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A incidência da responsabilidade civil nas relações de família

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A discussão sobre o dano moral no direito de família, especialmente em casos de abandono afetivo, revela a necessidade de uma indenização que compense o dano psicológico e social causado às crianças e adolescentes.

Resumo: A partir de uma extensa pesquisa tratou-se deste tema tão relevante, na medida em que trata de algo abstrato, mas ao mesmo intrínseco a totalidade da humanidade o afeto, ou mesmo aquilo que acostumou-se a denominar de amor. A contrassenso, buscar por meio das vias judiciais que alguém seja condenado por não ter dado amor, parece um tanto irracional, pois como descrevê-lo ou mesmo mensurá-lo? Certo é que o tema é por demais relevante, carecendo uma atenção por parte de todas as autoridades como se haverá de observar no decurso desta pesquisa, sendo assim o conflito de interesses envolvidos na demanda é de fato atrelado aos direitos das crianças e adolescentes e ainda dos jovens; alargando-se o entendimento para os idosos também, devido sua dependência e carência de afetividade.

Palavras-chave: Abandono Afetivo. Aplicação do Direito. Dano Moral. Reparação. Responsabilidade Civil.

Sumário: 1. Introdução; 2. A possibilidade jurídica da indenização por abandono afetivo de forma a assegurar ao filho abandonado sobre a reparação de dano moral; 2.1. Da falta de regulamentação do abandono afetivo no Brasil; 2.2. Princípios aplicáveis ao abandono afetivo; 2.2.1. Identificar os impactos do abandono afetivo na vida da vítima e sua vulnerabilidade; 2.3. Mostrar a necessidade de uniformização quanto a indenização por abandono afetivo 3. Discussão do tema; 4. Conclusão; 5. Referências.


1. INTRODUÇÃO

A discussão envolvendo o dano moral é muito comum no sistema jurídico civil atual, no passado, o dano moral era inserido na seara do direito contratual ou reais, paulatinamente foi adentrando-se no direito de família na contemporaneidade. Para os institutos jurídicos existem três funções básicas do dano moral: A de compensar o indivíduo que se sentiu lesado, a de punição ao agente causador do dano, e a de dissuadir ou prevenir outra prática da conduta danosa. Sobre a aplicabilidade da responsabilidade civil aos vínculos interfamiliares e relacionamentos afetivos, ainda gera muita discussão na doutrina e na jurisprudência, tendo como fundamento favorável à reparação do dano moral para o abandono afetivo, o artigo 186 do Código Civil, que traz o conceito de ato ilícito, já o posicionamento contrário defende que não é possível a indenização do abandono afetivo, pois isso seria quantificar ou monetarizar o amor. (PAVANI,?).

Não obstante, vale ressaltar que na responsabilidade civil decorrente do abandono afetivo, não é discutido a possibilidade da substituição do dinheiro pela ausência afetiva dos pais para com os seus filhos, bem como impor a obrigação de dar amor, mas de amenizar o dano advindo do abandono, que poderá afetar diretamente a formação da personalidade da criança e do adolescente, que pode, inclusive, necessitar de acompanhamento psicológico. Diante dessa possibilidade, o judiciário vem sendo provocado a se manifestar nas demandas por danos morais decorrentes de abandono afetivo. (REIS).

Vale ressaltar que as decisões judiciais têm sido favoráveis à indenização por dano moral ao filho desprovido de afeto, uma vez que além do direito de convívio, é levado em consideração uma série de transtornos sociais e psicológicos. Nas palavras de Montemurro, “não é a falta de amor que gera dano, não é o desamor por si só, o ato ilícito capaz de gerar o dano moral, mas sim a negativa em desferir amparo, assistência moral e psíquica”. (MONTEMURRO, 2015).

De todo modo, o abandono afetivo é a possibilidade encontrada no direito para falar da falta de afeto, de carinho e de cuidado dos pais para com seus filhos, que deixará marcas para vida toda, pleiteando a reparação do dano pecuniariamente que é imensurável, com o intuito de aliviar a dor do abandono.

Nessa seara, o presente trabalho se constituirá com a possibilidade jurídica da indenização por abandono afetivo de forma assegurar ao filho abandonado à reparação do dano moral, abordando a falta de regulamentação jurídica no Brasil, apontando os princípios aplicáveis ao abandono afetivo, além de apontar os impactos do abandono afetivo para a vítima, e a necessidade de uniformização das decisões judiciais.


2. A POSSIBILIDADE JURÍDICA DA INDENIZAÇÃO POR ABANDONO AFETIVO DE FORMA A ASSEGURAR AO FILHO ABANDONADO SOBRE A REPARAÇÃO DE DANO MORAL.

2.1. Da falta de regulamentação do abandono afetivo no Brasil

Apesar de não haver regulamentação específica para tratar do abandono afetivo, Filho, Porto, (2016) ressalta que o judiciário tem sido chamado para se manifestar sobre o assunto, das decisões proferidas, algumas foram no sentido de condenar os pais, embora tenham custeado a alimentação, não deram assistência de cunho moral aos seus filhos, deixando-os sem afeto e sem amor. (FILHO, PORTO, 2016).

A possibilidade de responsabilidade civil dos pais por dano decorrente do abandono afetivo é recente, e divide opiniões na doutrina, onde há vários fundamentos que justificam cada uma das posições. Nesse sentido, Paulo Luiz Netto Lôbo, citado por Filho, Porto (2016), ressalta que o “princípio da paternidade responsável, previsto no art. 226, § 7° da constituição, não se resume ao simples cumprimento do dever de assistência material, abrangendo também a assistência moral, dever jurídico cujo descumprimento pode levar à pretensão indenizatória”.

Mesmo diante da falta de regulamentação do abandono afetivo, é possível ver julgado no sentido de permitir a indenização, conforme demonstra a relatora Nancy Andrighi, ao se manifestar no Superior Tribunal de Justiça:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. FILHA HAVIDA DE RELAÇÃO AMOROSA ANTERIOR. ABANDONO MORAL E MATERIAL. PATERNIDADE RECONHECIDA JUDICIALMENTE. PAGAMENTO DA PENSÃO ARBITRADA EM DOIS SALÁRIOS MÍNIMOS ATÉ A MAIORIDADE. ALIMENTANTE ABASTADO E PRÓSPERO. IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) Essa percepção do cuidado como tendo valor jurídico já foi, inclusive, incorporada em nosso ordenamento jurídico, não com essa expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas desinências, como se observa do art. 227. da CF/88. Vê-se hoje nas normas constitucionais a máxima amplitude possível e, em paralelo, a cristalização do entendimento, no âmbito científico, do que já era empiricamente percebido: o cuidado é fundamental para a formação do menor e do adolescente; ganha o debate contornos mais técnicos, pois não se discute mais a mensuração do intangível – o amor – mas, sim, a verificação do cumprimento, descumprimento, ou parcial cumprimento, de uma obrigação legal: cuidar. Negar ao cuidado o status de obrigação legal importa na vulneração da membrana constitucional de proteção ao menor e adolescente, cristalizada, na parte final do dispositivo citado: “(...) além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência (...)”. Alçando-se, no entanto, o cuidado à categoria de obrigação legal supera-se o grande empeço sempre declinado quando se discute o abandono afetivo – a impossibilidade de se obrigar a amar. Aqui não se fala ou se discute o amar e, sim, a imposição biológica e legal de cuidar, que é dever jurídico, corolário da liberdade das pessoas de gerarem ou adotarem filhos. O amor diz respeito à motivação, questão que refogue os lindes legais, situando-se, pela sua subjetividade e impossibilidade de precisa materialização, no universo meta-jurídico da filosofia, da psicologia ou da religião. O cuidado, distintamente, é tisnado por elementos objetivos, distinguindo-se do amar pela possibilidade de verificação e comprovação de seu cumprimento, que exsurge da avaliação de ações concretas: presença; contatos, mesmo que não presenciais; ações voluntárias em favor da prole; comparações entre o tratamento dado aos demais filhos – quando existirem –, entre outras fórmulas possíveis que serão trazidas à apreciação do julgador, pelas partes. Em suma, amar é faculdade, cuidar é dever. A comprovação que essa imposição legal foi descumprida implica. Por certo, a ocorrência de ilicitude civil, sob a forma de omissão, pois na hipótese o non facere que atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o necessário dever de criação, educação e companhia – de cuidado – importa em vulneração da imposição legal.

(STJ, REsp. 1.159.242-SP. Rel. Nancy Andrighi. Dj. 24.04.2012).

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Como visto, há possibilidade de indenização pela falta de afeto dos pais com os filhos, apesar de inexistir no ordenamento jurídico brasileiro previsão expressa impondo aos pais o dever de dar afeto aos filhos, nas palavras de Gomes, “tal dever decorre da análise conjunta de diversos dispositivos de lei e dos princípios que regem a família na atualidade”. (GOMES, 2011).

Além desse debate estar presente na doutrina e na jurisprudência, igualmente aportou o poder legislativo, existe atualmente dois projetos de lei tramitando no congresso nacional, a esse respeito.

O projeto de lei do Senado n° 700/2007, cuja autoria é do Senador Marcelo Crivela, que propõe a modificação do estatuto da criança e do adolescente, fazendo algumas alterações no dispositivo para dizer que o abandono moral é ilícito civil e penal.

Já o projeto de lei n° 4294/2008, de autoria do Deputado Carlos Bezerra, prevê, entre outras coisas, a inserção do parágrafo único do art. 1.632. do Código Civil, constando da seguinte redação: “O abandono afetivo sujeita os pais ao pagamento de indenização por dano moral”. (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2018).

2.2. Princípios aplicáveis ao abandono afetivo

A Constituição Federal de 1988 expressamente em seu artigo 1º, inciso III institui o princípio da dignidade humana como um dos fundamentos que constitui o estado democrático de direito, acerca do princípio dignidade humana tem-se como o mais elevado valor humano como intuito de protegê-lo de tudo aquilo que lhe cause indignidade, ou seja, é aquilo que é ínsito ao ser humano. Assim confirma Maria Cristina ao dizer que: “Compreender a dignidade da pessoa abarca uma séria discussão no campo das ideias na esfera jurídica constitucional e no campo de todas as relações na esfera do direito infraconstitucional inclusive, além de outras repercussões do pleno desenvolvimento da pessoa na perspectiva física, emocional, intelectual e psíquica”. (PEZZELA, 2006)

Por conseguinte, abordamos quanto ao princípio da paternidade responsável e planejamento familiar como sendo também um princípio constitucional situado no artigo 227, § 7º da Constituição Federal de 1988 que diz o seguinte: ”Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas”. Diante desse preceito conseguimos identificar a responsabilidade afetiva e de provimento ao filho, coisa que não pode faltar.

O princípio da igualdade jurídica de todos os filhos vai nos levar a um raciocínio lógico de que os filhos não são somente os sanguíneos, podendo este ser também filho em razão de uma sentença judicial, da adoção. E isso não exime os pais adotantes de um tratamento digno e de proteção. Este princípio também estar topografado artigo 227, § 6 da Carta Magna, onde estabelece o dever da família de propor aos filhos, sendo assim um dever de proporcionar a este, não somente a um menor, mas também ao maior de idade que pode vir a ser um filho por uma sentença judicial, a saber, o rito de um maior seguirá o rito da Lei de nº Lei 8.069/1990 que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA.

Como mais uma das formas de protecionismo, o princípio da afetividade vem demonstrar o dever de manter o afeto mutuo nas relações de pais e filhos. E nessa relação aprazível temos a seguinte afirmação: “A afetividade é o princípio que fundamenta o direito das famílias na estabilidade das relações socioafetivas e na comunhão de vida, com primazia em face de considerações de caráter patrimonial ou biológico. Princípio da solidariedade familiar”. (DIAS, 2016). Dentro da afetividade aproveitamos para fazer uma leve abordagem quanto ao amor e obrigatoriedade deste, é certo que ninguém é obrigado a amar ninguém, mas na existência de um filho passa a existir uma responsabilidade para com este e um filho nunca poderá ser negligenciado.

Já o princípio da autonomia privada da vontade, é entendido da seguinte forma, pode-se fazer o que quiser desde que não contrarie o ordenamento jurídico e os bons costumes, ele estima uma independência, poderes legítimos e sendo mais uma vez lembrado que essa capacidade de se autogovernar não pode se sobre a lei. A exemplo disso temos o artigo 19 da Lei nº 8.069/1999 que expressa da seguinte forma: “É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral”. Ou seja, havendo um regramento constitucional e infraconstitucional devem ser respeitados.

2.2.1. Identificar os impactos do abandono afetivo na vida da vítima e sua vulnerabilidade

Os impactos recorrentes ao abandono afetivo podem vir a ser a motivação da responsabilização geradora do dano moral, pois como falamos anteriormente, ninguém é obrigado a amar ninguém, mas estando na condição de país responsáveis eles têm o dever de guarda e cuidados. Mas para caracterizar essa responsabilidade não basta apenas viver longe do pai ou da mãe, tem que verdadeiramente ter alguma consequência altamente negativa na vida do indivíduo. A saber:

A guarda unilateral dos filhos menores pode ser deferida a qualquer dos cônjuges; não faz diferença, desde que haja acordo entre eles. Aquele que não ficar com a guarda dos filhos deverá supervisionar os seus interesses, podendo, para tanto, solicitar informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação dos menores (art. 1.583, § 5º, CC).(DIAS, MARIA, p.69, 2016)

A Constituição Federal de 1988 exatamente em se artigo 5º exalta quanto ao direito dos filhos, seja ele menor ou maior de idade quanto o direito de apoio, abrigo e proteção, sendo que no mesmo artigo 5º, inciso X expressa quanto inviolabilidade desses direitos e que uma vez violados passam a ser pressupostos de admissibilidade para aplicação da responsabilidade civil por abandono afetivo. No que diz respeito aos impactos, eles podem se apresentar de diversas formas atingindo diretamente a dignidade humana como a saúde, alimentação, educação, lazer, profissionalização, cultura, liberdade, convivência familiar e vulnerabilidade, fragilidade, formação psíquica, física e intelectual.

Segundo o art. 1.634. do CC, compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores: I – dirigir-lhes a criação e educação;9 II – tê-los em sua companhia e guarda; III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; IV – nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; V – representá-los, até aos 16 anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; VI – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; VII – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.( DIAS, MARIA, p.90, 2016).

Se tratando da responsabilidade civil, “De tudo o que se disse até aqui, conclui-se que a noção jurídica de responsabilidade pressupõe a atividade danosa de alguém que, atuando a priori ilicitamente, viola uma norma jurídica preexistente (legal ou contratual), subordinando-se, dessa forma, às consequências do seu ato (obrigação de reparar)”. (GALIANO, FILHO, 2012). Quanto à espécie de responsabilidade civil, temos a seguinte afirmação: A responsabilidade civil, enquanto fenômeno jurídico decorrente da convivência conflituosa do homem em sociedade, é, na sua essência, um conceito uno, incindível. (GALIANO, FILHO, 2012). Aqui, podemos desde já, citar a responsabilidade dos pais que gera um efeito negativo na vida dos filhos tem interesse ao mundo jurídico e com isso tem-se a subsunção que é um fato que a lei prevê e o agente acaba por cometê-la, contraria-la.

Diante dos efeitos jurídicos causados e das consequências por transgredir uma norma, haverá de ter consequências de forma que vise à reparação do dano causado, pois, o comando do Estado é o dever de cuidar dos seus filhos, e os pais logo incorrem em desobediência e a eles cabem à responsabilidade extracontratual, subjetiva que por sua vez enquadra-se na culpa em razão da negligência. Assim temos expresso nitidamente o Estatuto da Criança e do Adolescente no artigo 5º:Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência , discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”. Ainda quanto à negligência expõe-se:

A negligência se traduz na incapacidade de proporcionar à criança a satisfação dos cuidados básicos de higiene, alimentação, afeto e saúde, indispensáveis para que o seu crescimento e desenvolvimento ocorram em normalidade. A negligência pode manifestar-se sobre a forma ativa, em que há a intenção de causar dano à criança, ou sob a forma passiva, que geralmente resulta na incompetência dos pais em assegurar os referidos cuidados. (PEREIRA por SANTOS, 2008, p.57)

A forma de reparação mais indicada para o abandono afetivo se dá por danos morais como forma de compensação aos danos sofridos podendo também atingir os danos materiais, como exemplo temos o Recurso Especial 1.159.242/SP do Superior Tribunal de Justiça:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. FILHA HAVIDA DE RELAÇÃO AMOROSA ANTERIOR. ABANDONO MORAL E MATERIAL. PATERNIDADE RECONHECIDA JUDICIALMENTE. PAGAMENTO DA PENSÃO ARBITRADA EM DOIS SALÁRIOS MÍNIMOS ATÉ A MAIORIDADE. ALIMENTANTE ABASTADO E PRÓSPERO. IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

MINISTRA NANCY ANDRIGHI. RECURSO ESPECIAL Nº 1.159.242 - SP (2009/0193701-9) - 24 de abril de 2012(Data do Julgamento).

Em outros termos do Código Civil de 2002 testificamos o seguinte no artigo 927: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186. e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Sendo assim, está justificada a responsabilidade civil pelo abandono afetivo a saber:

Esta culpa, por ter natureza civil, se caracterizará quando o agente causador do dano atuar com negligência ou imprudência, conforme cediço doutrinariamente, através da interpretação da primeira parte do art. 159. do Código Civil de 1916 (“Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”), regra geral mantida, com aperfeiçoamentos, pelo art. 186. do Código Civil de 2002 (“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”). (GALIANO, FILHO, p. 59, 2012).

Vale ressaltar, já que se trata de uma ação com pedido de danos morais, abordar quando a prescrição desse direito como sendo “é a perda da ação atribuída a um direito, e de toda a sua capacidade defensiva, em consequência do não uso delas, durante um determinado espaço de tempo” (apud VENOSA, 2005, p. 597). E no que consta a decisão publicada no Informativo 502 do STJ - 2012 , tratando da Indenização por abandono afetivo e a prescrição:

O prazo prescricional das ações de indenização por abandono afetivo começa a fluir com a maioridade do interessado. Isso porque não corre a prescrição entre ascendentes e descendentes até a cessação dos deveres inerentes ao pátrio poder (poder familiar). No caso, os fatos narrados pelo autor ocorreram ainda na vigência do CC/1916, assim como a sua maioridade e a prescrição da pretensão de ressarcimento por abandono afetivo. Nesse contexto, mesmo tendo ocorrido o reconhecimento da paternidade na vigência do CC/2002, apesar de ser um ato de efeitos ex tunc, este não gera efeitos em relação a pretensões já prescritas. Precedentes citados: REsp 430.839-MG, DJ de 23/9/2002, e AgRg no Ag 1. 247.622-SP, DJe de 16/8/2010.

REsp 1.298.576-RJ , Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 21/8/2012.

2.3. Mostrar a necessidade de uniformização quanto à indenização por abandono afetivo

A segurança jurídica é fator preponderante na construção social do conceito de justiça, pois dentre outros fatores, entende-se que justiça é um tratamento igualitário para todos. É evidente que nem todos são iguais, nem as circunstâncias que permeiam a sociedade, sendo necessário no próprio conceito de justiça adequar a lei a estas diferenças sociais, devendo-se aplicar os critérios de razoabilidade e proporcionalidade (STOLZE, 2012).

A possibilidade de reparação civil nos casos de abandono afetivo é, atualmente, um dos temas mais controversos do Direito das Famílias Brasileiras. Neste sentido a decisão do Superior Tribunal de Justiça que concedeu a reparação monetária em um caso de abandono afetivo paterno, inovadora nos tribunais superiores, ainda é objeto de intensa discussão doutrinária e jurisprudencial, As próprias particularidades fáticas inerentes a estas situações jurídicas permitem que se encontrem soluções distintas para casos concretos vistos como próximos, embaralhando os fatores envolvidos.

O Professor Flávio Tartuce (2012) ao comentar o tema cita a decisão do Superior Tribunal de Justiça, afirmando ser perfeitamente indenizável o abandono afetivo, pois segundo as palavras da ministra Nancy Andrighi, da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), “amar é faculdade, mas cuidar é dever.” Tartuce Observa, entretanto que o mesmo STJ havia julgado como não indenizável o abandono afetivo em caso semelhante, e este foi um dos argumentos do pai em sua defesa, a divergência do mesmo órgão do judiciário sobre o mesmo tema, divergência ocorrida entre a Terceira e Quarta turma do STJ.

Tem se observado que as decisões do judiciário, tende a divergir em temas ainda não pacificados, ou mesmo não julgados pelas Cortes Superiores, a exemplo do abandono afetivo, que é bem recente sua discussão até mesmo na doutrina. Por outro lado sabe-se que um dos princípios que permeia o direito brasileiro é a unidade da jurisdição, fato este que possibilita que uma decisão tomada em qualquer parte do território Nacional tenha valor jurídico em todo solo brasileiro, todavia ao analisarem-se as decisões percebe-se haver divergência quanto ao resultado jurídico de determinado tema, principalmente quando o mesmo ainda não foi consolidado pela doutrina, nem pelos Tribunais Superiores. É forçoso ainda mencionar que além do abandono afetivo, ser algo extremamente novo no campo do direito, é inegável que o tema ainda estar longe de pacificação, aprofundando-se também as discussões em torno de qual área do direito o mesmo pertence. Todavia é evidente que a Constituição Federal de 1988 reconhece em seus artigo 227 e 229, que a responsabilidade primeira quanto ao dever de cuidado da criança, do adolescente e ainda do jovem é da família, compartilhando desta responsabilidade a sociedade e o Estado.

Sobre os autores
José Luís Ferreira Lima

Acadêmico do 10º Período do Curso de Direito do Centro Universitário Dom Bosco

Graciane da Silva Ferreira

Aluna do 6º período do Curso de Direito, da UNDB.

Hellen Flávia Luz Castro

Aluna do 6º período do Curso de Direito, da UNDB.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Paper apresentado à disciplina Responsabilidade Civil, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

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