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Imunidade privilegiada

Agenda 06/10/2020 às 16:09

A Constituição Federal de 1988 foi instituída pelo Congresso Nacional, consagrando o grande interesse de albergar direitos protetivos as Casas Legislativas, no pertinente a disciplinar as imunidades e privilégios na busca do poder ilimitado.

IMUNIDADE PRIVILEGIADA

I – INTRODUÇÃO

         O tema foro privilegiado tem seu berço na Inglaterra, país onde foram instituídas as principais regras do Direito Constitucional, inclusive sobre a imunidade, contudo o foro privilegiado não foi acatado. No pertinente a França, conhecido berço da declaração universal dos direitos humanos e das liberdades, há previsibilidade do foro especial por prerrogativa de função, tão somente, para o Presidente, o primeiro ministro e os ministros de Estado.     

II – TIPOS DE IMUNIDADES PARLAMENTARES

       De acordo com o tópico da Seção V – Dos Deputados e dos Senadores, há previsão no artigo 53, caput, da Constituição Federal de 1988, reza que “Os deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. Ressalte-se que esse texto legal do artigo 53, caput, foi emendado por meio da EC nº 35/2011.

         Noutra vertente, vislumbram-se que os parlamentares brasileiros possuem inviolabilidade ou imunidades civil e penal ou material; imunidade processual; imunidade prisional; foro especial por prerrogativa de função; imunidade probatória; e prerrogativa testemunhal.

         De efeito, nos termos do caput do artigo 53 da Carta Magna vigente, essa imunidade parlamentar atinge a qualquer tipo de manifestação de concepção no pleno exercício da função política (in officio ou propter officium), no âmbito ou fora da Câmara ou do Senado, com toda proteção da liberdade de expressão (freedom of speech). Nesse sentido, a primeira imunidade, porquanto, inexistem responsabilidades, tampouco de qualquer ato indenizatório nas esferas cível e penal. No entanto, essa imunidade material não compreende os delitos praticados pelos parlamentares fora do mandato, assim como de suas opiniões, palavras e votos, como no caso de corrupção ou mesmo pelo emprego de hostilidade. Ademais, na hipótese da crítica parlamentar for externada pela mídia, também não implica em responsabilidade civil ou penal contra o parlamentar, desde que a critica tenha sido feita no exercício da função.

            No segundo tipo de imunidade, a previsão é do artigo 53, § 3º, da CF/88, que trata da Imunidade Processual, nos termos seguintes: “Recebida a denúncia contra Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva, que, por iniciativa do partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação”.

            A precitada norma disciplinadora cogita que, na hipótese da aprovação da sustação da ação penal, não haverá prescrição no decorrer de todo o mandato parlamentar. Vale salientar, que essa suspensão processual é tida como um ato deliberativo interna corporis, unilateral e vinculativo, onde nenhum dos outros dois Poderes (Executivo e Judiciário) pode formalmente intrometer-se nessa decisão. Destarte, nesse caso o Poder Judiciário permanece subordinado à impetuosidade do Poder Legislativo, considerado soberano neste ato. Na hipótese de que o delito tenha sido praticado antes da diplomação, a suspensão do processo não é permitida.

            No terceiro tipo de imunidade, consta a Imunidade Prisional, inserida no artigo 53, § 2º, da CF/88, nos termos seguintes: “Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável”. Entretanto, in casu, “os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão”.

            Impende, porém, observar que, nesse caso, os parlamentares em face de suas imunidades somente serão presos na hipótese de condenação definitiva, ou seja, com sentença transitada em julgado, salvante em flagrante de crime inafiançável. Ademais, o parlamentar também não pode ser alvo de prisão preventiva, tampouco temporária. Ademais, vale salientar que nem no caso de prisão em flagrante, pela prática de crime inafiançável, o parlamentar somente poderá ser preso na hipótese da prática de delitos austeros, a exemplo dos crimes hediondos e de racismo e outros crimes graves. Contudo, em face da freedom from arrest (imunidade quanto à prisão), a decisão sobre a manutenção ou não da prisão em flagrante pela prática de crime inafiançável é do próprio parlamento, por meio do voto da maioria de seus membros. Destarte, somente após a condenação criminal determinada por sentença transitada em julgado, tornar-se-á cabível a prisão do parlamentar, com a decretação da perda do mandato parlamentar, nos termos do artigo 55, inciso VI, da CF/88. Salvante, na hipótese de o parlamentar já ter sido cassado no pretérito, pelos membros do parlamento, em decorrência da falta de decoro parlamentar.

            No pertinente ao quarto tipo de imunidade parlamentar, exsurge o Foro Especial por Prerrogativa de Função, prevista no artigo 53, § 1º, CF/88, onde os parlamentares têm o privilégio de ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no caso da prática de crimes comuns e eleitorais. Na hipótese da prática de crimes de responsabilidades ou funcionais, como na falta de decoro parlamentar e outros previstos na legislação pertinente, o parlamentar é julgado pelos próprios membros das Casas Legislativas, conforme previsão do artigo 55, da CF/88. Ademais, essa prerrogativa de foro especial não abraça a questões de natureza cível, a exemplo do protesto judicial cível, cujo procedimento da ação ocorrerá na primeira instância da Justiça Comum Federal.

            Concernente ao quinto tipo de imunidade parlamentar, tem-se a Imunidade Probatória, desobrigando-o de testemunhar em torno de noticias colhidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, tampouco sobre pessoas confidentes ou delas receberam as notícias, conforme prevê o artigo 53, § 6º, da CF/88. O intuito desse critério é pela preservação da liberdade de atuação e da independência do parlamento.

            Finalmente o sexto tipo de prerrogativa, conhecida como Prerrogativa Testemunhal, onde na condição de testemunha, os parlamentares podem ajustar com o magistrado, dia, hora e local da sua ouvida, nos termos do artigo 221, do Código de Processo Penal (CPP). Contudo, essa prerrogativa só é deferida às testemunhas, e na hipótese do parlamentar ser o acusado, este deverá ser interrogado nos termos da intimação judicial.

III – TEMPO DO CRIME

            A prática do crime parlamentar federal pode ocorrer antes, durante e depois de ingressar na função parlamentar. Destarte, em cada fase há uma metodologia jurídica pertinente, senão vejamos:

            Na fase primeira, quando o crime vem a ocorrer antes da diplomação do parlamentar, ou seja, já havia um procedimento judicial em andamento, a partir da expedição do diploma, nos termos do artigo 53, § 1º, CF/88. Porquanto, a ação penal deverá deixar a comarca de origem, e encaminhada ao STF, alterando-se o órgão jurisdicional competente, pela modificação da competência ratione personae.

            Na segunda fase, quando o crime é praticado após a diplomação, assim como perante o exercício das funções parlamentares, a tramitação permanece no STF, no âmbito do foro especial por prerrogativa de função. Com a cessação das funções parlamentares, extingue-se o foro especial. (Grifei).

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            Na terceira fase, quando o delito é cometido após o exercício das funções parlamentares, o foro especial deixa de existir, de acordo com a Súmula n° 451-STF, passando o ex-parlamentar a responder perante a primeira instância da Justiça Federal.

IV – RESTRIÇÃO DO FORO PRIVILEGIADO PELO STF

            Em 2018, os ministros do STF decidiram restringir o foro privilegiado de função, para os parlamentares, decidindo que estes só podem responder a processos no STF, na hipótese de a infração penal tenha sido cometida durante o mandato e em razão da função parlamentar. Assim sendo, fora dessa hipótese, os processos deverão ser encaminhados para a primeira instância da Justiça Comum Federal.

            Em circunstâncias simílimas, em 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF), afastou a competência da Justiça Federal para conhecer e julgar casos de corrupção e lavagem de dinheiro, em casos associados ao crime de Caixa 2, determinando o encaminhamento dos autos para a Justiça Eleitoral.

V – DECISÃO CONTROVERSA DO STF

            Rebuscando-se mais uma decisão controversa do STF, que chamou atenção da sociedade brasileira, desta feita prolatada monocraticamente por meio do ministro Dias Toffoli, quando na data de 29/06/2016, concedeu liberdade ao ex-ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, do governo do então presidente Lula da Silva, que havia sido preso pela Polícia Federal na Operação Custo Brasil, com conjunção com o MPF e a Receita Federal, deflagrada em 23/06/2016, em desdobramento da 18ª Fase da Operação Lava Jato.

            A Operação Custo Brasil, foi deflagrada com o escopo de combater o esquema relativo a fraudes no serviço de gestão de crédito consignado, dirigido a servidores públicos ativos e inativos e pensionistas da União.

            De acordo com as investigações, a empresa Consist, com sede em Brasília (DF), contratada pelo Ministério do Planejamento, cobrava excessivamente pelos seus serviços e repassava o percentual de 70% do seu faturamento para o Partido dos Trabalhadores (PT) e para políticos.

            Segundo, ainda, as investigações, essa gestão fraudulenta ocorreu no período de 2009 a 2015, e que a propina distribuída teria atingido o montante de R$ 100 milhões de reais. Durante esse período, a empresa Consist obteve a arrecadação no valor de R$ 140 milhões de reais, onde R$ 40 milhões de reais foi recebido pelos serviços prestados pela empresa, e os R$ 100 milhões de reais foram desviados para o esquema de propina, coordenado pelo ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto.

            Constam da relação dos investigados na Operação Custo Brasil, João Vaccari Neto e Paulo Ferreira, ex-tesoureiro do PT, Valter Correa da Silva, secretário de gestão do prefeito de São Paulo, Paulo Bernardo, ex-ministro do Planejamento, Dias Toffoli, ex-ministro do TSE e atualmente ministro do STF e Carlos Gabas, ex-ministro da Previdência Social.

            De acordo com o relatório da Polícia Federal, revela conversas entre o ministro Dias Toffoli e Carlos Gabas, sendo este alvo de investigações sobre o desvio de R$ 100 milhões de reais do Ministério do Planejamento. Conforme noticia a Revista Veja, o ministro do STF mantinha conversas e laços de amizade com os investigados, principalmente com Carlos Gabas. Em face dessas informações, o PGR, Rodrigo Janot, segundo a Revista Veja, edição nº 2647, de 15/12/2016, deverá analisar o pedido de afastamento do ministro Dias Toffoli, do STF, de fatos relacionados à Operação Custo Brasil, que envolve o suposto pagamento de propinas ao ex-ministro, Paulo Bernardo e a sua mulher, Gleisi Hoffmann, senadora da República (PT-PR).

            No prosseguimento da persecutio criminis, a Justiça Federal de São Paulo, determinou o cumprimento do mandado de condução coercitivas para 14 suspeitos, além do cumprimento do mandado de busca e apreensão pela Polícia Federal, na residência de Paulo Bernardo, ex-ministro do Planejamento.

            No entanto, na data de 26/06/2018, a segunda Turma do STF, decidiu pela ilegalidade do mandado de busca e apreensão, redundando na anulação das diligências relativa ao mandado de busca e apreensão, ou seja, as provas coletadas na busca e apreensão foram consideradas ilegais, não podendo ser utilizadas na investigação policial, pelo simples fato de que a senadora, Gleisi Hoffmann, ser casada com o investigado, Paulo Bernardo, embora não esteja inserida no rol dos investigados, mas possui foro privilegiado junto ao STF. Portanto, no caso, o mandado de busca e apreensão deveria ter sido requerido ao STF, segundo o entendimento da Corte.

            No julgamento, a decisum foi acatada por 3 votos contra 1, votando pela anulação das diligências, o ministro relator, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski. Votando em favor da legalidade das diligências, o ministro Edson Fachin, por entender que o foro privilegiado não tem sua extensão à residência de parlamentares. (Grifei).

            No pertinente a libertação de Paulo Bernardo, o ministro relator, Dias Toffoli, decidiu monocraticamente, afirmando que “Por reputar configurado flagrante constrangimento ilegal, passível de correção por habeas corpus de ofício, quando do julgamento de mérito da ação, determino cautelarmente, sem prejuízo de reexame posterior, a revogação da prisão preventiva de Paulo Bernardo Silva”. (Grifo nosso).

            Destarte, no que diz respeito a liberdade de Paulo Bernardes, ex-ministro do Planejamento, envolvido em fraudes no serviço de gestão  de crédito consignado a servidores públicos ativos e inativos, além de pensionistas da União, concedida por meio de liminar pelo ministro relator, Dias Toffoli, trazendo em consequência a anulação das provas coletadas pela Polícia Federal na residência de Paulo Bernardo e de sua então esposa, Gleisi Hoffmann, com respaldo no foro privilegiado da senadora, é cediço que essa extensão protetiva não se aplica ao local de residência do casal. (Grifei).

VI – INEXISTÊNCIA DE PRERROGATIVA DE FORO A LOCAIS

            Em tese, é sabido que a determinação para o cumprimento de mandado de busca e apreensão nas dependências da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, não há imposição legal implicando a competência do STF, ou seja, que essa medida policial de busca e apreensão nos âmbitos da Câmara e do Senado deva ser decretada obrigatoriamente pelo STF, uma vez que a Constituição Federal, quando disciplinou as imunidades e prerrogativas dos parlamentares, não adotou a exclusividade ao STF, para determinar as medidas de busca e apreensão nas dependências da Câmara Federal ou do Senado Federal.

            Nesse sentido, diante dessa lacuna, a determinação do cumprimento do mandado de busca e apreensão nas dependências das duas Casas, desde que não esteja direcionada a conduta de parlamentares, não está relacionada com as imunidades e prerrogativas parlamentares. Uma vez que, a contrario sensu do que acontece com as imunidades diplomáticas, as prerrogativas e imunidades parlamentares não se estendem aos locais onde os parlamentares exercem suas atividades, tampouco aos dos seus assessores.

            Na hipótese de o endereço de cumprimento da medida policial coincidir com as dependências do Congresso Nacional, não atrai necessariamente e de modo irrefutável a competência do STF. Faz-se necessário perquirir concretamente, se a investigação estava dirigida diretamente a parlamentar, na condição de alvo da operação.

            De efeito, a prerrogativa de foro faz referência as funções desempenhadas e nunca a locais, uma vez que a Constituição Federal vigente não previu a figura da “prerrogativa de foro a locais”, ou seja, diante do mero fato de que a medida cautelar deva ser cumprida nos âmbitos do Senado ou da Câmara Federal, não enseja a competência do STF, desde que o investigado não seja um parlamentar.

            Na hipótese da alegação de afronta ao princípio da separação dos poderes, não procede, uma vez que a determinação emanada do Poder Judiciário do mandado de busca e apreensão, a ser cumprida nas dependências de Casa Legislativa, não caracteriza, por si só, qualquer ato de desrespeito ao princípio da separação dos poderes da República, de acordo com as inúmeras jurisprudências dos Tribunais Superiores.

VII - A PROVA E SEU DUPLO JUÍZO DE VALIDADE

            É cabível executar um compartimento dos efeitos da declaração judicial de nulidade de uma mesma prova, ou seja, é possível que uma prova seja declarada inválida para alguns investigados, mas por outra monta, seja usada contra outros investigados.

            Nessa inteligência, a própria jurisprudência do STF, manifesta-se nesse sentido que “Eventual nulidade decorrente de inobservância da prerrogativa de foro não se estende aos agentes que não se enquadram nessa condição”. (STF, Plenário, Rcl nº 25537-DF e AC nº 4297-DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgados em 26/06/2019).

            No mesmo sentido, e de acordo com a manifestação da Corte Maior, a declaração de imprestabilidade dos elementos de prova, angariados em eventual usurpação da competência criminal do Supremo Tribunal Federal não alcançaria aqueles destituídos de foro por prerrogativa de função. (STF, 2ª Turma, Rcl 25497 AgR, Rel. Ministro Dias Toffoli, julgado em 14/02/2017). (Grifei).

            Na mesma inteligência, “A usurpação da competência do STF, traz como consequência a inviabilidade de tais elementos operarem sobre a esfera penal do denunciado. Precedentes desta Corte. Conclusão que não alcança os acusados destituídos de foro por prerrogativa de função”. (STF, Plenário, Inquérito nº 2842, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 02/05/2013). (Grifei).

            Destarte, chega-se à ilação de que as provas colhidas por determinação do Juiz de primeira instância da Justiça Comum Federal são consideradas nulas para os parlamentares envolvidos, porém podem ser consideradas válidas para os demais investigados, que não gozam do foro especial de prerrogativa de função.

            Diante do tudo que foi exposicionado, conclui-se que, in casu,  a reconhecida usurpação da competência do STF, alegada pela 2ª Turma do STF, no julgamento datado de 26/06/2018, onde as provas coletadas na residência de Paulo Bernardo foram consideradas ilegais e consequentemente, não podendo ser utilizadas na investigação, uma vez que a casa é residência comum da senadora, Gleisi Hoffmann, esposa do investigado, é possuidora do foro especial de prerrogativa de função, mas que não estava inserida no rol dos investigados, não prejudicou os elementos probatórios colhidos na residência de Paulo Bernardo, simplesmente porque as provas estavam direcionadas exclusivamente ao investigado, assim como Paulo Bernardo já não possuía foro especial por prerrogativa de função, no momento da sua prisão e no cumprimento do mandado de busca e apreensão pela Polícia Federal.

VIII – CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Levando-se em consideração a toda a matéria explanada, chega-se à dedução lógica de que, a nossa Constituição Federal de 1988, foi instituída por membros do Congresso Nacional  e de outros juristas convidados, consagrando o grande interesse de albergar direitos protetivos as Casas Legislativas, no pertinente a disciplinar as imunidades e prerrogativas, na busca do poder ilimitado, ferindo a não mais poder a previsão tipificada no artigo 5º da Constituição Federal vigente, de que todos são iguais perante a lei, porquanto o excesso de privilégios e de imunidades que são incompatíveis com o Estado Republicano.

            No pertinente aos privilégios que se encontram tipificados em leis e regulamentos internos, instituídos e votados pelos próprios membros do legislativo, sem que antes sejam perquiridos aqueles que exercem a soberania popular, a qual é exercida por meio do sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, através do plebiscito, do referendo e da iniciativa popular, nos termos do artigo 14, incisos I usque III, da Carta Fundamental de 1988.

            Diante dos vultosos privilégios, todos votados no interesse de causa própria, que ao ser vislumbrados acarretam indignidades, repúdios aos atos de puro egoísmo e desprezos pelos nossos representantes no parlamento, onde há muito tempo não se vê a criação de um projeto em benefício popular, de iniciativa parlamentar. Assim sendo, instituiu-se um projeto de lei de iniciativa popular, com o esteio de todo projeto de lei ou regulamento interno do Congresso Nacional, passe pelo crivo da população, mediante plebiscito ou referendo, quando presente estiver a intenção de ser criado algum benefício financeiro em causa própria. Porém, como é sabido que a iniciativa de ingressar com o projeto popular, junto à Câmara dos Deputados, tem que partir de uma instituição representativa de classe, como no caso de sindicatos, associações e similares, mas até a presente data nenhuma demonstrou interesse em abraçar o projeto, quiçá por temor ou pela expectativa de um dia ingressar no parlamento.

            Por outro lado, vislumbra-se a presença do Poder Executivo, que se constitui da agregação de órgãos e autoridades públicas, regulamentada pela Constituição Federal, aos quais são atribuídos a função essencial de administrar o país. Portanto, o Presidente da República é quem desempenha o papel de Chefe de Estado e de Governo. Porém, embora seja a maior autoridade do país, no pertinente a sua imunidade e de privilégios do cargo, praticamente inexistem, pois o que a Constituição lhe outorgou foi tão somente as atribuições elencadas no artigo 84, incisos I usque XXXVII, além da possiblidade de responder pela prática de crimes de responsabilidade, previstos no artigo 85, incisos I a VII, da CF/88, ao alvedrio da autorização por 2/3 da Câmara dos Deputados para ser submetido ou não a julgamento pelo Senador Federal, e na hipótese da prática de crime comum, obedecendo a mesma regra de submissão, perante ao Supremo Tribunal Federal (STF), de acordo com a previsão do artigo 86 da CF/88.

            Nesse sentido, tão clarividente está que apenas os Poderes Legislativo e Judiciário são dotados de imunidades e privilégios, bastando para tanto perquirir as regras constitucionais, infraconstitucionais e administrativas, para que fiquem claramente demonstrados. Situação bem diferenciada, como alhures apontada, vivida na França, berço da Declaração Universal dos Direitos Humanos e das liberdades, onde há previsibilidade do foro especial por prerrogativa de função, é dirigida somente para o Presidente, o primeiro ministro e os ministros de Estado.

            No que concerne as decisões do STF, quanto ao julgamento que invalidou as provas coletadas na residência de Paulo Bernardo, além de libertá-lo liminarmente e de modo monocrático, por meio do ministro relator, Dias Toffoli, revestem-se de totais ilegalidades, uma vez que houve usurpação da competência do STF, por inobservância das regras do juiz natural, cuja competência é fixada em lei para processar e julgar. Ademais, o princípio do juiz natural prevê que a presença de regras objetiva de competência jurisdicional, com a garantia da independência e a imparcialidade do órgão julgador. Este princípio está ligado à vedação dos tribunais de exceção, excluído de prévia competência constitucional.

            Por conseguinte, a mácula da inconstitucionalidade é contaminada através das duas precitadas decisões do STF, a primeira de contaminar os elementos probatórios colhidos pela Polícia Federal, em cumprimento ao mandado de busca e apreensão emanado pelo Juiz Federal de São Paulo, na residência do investigado Paulo Bernardo, único alvo das diligências, além deste não ser mais possuidor do foro especial por prerrogativa de função.

            No pertinente a efetivação do mandado de busca e apreensão, cumprido na residência do casal, Paulo Bernardo e Gleisi Hoffmann, embora esta, à época, ser possuidora do foro especial por prerrogativa de função, o mandado não estava direcionado para apurar conduta da parlamentar, mas tão somente do seu então marido Paulo Bernardo, desprovido do foro especial. Por outro lado, como já mencionado alhures, quando a Constituição Federal vigente disciplinou as imunidades e prerrogativas dos parlamentares, não conferiu exclusividade ao STF, para determinar medidas de busca e apreensão nas dependências das duas Casas (Câmara e Senado).

Em outras palavras, a Constituição Federal de 1988 não previu a “prerrogativa de foro a locais”, por conseguinte o mero fato de que á medida cautelar necessita ser cumprida na residência do investigado, Paulo Bernardo, marido de uma senadora, não enseja a competência do STF, uma vez que o investigado não é parlamentar. Ora, nesse caso, a coerência é relevante, se não existe exclusividade por parte do STF de determinar a medida cautelar nos âmbitos da Câmara e do Senado Federal, como pode haver extensão da mesma medida em residência comum?

Nesse prisma, vale trazer a lume, conforme analisado acima, as provas coletadas pela Polícia Federal por decisão do Juiz Federal Criminal de 1ª Instância seriam nulas na hipótese de que a pessoa investigada fosse uma parlamentar, mas como, in casu, estas foram direcionadas a um investigado que não gozava do foro especial por prerrogativa de função, portanto, as provas podem ser consideradas válidas para todos os efeitos legais.

Ademais, embora não tenha havido usurpação da competência do STF, mas reconhecida pela 2ª Turma da Corte Maior, este questionamento não chegou a contaminar os elementos probatórios coletados pela Polícia Federal, no pertinente a Paulo Bernardo, porque ele não possuía foro por prerrogativa de função.

Por outra monta, embora tenha ocorrido a inobservância das regras do juiz natural, no caso, o Juiz Federal Criminal de Primeira Instância, também, não acarreta nulidade das provas coletadas, cuja produção prescindem de prévia autorização judicial.

Na realidade fática e de direito, conforme acima explanado, o ministro Dias Toffoli do STF, deveria ter-se declarado suspeito de atuar no julgamento que anulou as provas coletadas pela Polícia Federal, e na decisão monocrática que libertou o investigado Paulo Bernardo, na data de 26/06/2018, conforme prevê o inciso I, do artigo 145, do CPC/2015, em vista de que, a Revista Veja, edição nº 2647, na data de 15/12/2016, publicou informações relacionadas a conversas com laços de amizade, entre o ministro Dias Toffoli e Carlos Gabas, alvo de investigação pelo desvio de R$ 100 milhões de reais do Ministério do Planejamento, juntamente com Paulo Bernardo e outros envolvidos na Operação Custo Brasil, cuja notitia criminis fez parte do Relatório da Polícia Federal.

            Em face dessas informações, o PGR, Rodrigo Janot, incumbiu-se de analisar o pedido de afastamento do ministro Dias Toffoli, do STF, dos fatos relacionados à Operação Custo Brasil, que envolve o suposto pagamento de propinas ao ex-ministro, Paulo Bernardo.

            Diante desse contexto, centrado nos fundamentos das razões de fato e de direito, cujo conteúdo fático revela que essas atividades geram insegurança jurisdicional, onde no ponto de vista legal, convivemos presentemente com um caos jurídico, perante as constantes mudanças de posicionamento de nossos tribunais, com ênfase no âmbito do Supremo Tribunal Federal, adepto a discricionaridade de forma ilimitada e irrestrita nas decisões judiciais, por parte de alguns membros da segunda Turma do STF, acreditando que têm poderes supremos, afastando-se da obrigação de perseguir padrões atinentes da sociedade, mormente de princípios morais.

            Destarte, todos esses atos refletem um sentido de desconfiança no jurisdicionado, acrescendo a litigiosidade, convertendo em letra morta o princípio razoável da durabilidade do processo, inclusive de provocar grande prejuízos de ordem econômica, uma vez que, sem a segurança jurídica a atividade econômica passa a ter alto grau de risco.

JACINTO SOUSA NETO – ADVOGADO – CONSULTOR JURÍDICO E LITERÁRIO.

        

Sobre o autor
Jacinto Sousa Neto

Advogo nas área de direito civil, trabalhista e em procedimentos administrativos (sindicância e processo administrativo), além disso sou escritor e consultor jurídico.

Informações sobre o texto

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