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INSTITUTO DO POLIAMORISMO

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Agenda 23/08/2020 às 23:06

O presente artigo trata da teoria do poliamorismo, abordando o problema: Existe impedimento da união poliafetiva no ordenamento jurídico brasileiro? Será demonstrada as possibilidades e impedimentos do poliamor no ordenamento jurídico.

1. INTRODUÇÃO

 

O presente artigo pretende pesquisar sobre o poliamorismo e a possibilidade jurídica de união poliafetiva.

O instituto do poliamorismo trata-se de um relacionamento composto por três ou mais pessoas, ou seja, é um relacionamento múltiplo onde existe sentimento recíproco entre todos os envolvidos na relação. Esse relacionamento é revestido de afeto, amor, durabilidade, continuidade, e com o objetivo em comum de que seja constituída uma família.

Esclarece-se que no Brasil, está ficando cada vez mais comum a união entre 3 ou mais pessoas. Dentro deste raciocínio, faz-se interessante saber se existem impedimentos da união poliafetiva no ordenamento jurídico brasileiro?

Tem-se como hipótese o fato de que, embora o instituto do poliamorismo seja algo ainda muito incomum e imoral de acordo com os padrões impostos pela sociedade, não há no ordenamento jurídico brasileiro, nenhum impedimento legal previsto na legislação cível que trata do tema, no Código Penal e tampouco na Constituição Federal de 1988, que traga algum impedimento ou proibição quanto aos tipo de relações poliafetivas, tendo em vista que o que, no ordenamento jurídico brasileiro, apenas é considerado crime a bigamia (quando um indivíduo já casado, contrai matrimônio com outra pessoa). Desta maneira, a união poliafetiva não se trata de casamento entre várias pessoas, mas sim um tipo de união estável entre mais de duas pessoas.

Portanto, não há que se falar em impedimento legal nos casos em que haja o contrato de união estável entre três ou mais indivíduos, visto que essa união não gerará nenhum tipo de efeitos automáticos no âmbito do direito de família. Desta maneira, não há nada impeça que os indivíduos envolvidos nesse tipo de relação poliafetiva se utilizem da declaração de união estável para requerer judicialmente o possível reconhecimento de todos os direitos inerentes, enquanto entidade familiar.

O objetivo geral desse projeto é demonstrar por meio de um estudo sobre o direito de família, as possibilidades e os impedimentos, bem como verificar as causas e os conflitos da união entre 3 ou mais pessoas. Por fim, como objetivos específicos enumerar por meio de um estudo sobre a união poliafetiva nos dizeres da Constituição Federal e evidenciar que embora não seja um fato corriqueiro na nossa sociedade, não há impedimentos legais, sendo assim dimensionar os efeitos dessa modalidade de união enquanto entidade familiar.

Portanto justifica-se neste trabalho, que o poliamor, e a união poliafetivas não é considera crime de bigamia, pois não se trata de casamento, visto que este deve ser realizado entre um homem com uma mulher.

Para o desenvolvimento deste projeto estão sendo utilizados artigos publicados em sites confiáveis, buscando assim o respaldo teórico científico para a elaboração desta pesquisa.

Evidencia-se como objetivo desta pesquisa esboçar que o poliamorismo ou a união poliafetiva está cada vez mais comum em nossa sociedade e deve ser reconhecida e regulamentada. Para tanto, o método utilizado será o dedutivo, partindo de leis gerais para a compreensão de questões atuais, juntamente ao procedimento técnico de pesquisa bibliográfica.

 

2. DESENVOLVIMENTO

 

A constante evolução de nossa sociedade é, certamente, um dos fatores preponderantes a determinar uma maior flexibilização do conceito de família no ordenamento jurídico brasileiro.

Importante ressaltar que a família, em suas diversas concepções, possui proteção garantida na Constituição Federal de 1988, no artigo 226, caput, que preconiza: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.”[1]

A promulgação da Constituição Federal de 1988, trouxe significativas mudanças para o ordenamento jurídico brasileiro, principalmente no que tange ao Direito de Família, começando pela regularização da união estável em seu artigo 226, parágrafo terceiro, que determina: “[...] Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”{C}[2]

Conceito ainda mais moderno e significativo para o Direito de Família, pode ser visto no entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio do RE nº 477.554, que admite o reconhecimento da união estável de pessoas do mesmo sexo, e ainda o reconhecimento de que esse tipo de união trata-se de uma entidade familiar, conforme demonstrado a seguir:

 

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE. UNIÃO HOMOAFETIVA. LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO RECONHECIMENTO E QUALIFICAÇÃO DA UNIÃO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO COMO ENTIDADE FAMILIAR. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DAS REGRAS E CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS VÁLIDAS PARA A UNIÃO ESTÁVEL HETEROAFETIVA. DESPROVIMENTO DO RECURSO. 1. O Pleno do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 4.277 e da ADPF 132, ambas da Relatoria do Ministro Ayres Britto, Sessão de 05/05/2011, consolidou o entendimento segundo o qual a união entre pessoas do mesmo sexo merece ter a aplicação das mesmas regras e consequências válidas para a união heteroafetiva. 2. Esse entendimento foi formado utilizando-se a técnica de interpretação conforme a Constituição para excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, entendida esta como sinônimo perfeito de família. Reconhecimento que deve ser feito segundo as mesmas regras e com idênticas consequências da união estável heteroafetiva. 3. O direito do companheiro, na união estável homoafetiva, à percepção do benefício da pensão por morte de seu parceiro restou decidida. No julgamento do RE nº 477.554/AgR, da Relatoria do Ministro Celso de Mello, DJe de 26/08/2011, a Segunda Turma desta Corte, enfatizou que ninguém, absolutamente ninguém, pode ser privado de direitos nem sofrer quaisquer restrições de ordem jurídica por motivo de sua orientação sexual. Os homossexuais, por tal razão, têm direito de receber a igual proteção tanto das leis quanto do sistema político-jurídico instituído pela Constituição da República, mostrando-se arbitrário e inaceitável qualquer estatuto que puna, que exclua, que discrimine, que fomente a intolerância, que estimule o desrespeito e que desiguale as pessoas em razão de sua orientação sexual. A família resultante da união homoafetiva não pode sofrer discriminação, cabendo-lhe os mesmos direitos, prerrogativas, benefícios e obrigações que se mostrem acessíveis a parceiros de sexo distinto que integrem uniões heteroafetivas. (Precedentes: RE n. 552.802, Relator o Ministro Dias Toffoli, DJe de 24.10.11; RE n. 643.229, Relator o Ministro Luiz Fux, DJe de 08.09.11; RE n. 607.182, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 15.08.11; RE n. 590.989, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJe de 24.06.11; RE n. 437.100, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJe de 26.05.11, entre outros). 4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(STF - RE: 687432 MG, Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 18/09/2012, Primeira Turma, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-193 DIVULG 01-10-2012 PUBLIC 02-10-2012)[3]

 

 Esse julgamento do STJ deixa claro que duas pessoas do mesmo sexo podem se unir sem que haja nenhum tipo de discriminação e, em razão disso, já existem juízes de 1ª instância deferindo a conversão da união estável de pessoas do mesmo sexo em casamento, conforme reza o já descrito parágrafo 3º, do art. 226 da Constituição Federal de 1988.

Ainda sobre esta mesma linha de evolução do conceito familiar, a união poliafetiva ou “poliamorismo”, é um fato, ainda não abarcado pelo Direito de Família, e tampouco por boa parte da sociedade, devido às tradições culturais e religiosas. No entanto, o fato é que essa realidade existe e se torna cada vez mais comum, devendo, portanto, ser protegida pelo sistema jurídico brasileiro.

O instituto do poliamorismo é tido como uma espécie de relação poligâmica, havendo, portanto, duas ou mais relações afetivas que acontecem simultaneamente, e todas as partes envolvidas concordam e sabem sobre as relações.

No conceito de Gagliano, poliamor é definido como: “O poliamorismo ou poliamor, teoria psicológica que começa a descortinar-se para o Direito, admite a possibilidade de coexistirem duas ou mais relações afetivas paralelas, em que os seus partícipes conhecem e aceitam uns aos outros, em uma relação múltipla e aberta.”[4]

No poliamor, uma pessoa pode amar o seu parceiro e ainda amar outras pessoas com quem mantem alguma relação extraconjugal. No entanto, há casos em que existem relacionamentos múltiplos, onde existe sentimento entre todas as pessoas que compõe o relacionamento.

Neste sentido explica Lins Navarro:

 

No poliamor uma pessoa pode amar seu parceiro fixo e amar também as pessoas com quem tem relacionamentos extraconjugais, ou até mesmo ter relacionamentos amorosos múltiplos em que há sentimento de amor recíproco entre todos os envolvidos. Os poliamoristas argumentam que não se trata de procurar obsessivamente novas relações pelo fato de ter essa possibilidade sempre em aberto, mas sim, de viver naturalmente tendo essa liberdade sempre em mente. Eles dizem que o poliamor pressupõe uma total honestidade no seio da relação. Não se trata de enganar nem de magoar ninguém. Tem como princípio que todas as pessoas envolvidas estão a par da situação e se sentem à vontade com ela. A ideia principal é admitir essa variedade de sentimentos que se desenvolvem em relação a várias pessoas, e que vão além de mera relação sexual[5].

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Nesse tipo de relação, é evidente que todas as pessoas envolvidas possuem sentimentos mútuos. Desta maneira, a família constituída por mais de duas pessoas não pode ser discriminada porque, como dito na ementa do RESP nº 1.183.378, deve haver respeito às mesmas regras do reconhecimento da união estável, se de casais heteroafetivos ou de casais homoafetivos.

Vejamos:

 

DIREITO DE FAMÍLIA. CASAMENTO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO (HOMOAFETIVO). INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 1.514, 1.521, 1.523, 1.535 e 1.565 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO EXPRESSA AQUE SE HABILITEM PARA O CASAMENTO PESSOAS DO MESMO SEXO. VEDAÇÃO IMPLÍCITA CONSTITUCIONALMENTE INACEITÁVEL. ORIENTAÇÃO PRINCIPIOLÓGICA CONFERIDA PELO STF NO JULGAMENTO DA ADPF N. 132/RJ EDA ADI N. 4.277/DF. 1. Embora criado pela Constituição Federal como guardião do direito infraconstitucional, no estado atual em que se encontra a evolução do direito privado, vigorante a fase histórica da constitucionalização do direito civil, não é possível ao STJ analisar as celeumas que lhe aportam "de costas" para a Constituição Federal, sob pena de ser entregue ao jurisdicionado um direito desatualizado e sem lastro na Lei Maior. Vale dizer, o Superior Tribunal de Justiça, cumprindo sua missão de uniformizar o direito infraconstitucional, não pode conferir à lei uma interpretação que não seja constitucionalmente aceita. 2. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento conjunto da ADPF n.132/RJ e da ADI n. 4.277/DF, conferiu ao art. 1.723 do Código Civil de 2002 interpretação conforme à Constituição para dele excluir todo significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, entendida esta como sinônimo perfeito de família. 3. Inaugura-se com a Constituição Federal de 1988 uma nova fase do direito de família e, consequentemente, do casamento, baseada na adoção de um explícito poliformismo familiar em que arranjos multifacetados são igualmente aptos a constituir esse núcleo doméstico chamado "família", recebendo todos eles a "especial proteção do Estado". Assim, é bem de ver que, em 1988, não houve uma recepção constitucional do conceito histórico de casamento, sempre considerado como via única para a constituição de família e, por vezes, um ambiente de subversão dos ora consagrados princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana. Agora, a concepção constitucional do casamento - diferentemente do que ocorria com os diplomas superados - deve ser necessariamente plural, porque plurais também são as famílias e, ademais, não é ele, o casamento, o destinatário final da proteção do Estado, mas apenas o intermediário de um propósito maior, que é a proteção da pessoa humana em sua inalienável dignidade. 4. O pluralismo familiar engendrado pela Constituição -explicitamente reconhecido em precedentes tanto desta Corte quanto do STF - impede se pretenda afirmar que as famílias formadas por pares homoafetivos sejam menos dignas de proteção do Estado, se comparadas com aquelas apoiadas na tradição e formadas por casais heteroafetivos. 5. O que importa agora, sob a égide da Carta de 1988, é que essas famílias multiformes recebam efetivamente a "especial proteção do Estado", e é tão somente em razão desse desígnio de especial proteção que a lei deve facilitar a conversão da união estável em casamento, ciente o constituinte que, pelo casamento, o Estado melhor protege esse núcleo doméstico chamado família. 6. Com efeito, se é verdade que o casamento civil é a forma pela qual o Estado melhor protege a família, e sendo múltiplos os "arranjos" familiares reconhecidos pela Carta Magna, não há de ser negada essa via a nenhuma família que por ela optar, independentemente de orientação sexual dos partícipes, uma vez que as famílias constituídas por pares homoafetivos possuem os mesmos núcleos axiológicos daquelas constituídas por casais heteroafetivos, quais sejam, a dignidade das pessoas de seus membros e o afeto. 7. A igualdade e o tratamento isonômico supõem o direito a ser diferente, o direito à autoafirmação e a um projeto de vida independente de tradições e ortodoxias. Em uma palavra: o direito à igualdade somente se realiza com plenitude se é garantido o direito à diferença. Conclusão diversa também não se mostra consentânea comum ordenamento constitucional que prevê o princípio do livre planejamento familiar (§ 7º do art. 226). E é importante ressaltar, nesse ponto, que o planejamento familiar se faz presente tão logo haja a decisão de duas pessoas em se unir, com escopo de constituir família, e desde esse momento a Constituição lhes franqueia ampla liberdade de escolha pela forma em que se dará a união. 8. Os arts. 1.514, 1.521, 1.523, 1.535 e 1.565, todos do Código Civil de 2002, não vedam expressamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo, e não há como se enxergar uma vedação implícita ao casamento homoafetivo sem afronta a caros princípios constitucionais, como o da igualdade, o da não discriminação, o da dignidade da pessoa humana e os do pluralismo e livre planejamento familiar. 9. Não obstante a omissão legislativa sobre o tema, a maioria, mediante seus representantes eleitos, não poderia mesmo "democraticamente" decretar a perda de direitos civis da minoria pela qual eventualmente nutre alguma aversão. Nesse cenário, em regra é o Poder Judiciário - e não o Legislativo - que exerce um papel contra majoritário e protetivo de especialíssima importância, exatamente por não ser compromissado com as maiorias votantes, mas apenas com a lei e com a Constituição, sempre em vista a proteção dos direitos humanos fundamentais, sejam eles das minorias, sejam das maiorias. Dessa forma, ao contrário do que pensam os críticos, a democracia se fortalece, porquanto esta se reafirma como forma de governo, não das maiorias ocasionais, mas de todos. 10. Enquanto o Congresso Nacional, no caso brasileiro, não assume, explicitamente, sua coparticipação nesse processo constitucional de defesa e proteção dos socialmente vulneráveis, não pode o Poder Judiciário demitir-se desse mister, sob pena de aceitação tácita deum Estado que somente é "democrático" formalmente, sem que tal predicativo resista a uma mínima investigação acerca da universalização dos direitos civis. 11. Recurso especial provido.

(STJ - REsp: 1183378 RS 2010/0036663-8, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 25/10/2011, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/02/2012).[6]

 

 

Desta forma, fica claro que toda pessoa tem o direito fundamental de constituir família, independentemente de sua orientação sexual ou identidade de gênero, ou seja, mesmo que a família se dê por meio de uma união homoafetiva ou por meio do poliamorismo, estas não poderão sofrer nenhum tipo de discriminação, sendo-lhes assegurados os mesmo direitos assegurados às famílias que são constituídas por casais de sexos opostos. Assim, tratar de forma diferenciada uma família baseada no amor e no afeto, importa violação ao princípio da igualdade.

O poliamorismo ou união poliafetiva, admite a possibilidade de coexistirem duas ou mais relações afetivas paralelas, em que os seus integrantes têm pleno conhecimento e aceitam essa relação múltipla e aberta, nas quais estão estabelecidas regras de estrutura familiar.

Segundo o advogado Marcos Alves da Silva, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), não existem razões para se negar o reconhecimento jurídico a uma família ou conjugalidade, pois, de acordo com o seu entendimento, se estiverem “Presentes os requisitos da afetividade, publicidade, continuidade, durabilidade e a intenção de constituição de família, não importa a estrutura que tome a família”.{C}[7]

 A forma como uma família se constitui não é questão que diz respeito ao Estado, pois este apenas tem legitimidade para interferir no âmbito da família a fim de que seja assegurada a liberdade e o respeito àqueles que integram o núcleo familiar, especialmente em relação aos indivíduos que se encontrem em situação de vulnerabilidade, como as crianças e os idosos.

Na união poliafetiva, todos os parceiros são fixos e espera-se exclusividade e fidelidade entre eles, como se todos os envolvidos no relacionamento fossem casados entre si, e por isso, não fica caracterizada a bigamia.

Quando ocorre a bigamia ou a poligamia, o que se tem é uma ou mais pessoas já casadas, que constroem outros núcleos familiares distintos, com ou sem conhecimento de seus cônjuges, mas sem o envolvimento destes. E em razão da concordância e conhecimento dos parceiros, a união poliafetiva não pode e não deve ser tratada como crime de bigamia, pois, nesses casos, não se trata-se de casamento, uma vez que o matrimônio é contraído por apenas duas pessoas, enquanto o instituto do poliamorismo é tido como uma união baseada na afetividade, onde todos os envolvidos vivem juntos com o objetivo em comum de construir uma família.

Os novos tipos de família que surgem na sociedade são tutelados pelo Estado com base no princípio da liberdade, que diz respeito ao poder de escolha que cada indivíduo possui, tendo autonomia para formar a sua família, sem interferências de pessoas externas, ainda que da própria família, ou do legislador brasileiro. Cabe aos indivíduos planejar a sua família da melhor forma possível, inclusive no que tange ao modelo de educação, valores culturais ou até mesmo religiosos, desde que seja mantida a dignidade da pessoa humana, bem como integridade física, mental e moral de todos os envolvidos.

Neste sentido, sobre o princípio da liberdade, o doutrinador Paulo Lôbo ensina:

 

Na Constituição brasileira e nas leis atuais o princípio da liberdade na família apresenta duas vertentes essenciais: liberdade da entidade familiar, diante do Estado e da sociedade, e liberdade de cada membro diante dos outros membros e da própria entidade familiar. A liberdade se realiza na constituição, na manutenção e extinção da entidade familiar; no planejamento familiar, que “é livre decisão do casal ‘’ [destacou-se] (artigo 226, & 7° da Constituição), sem interferências públicas ou privadas; na garantia contra a violência, exploração e opressão no seio familiar; na organização familiar mais democrática, participativa e solidária. [...] Tendo a família se desligado de suas funções tradicionais, não faz sentido que o Estado interesse regular deveres que restringem profundamente a liberdade, a intimidade e a vida privada das pessoas, quando não repercutem no interesse geral.{C}[8]

 

Destaca, Maria Berenice Dias{C}[9], que o poder judiciário não pode se esquivar de tutelar as relações baseadas no afeto, inobstante as formalidades muitas vezes impingidas pela sociedade para que uma união seja “digna” de reconhecimento judicial. Dessa forma, havendo duplicidade de uniões estáveis, é cabível a partição do patrimônio amealhado na concomitância das duas relações.

Neste sentido, já o Supremo Tribunal Federal (STF), em Agravo em Recurso Extraordinário do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, já reconheceu que existe repercussão geral quanto à constitucionalidade alusiva à possibilidade de haver o reconhecimento de várias uniões estáveis simultâneas, e a consequente partilha da pensão por morte, conforme demonstrado a seguir:

 

CONSTITUCIONAL. CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA. UNIÕES ESTÁVEIS CONCOMITANTES. PRESENÇA DA REPERCUSSÃO GERAL DAS QUESTÕES CONSTITUCIONAIS DISCUTIDAS. Possuem repercussão geral as questões constitucionais alusivas à possibilidade de reconhecimento jurídico de união estável homoafetiva e à possibilidade de reconhecimento jurídico de uniões estáveis concomitantes.

(STF - RG ARE: 656298 SE - SERGIPE, Relator: Min. AYRES BRITTO, Data de Julgamento: 08/03/2012, Data de Publicação: DJe-084 02-05-2012).{C}[10]

 

Nos ensinamentos de Maria Iracema[11], o reconhecimento e a regulação das uniões poliafetivas é algo que se impõe na contemporaneidade, considerando que os envolvidos devem ter seus direitos garantidos, como forma de preservar a dignidade da pessoa humana de todos os conviventes e de seus respectivos filhos. Situações como: dissolução da união ou morte de um de seus membros; direitos sucessórios; partilha de bens e percepção de alimentos plenamente protegidos.

O contrato de união entre três ou mais pessoas não gera efeitos automáticos no campo do direito de família, mas nada impede que os conviventes se utilizem dessa declaração para buscar judicialmente o reconhecimento dos demais direitos enquanto possível entidade familiar. A existência de contrato estabelecido entre os companheiros não é requisito para configuração de união estável.

Conforme dispõe o artigo 1.725 do Código Civil, “Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.”[12]

 O contrato de união estável, assim como para as demais pessoas, pode ser celebrado por escritura pública ou por instrumento particular, e ambos terão o mesmo valor jurídico.

A incerteza sobre as consequências jurídicas do relacionamento entre mais de duas pessoas gera insegurança jurídica para os que dela participam e também para a sociedade. Portanto, o poder judiciário não pode se abster sobre o fato, tendo em vista que ele não abrange somente o direito ao reconhecimento da união poliafetiva como entidade familiar, mas o direito patrimonial e sucessório.

 

3. CONCLUSÃO

 

Em um país em que a monogamia é considerada pela maioria da população como um princípio abarcado pela Constituição Federal, o tema poliamor é tratado como uma afronta à moral e aos bons costumes. No entanto, analisando o princípio da autonomia privada, bem como o imenso conceito de família abarcado pela Constituição Federal de 1988, o instituo do poliamor deve ter proteção do Estado, gerando, consequentemente, seus efeitos jurídicos.

Sendo assim, frisa-se que a união poliafetiva, é uma evolução do conceito de família, que ainda não é abarcada pelo Direito de Família Brasileiro, e tampouco por boa parte da sociedade, devido às tradições culturais e religiosas, mas, o fato é que essa realidade existe e deve ser abarcada e protegida pelo sistema jurídico brasileiro.

O reconhecimento e a regulação das uniões poliafetivas é algo que se impõe na contemporaneidade, considerando que os envolvidos devem ter seus direitos garantidos, como forma de preservar a dignidade da pessoa humana das pessoas conviventes e dos seus respectivos filhos. Situações como: dissolução da união ou morte de um de seus membros; direitos sucessórios; partilha de bens e percepção de alimentos plenamente protegidos, devem ser assegurados pelo ordenamento jurídico.

 

ABSTRACT

 

This article deals with the theory of polyamory or poly-affective union, a theme that is increasingly common in our society. Based on this, the following problem will be addressed: Are there any impediments to the poly-affective union in the Brazilian legal system? In this way, it is intended to demonstrate the possibilities and impediments of polyamory, as well as the conflicts that can arise with the union of three or more people; apply the theory of polyamory, in the Brazilian legal system, structuring the concept in the family standards in force in our society, based on the principles of equality, sexual freedom and the dignity of the human person; enumerate by means of a study on the poly-affective union, in the words of the Federal Constitution and show that, although it is not a common fact in our society, there are no legal impediments, thus dimensioning the effects of this type of union as a family entity. The approach methodology was theoretical, under a deductive method, for a question that goes from the general to the particular.

 

 

Keywords: Poliafective Union. Family right. Polyamory.

 

 

 

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