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A consolidação da pós-modernidade jurídica no Brasil via regulação estatal da economia

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Agenda 07/05/2006 às 00:00

Conclusão

Ao estudarmos o direito administrativo brasileiro, em particular em sua vertente econômica, e perscrutando as relações entre o direito e a economia, percebemos o quanto as concepções tradicionais das teorias do direito público e do Estado estão dissociadas da atual atuação estatal. [61]

As rápidas e profundas mudanças trazidas pela revolução científico-tecnológica, e em seu bojo, pela revolução das comunicações, atuam no sentido de despir a administração pública das características burocráticas que assumiram nos países de tradição jurídica continental européia, na linha do direito administrativo gerado pela Revolução Francesa. Até porque as redes que se formaram ao longo do globo entre estes diversos interesses parciais de organização da sociedade, propiciadas pelos avanços comunicacionais verificados, colocaram em xeque a presunção de o Estado poder, de per si, fazer as suas regras de conduta terem os efeitos sociais desejados.

Permeável a todas essas mudanças e rompendo, por conseguinte, com a dogmática jurídica inerente à modernidade, o direito administrativo econômico brasileiro – direito pluralista, direito negociado, direito mole, direito fluido – apresenta novas características em relação ao direito moderno: esposando a complexidade do real, ele se transforma em instrumento flexível de pilotagem e de regulação.

Podemos, destarte, adotar as conclusões a que em relação ao tema chegou D. F. MOREIRA NETO:

"Sem dúvida, estamos vivendo uma Era Fascinante, em um pequeno segmento da História, que poderá ser lembrado como o heróico preâmbulo de uma civilização ecumênica. Por isso cada vez mais devemos estar atentos à velha lição de Cícero ao nos recomendar: "Tempori cedere, id est necessitati parere, semper sapientis est habitum" (Ceder ao tempo, ou seja, obedecer à necessidade, é sempre hábito de sabedoria)". [61]


Bibliografia

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Notas

01 G. CARCASSONE et alli. Transformaciones del derecho público. Buenos Aires: Ciudad Argentina, 2001, p. 09.

02 Esta também é uma preocupação de F. A. MARQUES NETO: "A reforma do Estado no Brasil e em diversos países ocidentais, aliada à redução da atividade estatal como agente econômico colocou-nos diante da necessidade de se construir uma teoria da regulação estatal em face da ordem econômica" (Limites à abrangência e à intensidade da regulação estatal. In: Revista de direito público da economia. Belo Horizonte: Fórum, n. 1, jan.-mar./2003, p. 71).

03Direito Económico. Coimbra: Coimbra Ed., 1998, p. 12.

04 A. LAUBADÈRE. Droit public économique. Paris: Dalloz, 1976, p. 23.

05 M. J. VILLELA SOUTO. Direito administrativo regulatório. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 1.

06 "El servicio público, en su acepción tradicional, presuponía una actividad que ha sido retenida por el Estado, excluída del mercado, asumida en cuanto a su titularidad aunque su gestión pudiera concederse. (...) Pues bien, ese modelo que hemos analizado y a partir del cual se han montado buena parte de las técnicas de intervención del Derecho Administrativo en este pasado siglo, ese modelo, digo, es el modelo que, justamente, está en crisis. (...) Los servicios de interés general se refieren as las actividades, públicas o privadas, que cumplen misiones de interés general y están sometidas, por ello, a obligaciones de servicio público en atención a razones diversas que plasmam valores colectivos comúnmente asumidos: la cohesión social, en medio ambiente, la protección de los consumidores, la igualdad social, la garantía de un común de benestar." (L. M. REBOLLO. Servicios públicos y servicios de interés general. In: D. F. Moreira Neto. Una evaluación de las tendencias del derecho administratvo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, pp. 102, 107.

07 J. C. CASSAGNE se faz pertinente: "Uno de los temas de palpitante actualidad es el que concierne a la regulación por el Estado de aquellos servicios que satisfacen las necesidades primordiales de los habitantes. Es indudable que la privatización ha sido la causa principal de este fenómeno, pero también es cierto que la operación privatizadora no resuelve, en sí misma, toda la compleja problemática que actualmente se plantea en los planos jurídicos, económico y hasta político. Es tan sólo un punto de partida. Y en medio de este escenario, donde nuevos marcos legales y reglamentarios introducen grandes innovaciones sobre los esquemas tradicionales, aparecen los entes reguladores, cuya función básica y esencial consiste en actuar como factores de equilibrio y de recomposición de los diferentes intereses en juego. (...) La necesidad de regulación aparece como correlato del servicio público y se justifica en el principio de subsidiariedad; su objeto es armonizar los poderes de los prestatarios con el interés de los clientes o usuarios y, más todavía, con el interés más genérico de la comunidad, interés público en suma. (Fragmentos de derecho administrativo. Entre la justicia, la economía y la política. Buenos Aires: Hammurabi, 2003, p. 201).

08 D. A. MUSTTI GROTTI. A participação popular e a consensualidade na administração pública. In: D. F. Moreira Neto. Una evaluación de las tendencias del derecho administratvo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 648.

09 Nesse mesmo sentido F. A. MARQUES NETO. Direito das telecomunicações e Anatel. In: C. A. SUNDFELD (org.). Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2000, pp. 300-302.

10 J. CHEVALLIER. La régulation juridique en question. In: Droit et Société. Paris: LGDJ, n. 49, 2001, p. 828.

11 A teoria da autopoiese, ao discutir os limites substantivos da regulação estatal, questiona a própria capacidade regulatória da lei diante da lógica do sistema econômico. Sobre isso ver T. PROSSER. The modern law review limited. Oxford: Blackwell, 1999, pp. 209-213.

12 J. CHEVALLIER. Op. cit., p. 829.

13 J. THOENIG. L’usage analytique du concept de de regulation. In: Jacques COMAILLE et Bruno JOBERT (org.). Les métamorphoses de la régulation juridique. Paris: LGDJ, 1998, p. 36.

14 G. ARIÑO ORTIZ. Economía y Estado. El Estado productor (de las nacionalizaciones a las privatizaciones). El Estado regulador (del monopolio a la competencia). Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2002, p. 54.

15 F. A. HAYEK, em seu Caminho da Servidão ainda em 1944, faz "um ataque apaixonado contra qualquer limitação dos mecanismos de mercado por parte do Estado, denunciadas como uma ameaça letal à liberdade, não somente econômica, mas também política." (apud P. ANDERSON. Balanço do neoliberalismo. In: E. SADER (org.). Pós-neoliberalismo. As políticas sociais e o Estado democrático. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995, p. 09).

16 J. CHEVALLIER. Op. cit. 829.

17 Adotamos, parcialmente, a tese proposta por J. CHEVALLIER em seu Vers un droit post-moderne? Les transformations de la régulation juridique. In: Révue du droit public. Paris: LGDJ, n. 03, mai-juin 1998, p. 671.

18 Complexidade que, para M. KERCHOVE e F. OST (Le droit et les paradoxes du jeu. Paris: PUF, 1992, p. 12), é reconhecida pelo tríplice qualidade da incerteza, da recorrência e de dialética.

19 P. AMSELEK. L’évolution générale de la technique juridique dans les sociétés occidentales. In: Révue du droit public. Paris: LGDJ, n. 02, 1982, p. 291.

20 J. AUTIN. L’usage de la régulation en droit public. In: M. MIAILLE (org.). La régulation entre droit et politique. Paris: L’Hartmattan, 1995, p. 43.

21 A. S. ARAGÃO. Regulação da economia: conceito e carcterísticas contemporâneas. In: Revista de Direito da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, n.11, 2002, passim.

22 F.OST. Le rôle du droit: de la vérité révélée à la réalité négociée. In: G. TIMSIT; A. CLAISSE; N. BELLOUBET-FRIER (org.). Les administrations qui changent. Paris: PUF, 1996, p. 75.

23 D. BÉCHILLON. La structure des normes juridiques à l´épreuve de la post-modernité. Paris: PUF, 1999.

24 CURAPP. La doctrine juridique. Paris: PUF, 1993, apud J. CHEVALLIER. Op. cit., p. 673.

25 J. CHEVALLIER. Op. cit., p. 673.

26 F. A. MARQUES NETO. Op. cit., pp. 300-301.

27 M. S. GIANNINI. Diritto amministrativo. Milano: Giuffrè, v. 1, 1993, pp. 49-50.

28 F. K. COMPARATO. A organização constitucional da função planejadora. In: R. A. L. CAMARGO. Desenvolvimento econômico e intervenção do Estado na ordem constitucional. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1995, p. 81.

29 J. J. G. CANOTILHO. Direito constitucional e teoria da constituição. Coimbra: Almedina, 1999, p. 1265.

30 F. K. COMPARATO. Op. cit., pp. 80-81.

31 M. A. STEFANELLI. La tutela dell’utenti di publici servici. Padova: Cedam, 1994, p. 64 apud A. S. ARAGÃO. Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 101.

32 Para citar apenas um exemplo, a lei geral de telecomunicações (lei nº 9.472/97) confere poderes a ANATEL para expedir normas quanto à outorga, prestação e fruição dos serviços de telecomunicações em regime público e privado (art. 19, VI e X).

33 Nesse sentido se poderá afirmar que é da atividade individual que decorrem as explicações para os fatos sociais. Estamos no domínio do individualismo epistemológico. A expressão é de S. G. KOLM. Le liberalisme moderne. Paris: LDG, 1997, p. 185.

34 F. K. COMPARATO. Juízo de constitucionalidade das políticas públicas. In: Estudos em homenagem a Geraldo Ataliba. Vol. 2. São Paulo: Malheiros, 1997, pp. 350-351.

35 N. REICH. Economic state interventionism. Annals of the II Euskal Mundu-biltzarra. Ekonomiaren herri-alorreko Zuzenbideari Buruzku Biltzarra. Bilbao: Eusko Jaurlaritzaren Argitalpen-zerbitzu Nagusia. 1988, p. 185.

36 A. S. ARAGÃO. Op. cit.,p. 24.

37 J. CHEVALLIER. Op. cit., p. 679

38 A. S. ARAGÃO. Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 85.

39 L. S. C. MONCADA. Op. cit., pp. 56-57.

40 A lei nº 9.478/97, que dispõe sobre a política energética nacional e institui a Agência Nacional do Petróleo estabelece uma série de objetivos gerais como: preservar o interesse nacional; promover o desenvolvimento; promover o desenvolvimento; ampliar a competitividade do país; utilizar fontes alternativas de energia; dentre outros.

41 G. TIMSIT. Les deux corps du droit: essai sur la notion de régulation. In: Révue française d’administration publique. Paris: LGDJ, n. 78, 1999, p. 375.

42 P. AMSELEK. Op. cit., p. 287.

43 Le droit de l’État providence. In: Révue du droit suisse, 1988, p. 527.

44 Consoante o pensamento de A. JEAMMAUD; E. SERVERIN. Évaluer le droit. Paris: LGDJ, 1992, p. 47.

45 "L’expérimentation législative suppose la réunion de quatre conditions: qu’un terme soit fixé; que ce terme figure dans le texte même; qu’une évaluation des effets soit prévue; que la pérennisation du dispositif soit subordonné à l’adoption d’une nouvelle loi. Ainsi, le législateur procède-t-il par tâtonnement en remettant en chantier son ouvrage. On peut aller plus loin encore dans cette integration de l’évaluation au processus décisionnel, en en faisant la condition explicite du maintien ou de la disparition d’une legislation: c’est le cas au États-Unis des Sunset laws, c’est-à-dire des lois instituées pour un délai determiné et qui tombent automatiquement à l’expiration de ce délai – la prorogation étant subordonée à une procedure d’évaluation. L’exigence d’adaptation est dès lors inscrite au coeur de la production juridique."(J. CHEVALLIER. Op. cit., p. 681).

46 A. S. ARAGÃO. Op. cit., p. 92.

47 G. RIPERT. Aspectos jurídicos do capitalismo moderno. Trad. G. G. Azevedo. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1947, pp. 12-13.

48 G. T. E. FARIA. Interpretação econômica do direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 1994, passim.

49 G. TEUBNER. O direito como sistema autopoiético. Trad. J. E. ANTUNES. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989, pp. 187-188.

50 O primeiro texto de BOBBIO sobre a Análise Funcional do Direito, The Promotion of Action in the Modern State, foi publicado na obra coletiva organizada por G. HUGES, Essays in Legal Philosophy, New York University Press, 1969. Ainda em 1969 ele publicou L’Itinerario di Túlio Ascarelli, in Studi in memória di Tullio Ascarelli. Em 1976, na obra coletiva organizada por G. R. CARRIÓ, Derecho, Filosofia y Lenguaje, homenaje a Ambrosio L. Gioja, publicou o importante Hacia uma teoria funcional Del derecho. Em 1977 foi publicada a 1º edição do livro Dalla Struttura alla funzione, nuovi studi di teoria Del diritto, que reúne os ensaios anteriores de Bobbio sobre o tema, com uma 2ª edição revista em 1984.

51 L. JANSEN. Introdução à economia jurídica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, pp. 11-14.

52 R. JEHRING. A evolução do direito. Salvador: Livraria Progresso, 1953, p. 132, apud L. JANSEN. Op. cit., p. 13.

53 G. TEUBNER. Op. cit., pp. 189.

54 A. S. ARAGÃO. Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 95.

55 J. CHEVALLIER. Op. cit., p. 675.

56 D. A. MUSTTI GROTTI. Op. cit.,p. 648.

57 D. F. MOREIRA NETO. O sistema judiciário brasileiro e a reforma do Estado. São Paulo: IBDC, Celso Bastos Editor, 1999, pp. 51-52.

58 G. A. ORTIZ. Principios de derecho público económico. Granada: Ed. Comres, 1999, pp. 598-599.

59 Desarollo reciente de los instrumentos de la administración consensual en España. In: D. F. MOREIRA NETO. Una evaluación de las tendencias contemporaneas del derecho adminstrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 382.

60 Nesse mesmo sentido ver A. S. ARAGÃO. Ensaio de uma visão autopoiética do direito administrativo. In: Revista de direito público da economia. Belo Horizonte: Fórum,n. 4, out. /dez. 2003, p. 9.

61 D. F. MOREIRA NETO. A globalização e o direito administrativo. In: D. F. MOREIRA NETO. Una evaluación de las tendencias contemporaneas del derecho adminstrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 562.

Sobre o autor
André Felipe Canuto Coelho

economista e bacharel em Direito em Recife (PE), mestre em Direito pela UFPE, doutorando em Ciência Política pela UFPE

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COELHO, André Felipe Canuto. A consolidação da pós-modernidade jurídica no Brasil via regulação estatal da economia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1040, 7 mai. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8325. Acesso em: 28 dez. 2024.

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