADE ORGANIZATION. Export Prohibitions and Restrictions. Disponível em: https://www.wto.org/english/tratop_e/covid19_e/export_prohibitions_report_e.pdf. Acesso em: 12 jun. 2020.
[17] No original, o texto é o seguinte: The COVID-19 pandemic presents the world with an unprecedented public health challenge. Measures to curb the spread of the disease have shut down large swathes of the world economy. Worldwide demand for medical products to fight the pandemic is unprecedented. All countries depend on international trade and global value chains to source these products. This is challenging in light of ongoing disruptions to international transport, particularly air cargo, which often goes together with passenger travel. WORLD TRADE ORGANIZATION. Export Prohibitions and Restrictions. Disponível em: https://www.wto.org/english/tratop_e/covid19_e/export_prohibitions_report_e.pdf. Acesso em: 12 jun. 2020.
[18] No original, o texto é o seguinte: An additional complicating factor is the growing number of export prohibitions and restrictions, which some WTO members have introduced to mitigate critical shortages at the national level. Responding to COVID-19 urgently requires sharp increases in global production of essential medical supplies. Well-functioning value chains can help quickly ramp up production while containing cost increases. As new production becomes available, trade will be essential to move supplies from where they are abundant to where they are lacking, especially as the disease peaks at different times in different locations. However, a lack of international cooperation risks hampering the urgently required supply response. WORLD TRADE ORGANIZATION. Export Prohibitions and Restrictions. Disponível em: https://www.wto.org/english/tratop_e/covid19_e/export_prohibitions_report_e.pdf. Acesso em: 12 jun. 2020.
[19] No original, o texto é o seguinte: The products covered by these new export prohibitions and restrictions vary considerably; most have focused on medical supplies (e.g. facemasks and shields), pharmaceuticals and medical equipment (e.g. ventilators), but others have extended the controls to additional products, such as foodstuffs and toilet paper. WORLD TRADE ORGANIZATION. Export Prohibitions and Restrictions. Disponível em: https://www.wto.org/english/tratop_e/covid19_e/export_prohibitions_report_e.pdf. Acesso em: 12 jun. 2020.
[20] No texto original: While Article XI of the General Agreement on Tariffs and Trade (GATT) 1994 broadly prohibits export bans and restrictions, it allows members to apply them temporarily to prevent or relieve critical shortages of foodstuffs or other essential products. If members move to restrict exports of foodstuffs temporarily, the Agreement on Agriculture requires them to give due consideration to the food security needs of others. WTO rules also contain more general exceptions, which could be used to justify restrictions provided that they do not constitute a means of arbitrary or unjustifiable discrimination between countries, or a disguised restriction on international trade. WORLD TRADE ORGANIZATION. Export Prohibitions and Restrictions. Disponível em: https://www.wto.org/english/tratop_e/covid19_e/export_prohibitions_report_e.pdf. Acesso em: 12 jun. 2020.
[21] ORGANIZATION FOR ECONOMIC COOPERATION AND DEVELOPMENT. Combatendo o coronavírus (COVID?19): Contribuindo para um esforço global. Disponível em: https://www.oecd.org/coronavirus/pt/. Acesso em: 16 jun. 2020.
[22] Dados gerais sobre a pandemia: WORLD HEALTH ORGANIZATION. WHO Coronavirus Disease (COVID-19) Dashboard. Disponível em: https://covid19.who.int/. Acesso em: 16 jun. 2020. Para recomendaçoes, ver: WORLD HEALTH ORGANIZATION. Country & Technical Guidance - Coronavirus disease (COVID-19). Disponível em: https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/technical-guidance. Acesso em: 16 jun. 2020. Notícias específicas são reunidas em: WORLD HEALTH ORGANIZATION. Coronavirus disease (COVID-2019) situation reports. Disponível em: https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/situation-reports. Acesso em: 16 jun. 2020.
[23] G20 INFORMATION CENTER. Extraordinary G20 Leaders' Summit: Statement on COVID-19. Disponível em: http://www.g20.utoronto.ca/. Acesso em: 15 jun. 2020. Ver também: MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES. Cúpula extraordinária dos líderes do G20 - Declaração sobre COVID-19. Disponível em: http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/notas-a-imprensa/21469-cupula-extraordinaria-dos-lideres-do-g20-declaracao-sobre-covid-19. Acesso em: 2 jun. 2020.
[24] No original: The unprecedented COVID-19 pandemic is a powerful reminder of our interconnectedness and vulnerabilities. The virus respects no borders. Combatting this pandemic calls for a transparent, robust, coordinated, large-scale and science-based global response in the spirit of solidarity. We are strongly committed to presenting a united front against this common threat. G20 INFORMATION CENTER. Extraordinary G20 Leaders' Summit: Statement on COVID-19. Disponível em: http://www.g20.utoronto.ca/. Acesso em: 15 jun. 2020.
[25] No original: The G20 is committed to do whatever it takes to overcome the pandemic, along with the World Health Organization (WHO), International Monetary Fund (IMF), World Bank Group (WBG), United Nations (UN), and other international organizations, working within their existing mandates. We are determined to spare no effort, both individually and collectively, to: protect lives; safeguard people's jobs and incomes; restore confidence, preserve financial stability, revive growth and recover stronger; minimize disruptions to trade and global supply chains; provide help to all countries in need of assistance; coordinate on public health and financial measures. G20 INFORMATION CENTER. Extraordinary G20 Leaders' Summit: Statement on COVID-19. Disponível em: http://www.g20.utoronto.ca/. Acesso em: 15 jun. 2020.
[26] G20 INFORMATION CENTER. Extraordinary G20 Leaders' Summit: Statement on COVID-19. Disponível em: http://www.g20.utoronto.ca/. Acesso em: 15 jun. 2020.
[27] G20 INFORMATION CENTER. Extraordinary G20 Leaders' Summit: Statement on COVID-19. Disponível em: http://www.g20.utoronto.ca/. Acesso em: 15 jun. 2020.
[28] G20 INFORMATION CENTER. Extraordinary G20 Leaders' Summit: Statement on COVID-19. Disponível em: http://www.g20.utoronto.ca/. Acesso em: 15 jun. 2020.
[29] G20 INFORMATION CENTER. Extraordinary G20 Leaders' Summit: Statement on COVID-19. Disponível em: http://www.g20.utoronto.ca/. Acesso em: 15 jun. 2020.
[30] G20 INFORMATION CENTER. Extraordinary G20 Leaders' Summit: Statement on COVID-19. Disponível em: http://www.g20.utoronto.ca/. Acesso em: 15 jun. 2020.