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A Vigência da Lei n.º 14.010/2020 e as Assembleias Condominiais Presenciais - possibilidade de realização ou vedação legal

As Assembleias condominiais presenciais durante a vigência dos decretos estaduais e municipais que restringem aglomerações e a lei 14.010/2020. Um provável conflito aparente de normas? Como proceder? Existiria uma proibição legal para se realizar assemble

Em função da Lei 14.010/2020 que regulamenta e sugere a realização das assembleias condominiais na modalidade virtual, pergunta-se: as assembleias presenciais estão vedadas?

Após o advento indigesto da pandemia do Covid-19, fomos obrigados a nos deparar com uma realidade totalmente diferente da qual estávamos acostumados, sobretudo, na seara condominial. Antes, era usual e comum a realização das assembleias condominiais de forma eminentemente presencial onde se travavam os debates acerca dos temas de relevância para o condomínio e os condôminos tinham mais possibilidade e visibilidade de seu direito de expressar sua opinião diante dos demais, de maneira a influenciar nas votações e deliberações da aludida assembleia.

Contudo, diante da pandemia, os governos estaduais e municipais, até mesmo por força de decisão do STF, ganharam uma autonomia legislativa, em matéria que trata de saúde pública, para baixar decretos e portarias que restringiam a circulação de pessoas tanto em locais públicos, como até mesmo no interior de condomínios, como forma de tentar frear a propagação do novo corona vírus.

Muito se discutiu sobre a legitimidade desses decretos em impor medidas restritivas nos ambientes intra muros dos condomínios, sobretudo porque havia quem pensasse que se estaria extrapolando os limites do poder de legislar, uma vez que competia aos condôminos decidir se se deveria fechar as áreas comuns, realizar ou não as assembleias de forma presencial ou não, por ser uma questão eminentemente interna. Contudo, tal entendimento foi superado e amplamente sufragado pelo princípio da primazia do interesse público sobre o privado e, no caso de uma pandemia dessa magnitude, a lei federal e os decretos estaduais e municipais, que tem força de lei, porquanto os Estados e Municípios podem legislar sobre saúde pública concorrentemente com a União, ao teor do art. 24, inciso XII, da Magna Carta, tem prevalência sobre as deliberações das assembleias condominiais e das convenções.

Dito isto, em meados de maio, mais precisamente no dia 14/05/2020, o Senado Federal aprovou e, alguns dias depois, o Presidente Jair Messias Bolsonaro sancionou o projeto de lei 1179/2020, que converteu-se na lei 14.010/2020, no qual se estabeleceu que as assembleias condominiais poderiam acontecer preferencialmente pela modalidade virtual, ou seja, fazendo-se o uso de uma plataforma e por meio de equipamentos como computadores, celulares ou tablets, a fim de se evitar as aglomerações nos condomínios e, com isso, diminuir os índices de contaminação pelo novo corona vírus.

Vários questionamentos surgiram, uma vez que, para muitos condomínios, síndicos, administradores, gestores e advogados condominialistas tratava-se de uma novidade. Questionava-se acerca da legalidade, da legitimidade, sobre o recebimento de documentos, sobre situações que falibilidade técnica e de como se haveria de proceder, requisitos para funcionamento, dentre outros tantos assuntos levantados até que, durante os meses, aparentemente, essa modalidade caiu nas graças dos condôminos e de alguns síndicos.

Não se pode olvidar dos custos, sobretudo porque a maioria imensa dos condomínios não estava preparada para essa realidade. Conforme as situações iam andando, as adaptações iam sendo feitas.

Porém, de uns dias pra cá, alguns colegas advogados tem recebido questionamentos acerca do seguinte fato: já não seria a hora de se retornar com as assembleias presenciais? Qual seria o impedimento para tanto? Existe uma proibição expressa que veda a realização de assembleias presenciais? As que estão sendo realizadas, podem ser anuladas ou podem ser consideradas válidas? A realização das assembleias condominiais na modalidade virtual é uma obrigatoriedade? E, por fim, até quando haverão essas restrições oriundas desses decretos municipais e estaduais? O presente texto, em forma de artigo, pretende lançar luz sobre esses questionamentos, porém sem a pretensão arrogante de exaurir o assunto, uma vez que existem vozes de envergadura muito maior para tratar desse e de temas afins.

A intenção é contribuir para o salutar debate e promover esclarecimentos àqueles que militam na seara condominial, bem como a síndicos, gestores, administradores e condôminos.

De forma objetiva, é preciso levar em consideração alguns fatores importantes para que se tenha uma resposta precisa e clara sobre a questão suscitada.

Primeiramente, conforme enfatizado acima, nos termos do art. 24 da Constituição Federal de 1988, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios legislam concorrentemente sobre questões de saúde pública e tal fato encontra-se pacificado tanto em nosso ordenamento jurídico quanto na nossa jurisprudência.

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Partindo, portanto, dessa premissa, compete aos Estados e aos Municípios determinar, por meio de decretos e portarias, quais devem ser as normas que regularão a abertura, fechamento e/ou reabertura de locais públicos ou privados onde possa haver aglomerações de pessoas, estabelecendo, se for o caso, protocolos rígidos a serem seguidos para se evitar e minimizar os riscos de contaminação da COvid-19.

Nesse sentido, tomando o Estado de Goiás como exemplo, em meados de abril, foi editado o decreto estadual de n.º 9.653/2020 no qual se estabelecia, dentre outras medidas, o lockdown, como forma de se evitar aglomerações e isso afetou diretamente os condomínios, pois, em seu art. 3º, inciso I, preceituava-se claramente que não se poderia haver reuniões em condomínios fechados e edilícios.

Assim, as assembleias condominiais não poderiam se realizar na modalidade presencial, ainda que se argumentasse que fossem respeitados o distanciamento entre os participantes e demais protocolos para se evitar a contaminação da nova doença.

Já no mês de junho, um novo decreto estadual, agora sob n.º 9633/2020, estabeleceu algumas medidas de flexibilização, contudo, manteve a restrição a reuniões em condomínios. Houve, sim, um permissivo para reabertura de quadras poli esportivas, academias, piscinas, para atividades esportivas e não recreativas. No entanto, o decreto não concedeu nenhuma autorização para realização de assembleias presenciais.

A partir dessas ponderações, parece-nos claro e inequívoco que, diante na vedação dos decretos legislativos estaduais e municipais, a realização das assembleias presenciais, até segunda ordem, permanece obstaculizada.

Discordamos do posicionamento dos que defendem a tese de que se deve analisar caso a caso, porquanto a situação é clara, não havendo dúvidas que pudessem pairar sobre o tema, uma vez que em havendo a proibição advinda dos decretos estaduais ou municipais, assim como havendo o permissivo legal da Lei n.º 14.010/2020, não há que se falar em retorno das assembleias presenciais, pelo menos, a priori.

Até quando durará esta vedação? Esta é uma pergunta para a qual não se tem uma resposta de forma pronta, rápida e objetiva. Tudo dependerá de fatores externos, tais como: a redução do número de óbitos, o controle do número de contaminação, o alargamento do sistema público de saúde, bem como a edição de portarias ou outros decretos que revoguem os anteriores, permitindo, assim, a realização das assembleias virtuais e determinando os protocolos a serem respeitados para garantir a segurança dos condôminos participantes.

Outro ponto que merece destaque, por fim, é o de que existe uma certa predileção de alguns condôminos pela realização das assembleias presenciais, mormente os mais velhos, sobretudo por conta da sua dificuldade de manejar equipamentos digitais e de considerarem essa modalidade com maior facilidade para expressão de suas opiniões.

Obviamente, que tal assertiva encontra refutações, sobretudo pelo fato de que o mesmo direito de opinião e fala das assembleias presenciais é conferido nas assembleias virtuais e, além disso, tem-se promovido uma divulgação exaustiva acerca do funcionamento e também se realizado até mesmo treinamento com síndicos e gestores de condomínios para instrução acerca de plataformas a fim de promover a maior participação dos condôminos e viabilizar ainda mais o engajamento de todos.

A realidade agora é totalmente diferente. Os tempos são outros. Estamos numa era digital. Não se está encorajando e muito menos se realizando um marketing em cima das assembleias virtuais, mas fato é que, enquanto existam decretos estaduais ou municipais que vedem a realização de aglomerações em condomínios, e por aglomerações entendam-se as assembleias presenciais, ainda que estas fossem realizadas obedecendo protocolos de segurança, tais, pelo menos por enquanto, não estão permitidas, devendo ser realizadas, quando possível, por meio de modalidade virtual, até que os governos estaduais e municipais decidam por flexibilizar e permitir a realização das assembleias presenciais.

O bom senso, como sempre temos enfatizado, deve prevalecer. O rigor técnico e o rigorismo legal não são de bom tom, porém a observância à lei deve sempre ser um norte a ser seguido e estimulado por todos os operadores por direito.

Conforme ressaltado acima, as vedações à realização de assembleias presenciais encontram-se respaldadas nos decretos municiais ou estaduais que restringem aglomerações de pessoas. Insta destacar que o próprio município não consegue realizar uma fiscalização efetiva, porém um condomínio que, mesmo sob a égide do decreto, realize a assembleia pela modalidade presencial, leve-a a registro, tal ato será considerado válido, pois o cartorário e nem o próprio Estado ou o Município tem competência para anular tal ato.

Contudo, recomenda-se que, enquanto se mantenha a vedação advinda pelos decretos, municipais ou estaduais, que se realizem por meio virtual, até segunda ordem.

 

Autores:

 

João Ricardo C. de Oliveira, advogado, especialista em direito imobiliário, condominial, cível e tributário, professor de cursos de pós graduação em direito, consultor jurídico e parecerista.

Adriano Naves Teixeira, advogado, Vice-Presidente da Comissão de Direito Condominial da Ordem dos Advogados do Brasil Seção Goiás, especialista em direito condominial, cível e empresarial, sócio administrador do escritório Adriano Naves Advogados Associado

Sobre os autores
João Ricardo Cardoso de Oliveira

Advogado, Consultor Jurídico e de Negócios, Empresário da Educação, atuante nas áreas imobiliária, tributária, empresarial. Parecerista e Professor. Especialista em Direito Imobiliário com MBA, Direito Constitucional.

Adriano Naves Teixeira

Advogado, Inscrito na OAB/GO n.º 45.986, Vice-Presidente da Comissão de Direito Condominial da Ordem dos Advogados do Brasil Seção Goiás, especialista em direito condominial, cível e empresarial, sócio administrador do escritório Adriano Naves Advogados S/S.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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