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O cruzamento de dados entre o fisco e as operadoras de cartão de crédito e suas consequências criminais

Agenda 19/07/2020 às 20:26

Quais as consequências criminais da redução e/ou supressão de tributos na venda de mercadorias para os sócios?

O sistema tributário nacional é composto por diversas camadas de legislação, assim é correto afirmar que toda e qualquer empresa deve observar além da legislação Federal, a legislação Estadual e Municipal atinente a sua área de atuação.

Dentre todos os tributos previstos no Código Tributário Nacional, - Lei 5.172/1966, os impostos são os que mais severamente oneram a atividade empresarial no Brasil. Nesse sentido é correto afirmar que o imposto mais frequentemente objeto de apurações administrativas e judiciais é o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) previsto no artigo 155, II da Constituição Federal de 1988.

Por se tratar de um Imposto de competência dos Estados as regras sobre o ICMS podem variar de Estado para Estado. Entretanto uma prática comum entre a fiscalização estadual para fins de averiguação de regularidade do recolhimento do referido imposto é o cruzamento de dados das operadoras de cartão de crédito.

A referida prática consiste em: O fisco estadual solicita as operadoras as movimentações realizadas por meio de cartão de crédito de uma determinada empresa e posteriormente compara os valores auferidos por meio de cartão de crédito com os valores declarados pela empresa ao fisco.

Nesse sentido o questionamento que se faz é: Constatada uma discrepância de valores e constituído o crédito tributário tal conduta pode ser enquadrada como um crime tributário?

Sim, a conduta de omitir operações exigidas pela lei fiscal é considerado um crime contra a ordem tributária conforme o artigo 1°, inciso II da Lei 8.137 de 1990, confira-se:

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:
[...] II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;
[...] Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Tal tipo penal incide sobre a figura dos sócios constantes do contrato social, entretanto é importante destacar que para que se fale em crime contra ordem tributária é necessário que a referida conduta tenha sido pratica de forma intencional mediante fraude, ou seja, que a conduta realizada pelos sócios tenha convergido no sentido de fraudar a legislação tributária, condição que somente se pode verificar mediante a apreciação de provas.

Assim é correto afirmar que o sócio que consta no contrato social, mas que não tem sua conduta devidamente descrita e comprovada nos autos do processo criminal deve ser absolvido, ante a ausência de provas, nos moldes do artigo 386, inciso VII do Código de Processo Penal.

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Como exemplo vale mencionar a decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, nos autos N° 70082614744 (Nº CNJ: 0233383-14.2019.8.21.7000), aonde a socia da empresa restou absolvida do crime tributário a ela imputado, confira-se:

De fato, a ré possuía poder de mando na empresa, no período descrito na denúncia, conforme contrato social de fls. Contudo, não se pode atribuir a autoria à apelante apenas por figurar no contrato social como sócia com poderes de gerência, sob pena de responsabilidade penal objetiva. Não há prova suficiente de que tenha omitido as operações de saídas de mercadorias sujeitas à incidência do imposto, mediante fraude. Nessas condições, há, no mínimo, dúvida quanto à vontade livre e consciente da apelante de fraudar a fiscalização tributária. Assim, não se podendo afirmar, estreme de dúvida, na espécie, que a ré tenha agido com dolo, elemento imprescindível à configuração do crime contra a ordem tributária, tipificado no art. 1º, inciso II da Lei nº 8.137/90, impositiva a solução absolutória.

No referido julgado é possível concluir que ainda que tenha ocorrido a constituição do crédito tributário oriundo da apuração do não recolhimento de ICMS mediante o cruzamento de dados das operadoras de cartão de crédito, tal conduta por si não acarreta a responsabilização criminal dos sócios previstos no contrato social.

Fonte:

Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Processo N° 70082614744 (Nº CNJ: 0233383-14.2019.8.21.7000).

Sobre o autor
Michel Radames Goncalves Lopes

Advocacia Criminal Especializada

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