Ainda, no século XXI não é raro ter famílias, onde o marido é o provedor e a esposa fica em casa para cuidar dos filhos, do lar e do marido, ou seja, essa responsabilidade fica ao seu rogo e o marido fica tranquilo para poder manter a família e juntar riquezas.
Mesmo naquelas famílias onde o casal trabalha, a mulher ainda continua a gerenciar o lar conjugal, conhecido com a segunda jornada de trabalho.
Nessa linha, o Dr. Rodrigo da Cunha Pereira, escreve[1]: “Apesar do acesso da mulher ao mercado de trabalho, ainda persiste uma realidade socioeconômica e cultural em que elas têm na relação conjugal um papel e função de suporte ao marido. Mesmo que tenham atividade remunerada, o seu maior valor ainda não está aí, mas na tradicional função cotidiana de criar e educar filhos, gerenciar o lar, enfim, dar todo o suporte e aporte psíquico, psicológico, lógico e emocional ao marido, proporcionando que ele possa crescer cada vez mais em sua profissão. Tudo isso em nome do casal e da família”.
“Quando o amor acaba, e o amor às vezes acaba, a ideia de justo e de justiça têm ângulos e olhares diferentes entre marido e mulher. Pensa-se que o trabalho doméstico desenvolvido não tem valor, e não foi significativo, para o crescimento e aquisição patrimonial. É preciso revalorizarmos o trabalho doméstico. Sem ele não haveria família e filhos psiquicamente saudáveis, nem mesmo produção e desenvolvimento econômico e reprodução”.
Evidente que direcionamos a fala apenas para a mulher como vítima, pois, costumeiro, mas, eventualmente acontece com o marido.
Ocorre que com o divórcio, a mulher que abdicou profissionalmente para dedicar ao lar geralmente é a prejudicada, sem contar que se o casal separando tem filhos menores, estes ficam com ela e o pai raramente paga um valor de pensão digno que não altere a condição social que os filhos viviam.
Mas, neste caso, estamos a falar da condição social da ex-esposa quando da separação. Pela lógica, a mulher deve viver de modo compatível com sua condição social de quando era casada, até porque, a riqueza do casal teve sua colaboração.
Em vezes, o marido fica com os louros do casamento e a mulher apenas com a casa onde cria os filhos, sem qualificação para trabalhar.
Daí falar em alimentos compensatórios, que se se trata de uma indenização.
Os chamados alimentos compensatórios, ou prestação compensatória, não têm por finalidade suprir as necessidades de subsistência do credor, tal como ocorre com a pensão alimentícia regulada pelo art. 1.694 do CC/2002, senão corrigir ou atenuar grave desequilíbrio econômico-financeiro ou abrupta alteração do padrão de vida do cônjuge desprovido de bens e de meação.
Em verdade, o Ministro do STJ, Antonio Carlos Ferreira, no REsp 1290313, definiu com precisão e clareza[2]:
“Os ‘alimentos compensatórios’ são entendidos como aqueles que não possuem caráter alimentar ou civil, e não têm como pressuposto a necessidade da parte, possuindo, na verdade, nítida natureza indenizatória. Dessa forma, o objetivo do instituto em análise é desfazer eventual desequilíbrio econômico no momento da extinção do vínculo conjugal, de modo a reequilibrar a situação de vida de um cônjuge em relação ao outro”.
Rolf Madaleno, assim define o alimentos compensatórios: "uma prestação periódica em dinheiro, efetuada por um cônjuge em favor do outro na ocasião da separação ou do divórcio vincular, onde se produziu um desequilíbrio econômico em comparação com o estilo de vida experimentado durante a convivência matrimonial, compensando deste modo a disparidade social e econômica com a qual se depara o alimentando em função da separação, comprometendo suas obrigações materiais, seu estilo de vida e a sua subsistência pessoal” [3]
Na doutrina contemporânea, outros juristas vêem com bons olhos a sua fixação. Nessa linha está Maria Berenice Dias[4], para quem deve “o cônjuge mais afortunado garantir ao ex-consorte alimentos compensatórios, visando a ajustar o desequilíbrio econômico e a reequilibrar suas condições sociais.
Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald[5] acrescem o fundamento na boa-fé objetiva, eis que, “durante o relacionamento, um dos cônjuges acaba criando no outro a justa expectativa de manutenção do mesmo padrão de vida, caso o relacionamento seja dissolvido”
Já a pensão alimentícia regulada pelo art. 1.694 do CC, objetiva suprir as necessidades de quem precisa para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
Estes alimentos devidos entre ex-cônjuges devem, em regra, ser fixados por um certo período, assegurando-se ao beneficiário dos alimentos, tempo hábil para sua inserção, recolocação ou progressão no mercado de trabalho, que lhe possibilite manter, pelas próprias forças, o status social similar ao período do relacionamento.
Desequilíbrio
Numa ação, cujo número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial, fundamentou o relator, no caso, que havendo uma ruptura do equilíbrio econômico-financeiro com a separação, sendo possível a correção desse eventual desequilíbrio com a fixação de alimentos compensatórios.
Quanto ao prazo para os alimentos, o ministro Antonio Carlos destacou que o pagamento vem sendo feito desde 2002. Assim, como a ex-mulher tem idade e formação que permitem sua inserção no mercado de trabalho, o ministro votou, inicialmente, pelo pagamento de prestação alimentícia por três anos, a contar do trânsito em julgado da decisão.
O ministro Luís Felipe Salomão ressaltou que a conclusão do relator corresponde à jurisprudência do STJ. Há precedentes da Corte que fixam a tese de que o pedido de pensão formulado é meramente estimativo. Não configura decisão extra petita o arbitramento de valor maior que o solicitado, com base nos elementos do processo.
Nesse processo foi fixado um valor a título de indenização que deveria ser quitado em três anos, dissolvida em parcelas.
Noutros julgados, temos a mesma linha de pensamento, como:
(…) Apesar de não serem expressamente previstos na legislação pátria, os alimentos compensatórios são admitidos pela doutrina e pela jurisprudência com o objetivo de equilibrar o padrão de vida do casal, compensando o eventual desequilíbrio gerado pelo rompimento da relação na hipótese de apenas um dos cônjuges/companheiros usufruir dos frutos advindos de negócios constituídos na constância do casamento/união estável ou de imóveis adquiridos neste período, sobre os quais incida direito de meação. (…) (TJRS, Agravo de Instrumento Nº 70078428596, Oitava Câmara Cível, , Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 28/02/2019).
(...) “efetivamente, indicar que as partes conviveram em regime de união estável e que pode haver efetivo desequilíbrio na partilha do patrimônio, isso é suficiente para dar suporte ao pedido de fixação de alimentos que a doutrina vem chamando de 'compensatórios', que visam à correção do desequilíbrio existente no momento da separação, quando o juiz compara o status econômico de ambos os cônjuges e o empobrecimento de um deles em razão da dissolução da sociedade conjugal”. (TJDF, Recurso n. 2011.00.2.003519-3, Acórdão n. 508.103, Quarta Turma Cível, Rel. Des. Arnoldo Camanho de Assis, DJDFTE 03/06/2011, p. 148).
Flavio Tartuce[6], chamou atenção sobre os alimentos compensatórios, pois, sendo ele: “Além disso, a fixação dos alimentos compensatórios não pode ser desmedida ou exagerada, de modo a gerar o ócio permanente do ex-cônjuge, ou uma espécie de parasitismo amparado pelo Poder Judiciário. Nesse contexto, deve ser vista com ressalvas a ideia de que os alimentos compensatórios visam a manter o status quo de alto padrão da ex-mulher que não trabalhava quando casada, e que continuará sem trabalhar após o fim da união. Em casos tais, o fundamento para tais alimentos deixa de ser o princípio da solidariedade, passando a ser o enriquecimento sem causa, não sendo o caso de se admitir tal fixação”.
Diante do acima posto, restou falado que os alimentos previstos do artigo 1.694 do Código Civil são para suportar as necessidades vitais do ex-cônjuge ou companheiro e diverge totalmente dos alimentos compensatórios, pois, estes, tem natureza indenizatória que é para compor um injusto, uma desproporção. Não significa que essa indenização é perene, mas, até que possa restabelecer a condição social da pessoa carente.
[1] Pereira, Rodrigo da Cunha. Direito das Famílias. Ed. Forense. Ano: 2020.
[2] https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/153485314/recurso-especial-resp-1290313-al-2011-0236970-2
[3] MADALENO, Rolf. Curso de direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2008. P. 725.
[4] DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 6. Ed. São Paulo: RT, 2010. P. 540.
[5] FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil. 4. Ed. Salvador: Juspodivm, 2012. V. 6: Famílias, p. 791.
[6] https://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/artigos/121822614/possibilidade-de-alimentos-compensatorios