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DAS DUAS, UMA: OU SE CASTIGA O BOLSONARO OU SE RELEVA O CHILIQUE DO DESEMBARGADOR

Agenda 20/07/2020 às 11:32

Há na mídia e nas redes sociais um clamor pela punição do desembargador que desacatou o guarda que cumpria seu dever de multá-lo por estar caminhando sem máscara pela cidade. Mas, será justo fazê-lo quando o presidente da República age assim a toda hora?

Foi simplesmente repulsivo o chilique do desembargador Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira, do Tribunal de Justiça de São Paulo, ao insurgir-se contra dois civilizados guardas civis de Santos (SP) em razão da mísera multa de 100 reais que teria de pagar por não estar usando máscara ao caminhar junto à praia. 

Ligou para o secretário municipal da Segurança Pública, referiu-se ao policial como analfabeto, tentou obrigá-lo a falar pelo celular com o figurão e, finalmente, rasgou a multa recebida e atirou-a aos pés do guarda  (o que, antes mesmo de ser multado, já ameaçara fazer em gestos).

Mesmo assim, seria injusto puni-lo por abuso de autoridade ou comportamento indigno do seu cargo se piores ainda foram dezenas de episódios impunemente protagonizados pelo presidente da República.

Assim é que, multado em 2012 por um servidor do Ibama por crime ambiental (pesca irregular numa estação ecológica), Bolsonaro não só conseguiu que quatro anos mais tarde a multa fosse anulada em função de filigranas jurídicas, mas em 2019 (nem três meses depois de sua posse!), o digno funcionário foi exonerado do cargo de chefia que merecidamente ocupava após 17 anos de carreira exemplar.

Então, como dizia o grande Sergio Porto, ou restaure-se a moralidade ou locupletemo-nos todos... 

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Se o rei do exibicionismo arrogante em público sem a máscara, das carteiradas e dos crimes de responsabilidade continua avacalhando a Presidência da República dia após dia, castigar um mero desembargador por repetir um dos maus exemplos que vêm de cima equivale a bater em bêbado.

Sobre o autor
Celso Lungaretti

Jornalista, blogueiro, escritor e veterano da resistência à ditadura militar. Ingressei na luta contra a ditadura militar ainda secundarista, aos 17 anos. Passei um ano na clandestinidade, como dirigente estadual da VPR e VAR-Palmares. Preso, sofri uma lesão permanente que me prejudicaria tanto no convívio social quanto nos desempenhos profissionais. Mesmo assim, fiz longa carreira jornalística. Hoje sou escritor, articulista e blogueiro, atuando frequentemente na defesa dos direitos humanos. Observador atento da cena política brasileira há mais de meio século, além de haver sido, aos 18 anos, o primeiro e único comandante de Inteligência de uma organização que travava a luta armada, tento dar aos leigos no assunto um quadro realista das perspectivas atuais, para dissipar um pouco das paranoias e alarmismos que tantos pesadelos lhes causam .

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É enorme meu desalento com a índole submissa do povo brasileiro, que é incapaz de insurgir-se contra um presidente da República que extrapola praticamente todo dia os limites do seu cargo, mas recupera a coragem quando o figurão infrator é bem menos poderoso.

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