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A importância da realização das sessões de mediação nas ações de família à luz do novo Código de Processo Civil

Agenda 12/07/2020 às 17:09

O artigo busca relacionar a importância da mediação para a resolução das lides processuais familiares. Analisando a figura do mediador como um pacificador dos conflitos familiares e sua essencialidade para o Direito de Família.

INTRODUÇÃO

O instituto da Mediação foi introduzido no Processo Civil Brasileiro pelo Novo Código de Processo Civil- Lei nº 13.105/2015, tornando-se uma ferramenta indispensável para o desenvolvimento processual. O novo CPC trouxe em seu teor uma série de artigos que disciplinam a realização da sessão de mediação e a atuação dos mediadores.

O objetivo principal do instituto da mediação é devolver as partes litigantes o controle do conflito em que estão emersas, bem como a capacidade de comunicação e de empatia com o seu oponente. Isto porque a finalidade da mediação não é somente por fim àquele processo á qual foi designada, mas sim evitar que outros venham a abarrotar o Poder Judiciário.

Neste sentido é que a mediação é essencial nos conflitos judiciais familiares, já que devolve aos participantes o poder de comunicação e de pacificação entre seus membros. O papel do mediador é crucial para que tal finalidade seja alcançada, tendo em vista que possuem um treinamento específico para realizar tal tarefa, e diferentemente dos demais operadores do direito visam o bem estar social e não o fim do processo judicial.

O INSTITUTO DA MEDIAÇÃO E O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL- LEI Nº 13.105/2015

O instituto da mediação vem se tornando uma importante ferramenta para a solução dos conflitos judicias e para desafogar o poder judiciário que está a cada dia mais moroso e abarrotado de ações em todas as suas áreas. Após a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil, a mediação ganhou visibilidade e está conquistando os operadores do direito.

O conceito de mediação traduz também a sua sistemática e revela de maneira simples o seu funcionamento. Para o Conselho Nacional de Justiça

A mediação é um processo autocompositivo segundo o qual as partes em disputa são auxiliadas por uma terceira parte neutra ao conflito ou por um painel de pessoas sem interesse na causa, para se chegar a uma composição. Trata-se de um método de resolução de disputas no qual se desenvolve um processo composto por vários atos procedimentais pelos quais o(s) terceiro(s)  imparcial(is) facilita(m) a negociação entre as pessoas em conflito, habilitando-as a melhor compreender suas posições e encontrar soluções que se compatibilizam aos seus interesses e necessidades. (CNJ, 2015, p. 24)

Assim, a mediação é um método de resolução de conflitos que utiliza uma terceira pessoa que não possui interesse e nem conhecimento da causa para auxiliar as partes conflitantes a enxergarem seus interesses e necessidades, bem como a reconhecer as necessidades e interesses das outras partes, para através deste reconhecimento poderem reestabelecer uma comunicação saudável e chegarem a uma solução do conflito que atenda ao todo ou em parte as necessidades de todos os envolvidos.

O instituto da mediação não é apenas uma audiência onde as partes litigantes estão presentes para cumprir os trâmites processuais, a mediação é um momento utilizado para retomar ou fortalecer a comunicação entre as partes que se encontra prejudicada pela existência do conflito. Assim, para Tânia Almeida

A mediação é então um processo de diálogo assistido porque pressupõe a participação de um terceiro imparcial com conhecimento específico para atuar em sua coordenação. Necessita de coordenação porque é utilizada, primordialmente, quando a negociação direta não se mostrou produtiva. É um processo estruturado porque está destinado a finalidades específicas. A assistência do terceiro tem a fundamental finalidade de cuidar de sua efetividade. (ALMEIDA, 2014, p. 206)

Além, pode-se destacar que o objetivo maior da mediação não é encontrar uma solução para o conflito ou simplesmente realizar um acordo, segundo o Conselho Nacional de Justiça

São exemplos dos objetivos da mediação: a resolução da disputa, o empoderamento das partes, o controle sobre o processo, o estabelecimento de um clima cooperativo na mediação e o reconhecimento e a validação dos sentimentos de cada parte. (CNJ, 2015, p. 213)

Deste modo, a mediação é um instituto que abarca também os sentimentos e a personalidade dos envolvidos no conflito, auxiliando-os a separarem os seus sentimentos do conflito, para que assim possam superar o momento litigioso sem que este cause ainda mais sofrimento e prejuízos. Há uma gama de sentimentos expostos em uma sessão de mediação

Em todo o processo de mediação, diversos sentimentos irão ser manifestados: ressentimento, ódio, frustração, inveja, ciúmes, medo, mágoa, amor, entre outros. Nesse caso, o mediador deve identificar os sentimentos para que a parte sinta-se adequadamente ouvida e compreendida. (CNJ, 2015, p. 179)

O Código de Processo Civil de 2015 se prestou a trazer um novo entendimento e dar uma nova forma as ações processuais civis. Nessa esteira Humberto Theodoro Júnior (2015, p. 225) explica que o Novo CPC diante da ausência de profissionalismo no uso das técnicas tenta promover um peculiar modelo multiportas no qual o processo engloba a solução adjudicada, além da possibilidade endoprocessual de uma conciliação ou mediação profissionalizada.

Neste sentido, é possível afirmar que o NCPC permitiu um novo sistema chamado de multiportas para a resolução dos conflitos, isto quer dizer que o antigo modelo engessado em que as partes apresentavam seus lados da história e o magistrado decidia quem está certo ou errado, ou ainda, quem ganha ou perde já não é mais o único meio de resolução de conflitos.

Quanto à existência de um sistema multiportas Fernanda Tartuce explica

Sistema multiportas é o complexo de opções que cada pessoa tem a sua disposição para buscar solucionar um conflito a partir de diferentes métodos; tal sistema (que pode ser ou não articulado pelo Estado) envolve métodos heterocompositivos (adjudicatórios) e autocompositivos (consensuais), com ou sem a participação estatal. (TARTUCE, 2018, p.72)

O complexo de opções oferecidas pelo sistema multiportas é o responsável por adequar cada espécie de conflito ao método mais apropriado para sua resolução, isto porque a existência de um único método de resolução para os conflitos afasta os cidadãos da justiça e transforma-os em apenas números e estatísticas perante o abarrotamento de processos dentro do poder judiciário. A falta de opções para a solução de conflitos torna a justiça cada vez mais morosa e desigual e não traz dignidade e satisfação para as partes envolvidas no litígio.

Sobre este assunto, Carlos Eduardo de Vasconcelos leciona

As atuais inovações do CPC resgatam, portanto, uma dívida histórica do direito processual civil para com a Constituição da República. Estávamos reféns da supervalorização de processos de ganha-perde, com ênfase para as particularidades formais, que hipertrofiavam os mecanismos adjudicatórios e aviltavam as possibilidades dos métodos autocompositivos. (VASCONCELOS, 2017, p. 90-91)

Deste modo é possível afirmar que o NCPC buscou concretizar o acesso à justiça e ao método adequado para a solução de conflitos para as pessoas, isto porque mais importante que findar o conflito, é fazê-lo de modo que traga benefícios para as partes, bem como que propicie a continuação dos laços afetivos e o cumprimento do acordo de forma durável.

O NCPC concretizou os métodos alternativos de resolução de conflitos em seu artigo 3º, §1º, 2º e 3º quando determinou que é permitido o uso da arbitragem; quando determinou que o Estado promoverá sempre que possível a solução consensual dos conflitos, bem como quando afirmou que a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual dos conflitos deverão ser estimulados pelos operadores do direito, inclusive durante o curso do processo judicial.

Isto mostra que o processo judicial já não mais um procedimento engessado que não possa ser findado por outro meio que não seja somente uma sentença judicial, mostra também que é um dever dos defensores públicos, juízes, promotores, advogados e todos os operadores e auxiliares da justiça promover e estimular a utilização dos métodos consensuais, promovendo desta forma uma pacificação social e retirando a cultura da litigiosidade do cotidiano brasileiro.

Sobre a utilização da mediação, Humberto Theodoro Júnior (2015, p.221) explica que “a mediação não é vista como “justiça de segunda classe para cidadãos de segunda classe”, mas como um serviço público tão essencial quanto a assistência judiciária e o próprio Judiciário.” Neste sentido é que pode se afirmar que a mediação não é destinada a uma classe de pessoas ou a uma classe de processos, por mais que ela seja mais indicada para alguns tipos de ações, a mediação pode ser utilizada em diversas áreas do direito, sem que haja qualquer prejuízo para as partes e para os cidadãos.

A mediação é apenas um dos métodos do sistema multiportas, entretanto, por ser minuciosa e mais demorada, durante uma sessão de mediação poderão ser observadas as técnicas utilizadas em outros métodos como a negociação e a conciliação. Isto porque, o procedimento da mediação não visa a realização imediata de um acordo e nem está atrelada ao término processual, a mediação está principalmente ligada a existência e a manutenção da comunicação entre as partes processuais, daí o seu principal benefício para o processo de modo singular e para o sistema judiciário como um todo.

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Neste sentido, Fernanda Tartuce esclarece

O efeito verdadeiramente pacificador almejado pela prestação jurisdicional dificilmente é obtido com a imposição da decisão do juiz. Se as próprias partes puderem protagonizar a administração do conflito compreendendo suas múltiplas facetas e abordando-as de forma ampla e produtiva, certamente haverá mais chances de superação da situação conflituosa e de adesão aos termos definidos no acordo. (TARTUCE, 2018, p. 354).

Muito mais do que desafogar o judiciário, o Novo Código de Processo Civil objetivou a pacificação social, ou seja, solucionar as demandas sem que delas surjam novos conflitos. Isto ocorre porque, após prolatada uma sentença em que nenhuma das partes está satisfeita, ou ainda que está aquém das possibilidades daquele que se tornou o perdedor, outras demandas surgirão, como execuções de sentenças, ações de indenizações, recursos infinitos, etc.

Ainda, o legislador também se preocupou com o momento mais propicio para a realização da mediação durante o procedimento jurisdicional, colocando a mediação naquele que seria o momento mais oportuno para sua realização

Dentre outras, há duas providências determinadas pelo legislador, que visam diretamente facilitar e favorecer a autocomposição. A primeira delas é a instituição de uma audiência de tentativa de conciliação já no início do procedimento comum, antes que o réu tenha oportunidade de oferecer resposta, pois, depois dela, pode haver um recrudescimento do conflito, que dificultará a conciliação. A audiência antes da resposta do réu, logo no início do procedimento, pode encontrar um campo mais favorável à conciliação do que a audiência na fase de saneamento do processo, prevista no art. 331 do CPC de 1973. (GONÇALVES, 2017, p.302)

O Novo Código de Processo Civil trouxe mudanças profundas quanto à relação das partes com o litígio. O antigo código visualizava as partes apenas como uma parcela do litígio, transformando-as em papéis e alegações vazias, o que dificultava a composição harmoniosa do acordo e um modo humanizado de comunicação com as partes envolvidas.

A mediação é envolta de um mecanismo totalmente diferenciado do processo judicial comum como conhecemos, onde há a figura do magistrado que decide pelas partes, um advogado ou defensor público que procura de todas as formas proteger o seu cliente e ainda, um ministério público ou um autor da ação que utiliza de todas as suas fichas para obter o maior ganho possível naquele processo. Na mediação há somente um mediador sem nenhum interesse na resolução do conflito e as duas partes que estão naquela ocasião para conversar e entender melhor os seus interesses e objetivos. Sem que a resolução do litígio, o fim processual e um ganho a todo custo seja o foco maior do ato.

Neste sentido Adacir Reis

A adoção de tais políticas não significa fragilizar ou desprestigiar o Poder Judiciário. Pelo contrário, essa nova prática vai contribuir para conferir ao aparato estatal jurisdicional maior acessibilidade, autoridade e eficiência. No caso da mediação judicial, embora seja desejável alcançar a solução consensual, é preciso oferecer salvaguardas às partes para que os agentes do Estado- mediadores, magistrados ou mesmo membros do Ministério Público- não ultrapassem seus limites em razão de um possível desejo de pôr fim ao processo. (REIS, 2015, p. 234).

O procedimento da mediação não é indicado apenas para as demandas que contenham relações familiares, a mediação é um instituto que abarca todos os tipos de relações humanas e possui a aptidão de trabalhar a comunicação e manter as relações em diversas áreas da sociedade. A mediação, por vislumbrar somente uma finalização para o conflito, é um procedimento que possui a capacidade de trabalhar com vários tipos de litigantes, podendo assim ser indicada para a composição de acordos em vários ramos, conforme demonstra Adacir Reis

Como regra geral, é possível adotar a mediação nos conflitos que admitem a transação. A proposição legislativa em curso pretende ampliar sua aplicação, excluindo do alcance desse instituto apenas alguns temas de direito de família e recuperação judicial. Desse modo, pretende-se estimular as mediação não apenas em matérias civis e comerciais, mas também nas questões comunitárias, escolares, trabalhistas, coletivas e com a Administração Pública. (REIS, 2015, p. 226)

O mediador possui um papel diferente do juiz e do próprio conciliador dentro do processo, pois é dele a responsabilidade e capacidade de retomar a comunicação entre as partes e dar a elas o suporte e apoio de que necessitam para compor um acordo que traga vantagens para todos e que não gere mais tarde novos conflitos.

A mediação é um procedimento indicado principalmente para os casos em que há relação contínua entre as partes, sendo o mediador o profissional mais indicado para atuar neste tipo de demanda, conforme § 3º do artigo 165 do NCPC. Entretanto, a mediação não está restrita a estas situações e poderá ser também utilizada quando o magistrado ou o coordenador dos Centro Judiciários de Soluções de Conflitos e Cidadania (Cejusc) julgarem necessário.

AS AÇÕES DE FAMÍLIA E A APLICAÇÃO DAS SESSÕES DE MEDIAÇÃO

As ações de família ganharam um capítulo especial no Novo Código de Processo Civil, sendo suas disposições reunidas entre os artigos 693 ao 699. Isto ocorre devido à importância e a unicidade das ações de família, pois são ações que abarcam os sentimentos e a parte mais especial e importante da vida de cada cidadão.

A resolução consensual de conflitos é tão essencial nas ações de família que o NCPC no artigo 694 determina que “Nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos para a solução consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de conhecimento para a mediação e conciliação.” Deste modo, é possível vislumbrar a importância da ocorrência da sessão de mediação e a atuação do mediador dentro do processo judicial.

As ações de família possuem peculiaridades que a difere dos outros ramos processuais, segundo Maria Berenice Dias (2011, p. 82) os operadores do direito que se relacionam com esse segmento processual “devem atentar para o fato de que trabalham com o ramo do direito que trata mais de perto com a pessoa, seus sentimentos, suas perdas e frustrações.”.

Outra peculiaridade das ações de família é a existência do afeto entre seus pertencentes. Esse afeto não se encerra com a existência ou início de um processo judicial, sendo assim é importante que mesmo durante a ocorrência processual energias sejam gastas para a manutenção desse afeto. Segundo Flávio Tartuce

O afeto talvez seja apontado, atualmente, como o principal fundamento das relações familiares. Mesmo não constando a expressão afeto do Texto Maior como sendo um direito fundamental, pode-se afirmar que ele decorre da valorização constante da dignidade da pessoa humana. (TARTUCE, 2018, p.25)

A dignidade e a integridade de cada litigante familiar devem sem preservadas e respeitadas durante o processo judicial, e esta ocorrência só é possível através de um procedimento que respeite as partes e que as auxilie a manter a honestidade e a hombridade acima de qualquer interesse, sendo que o meio mais adequado para isso é através da possibilidade de comunicação entre as partes.

O procedimento da mediação, acima de qualquer objetivo, visa à retomada da comunicação nas relações em que a convivência é contínua, neste sentido Flávio Tartuce demonstra a importância do procedimento da mediação

No Direito de família, o aspecto continuativo da relação jurídica recomenda que haja uma eficiente e respeitável comunicação entre os indivíduos, despontando a mediação como importante instrumento para viabilizá-la. (TARTUCE, 2018, p. 353)

A mediação, portanto, tem o papel de “acalmar os ânimos” e devolver o controle da situação para as partes envolvidas no litígio. Mesmo que não seja possível a realização de um acordo, a mediação terá cumprido o seu papel se ao final de suas sessões as partes se respeitarem e passarem a enxergar o outro não como um inimigo, mas como um opositor naquela determinada situação.

O modelo heterocompositivo, onde um terceiro após analisar somente papéis e alegações vindas de advogados, não possui qualquer efeito sobre os sentimentos das partes, e muitas vezes contribui para o derradeiro fim da relação família. Maria Berenice Dias explica

A sentença raramente produz o efeito apaziguador desejado pela justiça. Principalmente nos processos em que envolvem vínculos afetivos, em que as partes estão repletas de temores, queixas e mágoas, sentimentos de amor e ódio se confundem. A resposta judicial jamais corresponde aos anseios de quem busca muito mais resgatar prejuízos emocionais pelo sofrimento de sonhos acabados do que reparações patrimoniais ou compensações de ordem econômica. (DIAS, 2011, p. 84)

É sabido que o magistrado possui o dever de procurar uma conciliação entre as partes durante a realização das audiências de Instrução e Julgamento, ou mesmo na audiência inicial de conciliação do procedimento comum. Entretanto, o instituto da conciliação não é o mais recomendado quando a causa trata-se de direito de família, isto porque o procedimento da conciliação admite a interferência do terceiro neutro para sugerir soluções para o conflito, bem como negociar com as partes as clausulas do acordo a ser redigido.

Assim, a conciliação pode mais tarde resultar em novas ações, é o que explica Flávio Tartuce

Em um conflito familiar que encerra elevada carga emocional, a controvérsia pode apenas ser deslocada, ressurgindo depois em um novo formato; nesse caso, a conciliação, apesar de encerrar oficialmente a causa, pode acabar por fazer brotar outras demandas decorrentes do mesmo conflito, ainda que sob diferentes aspectos. (TARTUCE, 2018, p. 355)

Deste modo, é possível vislumbrar que quanto a menor a interferência de um terceiro no epicentro do conflito, maiores serão as chances de as partes comporem um acordo que seja voluntário e sustentável. Neste sentido o papel do mediador é extremamente importante, já que seu interesse vai além de manejar o conflito, mas sim trabalhar com as partes para que elas sejam capazes de manusear e findar o conflito.

 Neste sentido, Adacir Reis explica que

O mediador tem a incumbência de clarificar as razões reais da disputa e as possíveis soluções e, considerando o eventual nível de hostilidade entre as partes, trabalhar para que as discussões ocorram com urbanidade e respeito recíprocos, inclusive para que cada uma das partes possa discernir quais são seus interesses reais e suas paixões momentâneas. (REIS, 2015, p. 227).

A mediação se torna importante quando analisada a função do mediador, pois após o curso do processo judicial as partes continuarão a ter um vínculo, e este não pode ser prejudicado ou desfeito como consequência de um processo judicial. Após o procedimento da mediação, mesmo que esta não resulte em acordo, as partes passam a possuir o entendimento de que as relações familiares estão a par de uma lide judicial, valorizando os sentimentos de todos os envolvidos.

Neste Sentido também José Domingues Filho exalta a valorização dos sentimentos familiares

A mediação é um processo do coração; o conflitos precisamos senti-lo ao invés de pensar nele; precisamos, em termos de conflito, sê-lo para conhece-lo. Os conflitos reais, profundos, vitais, encontram-se no coração, no interior das pessoas. Por isto é preciso procurar acordos interiorizados. E para busca-lo, com os contendores postos frente a frente, é que o mediador “intervém durante todo o processo, com o objetivo de conciliar as partes a aproximar seus pontos de vista sem, contudo, impor solução”. (FILHO apud WARAT, 2016, p. 241).

O papel do mediador é facilmente traduzido como um pacificador dos ânimos entre as partes. O mediador não deve intervir na razão objetiva do conflito, ou seja, não deve se concentrar no objeto da demanda, mas sim nos elementos que estão a sua volta. Desta maneira

Antes de cogitar a extinção do conflito como objetivo primordial deve o mediador contribuir para que deficiências de comunicação entre os sujeitos não impeçam suas conversas. Afinal, a ideia é permitir que eles próprios possam superar o impasse, transformando o conflito em oportunidade de crescimento e viabilizando mudanças de atitude. A mediação pode ser considerada uma proposta não de solução do conflito simplesmente, mas de reorganização e reformulação da comunicação entre as pessoas. (TARTUCE, 2018, p. 233)

Nestes termos, portanto, o papel possui uma função diferente de outros operadores do direito, sendo assim

O mediador deverá buscar, dentro do possível, uma reconciliação, ou uma pacificação ou apaziguamento, para que a relação, que tem caráter permanente ou prolongado, possa ser retomada sem obstáculos ou embaraços. É por meio da compreensão dos interesses em conflito e do restabelecimento da comunicação entre os envolvidos que o mediador poderá tentar fazer prevalecer e permanecer o vínculo. (GONÇALVES, 2017, p. 304)

Neste sentido também leciona Caetano Lagrasta Neto

Conciliações inúteis são comuns e habituais às meras propostas de acordo, frutos da insensibilidade dos juízes e dos advogados, os primeiros preocupados com a imparcialidade ou com a pauta diária; enquanto estes últimos, apesar de conciliadores iniciais ou mediadores natos da causa, muitas vezes enredados pelo aceno a polpudos honorários, estimulam uma demanda inútil e reiterada em ações e recursos, submetidos os interessados à solução estatal aguardada durante anos. (LAGRASTA, 2011, p. 113)

Em outros termos, o procedimento da mediação, diferentemente da conciliação, nunca será um ato infrutífero pois possui finalidades diversas dos demais métodos de resolução de conflitos. Neste sentido também se manifesta o Conselho Nacional de Justiça (2011, p. 17) que determina como sendo objetivos da mediação familiar (i) Reduzir antagonismos e agregar estabilização familiar; (ii) aumentar satisfação com procedimentos jurídicos e seus resultados e (iii) aumentar índice de cumprimentos de decisões judiciais. Sendo assim a conceituação de mediação familiar pode ser entendida como

Na sua essência a mediação de família consiste em uma negociação assistida ou facilitada por um ou mais colaboradores em que se desenvolve um processo composto por vários atos procedimentais, pelos quais o(s) terceiro(s) imparcial(ais) facilita(am) a negociação entre membros de uma família em conflito, habilitando-as a melhor entenderem suas posições e encontrar soluções que se compatibilizem com seus interesses e necessidades. (CNJ, 2011, p. 92)

O ramo de direito de família é o que envolve mais sentimentos e possui não só o dever de trazer justiça para as partes e solucionar conflitos, mas também de apaziguar desavenças, retomar a comunicação entre os envolvidos. Assim, os profissionais envolvidos com esse ramo do direito devem ser conscientes de que deve ser muito mais um pacificador, um apaziguador de almas despido de qualquer atitude moralista ou crítica. (DIAS, 2011, p. 83)

Neste sentido Maria Berenice Dias determina a função da mediação

Por ser uma técnica alternativa para levar as partes a encontrar solução consensual, é na seara da família que a mediação desempenha seu papel mais importante: torna possível a identificação das necessidades específicas de cada integrante da família, distinguindo funções, papéis e atribuições de cada um. Com isso possibilita que seus membros configurem um novo perfil familiar. A mediação pode ser definida como um acompanhamento das partes na gestão de seus conflitos, para que tomem uma decisão rápida, ponderada, eficaz e satisfatória aos interesses em conflito (DIAS, 2011, p. 85)

Depreende-se, portanto que a mediação é um procedimento que objetiva a dar visibilidade e valoração aos sentimentos das partes envolvidas no processo judicial, bem como a proporcioná-las a possibilidade de se enxergarem e enxergarem o outro não como um inimigo, mas como um compositor de um conflito temporário. Desta forma, o conflito fica restrito àquela única questão analisada na lide e não disseminada pela relação familiar anteriormente existente e posteriormente continuada.

O procedimento da mediação não visa à solução forçada do conflito e nem a resolução de conflitos para diminuir os números do judiciário. A mediação visa os sentimentos das partes, uma decisão conjunta de soluções para buscar o fim do litígio de maneira sustentável [1]·. Isto porque, quando há uma grande intervenção do mediador ou conciliador há grandes chances de o acordo não estar sendo realizado para suprir todos os anseios e interesses das partes litigantes.

Assim, retirar as ações familiares do centro do método comum de julgamento das demandas judiciais é uma forma de auxiliar as famílias a solucionar os seus conflitos de maneira mais célere e satisfatória. Nesta seara Flávio Tartuce (2018, p. 355) entende que “a mediação promove uma abordagem mais profunda da controvérsia, funcionando como um acompanhamento das partes para que possam gerir seus conflitos e formular uma decisão célere, ponderada, eficaz e satisfatória em relação à controvérsia instalada”.

Após a realização da sessão de mediação as partes litigantes possuem uma perspectiva diferenciada da lide processual em que estão atuando e de outros conflitos de sentimentos que existem dentro da relação familiar. Sendo assim, em demandas familiares a via consensual pode ser apresentar como uma alternativa para a prevenção de conflitos futuros.

Neste sentido o artigo 695 do CPC determina que “Recebida a petição inicial e, se for o caso, tomadas as providências referentes à tutela provisória, o juiz ordenará a citação do réu para comparecer à audiência de mediação e conciliação”. Desta forma a realização das sessões de mediação nas demandas familiares é obrigatória. E para afastar qualquer duvida quanto esta obrigatoriedade Flavio Tartuce explica que

Há quem afirme que ao contrário do procedimento comum do CPC (que admite exceções à obrigatoriedade da designação da sessão consensual inicial), o art. 695 não dá margem para a aplicação das mesmas exceções, sendo obrigatória a realização da audiência em toda demanda familiar. (TARTUCE, 2018, p.357)

Ante ao exposto, é possível compreender que o Novo Código de Processo Civil não mediu esforços para que a mediação fosse utilizada como uma forma de resolução e prevenção de demandas judiciais, sendo que sua realização é essencial para findar o conflito em questão e para trazer pacificação nas relações familiares. Neste sentido, o mediador é uma figura imprescindível no deslinde processual, sendo que sua intervenção na relação existente entre as partes litigantes é uma forma de humanizar o Poder Judiciário, dando voz as partes e validando os seus sentimentos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao introduzir a mediação como um dos procedimentos do processo civil, o ordenamento jurídico brasileiro humanizou os conflitos judiciais e proporcionou aos litigantes uma nova chance de findarem o seu conflito sem a imposição da decisão de um terceiro julgador. A importância da sessão de mediação vai muito além de uma simples audiência entre as partes, sua essencialidade se encontra no seu poder de proporcionar a comunicação real entre os litigantes.

O modelo engessado de audiências de conciliação e instrução e julgamento coordenada por juízes retiram das partes a sua personalidade e os seus sentimentos. Para realizar um julgamento imparcial o magistrado não possui o direito de dialogar com os litigantes e ter contato com os seus sentimentos e expectativas, isto não ocorre com os mediadores. O papel do mediador é ouvir as partes e auxiliá-las numa comunicação, para que assim possam se enxergar e enxergar o outro como uma parte do conflito e não como um inimigo ou adversário.

A humanização do processo civil anda a passos lentos, entretanto o passo mais importante já foi realizado, ou seja, a obrigatoriedade da realização das sessões de mediação possibilita uma nova perspectiva para as ações familiares, principalmente. O contato direto das partes com um mediador capacitado para direcionar uma comunicação saudável devolve aos litigantes o controle das próprias emoções e, consequentemente, da própria vida.

No procedimento da mediação os processos deixam de serem números e passam a ter voz e sentimentos, o que demonstra que muito mais do uma simples sentença, o que os litigantes necessitam é de auxílio especializado para que possam resolver suas adversidades de maneira justa e sadia. O método heterocompositivo é essencial em diversas demandas, visto que não é possível a ocorrência da mediação em todas as demandas judiciais, entretanto, este modelo de resolução de conflitos não traz a pacificação social desejada e constitucionalmente assegurada.

Assim, vê-se que a realização das sessões de mediação nos conflitos familiares está diretamente ligada com o bem estar familiar e social, tendo em vista que contribui para a estruturação das famílias nos períodos pós-processuais, bem como nos períodos pré-processuais, isto porque uma das funções da mediação é também evitar que os conflitos se transformem em ações judiciais.

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Sobre a autora
Barbara Diesel Scussel

Bacharela em Direito pela Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul, especialista em Relações Internacionais pela Unila e em Direito Processual Civil pela Uninter. Mediadora e Conciliadora formada pela Escola Judicial do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul. Atualmente atuando na advocacia e como professora do ensino superior.

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Artigo escrito para conclusão de curso de Pós Graduação em Direito Processual Civil

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