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Home office pode aumentar processos contra empresas

Agenda 24/09/2020 às 16:44

Alerta é da advogada Karina Alves Gonzalez Simonetti, sócia da Gonzalez & Simonetti Advogados Associados, que acredita ser necessária uma rápida adaptação às regras por parte das corporações ao trabalho remoto.

O número de ações trabalhistas cresceu muito nos últimos meses e teve como fator determinante o aumento do desemprego ocasionado pela pandemia do Coronavírus. De acordo com dados do Termômetro Covid-19 (publicado pela ConJur e desenvolvido pela plataforma de educação Finted em parceria com a startup Datalawyer Insights), entre janeiro e agosto deste ano, já superou a casa das 100 mil ações. O Termômetro também separa essas ações por terma, e a Covid-19 foi responsável por aproximadamente 19 mil processos.

Não bastasse isso, ainda segundo essa plataforma, o valor total das causas beirou a impressionante marca de R$ 7 bilhões (R$ 6, 87 bi) nos primeiros oito meses de 2020. Os dados são preocupantes. E podem ficar ainda piores. Essa é avaliação da advogada trabalhista Karina Alves Gonzales Simonetti, sócia-fundadora do escritório Gonzalez & Simonetti.

Um tema específico mudou a rotina do dia a dia dos empresários e trabalhadores desde março deste ano. O home office passou a fazer parte do novo cenário corporativo. E, infelizmente, muitas empresas ainda não se adaptaram a esse formato. E isso pode significar novas ações em um futuro não tão distante. O Covid-19 já representa o terceiro assunto no ranking total de processos no Brasil”, alerta a especialista.

Dados da PNAD Covid-19, pesquisa organizada pela Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), demonstram que mais de oito milhões de pessoas estavam trabalhando remotamente no final de agosto. Para a adoção do regime home office, muitas empresas levaram em conta a MP (Medida Provisória) 927, que flexibilizou algumas regras trabalhistas durante a pandemia.

No entanto, essa MP perdeu validade na segunda quinzena de julho, e as relações trabalhistas voltaram a ser regidas pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). Passados quase dois meses, ainda há muitos pontos de interrogação junto ao empresariado, e o cenário não é nada positivo.

Alguns sindicatos já ingressaram com ações pedindo compensações aos funcionários que foram trabalhar em casa e que não tinham condições adequadas para exercer essa função. Nesses casos, não se falam apenas de equipamentos e infraestrutura (computador, mesa e cadeira), mas, também, gastos como eletricidade e internet.

Como evitar isso?

Essa, certamente, é uma das perguntas feitas diariamente pelo empresariado brasileiro. Para se ter ideia, durante a vigência da MP, bastava que o patrão comunicasse o empregado por escrito ou por meio eletrônico com pelo menos 48 horas de antecedência.

Uma das principais mudanças, após o fim da validade da MP, é que o empregador não pode determinar unilateralmente a mudança do regime presencial para o teletrabalho. A mudança precisa ser acordada entre as duas partes: empregador e trabalhador”, explica a advogada.

Embora a prática já fosse usual pelas empresas brasileiras, o trabalho remoto passou a ser regulamentado pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) apenas com a Reforma Trabalhista (Lei 13.467) em 2017. Determinou-se que deveria ser estabelecido um acordo individual para o home office e que a instituição do modelo deveria ter a concordância do empregado.

“Pense no seguinte cenário: o que sua empresa está fazendo quando o assunto é jornada de trabalho? Há um controle? O empregador pode pedir uma compensação dessas horas não trabalhadas, certo? Por outro lado, o funcionário tem o direito de alegar que estava disponível. Ou seja, isso gera uma insegurança jurídica e pode resultar em novas ações trabalhistas”, define Karina Alves Gonzalez Simonetti.

Especialista esclarece dúvidas

O artigo 75-C da CLT determina que a prestação de serviços na modalidade home office deve constar expressamente do contrato individual de trabalho, que especificará as atividades que serão realizadas pelo empregado (pode ser elaborado termo aditivo de contrato de trabalho, caso não tenha sido mencionado no contrato original)

Não há alteração salarial, caso o empregado mantenha as atividades e carga horária. Vale destacar que os funcionários em home office permanente são dispensados do controle de ponto.

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O artigo 62 da CLT, inciso III prevê que o limite de oito horas diárias ou 44 horas semanais, o pagamento de horas extras, ou ainda, o respectivo adicional de 50%, não se aplicam a esses empregados, em razão da natureza do trabalho.

Entretanto, há tecnologia que permite que as empresas estabeleçam uma forma de controle, seja por tarefa ou produtividade por meio de softwares e sistemas de intranet, até mesmo assinaladas nos controles de frequência. Se não houver forma de controle, não haverá aferição
de horas, e, portanto, não há direito a horas extras.

Sim. O trabalhador tem direito a horário de intervalo.

A CLT não especifica quem deverá arcar com as despesas relacionadas à aquisição, manutenção e fornecimento dos equipamentos para o trabalho, como computadores, internet e telefone.

Se houver aumento de despesa do funcionário com telefone, internet, energia elétrica ou água, este valor pode ser pleiteado pelo empregado.

A situação pede parcimônia, para que funcionário não tente transferir todo o custo de uma casa ao empregador, o que não será justo e nem acolhido.

Se o empregado não possuir os equipamentos tecnológicos e a infraestrutura necessária e adequada à prestação do home office, o empregador poderá fornecer equipamentos em regime de comodato e pagar por serviços de infraestrutura, mas isso não irá caracterizar verba de natureza salarial, e sim indenizatória, e deverá estar previsto em aditivo contratual.

O funcionário será tratado da mesma forma em que no trabalho presencial. Deve-se buscar consulta médica junto ao médico de trabalho da organização, do plano médico disponibilizado ou do serviço público. Como ocorre na regra geral, o funcionário receberá os primeiros 15 dias pela empresa, depois será pago o benefício de auxílio-doença da Previdência Social.

A empresa, em especial aquelas que prestam serviços essenciais, podem solicitar o retorno ao trabalho, e o empregado, caso não possua justificativa médica para tal, o empregado não pode se recusar.

A recusa a ir trabalhar presencialmente poderá ensejar a aplicação da penalidade prevista em artigo 482 da CLT (justa causa para rescisão
do contrato de trabalho pelo empregador).

Sim, pois não haverá deslocamento do trabalhador entre sua casa e o local de trabalho, e vice-versa.

Há controvérsias. Contudo, baseando-se no o artigo 6º da CLT, não há distinção entre o trabalho realizado na empresa ou em home-office, o que nos leva à recomendação de não suspender tais benefícios.

Se a empresa já conceder tais benefícios, em especial por previsão em convenção coletiva, devem manter os referidos benefícios.

Sim. Não houve vedação para a adoção destas medidas em home office.

As convenções e acordos coletivos tiveram seus prazos prorrogados. Quando do fim da prorrogação, não há como se estendê-las, sendo que a via eletrônica tem sido usada para sanar tais lacunas, como a propositura de ação em juízo e acordo feitos através de acesso remoto com os sindicatos.

Só haverá banco de horas se houver o controle de horas feito pela empresa.

Existe a rescisão consensual, que surgiu com a reforma trabalhista de 2017, em que as partes podem rescindir o contrato de trabalho de comum acordo. Contudo, o empregado não terá direito a seguro desemprego.
A multa de FGTS será de 20% e não 40%. E o saque do FGTS será de 80%, e o empregado terá direito a 50% do total das verbas rescisórias.


Ou seja, na visão da especialista em direito trabalhista, é fundamental para minimizar um possível ônus no futuro que a empresa avalie cada detalhe minuciosamente. Seja a jornada de trabalho, o vale-transporte, o vale-refeição, equipamentos.

Com a vigência da LGPD [Lei Geral de Proteção de Dados], é importante e necessária a criação de regulamentos internos, formalização por meio de contratos, e, em alguns casos, criação de acordos coletivos de trabalho, com ajustes dos pontos de maiores divergências com o intuito de evitar questionamentos por utilização indevida do home office. É essencial conversar com o colaborador e deixar tudo descrito no contrato de trabalho para que nenhuma das partes saia prejudicada”, finaliza a advogada.

Sobre a autora
Karina Alves Gonzalez Simonetti

Advogada com mais de 20 anos de atuação, mestre em Direito e especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. É professora universitária.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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