Sumário: Introdução. Do vigia. Do vigilante. Considerações finais. Referências.
Introdução
A pesquisa trata do tema das profissões regulamentas, mais especificamente no que tange a diferenciação entre vigia e vigilante. O assunto já foi abordado por inúmeras vezes por especialistas da área. No entanto, se faz relevante rever alguns pontos de distinção e trazer dispositivos das leis que regulamentam o assunto tratado.
Num primeiro momento será feita uma abordagem à profissão do vigia, para em seguida, adentrar-se ao tema do vigilante onde se buscará apresentar os principais pontos de semelhanças e diferenças. Mesmo na atualidade ainda pairam dúvidas sobre tais profissões e o artigo se propõe a analisar as dúvidas da sociedade em geral, sendo essa a justificativa para tal.
Do Vigia
Iniciaremos pela profissão de vigia, por simplesmente não ter uma norma ou legislação própria definida, ao menos até o presente momento.
Existem muitas profissões chamadas de regulamentadas, que possuem disposições especiais para determinada categoria de trabalhadores. Como bem lembram Amauri Mascaro Nascimento e Sônia Mascaro Nascimento “além das normas gerais de proteção ao trabalho aplicáveis a todo empregado, há normas especiais para algumas profissões, em elevado número”. [1]
Assim, os empregados de uma forma geral tem seus respectivos empregos regulados primeiro pela Constituição Federal, que traz no rol do art. 7º uma lista de direitos de todo trabalhador urbano e rural, como salário mínimo, férias, direito ao FGTS, direito ao adicional de horas extras, etc. Além disso, os empregados de uma forma geral tem a regulamentação da CLT que traz inúmeros dispositivos de direitos e obrigações envolvendo o empregador e o empregado, direitos e deveres próprios de uma relação de emprego e com punições em caso de descumprimento, sem contar dos dispositivos referentes ao processo que poderá ocorrer em caso de conflito entre as partes envolvidas.
A CLT reserva uma parte especial para tratar de trabalhadores especiais que por conta de suas funções merecem possuir normas específicas que melhor condizem com suas atividades, como é o caso dos mineiros que precisam de certa proteção em função do trabalho penoso, ou dos trabalhadores em frigoríficos que trabalham em ambientes frios e com variações de temperatura a todo momento o que prejudica a saúde e chama a atenção do legislador para uma proteção especial além daquela disciplinada para os empregados em geral. E por aí vai, outros tantos trabalhadores também possuem normas especiais dentro da CLT como é o caso dos bancários com jornada especial de trabalho, os professores com suas características próprias, os químicos, dentre outros.
Mas, nem todas essas profissões regulamentadas estão na CLT, existem diversas profissões que mereceram uma disciplina especial seja por um motivo ou por outro. A título de exemplificação podemos listar os Enfermeiros que estão na Lei 5.905 de 1973; os Farmacêuticos que estão nas Leis 3.280 de 1969, e Lei 4.817 de 1965; o Artesão que está na Lei 13.180 de 2015; o Comerciário que está na Lei 12.790 de 2013; o Técnico em Radiologia que está na Lei 10.508 de 2002 ou o Árbitro de Futebol que está disciplinado na Lei 12.867 de 2013. [2]
Possuir legislação especial é o caso também do vigilante, tema principal desta pesquisa e que será trazido com mais detalhes no próximo tópico. Já o vigia, como dito anteriormente não possui uma lei específica, e em que pese, tenha suas atribuições por vezes parecidas com o vigilante com este não se confunde. De acordo com Jorge Neto e Cavalcante “vigia é o trabalhador que executa atividade de observação e fiscalização de um determinado local, não laborando armado”. [3]
Nesses termos temos que o vigia tem como função defender o patrimônio alheio e embora não possua arma, parece lógico que esteja exposto a perigo em função de assaltos. Sendo assim, o mais correto parece entender como uma atividade merecedora do adicional de periculosidade. [4] A CLT traz em seu artigo 193 as atividades consideradas perigosas que deverão receber o respectivo adicional de periculosidade, como nos casos tradicionais de inflamáveis, eletricidade e explosivos, mas o inciso II do referido dispositivo apresenta a seguinte redação como sendo atividades perigosos para o trabalhador que trabalha exposto a “roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial”.
O vigia está de fato, exposto a perigo, talvez até mais por não ter muito como se proteger já que está desarmado, e a sua função é justamente vigiar casas, pessoas, ou ruas, e ver se está tudo certo, sem atividades suspeitas. O fato, de não possuir arma não deverá retirar do vigia o adicional de periculosidade. Nesse mesmo sentido, é o entendimento de Sergio Pinto Martins ao mencionar que a CLT é omissa quanto a questão específica. Nas palavras do autor “o art. 193 da CLT não exige que o empregado porte arma de fogo para fazer jus ao adicional de periculosidade. Se a lei não distingue, não cabe ao intérprete fazê-lo”. [5]
Concluindo o tópico sobre o vigia é possível defini-lo como um empregado, considerado urbano, doméstico ou rural, dependendo de quem o contratar, mas em qualquer situação a sua tarefa principal é a de observação e fiscalização do local, uma função que requer, evidentemente muita atenção, para evitar que venham a ser cometidos furtos, roubos, danos, vandalismos, etc. O essencial é saber que via regra geral, o vigia não deve tomar uma posição, ou seja, se perceber atividade suspeita deve alertar a polícia, ou o empregador, enfim, mas evitar o confronto, justamente por não estar armado. Em suma, o vigia é o empregado contratado encarregado para tomar conta de alguma coisa. [6]
No próximo tópico iremos abordar o vigilante e sua regulamentação especial.
Do Vigilante
Ao contrário do vigia, o vigilante tem legislação especial, trata-se da Lei 7.102/83 e com alterações oriundas da Lei 8.863/94. Saad lembra ainda que a MP n. 2.184-23 “estabelece que o exercício da profissão de vigilante requer prévio registro no Departamento de Polícia Federal”. [7]
O autor menciona ainda que “a Instrução Normativa n. 78, do Departamento de Polícia Federal estabelece os procedimentos para o credenciamento, fiscalização da aplicação e correção dos exames psicológicos credenciados, responsáveis pela expedição do laudo que ateste a aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo e para exercer a profissão de vigilante”. [8]
Isto porque, de acordo, com a lei do vigilante mencionada acima, o mesmo tem uma atuação muito mais ostensiva no combate aos crimes como furto e roubo, e se distingue também do vigia pelo uso de arma de fogo. O vigilante de acordo com o art. 10 da Lei 7.102/83 combinado com o art. 15 da mesma lei tem como função principal proceder a vigilância patrimonial das instituições financeiras e de outros estabelecimentos, públicos ou privados, bem como a segurança de pessoas físicas, e realizar o transporte de valores ou garantir o transporte de qualquer outro tipo de carga.
A lei que trata do vigilante define em seu art. 1º que é “vedado o funcionamento de qualquer estabelecimento financeiro onde haja guarda de valores ou movimentação de numerário, que não possua sistema de segurança com parecer favorável à sua aprovação elaborado pelo Ministério da Justiça, na forma desta lei”. [9]
A lei também define os requisitos para ser vigilante no art. 16, num rol cumulativo, ou seja, todos os incisos devem estar preenchidos. São eles: ser brasileiro; ter idade mínima de 21 anos; ter instrução correspondente à quarta série do primeiro grau; ter sido aprovado em curso de formação de vigilante; ter sido aprovado em exame de saúde física, mental e psicotécnica; não ter antecedentes criminais; e estar quite com as obrigações eleitorais e militares.
Os requisitos parecem ter sido muito bem pensados, visto que são fundamentais para o exercício de uma função tão tensa como a do vigilante que corre risco de vida diariamente. Evidente que um dos requisitos deveria mesmo ser a realização e aprovação em curso específico que treine o trabalhador para as funções que irá exercer, parece ser este o mais importante de todos, pensando não somente nas partes envolvidas na relação de trabalho mas na sociedade como um todo, visto que um vigilante despreparado poderia ocasionar graves danos. Reparem, que a idade mínima é de 21 anos, e não de 18 anos como poderia se pensar levando em conta esta última ser a maioridade civil. Mas a idade de 21 anos se preocupa no amadurecimento da pessoa para lidar com arma de fogo e exercer a função de defesa de pessoas e defesa patrimonial.
Não possuir antecedentes criminais, chega a ser óbvio, imagina uma pessoa que já foi condenada por roubo, ou furto, ou outro crime contra o patrimônio exercendo agora a função de proteção? Nada impede que a pessoa se regenere e agora seja um trabalhador honesto, mas o índice de reincidência criminal é alto o bastante para impedir que alguém que tenha antecedentes venha a exercer a função de vigilante. Por outro lado, o exame psicotécnico também se faz deveras relevante, volta e meia se escuta que alguém que não tinha porte de arma comete um homicídio por motivos extremamente fúteis e banais, como em brigas de trânsito ou brigas de bar.
Já o art. 18 da lei dos vigilantes menciona que o uniforme de trabalho deverá ser usado somente quando estiver em efetivo serviço. Parece que o legislador se preocupou com a segurança do vigilante ao trazer essa norma legal, visto que o uniforme de trabalho poderia identificar o vigilante em momentos de lazer ou folgas e alguém poderia querer se vingar por algum motivo. E o art. 19 da lei trata que é assegurado ao vigilante o porte de arma quando em serviço, a prisão especial por ato decorrente do serviço, o seguro de vida em grupo feito pela empresa empregadora e uniforme especial às expensas da empresa a que se vincular.
Portanto, o vigilante tem toda uma normatização que o vigia não possui, com deveres diferentes e mais pesados e ostensivos. Para finalizar, Vólia Cassar ainda traz um terceiro sujeito que seria o segurança, que se distingue do vigilante em alguns aspectos, sendo o primeiro o não uso de arma de fogo nem cassetete, bem como pode ser contratado diretamente por qualquer pessoa física ou jurídica e não precisa ter formação profissional. Difere também do vigia. O segurança está ali para evitar conflitos, e deve agir se ocorrer algum problema, diferente do vigia que só observa e avisa alguém se ocorrer um problema, e diferente do vigilante por ser menos ostensivo e não ter os requisitos e características mencionados acima. O segurança normalmente é contratado para shows, casas noturnas, jogos de futebol, etc. [10]
Conclusão
Como se pôde observar vigia e vigilante não possuem a mesma função. Ambos tem algumas características parecidas pois as profissões visam defender o patrimônio alheio mas o vigia não tem legislação própria e o vigilante segue as normas de lei específica, inclusive com requisitos para o exercício da profissão.
Muito embora o vigia não possa utilizar arma de fogo a ele parece ser devido o adicional de periculosidade, porque a sua função não deixa de ser perigosa pelo não uso de arma, afinal, ele é contratado para tentar evitar furtos, roubos, etc. Seria prudente a criação de algumas normas específicas para determinar características próprias do vigia, assim como tem do vigilante, para que não houvessem mais dúvidas na solução de conflitos envolvendo o vigia, que por vezes aciona a Justiça do Trabalho. Determinar principalmente curso de formação para vigias e treinamento obrigatório, o que poderia, inclusive poupar conflitos violentos.
Referências
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016.
JORGE NETO, Francisco Ferreira; CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa. Curso de Direito do Trabalho. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2015.
MARTINS, Sergio Pinto. Comentários a CLT. 22 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro; NASCIMENTO, Sônia Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 41 ed. São Paulo: LTr, 2018.
SAAD, Eduardo Gabriel; SAAD, José Eduardo Duarte; BRANCO, Ana Maria SAAD C. Consolidação das Leis do Trabalho: comentada. 51. ed. atual., rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2019.
SCALÉRCIO, Marcos; PEREIRA, Leone; MINTO, Tulio Martinez. Profissões regulamentadas – legislação, súmulas e O.Js. São Paulo: LTr, 2017.
Notas
[1] NASCIMENTO, Amauri Mascaro; NASCIMENTO, Sônia Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 41 ed. São Paulo: LTr, 2018, p. 240.
[2] Idem, p. 241/243.
[3] JORGE NETO, Francisco Ferreira; CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa. Curso de Direito do Trabalho. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 200.
[4] Idem, p. 200.
[5] MARTINS, Sergio Pinto. Comentários a CLT. 22 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p. 241.
[6] CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016, p. 504.
[7] SAAD, Eduardo Gabriel; SAAD, José Eduardo Duarte; BRANCO, Ana Maria SAAD C. Consolidação das Leis do Trabalho: comentada. 51. ed. atual., rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2019, p. 529.
[8] Idem, p. 529.
[9] SCALÉRCIO, Marcos; PEREIRA, Leone; MINTO, Tulio Martinez. Profissões regulamentadas – legislação, súmulas e O.Js. São Paulo: LTr, 2017, p. 289.
[10] CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016, p. 503.