A DISPENSA DO EXAME CRIMINOLÓGICO
Rogério Tadeu Romano
Originariamente disposto no artigo 8º da LEP (Lei de Execução Penal), o exame criminológico tem por objetivo a correta aplicação da pena de forma individualizada, como forma de adequar às características pessoais de cada preso.
Tal análise abrange questões de ordem psicológica e psiquiátrica do apenado, tais como grau de agressividade, periculosidade, maturidade, com o finco de prognosticar a potencialidade de novas práticas criminosas.
O exame criminológico é uma espécie exame da personalidade e parte “do binômio delito-delinquente, numa inteiração de causa e efeito, tendo como objetivo a investigação médica, psicológica e social”, como se observa da Exposição de Motivos da Lei de Execuções Penais. No exame criminológico, a personalidade do criminoso é examinada em relação ao crime em concreto, ao fato por ele praticado, pretendendo-se com isso explicar a “dinâmica criminal(diagnostico criminológico), propondo medidas recuperadoras(assistência criminiátrica)”, e a avaliação da possibilidade de delinquir(prognóstico criminoso), como dizia Sérgio Marcos de Moraes Pitombo(Ainda o exame criminológico, Jornal do Advogado, junho de 1985 e os regimes de cumprimento da pena e o exame criminológico, RT 583/3013, pág. 315).
Compõem o exame criminológico, como instrumentos de verificação as informações jurídico-penais; o exame clínico; o exame neurológico; o exame eletrencefalográfico; o exame psiquiátrico; e o exame social. Assim essa pericia deve fornecer a síntese criminológica.
Alertou ainda Sérgio Pitombo(obra citada, pág. 315) que é preciso, contudo, não privilegiar em demasia o exame criminológico. A valoração cabe, sempre, ao juiz da execução, livre no apreciá-lo.
Entenda-se, como disse Sérgio Salomão Shecaira(O exame criminológico e a execução da pena, Cadernos de Advocacia Criminal, ano I, volume I, n. 2, páginas 36 a 41) que a perícia criminológica assim como da personalidade, colocadas em conjugação, tendem a fornecer elementos para a percepção das causas do delito e indicadoras para a sua prevenção.
Com a redação dada pela Lei nº 10.792 de 2003 alterou significativamente o artigo 112 da Lei de Execuções Penais, substituindo a necessidade do exame criminológico para a progressão de regime por um simples atestado de bom comportamento carcerário. Hodiernamente, fica a critério do magistrado requerer quando achar necessário o exame, desde que fundamentadamente.
Assim, foram suprimidas essas exigências, impondo o legislador o cumprimento do mínimo de um sexto da pena imposta e atestado de bons antecedentes, fornecido pela direção do estabelecimento penitenciário.
Tal modificação legislativa, não obsta o magistrado de determinar tais exames, conforme entendimento consolidado dos Tribunais Superiores, desde que o juiz da execução profira sua decisão fundamentadamente, senão vejamos:
PENA - REGIME DE CUMPRIMENTO - PROGRESSÃO - EXAME CRIMINOLÓGICO INEXIGIBILIDADE.A previsão de exigência do exame criminológico, para a análise relativa aos benefícios a que tem jus o custodiado, foi excluída do artigo 112 da Lei de Execuçoes Penais mediante a Lei nº 10.792/2003. (STF – HC: 115212 SP – SÃO PAULO 9966338-20.2012.0.01.0000, Relator Min. MARCO AURÉLIO, Data de Publicação: DJe-237 25-11-2015).
Para o regime fechado a Lei de Execuções Penais instituiu o exame criminológico para classificação dos condenados, o que será feito pela Comissão Técnica de Classificação, encarregadas de elaborar o programa individualizador e acompanhar a execução das penas, propondo a autoridade competente as progressões e regressões devidas.
Essa Comissão será presidida pelo diretor e será composta, no mínimo, por dois chefes de serviço, um psiquiatra, um psicólogo e um assistente social.
Com relação a matéria o STF editou a Súmula 439 afirmando a admissibilidade do exame criminológico sempre que as peculiaridades do caso vierem a recomendar
Recentemente o STJ, no julgamento do HC 431.433, entendeu que a exigência de exame criminológico para a progressão de regime deve ser bem fundamentada.
Consoante se lê do site do STJ, em 5 de janeiro de 2018, apenas a gravidade do delito cometido não justifica a necessidade de realização de exame criminológico para concessão de progressão de regime. Com esse entendimento, a ministra Laurita Vaz, presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), deferiu liminar em habeas corpus para afastar exigência do exame criminológico. Ela ainda determinou que o juízo de Execuções Penais prossiga no exame dos requisitos para a progressão de regime do condenado.
Naquele caso em análise, o paciente foi condenado a 14 anos de prisão por homicídio qualificado. As instâncias ordinárias, a fim de examinar o requisito subjetivo para a progressão de regime (do fechado para o semiaberto), determinaram a realização de exame criminológico.
A defesa sustentou que “a justificativa da gravidade do fato, por si só, não abona a submissão do paciente à perícia, sendo que inexistem nos autos elementos outros que recomendem a medida pretendida pelo juiz a quo”.
Segundo a presidente, nos termos da jurisprudência do STJ, embora a nova redação do artigo 112 da Lei n. 7.210/84 não mais exija, de plano, a realização de exame criminológico, cabe ao magistrado verificar o atendimento dos requisitos à luz do caso concreto. Assim, ele pode determinar a realização de perícia, se entender necessário, ou mesmo negar o benefício, desde que o faça fundamentadamente, quando as peculiaridades da causa assim o recomendarem, em observância ao princípio da individualização da pena.
Entretanto, ao examinar os autos, a presidente do STJ verificou que as instâncias ordinárias se basearam apenas na gravidade do delito cometido para concluir pela necessidade de realização do exame criminológico, antes de analisar o pedido de progressão.
“Nesses casos, tem decidido este STJ no sentido de que ‘há flagrante ilegalidade a ser reconhecida, uma vez que o tribunal de origem não logrou fundamentar a necessidade da realização do exame criminológico. Restringiu-se a mencionar a gravidade em abstrato dos delitos cometidos pela paciente, a reincidência específica, bem como a necessidade, em tese, da realização de exame criminológico para aferir as condições meritórias da apenada, necessárias à concessão de benefícios da execução penal’”, ressaltou a ministra.
É pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que cumpre ao julgador verificar, em cada caso, a necessidade, ou não, de realização do exame criminológico, podendo dispensá-lo ou, ao contrário, determinar sua realização, desde que mediante decisão concretamente fundamentada na conduta do apenado no decorrer da execução, nos termos da Súmula 439/STJ.
Fatores relacionados ao crime praticado são determinantes da pena aplicada,mas não justificam diferenciado tratamento para a progressão de regime, de modo que o exame criminológico somente poderá fundar-se em fatos ocorridos no curso da própria execução penal (HC 323553/SP, Sexta Turma, Relator Ministro Nefi Cordeiro, julgado em 18/8/2015, DJe 3/9/2015)
Observe-se então:
AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME AO SEMIABERTO DEFERIDA PELO JUIZ DA EXECUÇÃO. DECISÃO CASSADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE EXAME CRIMINOLÓGICO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA.1. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que, de acordo com o art. 112 da Lei de Execução Penal, com a redação dada pela Lei n. 10.792/2003, não há mais a exigência de submissão do condenado ao exame criminológico, podendo o Juiz ou mesmo o Tribunal de origem determinar sua realização, diante das peculiaridades do caso concreto e de forma fundamentada. 2. O Juiz da execução encontra-se mais próximo à realidade do caso concreto, podendo com muito mais propriedade distinguir as situações em que se mostra desnecessária a realização do exame (HC n. 196.913/SP, Ministra Maria Thereza, Sexta Turma, DJe 30/5/2011).
Assim, desde a Lei nº 10.792/2003, que conferiu nova redação ao art. 112 da Lei de Execução Penal, aboliu-se a obrigatoriedade do exame criminológico como requisito para a concessão da progressão de regime, cumprindo ao julgador verificar, em cada caso, acerca da necessidade, ou não, de sua realização, podendo dispensá-lo ou, ao contrário, determinar sua realização, mediante decisão concretamente fundamentada na conduta do apenado no decorrer da execução.