RESUMO: O presente trabalho tem por fito investigar o contrato de time-sharing turístico, designando o conceito desta modalidade de contrato excepcional, bem como apresentar as categorias deste instituto presentes no ordenamento jurídico nacional. Esta nova categoria contratual, bastante difundida no mundo, a pouco soprou seus ventos no Brasil, e a cada dia que passa ganha mais adeptos, isto porque por uma “modica” quantia pode o contratante obter vantagens de uso e gozo em empreendimentos turísticos de luxo, por um determinado período do ano. Desta forma, objetiva-se analisar se há nesta modalidade contratual o respeito ao direito à informação e à boa-fé contratual. Sabe-se que por ser um contrato turístico, uma modalidade contratual do direito do consumidor, e por ser o time-sharing uma modalidade incomum de contrato turístico, ele será regido pelo Código de Defesa do Consumidor. Logo, o propósito do presente artigo é justamente o de verificar se há o devido respeito às formas corretas de celebração contratual, se todas as informações constantes no contrato são verídicas e adimplíveis, se há obstáculo para a rescisão e respeito aos preceitos descritos no Código de Defesa do Consumidor. Para tanto, pretende-se analisar doutrinas e artigos científicos que trabalham o assunto.
Palavras-chave: Direito do consumidor. Contrato de time-sharing. Cláusulas abusivas
INTRODUÇÃO
O denominado “time-sharing” consiste em uma modalidade contratual capaz de trazer diversos benefícios para consumidores e fornecedores de serviços turísticos. Embora, diversas ações jurídicas questionem contratos de time-sharing turístico pelos mais diversos motivos; sendo, na maioria deles, pelo alto índice de práticas abusivas de venda que submetem o consumidor a uma pressão psicológica antes da efetivação do contrato, além da utilização de propagandas e informações falsas e a prestação de serviços dissonantes do pactuado. Diante disso, diversos consumidores buscaram a rescisão, e, diante da recusa das empresas, vem aumentando a quantidade de ações judiciais requerendo a rescisão dos referidos contratos (FIDALGO, 2017).
As situações de práticas abusivas supracitadas fazem com que os consumidores busquem a rescisão unilateral dos contratos de time-sharing turístico. Contudo, em face da recusa ou procrastinação por parte da empresa em atuar conforme requerido, não resta alternativa ao consumidor senão buscar auxílio judicial. O consumidor conta com amplo suporte legal e jurisprudencial para tutelar seus interesses, sendo estes amparados pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), bem como pelo Código Civil Brasileiro, possibilitando a rescisão contratual e a devolução integral dos valores pagos, com juros e correção monetária, bem como a anulação do contrato, caso este tenha sido realizado com base em erro, dolo ou coação (NICODEMOS, 2013).
Por um lado, o contrato de time-sharing turístico consiste em relevante instrumento para fomentar o dinamismo no mercado turístico, principalmente em períodos de baixa temporada. Porém, muitas vezes, são adotadas práticas ilícitas e abusivas, por parte das empresas que atuam no ramo. Por este motivo, e para evitar este tipo de situação, é fundamental que o consumidor esteja a par dos direitos que lhe são garantidos pelo Código consumerista, afim de não se deixar influenciar indevidamente. (NICODEMOS, 2013)
O objetivo do presente artigo é analisar criticamente as práticas e cláusulas abusivas constantes no contrato de time-sharing e aproximar o consumidor da realidade clausular deste contrato, através da elucidação dos direitos contidos no CDC, repudiando as práticas ilícitas e celebrando o negócio proposto apenas quando puder proferir seu consentimento livre e informado.
1. O CONTRATO DE TIME-SHARING
1.1 Breve histórico do contrato de time-sharing
A expressão inglesa time-sharing, que significa “tempo compartilhado”, foi utilizada, inicialmente, na programação de computadores, de forma a definir o processo de alternância entre os diversos sistemas operacionais de informática, permitindo ao usuário o acesso simultâneo a várias tarefas (FONSECA, 2018).
O time-sharing como uma forma de contrato nasceu no pós-guerra, por volta de 1960, para fazer frente à recessão econômica e permitir o uso compartilhado de casas de veraneio (vacation home sharing) (FONSECA, 2018). O contrato permitia às famílias adquirir sem onerar-se com pesados custos de aquisição e manutenção, dessa forma, por este tipo contratual, um grupo de pessoas adquire, conjuntamente, a propriedade de um bem imóvel e reveza-se, no tempo, para seu uso, gozo e fruição, o que possibilita usufruir do bem por um custo bem mais acessível (NICODEMOS, 2013).
Posteriormente, em 1974, o sistema foi introduzido nos EUA pela empresa Caribbean International Corporation no compartilhamento de "licenças de uso" (vacation license) em quartos de seus resorts (FONSECA, 2018). Nesses contratos de time-sharing turístico, não há a aquisição da propriedade de um imóvel, são adquiridos créditos que são convertidos em diárias de hotéis. Sendo assim, ao contrário do que acontece em um contrato de time-sharing imobiliário, em que há aquisição de um direito real de propriedade, no contrato de time-sharing turístico, os direitos adquiridos têm natureza pessoal (NICODEMOS, 2013).
O time-sharing turístico é muito difundido na Europa e nos Estados Unidos e destina-se, principalmente, ao planejamento de férias em família. Já no Brasil, embora venha ganhando espaço desde a década de noventa, a maioria dos brasileiros, dada sua relativa novidade no mercado nacional, ainda não está familiarizada com este modelo e suas peculiaridades, o que aumenta o número de abusos por empresas que atuam no ramo (NICODEMOS, 2013).
1.2 Definição do instituto, modalidades e características
O contrato de time-sharing, também conhecido como de multipropriedade, de tempo compartilhado, dentre outros, é caracterizado como um contrato múltiplo e complexo, que visa ao uso habitacional de um empreendimento turístico ou de vários, assim como ao uso de uma rede de serviços conexos a esta fruição, por certo tempo e em determinados períodos do ano. O contratante adquire o direito de hospedagem em um imóvel com uma estrutura turístico-hoteleira, como pousada, chalé, bangalô, apartamento, entre outras, por um determinado tempo até o período de validade do contrato (NICODEMOS, 2013; PISTORI, GLITZ, 2015).
Consiste o instituto em um tipo de contrato em que o co-titular passa a ter o direito de ocupar um determinado espaço de forma exclusiva e durante certo período anual, podendo, em determinadas situações, converter o número de créditos/pontos acumulados por uma semana de estadia em algum lugar diferente ou até mesmo em empreendimentos no exterior, o que é denominado de “clube de férias” ou “programa de férias”. Para tanto, o adquirente deve efetuar o pagamento de determinado preço como contraprestação pela utilização de unidades hoteleiras por um determinado tempo, realizando o pagamento antecipado pelo gozo de férias futuras, mediante a obtenção de um título de afiliação, além do pagamento de uma taxa de manutenção periódica, podendo o consumidor converter os montantes pagos em diárias de hotéis (NICODEMOS, 2013; PISTORI, GLITZ, 2015).
O contrato de time-sharing foi feito para o público que procura uma oportunidade de desfrutar de contratos turísticos, mas com um custo-benefício mais atraente, permitindo a sua hospedagem em locais de reconhecido potencial turístico. Este contrato permite o gozo dos serviços em períodos de lazer ou de férias, o que torna uma opção vantajosa, pois o consumidor tem à sua disponibilidade um imóvel com atrativo turístico, sem a necessidade de assumir os custos de manutenção, típicos de casas de serra ou de praia (GARBI JUNIOR, 2012).
Como regra, a propriedade pertence a um ou mais empreendedores que concebem e organizam sua fruição periódica pelos próprios titulares, ou por terceiros, mediante cessão livre ou pagamento de determinadas cotas pelas unidades de tempo (diárias), além de, necessitar do pagamento de taxas extras para realizar a manutenção, reparo, ampliação ou modernização do negócio (FONSECA, 2018).
A administração desses imóveis normalmente é feita por ou repassada a empresas de gestão em hotelaria, com expertise no ramo, o que favorece a relação jurídica e ainda colabora para a melhoria na qualidade do serviço, tornando mais fácil a manutenção dos imóveis pelos padrões de hotelaria. Porém, a falta de uma legislação própria trouxe grandes incertezas para os adquirentes, os quais são os mais vulneráveis na relação. Sendo assim, cada país evoluiu o conceito de multipropriedade e sua forma de aplicação de forma diferente (GARBI JUNIOR, 2012).
A doutrina costuma referir-se a três tipos de multipropriedade, a primeira - acionária ou societária - está relacionada a uma sociedade, que é proprietária de bem destinado ao lazer, em que podem ser emitidas ações que permanecem em poder de seus proprietários e ações que podem ser vendidas a sócios-usuários e apresentam um direito de uso por turnos (unidades de tempo) previamente definidos em contrato. Já na segunda - direito real de habitação periódica -, a multipropriedade seria um direito real de fruição da coisa alheia por unidade de tempo. Na terceira - copropriedade imobiliária ou de complexo de lazer -, cada multiproprietário detém uma quota da fração ideal do solo, da edificação e dos aparatos de lazer, ficando a cargo desses, decidir como usá-los e se compartilhá-los em determinados períodos de tempo ao longo do ano (FONSECA, 2018).
Portanto, o contrato de time-sharing turístico não é, em si, abusivo ou ilícito, pelo contrário, pode vir a ser bastante vantajoso para o consumidor, porém as informações inverídicas prestadas pelos vendedores podem fazer com que venham a surgir problemas, como ilicitude e abusividade, levando os consumidores a graves prejuízos. Sendo assim, é de extrema importância que o consumidor esteja muito atento aos seus direitos garantidos pela lei, para evitar possíveis conflitos.
2 AS DENOMINADAS PRÁTICAS E CLÁUSULAS ABUSIVAS E O DIREITO DO CONSUMIDOR
2.1 Conceito e exemplos de práticas abusivas
Quando se fala em direito do consumidor, o ordenamento jurídico nacional se preocupa mesmo em equilibrar a balança que pende sempre para o lado do fornecedor hipersuficiente. Tanto é verdadeira essa afirmação que o CDC regulamenta a disciplina práticas abusivas em vários dos seus dispositivos. Recepcionando também que
os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e equidade. (BRASIL, 1990).
Sendo assim, pode-se afirmar que as práticas abusivas são em suma bastante variadas, e que o CDC sozinho não conseguiria cuidar de todas elas.
Oliveira (2016), de maneira lato sensu, considera a prática abusiva como aquela “realizada em desconformidade com os padrões mercadológicos de boa conduta em relação ao consumidor”. E conforme os ensinamentos de Miragem (2016), pode ser considerada como prática abusiva toda a “atuação do fornecedor no mercado de consumo, que caracterize o desrespeito a padrões de conduta negociais regularmente estabelecidos, tanto na oferta de produtos e serviços, quanto na execução de contratos de consumo, assim como na fase pós-contratual”. Em sentido amplo, as práticas abusivas englobam toda a atuação do fornecedor em desconformidade com padrões de conduta reclamados, ou que estejam em desacordo com a boa-fé e a confiança dos consumidores.
De forma mais contundente é no art. 39 do CDC, cujo título é “práticas abusivas”, que encontram-se previstas as práticas proibidas por ensejarem abuso ao consumidor. É importante destacar que as condutas discriminadas no referido artigo, são meramente exemplificativas, visto que o legislador não teria condições de elencar todas as práticas abusivas existentes.
As práticas abusivas ligam-se a dois vieses distintos, um de origem produtiva, ou seja, como o nome indica ligadas a produção, como por exemplo a elencada no inciso VIII do art. 39, “Produção de produtos e serviços com desrespeitos a normas técnicas”; e outro de origem contratual, que se subdividirá em três: pré-contratuais, contratuais propriamente ditas e pós-contratuais, tudo isso a depender do momento em que sobrevierem.
As práticas abusivas pré-contratuais são aquelas empreendidas conforme a descrição dos incisos I, II e III do art. 39 do CDC, que se estabelecem da seguinte forma:
I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos; II - recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes; III - enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço. (BRASIL, 1990).
Ainda neste esteio, restarão configuradas como práticas abusivas pré-contratuais as descritas no art. 40 do CDC, o qual prevê:
O fornecedor de serviço será obrigado a entregar ao consumidor orçamento prévio discriminando o valor da mão-de-obra, dos materiais e equipamentos a serem empregados, as condições de pagamento, bem como as datas de início e término dos serviços. § 1º Salvo estipulação em contrário, o valor orçado terá validade pelo prazo de dez dias, contado de seu recebimento pelo consumidor. § 2° Uma vez aprovado pelo consumidor, o orçamento obriga os contraentes e somente pode ser alterado mediante livre negociação das partes. § 3° O consumidor não responde por quaisquer ônus ou acréscimos decorrentes da contratação de serviços de terceiros não previstos no orçamento prévio. (BRASIL, 1990).
As chamadas práticas abusivas pós-contratuais são elencadas no inciso VII do art. 39 do CDC. Consta neste inciso, dentre outras práticas abusivas, a de “divulgar informações depreciativas sobre o consumidor, referente a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos”. Há ainda, as cláusulas relativas à falta de peças de reposição (art.32) e as relativas à cobrança de dívidas (art. 42) do CDC.
Com a finalidade de inibir a conduta de práticas abusivas, o CDC prevê várias sanções que podem ser de natureza penal ou administrativa. São exemplos de sanções de natureza administrativa a cassação de licença, a interdição, a suspenção das atividades, e também a intervenção administrativa. No tocante as sanções de cunho penal, há as previstas nos Capítulos XII e XII do CDC, e ainda consta no art. 6° a possibilidade do requerimento por parte dos consumidores lesados de indenização por danos causados, moral ou materialmente.
Frisa-se que, com base no art. 28 do CDC, a realização de práticas abusivas reiteradamente pode culminar na desconsideração da personalidade jurídica, e que com base no art. 84 do mencionado código, poderá o magistrado determinar a aplicação de multa como forma de punição.
2.2 Conceito e exemplos de cláusulas abusivas
A matéria cláusulas abusivas é tratada no CDC a partir do art. 51. Assim como na parte em que trata de condutas abusivas, o legislador ao disciplinar sobre as cláusulas abusivas somente o fez de forma exemplificativa. Destarte, as cláusulas contratuais que se assemelharem às descritas no art. 51 e seus incisos configurarão cláusulas abusivas. Pois bem, no que tange ao conceito de cláusulas abusivas, assevera Miragem (2016) que são elas “as cláusulas contratuais em razão das quais o consumidor se vê submetido ao fornecedor, em face de seu próprio conteúdo, ou do modo como foram inseridas no contrato”.
Em outras palavras, pode-se afirmar que o caráter abusivo de certas disposições contratuais decorre da posição dominante do fornecedor hipersuficiente em relação ao consumidor hipossuficiente, que acaba por permitir a imposição unilateral de condições contratuais prejudiciais aos interesses legítimos dos consumidores. Sendo assim, tais cláusulas violam a boa-fé objetiva, esteio mor da relação entre consumidores e fornecedores.
O que difere as cláusulas abusivas das demais cláusulas contratuais é justamente o fato delas comprometerem o equilíbrio contratual, fazendo com que o fornecedor obtenha vantagens extremamente superiores em relação ao consumidor. Outra forma de se manifestarem nos contratos é por meio da falta de apresentação prévia ao consumidor, ou por omissão de informações importantes, violando assim o direito de informação do consumidor.
A proteção do consumidor em relação às cláusulas abusivas se estabelece, segundo a previsão normativa do CDC, a partir de duas técnicas: o caráter enumerativo ou exemplificativo (numerus apertus) das espécies de cláusulas abusivas previstas no artigo 51 do CDC, e a sanção de nulidade da cláusula, permanecendo válido o restante do contrato (a redução do negócio jurídico), admitindo-se a invalidade total apenas quando, conforme o artigo 51, § 2º, “de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes".
Outro importante direito ofertado ao consumidor, por meio do qual se busca a proteção do mesmo contra práticas e cláusulas abusivas, é o denominado “direito de arrependimento”. Em seu art. 49, o CDC prevê o direito dos consumidores de desistirem do contrato, “no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial”. (BRASIL, 1990). A intenção do legislador ao prever tal direito está relacionada à preservação da vontade livre e racional do consumidor, permitindo uma decisão segurada e bem pensada, além de resguardá-lo contra táticas agressivas de venda, as quais muitas vezes são praticadas na celebração dos contratos de time-sharing. (FIDALGO, 2017; NICODEMOS, 2013; PISTORI, GLITZ, 2015).
Caso seja efetuado o direito de arrependimento, com rescisão unilateral do contrato, os valores eventualmente pagos deverão ser devolvidos de imediato e monetariamente atualizados, conforme dispõe o parágrafo único do art. 49 do CDC (BRASIL, 1990). Vale ressaltar que, embora haja um prazo previsto para exercício do supracitado direito, é possível que seja declarada a abusividade do contrato com fundamento em vários dispositivos do CDC, consoante dissertam Pistori e Glitz (2015), possibilitando a rescisão contratual e a devolução dos valores pagos. Ademais, ainda em conformidade com os autores, “o §1º do artigo 12 da Deliberação Normativa nº 378/97 da Embratur reforça o direito de arrependimento do consumidor, com a devolução integral dos valores pagos”.
O direito à informação e o direito ao arrependimento estão entre os mais relevantes para os consumidores, em contrapartida, também se encontram dentre aqueles direitos que mais frequentemente são desrespeitados na contratação do time-sharing turístico.
3.2 Principais práticas e cláusulas abusivas encontradas nos contratos de time-sharing turístico
Consoante Pistori e Glitz (2015), a massificação e o aumento da propagação dos contratos de time-sharing no Brasil, aliados ao fato de inexistir no país legislação específica que os regule, terminam por encorajar a introdução de uma série de cláusulas abusivas em tais contratos por parte dos fornecedores. Estes, por sua vez, ignoram as determinações legais acerca dos direitos dos consumidores e instituem cláusulas que os oneram de modo excessivo, restringem direitos e impõem sanções desproporcionais, além de os submeterem a práticas abusivas como as já mencionadas neste trabalho. Tais comportamentos acabam ocasionando o denominado desequilíbrio contratual.
Embora haja expressa proteção legal ao direito do consumidor de obter completas e verossímeis informações quanto aos serviços a serem prestados, bem como de se arrepender do contrato efetuado sob determinadas circunstâncias, especialmente no caso de contratos complexos como o de time-sharing; na prática, em grande parte das vezes, os referidos direitos não são observados quando da contratação de tais serviços. Este é um dos principais problemas relacionados ao contrato de time-sharing turístico, posto que as técnicas agressivas utilizadas quando da celebração do mesmo muitas vezes não permitem que o consumidor expresse sua vontade de modo verdadeiramente livre e consciente. (FIDALGO, 2017; NICODEMOS, 2013; PISTORI; GLITZ, 2015).
O desrespeito aos seus direitos obriga os consumidores, em grande parte das vezes, a buscar proteção judicial dos mesmos. Nesta esteira, o Judiciário tem exercido papel relevante na defesa do consumidor contra os abusos nos contratos em comento, sendo possibilitadas a rescisão ou a anulação contratuais nas situações em que o consumidor é submetido a práticas e cláusulas abusivas. (NICODEMOS, 2013; PISTORI, GLITZ, 2015). De acordo com Marques apud Pistori e Glitz, ao realizar uma análise das ações envolvendo contratos de time-sharing por volta de 1997, as cláusulas constantes de tais contratos mais frequentemente contestadas em Juízo seriam:
a cláusula penal, a cláusula de perda das quantias pagas, a cláusula mandato, a cláusula de eleição de foro, a cláusula de vencimento antecipado dos débitos, a cláusula que permite a rescisão unilateral pelo fornecedor do contrato, as cláusulas de carência ou de limitação dos direitos de uso, as cláusulas que permitem a variação do preço e as cláusulas que limitam a utilização dos serviços conexos ao complexo de lazer. (PISTORI; GLITZ, 2015, p.16).
Dentre as demandas mais atuais encontradas na jurisprudência brasileira, as reclamações quanto aos contratos de time-sharing turístico que dizem respeito a cláusulas abusivas estão relacionadas principalmente ao uso de propagandas e informações falsas, repletas de omissões acerca de aspectos relevantes do serviço a ser prestado, ferindo o direito à informação; à deficiência dos serviços prestados, sendo estes falhos ou muito divergentes do que foi pactuado, ou, em alguns casos, até mesmo não executados, de modo totalmente diverso do que se encontra previsto nas cláusulas contratuais; à cláusula de eleição de foro; e às cláusulas que impedem o exercício do direito de arrependimento pelo consumidor, penalizando-o nesta situação através de percentual excessivo da multa por rescisão antecipada do contrato, sendo a multa, muitas vezes, cumulada ainda com outras retenções e indenizações indevidas. (NICODEMOS, 2013; PISTORI, GLITZ, 2015).