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Os momentos de oposição das exceções processuais no CPPM

Agenda 11/11/2020 às 12:00

O presente artigo visa analisar as exceções processuais no Codex Processual Castrense numa visão crítica ao seu procedimento legal

          Via de regra a instituto da exceção processual pode ser vista como um direito público subjetivo da parte de ter seu processo julgado sem qualquer mácula ou vício nos campos da existência e validade da relação processual e, em sentido oposto, representa uma obrigação para o Parquet Militar, na condição de fiscal da lei, em garantir que o processo siga seu correto curso sem qualquer intercorrência, mesmo que ao final proponha a absolvição do réu.

Dessa forma,  bem ressalta Nestor Távora:

“...Nada impede que a ferramenta seja também utilizada pela acusação, já que as exceções levantam questões atinentes aos pressupostos processuais e às condições da ação. Exceção é, em sentido amplo, defesa, isto é, a forma pela qual a parte passiva se opõe a uma pretensão. De tal maneira, se temos ação de um lado, do outro temos exceção. A exceção se opõe à ação. O autor “pede” na ação, enquanto o réu “impede” na exceção. O demandante “insiste” na ação, enquanto o demandado “resiste”. Podemos dizer que ação e exceção são dois lados de uma mesma moeda que se chama processo...”.

           Dentro da estrutura do Código Processo Penal Militar (CPPM), pode ser vista como uma defesa indireta do mérito, que sendo julgada antes dele, tem como finalidade apenas dilatória (procrastinando a entrega da tutela jurisdicional ou retardando a marcha do processo) ou peremptória (visa dar fim abrupto a ação penal militar, levando a sua extinção sem análise do mérito).

           O Código de Processo Penal Militar elenca os seguintes tipos no artigo 128:

(...)

a) suspeição ou impedimento;

b) incompetência de juízo;

c) litispendência;

d) coisa julgada.

         Apenas por referência doutrinária, Cícero Coimbra observa “...que Célio Lobão parece admitir também a exceção de ilegitimidade da parte, embora não não teça minúcias a essa exceção não constante no rol do artigo 128 do CPPM…”., contudo é importante esclarecer que tal exceção não existe no Código de Processo Penal Militar.

          A primeira exceção, de natureza dilatória, é concernente a um vínculo objetivo (impedimento) ou subjetivo (suspeição) que o órgão julgador tenha com a causa a ser julgada, no primeiro aspecto, ou com as partes ou questão de julgamento, no segundo aspecto, nascendo naquela situação um ato inexistente (artigo 37, parágrafo único,  do CPPM) ou nesta situação um ato nulo.

       Caso reconhecido o impedimento ou suspeição, o magistrado suspende a marcha do processo e remete os autos ao substituto legal. Do contrário, será instaurado um incidente em autos apartados a ser solucionado pelo E. Superior Tribunal Militar (E. STM) (artigo 132 do CPPM).

         Obviamente, ela é extensível ao Juiz Militar que faz parte do Conselho. 

       A segunda exceção, de natureza dilatória, visa manter um órgão judicial competente a frente do processo, evitando assim a nulidade de seus atos judiciais, ressalvando os atos probatórios que no entendimento do novo Juízo competente podem ser convalidados (artigo 507 do CPPM ).

       Ressalvando-se a incompetência relativa, que se convalida após ter passado o momento oportuno para alegar tal situação, como no caso da incompetência territorial (ratione loci).

      Acolhida a exceção pelo Órgão Julgador (Conselho ou Juiz monocrático), caberá recurso em sentido estrito (artigo 516, alínea f, do CPPM) da parte contrária, caso rejeitada, caberá recurso inominado (artigo 145 do CPPM), sendo ambos analisados pelo Corte Superior Castrense. 

      A terceira, de natureza peremptória, liga a tríplice identidade de dois processos (parte, pedido e causa de pedir), tem como finalidade evitar que uma mesma pessoa seja processada duas vezes pelo mesmo fato criminoso.

     Caso ocorra entre Auditorias distintas é possível falar nessa exceção, pois se for entre Justiça distintas será conflito de competência, seja negativo ou positivo. 

       A quarta, por sua vez, peremptória e decorrente logicamente da terceira,  visa evitar que um réu seja julgado por um mesmo fato do qual já há uma sentença transitada em julgado.     

       Importante relatar que do reconhecimento da coisa julgada caberá recurso de ofício para o Superior Tribunal Militar (artigo 154 do CPPM).

        Passada essas noções preliminares, o CPPM unificou seu momento processual de apresentação no prazo de 48 horas após a qualificação e interrogatório do acusado (artigos 143 e 407, ambos do CPPM), tendo como verdadeiro intento, presume-se, de manter a marcha processual numa mesma cadência e evitar um tumulto na instrução probatória.

      Contudo, observe-se que os próprios dispositivos legais se mostram incongruentes dentro Codex Processual Castrense, pois todas as exceções processuais, com a ressalva da incompetência relativa, são de ordem pública e podem ser alegadas a qualquer tempo e grau no processo criminal, tanto antes como após a qualificação e interrogatório do acusado salvo após o trânsito em julgado, quando em prejuízo ao réu, pois não é possível a reformatio in societate.

       Nesse sentido bem orienta Renato Brasileiro quando comenta que:

(...)A arguição de suspeição deve preceder a qualquer outra, salvo quando fundada em motivo superveniente. De fato, a verificação da imparcialidade do magistrado deve preceder a análise de qualquer outra questão processual ou de mérito. Caso o motivo ensejador da suspeição seja conhecido previamente pelo Ministério Público ou pelo querelante, haja vista anterior distribuição do inquérito policial perante determinado juiz, caberá à acusação apresentar a exceção de suspeição por ocasião do oferecimento da peça acusatória. Se, no entanto, a exceção for oposta pela defesa, esta deve ser arguida no momento de apresentação da resposta à acusação (CPP, art. 396-A). Se, no entanto, o juiz suspeito assumir a competência para o julgamento do feito durante o curso do processo, em virtude de licença, promoção ou convocação, por exemplo, do juiz antecessor, devem as partes opor a exceção tão logo tomarem conhecimento da falta de imparcialidade do magistrado.(...)

       Nesse sentido é a jurisprudência do E. Superior Tribunal Militar:

EMENTA: APELAÇÃO. RECURSOS DA DEFESA E DO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR. DESRESPEITO A SUPERIOR. VIOLÊNCIA CONTRA MILITAR EM SERVIÇO. DEVOLUÇÃO DA MATÉRIA DISCUTIDA NA PRIMEIRA INSTÂNCIA. TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APPELLATUM. VIOLÊNCIA CONTRA SUPERIOR. LESÃO CORPORAL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. PRESENÇA DOS ELEMENTOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS DOS TIPOS PENAIS. ALEGAÇÃO DE NÃO RECEPÇÃO DO ART. 88, INCISO II, ALÍNEAS "A" E "B", DO CPM, PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. IMPROCEDÊNCIA. APELO DEFENSIVO. DESPROVIMENTO. APELO MINISTERIAL. PROVIMENTO. DECISÃO UNÂNIME. PRESCRIÇÃO. VERIFICAÇÃO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. DECISÃO UNÂNIME. À exceção das matérias de ordem pública, que não são passíveis de alcance pela preclusão, o efeito devolutivo do recurso de apelação cinge-se ao alegado nas razões apresentadas pelas partes, em observância ao princípio do tantum devolutum quantum appellatum. Acertada a condenação pela incursão nos crimes de desrespeito a superior (art. 160, caput, do CPM) e de violência contra militar em serviço (art. 158, caput, do CPM), uma vez comprovado ter o réu agido de forma consciente e voluntária ao praticar as condutas delituosas. O denunciado era comprovadamente imputável à época dos fatos. Possuía autonomia de vontade, sendo capaz de entender o caráter ilícito de suas ações e de determinar-se de acordo com esse entendimento. Problemas psiquiátricos, assim como a ingestão de medicação de uso controlado juntamente com bebida alcoólica, não excluem a sua culpabilidade. Considerando ter sido a embriaguez produzida por ato voluntário do agente, deve incidir a teoria da actio libera in causa. Conforme precedentes desta Justiça Especializada, não se exige a efetiva lesão para a configuração do crime de violência contra militar de serviço, porquanto os bens jurídicos protegidos pela norma são a disciplina e a hierarquia militares. Mantém-se a condenação do réu à pena de 1 (um) ano e 15 (quinze) dias de reclusão, como incurso no art. 160, caput, e 158, caput, unificadas na forma do art. 79, tudo do CPM. Na esteira da jurisprudência do Excelso Pretório e desta Corte Castrense, carece de amparo jurídico a alegação de não recepção do art. 88, inciso II, alíneas "a" e "b", do CPM, pela Constituição da República, por ofensa aos princípios da proporcionalidade, da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, da CRFB/88) e da individualização da pena (art. 5º, inciso XLVI, da CRFB/88). No caso concreto, afasta-se o princípio do in dubio pro reo quanto ao crime de violência contra superior (art. 157 do CPM), uma vez comprovadas a materialidade, a autoria, bem como o dolo do graduado de perpetrar a agressão descrita na peça acusatória, culminando com a lesão corporal à integridade física do seu superior hierárquico, cabendo o enquadramento da conduta na forma qualificada, estabelecida no art. 157, § 3º, da Lei Penal Militar, que determina também a aplicação da pena do crime de lesão corporal (art. 209 do CPM). Apelação Ministerial provida, porém declarada a extinção da punibilidade em virtude da prescrição da pretensão punitiva, na forma retroativa, em relação aos delitos previstos nos arts. 157, § 3º, e 209, caput, do CPM. Decisão uniforme. Apelação Defensiva desprovida à unanimidade. (Superior Tribunal Militar. Apelação nº 7000965-02.2019.7.00.0000. Relator(a): Ministro(a) WILLIAM DE OLIVEIRA BARROS. Data de Julgamento: 20/08/2020, Data de Publicação: 17/09/2020)

EMENTA: APELAÇÃO. USO DE DOCUMENTO FALSO. ARTS. 311 E 315 DO CPM. COMPROVAÇÃO DE ESCOLARIDADE PARA INGRESSO NOS QUADROS DAS FORÇAS ARMADAS AMPARADA EM DOCUMENTO FALSO. CRIME CONTRA AS INSTITUIÇÕES MILITARES. SUPERVENIENTE LICENCIAMENTO DA ACUSADA. AUSÊNCIA DE ÓBICE PROCESSUAL. CRIME IMPROPRIAMENTE MILITAR. CONDIÇÃO DE PROSSEGUIBILIDADE. SENTENÇA PROFERIDA POR JUIZ FEDERAL DA JUSTIÇA MILITAR. RÉU CIVIL AO TEMPO DA AÇÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO. NÃO REALIZAÇÃO DA SESSÃO DE JULGAMENTO. FALTA DE SUSTENTAÇÃO ORAL. ASSEGURADA A POSSIBILIDADE DE COMPLEMENTAÇÃO DAS ALEGAÇÕES ESCRITAS. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. PRELIMINARES REJEITADAS. EFEITO DEVOLUTIVO. MÉRITO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. DESPROVIMENTO DO RECURSO. CONDENAÇÃO MANTIDA. A definição do que vem a ser crime militar encontra previsão no art. 9º, e seus incisos, do CPM. No caso em tela, o crime praticado pela ora Recorrente tem sua adequação típica estabelecida no art. 315, caput, c/c o art. 9º, inciso III, alínea "a", ambos do CPM, tendo em vista a sua prática em lugar sujeito à administração militar e contra a ordem administrativa militar. Preliminar de incompetência da Justiça Militar da União rejeitada por unanimidade. Considerando o disposto na nova redação do art. 30, inciso I-B, da LOJM (Lei nº 8.457/92), o juiz sentenciante não extrapolou a competência ao julgar, de forma monocrática, o feito, pois, ao tempo do crime, a acusada se encontrava na condição de civil, não tendo prestado até o momento da apresentação da documentação falsa qualquer compromisso com as Forças Armadas. Preliminar de nulidade da sentença rejeitada por unanimidade. Em sendo assegurado às partes a oportunidade para manifestações complementares às alegações escritas, logo após intimadas de que não haveria mais sessão de julgamento, não há falar em prejuízo à ampla defesa pela ausência de sustentação oral. Preliminar de nulidade de julgamento por prolação de sentença sem a realização prévia de sustentação oral rejeitada por maioria. Nos crimes militares impróprios, o posterior licenciamento do acusado não obsta o prosseguimento da ação penal e nem modifica a sua situação processual, tendo em vista o fato que lhe fora imputado não ter deixado de ser crime pelo mero desligamento das fileiras da Força Aérea Brasileira. Preliminar de perda de condição de prosseguibilidade da ação penal militar rejeitada por unanimidade. Na área criminal, o efeito devolutivo é amplo, o que significa que a instância ad quem pode avaliar matéria não analisada pelo juízo a quo desde que respeitados os limites dos pedidos arguidos pela parte e por força do princípio tantum devolutum quantum appellatum. A exceção se encontra nas matérias de ordem pública, que independente de provocação, podem ser conhecidas a qualquer tempo. É entendimento deste Tribunal que os pedidos extemporâneos, aqueles apresentados fora das razões do apelo, serão alcançados pela preclusão consumativa. A conduta perpetrada pela Apelante, ao apresentar documentos comprobatórios de escolaridade sabidamente falsos, com o objetivo de ingressar na carreira das Armas, feriu não só a boa-fé e a credibilidade, como também a hierarquia e a disciplina, pilares essenciais das Forças Armadas. Ao magistrado é assegurada a prerrogativa do livre convencimento na avaliação dos elementos processuais e, por essa razão, não se vincula ao pedido de absolvição formulado pelo Ministério Público em alegações escritas. Precedentes do STF e STM. Materialidade e autoria confirmadas por meio da confissão e laudos periciais. Dolo caracterizado por meio do interrogatório da Apelante. Inexistência de causas excludentes da culpabilidade ou da ilicitude. Conduta perpetrada classificada como fato típico, antijurídico e culpável. Desprovido o apelo defensivo. Decisão unânime. (Superior Tribunal Militar. Apelação nº 7000558-93.2019.7.00.0000. Relator(a): Ministro(a) WILLIAM DE OLIVEIRA BARROS. Data de Julgamento: 28/05/2020, Data de Publicação: 10/06/2020)   

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             O procedimento insculpido nos artigos 143 e 408 do CPPM perdeu ainda mais sentido quando o HC nº 127.900-AM do Egrégio Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que a qualificação e interrogatório passou a ser o último ato da instrução criminal:

EMENTA Habeas corpus. Penal e processual penal militar. Posse de substância entorpecente em local sujeito à administração militar (CPM, art. 290). Crime praticado por militares em situação de atividade em lugar sujeito à administração militar. Competência da Justiça Castrense configurada (CF, art. 124 c/c CPM, art. 9º, I, b). Pacientes que não integram mais as fileiras das Forças Armadas. Irrelevância para fins de fixação da competência. Interrogatório. Realização ao final da instrução (art. 400, CPP). Obrigatoriedade. Aplicação às ações penais em trâmite na Justiça Militar dessa alteração introduzida pela Lei nº 11.719/08, em detrimento do art. 302 do Decreto-Lei nº 1.002/69. Precedentes. Adequação do sistema acusatório democrático aos preceitos constitucionais da Carta de República de 1988. Máxima efetividade dos princípios do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, inciso LV). Incidência da norma inscrita no art. 400 do Código de Processo Penal comum aos processos penais militares cuja instrução não se tenha encerrado, o que não é o caso. Ordem denegada. Fixada orientação quanto a incidência da norma inscrita no art. 400 do Código de Processo Penal comum a partir da publicação da ata do presente julgamento, aos processos penais militares, aos processos penais eleitorais e a todos os procedimentos penais regidos por legislação especial, incidindo somente naquelas ações penais cuja instrução não se tenha encerrado. 1. Os pacientes, quando soldados da ativa, foram surpreendidos na posse de substância entorpecente (CPM, art. 290) no interior do 1º Batalhão de Infantaria da Selva em Manaus/AM. Cuida-se, portanto, de crime praticado por militares em situação de atividade em lugar sujeito à administração militar, o que atrai a competência da Justiça Castrense para processá-los e julgá-los (CF, art. 124 c/c CPM, art. 9º, I, b). 2. O fato de os pacientes não mais integrarem as fileiras das Forças Armadas em nada repercute na esfera de competência da Justiça especializada, já que, no tempo do crime, eles eram soldados da ativa. 3. Nulidade do interrogatório dos pacientes como primeiro ato da instrução processual (CPPM, art. 302). 4. A Lei nº 11.719/08 adequou o sistema acusatório democrático, integrando-o de forma mais harmoniosa aos preceitos constitucionais da Carta de República de 1988, assegurando-se maior efetividade a seus princípios, notadamente, os do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, inciso LV). 5. Por ser mais benéfica (lex mitior) e harmoniosa com a Constituição Federal, há de preponderar, no processo penal militar (Decreto-Lei nº 1.002/69), a regra do art. 400 do Código de Processo Penal. 6. De modo a não comprometer o princípio da segurança jurídica (CF, art. 5º, XXXVI) nos feitos já sentenciados, essa orientação deve ser aplicada somente aos processos penais militares cuja instrução não se tenha encerrado, o que não é o caso dos autos, já que há sentença condenatória proferida em desfavor dos pacientes desde 29/7/14. 7. Ordem denegada, com a fixação da seguinte orientação: a norma inscrita no art. 400 do Código de Processo Penal comum aplica-se, a partir da publicação da ata do presente julgamento, aos processos penais militares, aos processos penais eleitorais e a todos os procedimentos penais regidos por legislação especial incidindo somente naquelas ações penais cuja instrução não se tenha encerrado. (HC 127900, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 03/03/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-161  DIVULG 02-08-2016  PUBLIC 03-08-2016 RTJ VOL-00237-01 PP-00137)

            Ora, como sustentar uma incompetência absoluta ou um impedimento da autoridade judicial após toda a  instrução processual concluída, haja vista o interrogatório ser agora o último ato da instrução processual. Dessa forma os dispositivos vergastados atentam contra o devido processo legal.

               Pois, primeiro, uma nulidade absoluta faria regressar a marcha processual até o ponto onde ela ocorreu, tornando demorado o provimento jurisdicional, a exemplo do estabelecimento da competência dos Conselhos de Justiça em crimes praticados por militares ou logo após o delito ou durante a instrução processual passaram à condição de civis.

               Pela regra do tempus regit actum, prevista no artigo 5º do Código Penal Militar, a competência é estabelecida no momento da prática do delito logo, mesmo que o réu deixasse de ser militar, o Conselho Permanente ou Especial de Justiça continuaria competente para apreciar o fato criminoso.

             Contudo, há várias decisões de primeira instância, que compreendem que a competência seria do Juízo monocrático, considerando que com licenciamento do réu das fileiras das Forças Armadas, não haveria mais reflexos na hierarquia e disciplina castrenses.

           O E. Superior Tribunal Militar (STM), por outro lado, não pensa dessa forma, tanto que já firmou a competência dos Conselhos nesses casos num incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR), por meio da Petição nº 7000425-51.2019.7.00.0000:

EMENTA: INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR). PRELIMINAR DE INCONSTITUCIONALIDADE DO IRDR. INSTITUTO QUE SE ADEQUA ÀS GARANTIAS INERENTES AOS PRINCÍPIOS DA SEGURANÇA JURÍDICA, DA ISONOMIA E DA DURAÇÃO RAZOÁVEL DOS PROCESSOS. REJEIÇÃO. PRELIMINAR DE INADMISSIBILIDADE DO IRDR. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO ART. 976, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC). DESCABIMENTO. PRESSUPOSTOS PLENAMENTE RECONHECIDOS NA DECISÃO DE ADMISSIBILIDADE. REJEIÇÃO. MÉRITO. AUSÊNCIA DE SUSPENSÃO DE TODOS OS PROCESSOS EM CURSO NA JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO (JMU) SOBRE O TEMA. FACULTATIVIDADE. DECISÃO DO PLENÁRIO DA CORTE. ADMISSIBILIDADE. IRDR. NOTIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS FORÇAS ARMADAS, DO MINISTÉRIO DA DEFESA, DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO (AGU), DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, DO CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB) E DOS JUÍZOS DAS AUDITORIAS DAS CIRCUNSCRIÇÕES JUDICIÁRIAS MILITARES. REQUERIMENTO DE INGRESSO COMO AMICI CURIAE REALIZADO PELA AGU E PELO CONSELHO SECCIONAL DO DISTRITO FEDERAL DA OAB. DEFERIMENTO. ORIGEM. HIPÓTESES DE CABIMENTO. EFETIVA REPETIÇÃO DE PROCESSOS. CONTROVÉRSIA SOBRE QUESTÃO UNICAMENTE DE DIREITO. RISCO DE OFENSA À ISONOMIA E À SEGURANÇA JURÍDICA. COMPROVAÇÃO NO CASO CONCRETO. JULGAMENTO DE MILITARES AO LONGO DA HISTÓRIA. SUBMISSÃO A DECISÕES DE SUPERIORES HIERÁRQUICOS, POSTERIORMENTE ALIADA AO CONHECIMENTO DOS AUDITORES. PROTEÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA HIERARQUIA E DA DISCIPLINA. JULGAMENTO DE CIVIS PELA JUSTIÇA CASTRENSE. ALTERAÇÃO ADEQUADA À REALIDADE FÁTICA ATUAL. DISCUSSÃO. COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR E JULGAR EX-MILITARES QUE COMETERAM DELITOS CASTRENSES EM ATIVIDADE. INTENÇÃO LEGISLATIVA. MENÇÃO AOS INCISOS I E III DO ART. 9º DO CÓDIGO PENAL MILITAR (CPM). AUSÊNCIA DE DISPOSIÇÃO ACERCA DO INCISO II DO DISPOSITIVO. PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. INTERPRETAÇÃO EXTRAÍDA DA REDAÇÃO DO ART. 30, INCISO I-B, DA LEI 8.457/1992. DIREITO COMPARADO. OFENSA AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA E À JURISPRUDÊNCIA DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. INDEPENDÊNCIA E IMPARCIALIDADE DOS OFICIAIS DAS FORÇAS ARMADAS. CARGO PÚBLICO VITALÍCIO. ATUAÇÃO PAUTADA EM PRINCÍPIOS ÉTICOS. PREVISÃO ESTATUTÁRIA. ANALOGIA. FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. AUSÊNCIA DE EQUIPARAÇÃO. ALTERAÇÃO DO FORO PELA PROMOÇÃO DO MILITAR. SIMILARIDADE INEXISTENTE. MANUTENÇÃO DA COMPETÊNCIA COLEGIADA. ADEQUAÇÃO AO PRINCÍPIO DA HIERARQUIA. JUSTIÇA MILITAR EM TEMPO DE GUERRA. SITUAÇÃO EXTRAORDINÁRIA. CONCESSÃO DE GRAU HIERÁRQUICO AOS JUÍZES. PREVISÃO NO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL MILITAR (CPPM). ENUNCIADO DA 1ª JORNADA DE DIREITO MILITAR DA ESCOLA NACIONAL DE FORMAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO DE MAGISTRADOS DA JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO (ENAJUM). CUNHO ACADÊMICO. NÃO VINCULANTE. IRDR PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. I - Preliminar de Inconstitucionalidade do IRDR: diante do aparente conflito entre a legalidade e a segurança jurídica, deve prevalecer a primazia da segurança jurídica, aliada à isonomia e à duração razoável dos processos. Preliminar rejeitada por unanimidade. II - Preliminar de Inadmissibilidade do IRDR: os requisitos previstos no inciso I do art. 976 do CPC foram analisados por ocasião da admissibilidade do Incidente nesta Corte. Presença de efetiva repetição de processos e de controvérsia sobre questão unicamente de direito. Preliminar rejeitada por unanimidade. III - O IRDR é instituto com inspiração no Musterverfahren alemão e no Group Litigation Order britânico. O procedimento está descrito no art. 976 e seguintes do Código de Processo Civil. No caso concreto, os requisitos foram analisados por ocasião do Juízo de Admissibilidade do Incidente, no qual foi constatado o efetivo cumprimento dos dispositivos do CPC. Na mesma oportunidade, decidiu-se pela suspensão apenas do caso paradigma, diante da necessidade do cumprimento dos princípios inerentes ao processo penal. Definiu-se, também, a viabilidade do Incidente na seara processual penal. Ressalte-se que, cientificados os Comandos das Forças Armadas, o Ministério da Defesa, a Advocacia-Geral da União, a Defensoria Pública da União, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e os Juízos das 19 Auditorias das 12 Circunscrições Judiciárias Militares para prestar as informações entendidas cabíveis, requereram habilitação como Amici Curiae a AGU e o Conselho Seccional do Distrito Federal da OAB, pedidos deferidos pelo Ministro-Relator. IV - Desde os primórdios da Civilização ocidental, o cometimento de delitos por integrantes das Forças de Guerra eram julgados por oficiais de grau hierárquico superior ao do Acusado. Na Idade Moderna, Portugal e Espanha instituíram os Conselhos de Guerra, nos quais houve a formação do escabinato. Desde então, pouco se alterou quanto à estrutura dos órgãos de 1ª instância, composição também adotada no Brasil desde o Alvará de 1º.4.1808. V - A formação colegiada mista dos órgãos da Justiça Militar decorre da necessidade de eficiente proteção aos princípios da hierarquia e da disciplina. Alia-se a experiência da caserna dos oficiais, ao conhecimento jurídico dos juízes togados. Proteção amparada pela Constituição Federal e ratificada pela doutrina militar nacional e estrangeira. Interpretação contrária gera ofensa à ratio essendi da Justiça Militar da União. VI - Discussão referente ao julgamento de ex-militares que cometeram delitos castrenses na qualidade de integrantes da ativa das Forças Armadas. VII - A Lei 13.774/2018 modificou a Lei de Organização Judiciária Militar da União (LOJM) - Lei 8.457/1992 - e estabeleceu a competência do Juiz Federal da Justiça Militar, de forma monocrática, para o julgamento de civis que pratiquem crimes militares. No entanto, não visou o legislador a modificação da regra para o processamento de ex-militares que cometeram delitos castrenses em atividade. Inteligência da Justificativa ao Projeto de Lei 7.683/2014. VIII - Interpretação da nova redação do inciso I-B do art. 30 da LOJM, que menciona expressamente os incisos I e III do art. 9º do CPM, e olvida propositadamente o inciso II, que dispõe acerca das situações de crimes praticados somente por militares. Inserção por analogia importaria em ativismo judicial, eis que não manifestada a vontade do legislador ordinário. IX - Adoção do princípio tempus regit actum, o qual dispõe que a competência deve ser fixada na data do fato, sob pena de possibilitar a criação de juízos de exceção, bem como a escolha do órgão julgador pelo acusado. Obediência à garantia do juiz natural. X - Fundamentação que encontra amparo no Direito Comparado, a exemplo de Chile, Espanha e Itália. No mesmo sentido há previsão nas Justiças Militares Estaduais. XI - Não há que se falar em violação ao Pacto de São José da Costa Rica ou à jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Situações que envolvem civis que cometeram delitos castrenses nessa qualidade e não como integrantes das Forças Armadas. Distinção em relação ao caso vertente. XII - Assim como os magistrados togados, os Oficiais integrantes dos Conselhos de Justiça possuem vitaliciedade assegurada pela Constituição Federal. Na forma do Estatuto dos Militares (Lei 6.880/1980), sua atuação é pautada em princípios éticos, entre os quais a justiça e a imparcialidade nas suas decisões. XIII - Descabida a analogia ao foro por prerrogativa de função e à remessa dos feitos ao 1º grau de jurisdição após o término do mandato parlamentar. A condição de militar não se amolda à ideia de cargo eletivo. Concepção de Justiça Especial para processar e julgar delitos castrenses que deve ser considerada. XIV - Sob o mesmo viés, é inviável a equiparação da alteração da competência pela promoção ao oficialato ou ao generalato. Manutenção da atribuição colegiada. Adequação do escabinato ao princípio da hierarquia. XV - Em que pese a competência monocrática dos Juízes Federais da Justiça Militar em tempo de guerra, cuida-se de situação extraordinária. Ademais, de acordo com o art. 710 do CPPM, eles serão comissionados em postos militares. XVI - O Enunciado 1 da 1ª Jornada de Direito Militar, organizada pela ENAJUM, tem cunho acadêmico e não possui qualquer efeito vinculante. XVII - Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas procedente. Adoção da tese jurídica: "Compete aos Conselhos Especial e Permanente de Justiça o julgamento de civis que praticaram crimes militares na condição de militares das Forças Armadas.". Decisão unânime. (Superior Tribunal Militar. Petição nº 7000425-51.2019.7.00.0000. Relator(a): Ministro(a) PÉRICLES AURÉLIO LIMA DE QUEIROZ. Data de Julgamento: 23/08/2019, Data de Publicação: 27/06/2019)     

             Dessa forma, toda a instrução processual realizada por um Juiz incompetente será declarada nula e a marcha do processo vai retroagir a partir do ato de recebimento da denúncia, conforme declarado pelo STM em numerosos julgados, por todos, o exemplo abaixo:

EMENTA: APELAÇÃO. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO (DPU). DROGA. ART 290, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL MILITAR (CPM). PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO MONOCRÁTICO SUSCITADA PELO CUSTOS LEGIS. POSSIBILIDADE. DECLARAÇÃO DE NULIDADE. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR) 7000425-51.2019.7.00.0000. APLICAÇÃO DA SÚMULA 17 DO SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR (STM). ACOLHIMENTO. DECISÃO POR MAIORIA. I - A condução de forma singular pelo Juiz Federal da Justiça Militar fere a competência absoluta do Conselho de Justiça para processar e julgar aquele que, embora excluído das Forças Armadas, praticou o fato delituoso quando ainda era militar. A exclusão de militar da Força por licenciamento, por término da prestação do serviço militar, ex-officio ou a bem da disciplina não tem o condão de interferir no andamento da Ação Penal, uma vez que o Acusado integrava as fileiras da Aeronáutica ao cometer o crime e, portanto, ostentava o status de militar da ativa. Por consequência, foi lesado o direito do Apelante ao seu juízo natural, consoante garante a Constituição da República em seu art. 5º, inciso LIII. Entendimento fundamentado na tese vinculante do IRDR 7000425-51.2019.7.00.0000 e na Súmula 17 deste STM. II - Ainda que se questione a possibilidade de acolher a nulidade aduzida pela Procuradoria-Geral de Justiça Militar (PGJM) atuante na condição de custos legis, o Tribunal detém a prerrogativa de declarar, de ofício, a invalidade prejudicial à Defesa. Inteligência que se retira do art. 500, inciso I, c/c o art. 504, § único, ressalvada a possibilidade da revalidação com base no art. 507, todos do Código de Processo Penal Militar (CPPM). III - Acolhimento da preliminar de incompetência absoluta do Órgão Judicial, com a fixação da competência do Conselho de Justiça para processar e julgar o Acusado que era militar ao tempo do fato. Declaração de nulidade da Sentença e de todos os atos da instrução conduzidos pelo Juízo Monocrático. Prejudicado o conhecimento do mérito do Apelo. Decisão por maioria. (Superior Tribunal Militar. Apelação nº 7000007-79.2020.7.00.0000. Relator(a): Ministro(a) PÉRICLES AURÉLIO LIMA DE QUEIROZ. Data de Julgamento: 18/06/2020, Data de Publicação: 03/07/2020) 

        Segundo, como visto no exemplo acima, a insegurança jurídica reinaria no processo, pois a declaração de uma nulidade processual poderia pôr a perder toda instrução até então realizada, ressalvando a possibilidade de o novo Órgão, agora competente, revalidar todos os atos instrucionais, conforme declara o artigo 507 do Codex Processual Militar.  

          Terceiro, e último, com a celeridade processual e segurança jurídica abalado, por tabela encontra-se prejudicado o devido processo legal, pois ele é o reservatório de vários outros princípios garantísticos,  conforme declara Lammêgo Bulos : 

...Devido processo legal é reservatório de princípio constitucionais, expressos e implícitos, que limitam a ação dos Poderes Públicos. Definição complexa: os estudiosos são unânimes em destacar a dificuldade de definir o que seja devido processo legal, sob pena de se restringir a  pujança de seu alcance. O mais apropriado seria extrair o significado da cláusula a partir de seu uso. Foi o que fizeram os autores americanos, motivo pelo qual não encontramos um esquema definitório de todas as suas potencialidades nos manuais estadunidenses sobre a matéria...” 

           Logo, pode-se afirmar que tanto antes quanto após o HC nº 127.900-AM do Supremo Tribunal Federal, percebe-se que os dispositivos dos artigos 143 e 408 do CPPM jamais foram recepcionados pela Carta Magna.

         Dessa forma, considerando que o procedimento originalmente trazido pelo CPPM encontra-se superado, em que momento e de que maneira se pode apresentar as exceções processuais?

           Não há uma resposta precisa sobre o tema, Cícero Coimbra advoga a tese de que seja aplicada a resposta a acusação ao processo penal militar por analogia do que acontece com o Código de Processo Comum, quando comenta a exceção de incompetência:

“(...) Assim, conveniente que a exceção seja oposta pela Defesa logo no início da instrução criminal, fazendo-se uma analogia com o processo penal comum, ou seja, deve ser manejada no prazo de defesa (art. 108 do CPP), considerada esta como a resposta à acusação no prazo de 10 dias (artigo 396 do CPP), contados da citação, sob pena de preclusão e da consequente prorrogação da competência relativa (...)”

            A ideia do autor se baseia num pressuposto lógico e coerente de que “se a própria inversão do momento do interrogatório já é fruto de analogia, trazendo a reboque, aquilo que for exigido para a aplicação dessa realidade no processo penal militar” 

            Tal pensamento não encontra ressonância na jurisprudência do E. STM, que a afasta o instituto da resposta à acusação diante do princípio da especialidade:

EMENTA: Habeas Corpus. DELITOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 315 E 311 DO CÓDIGO PENAL MILITAR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO DA RESPOSTA À ACUSAÇÃO NO PROCESSO PENAL MILITAR. NÃO CERCEAMENTO DE DEFESA. DECISÃO DE RECEBIMENTO DA DENÚNCIA SATISFATORIAMENTE FUNDAMENTADA. PEÇA ACUSATÓRIA QUE ATENDE A TODOS OS REQUISITOS LEGAIS. PRESENÇA DE JUSTA CAUSA. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME EXAUSTIVO DA PROVA NA VIA ESTREITA E EXPEDITA DO HABEAS CORPUS. POTENCIALIDADE LESIVA À REGULARIDADE DA ADMINISTRAÇÃO MILITAR E À FÉ PÚBLICA. A Carta Magna de 1988 confirmou o postulado do juízo natural da Justiça Militar da União também para julgar civis responsáveis pela prática de crimes militares na órbita federal, revigorando, no plano constitucional, a preexistente dicção do artigo 9º, inciso III e suas alíneas, do Código Penal Militar de 1969. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal Militar. O Código de Processo Penal Militar e o Código Penal Militar são diplomas legais especiais, tendo como razão para isso os peculiares traços da Caserna e dos bens jurídicos tutelados. Destarte, por força do princípio da especialidade, são diplomas com disciplinas próprias, infensos, portanto, às modificações e preceitos da lei processual comum, dentre elas a que introduziu o instituto da "resposta à acusação". Precedentes do Superior Tribunal Militar. O juízo de recebimento da Denúncia é de simples delibação, nunca de cognição exauriente da prova. Bastante, pois, para o recebimento da Denúncia, são o exame da sua validade formal e a verificação da presença de elementos informativos de ocorrência de crime e de suficientes indícios de autoria. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal Militar. (...) Denegação da Ordem. Unânime. (Superior Tribunal Militar. Habeas Corpus nº 7000082-21.2020.7.00.0000. Relator(a): Ministro(a) LUIS CARLOS GOMES MATTOS. Data de Julgamento: 07/05/2020, Data de Publicação: 22/06/2020) 

          Na doutrina, a própria ideia encontra limites, como bem lembra Renato Brasileiro, citando o instituto do Código de Processo Penal comum:

Portanto, pode-se dizer que a exceção funciona como verdadeiro direito público subjetivo, corolário do princípio constitucional da ampla defesa, a qual, é bom lembrar, não se exaure com a simples apresentação da resposta à acusação (CPP, art. 396-A), mas abrange a possibilidade conferida ao acusado de reagir à pretensão acusatória para que não seja responsabilizado criminalmente. De todo modo, é oportuno destacar que, no âmbito processual penal, as matérias constantes do art. 95 do CPP podem ser reconhecidas de ofício pelo magistrado (objeções processuais), ou mesmo arguidas pela acusação (Ministério Público ou querelante). 

            Nesse mesmo sentido, o próprio Coimbra também reconhece tal fato ao declarar que “(...) No caso de competência absoluta, frise-se, não ocorre a prorrogação, podendo ela ser alegada em qualquer fase do processo, isso de ofício, ou pelas partes, via preliminar nas razões escritas, por habeas corpus (…)”

             Lado outro, parece mais simples e sem rodeios a solução apontada por Claudio Amin Miguel no sentido de que as exceções sejam vistas como simples arguições, sem qualquer apego a forma ou momento procedimental, quando  esclarece:

A partir da inversão, passando o interrogatório a ser o último ato processual, pode-se questionar quando serão opostos as exceções previstas no artigo 407 do CPPM, cujo prazo era de 48 horas após o interrogatório. Se, por exemplo, a Defesa quiser questionar a competência ou alegar que o acusado já foi julgado pelo mesmo fato, havendo coisa julgada, terá que aguardar o término da instrução criminal? É claro que não. Não precisamos transformar a questão em algo de difícil complexidade, pois se trata apenas de nomenclatura, ou seja, a Defesa poderá questionar a incompetência ou a existência de coisa julgada sob a forma de arguição, desde o início da instrução criminal. Aliás, se houver coisa julgada, até mesmo após o trânsito em julgado, mediante a impetração de habeas corpus . A solução é simples, basta não se apegar a forma. 

           Conclui-se, portanto, que independente da forma ou momento da apresentação das exceções processuais, não é mais viável estabelecer um único momento ou forma para a sua oposição nos autos, seja resposta a acusação ou simples arguições, pois elas possuem, via de regra, questões de ordem pública, que podem ser apreciadas em preliminares de alegações finais, caso sejam descobertas ao final da instrução e antes de julgamento ou no plenário da sessão de julgamento ou razões recursais, depois do prazo das alegações escritas, conforme bem lembra o artigo 504 do Código de Processo Penal Militarou em qualquer momento da própria instrução processual como bem lembra o parágrafo único do citado dispositivo.  

Bibliografia:

BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2010.

COIMBRA, Cicero Robson, Manual de Direito  Processual  Penal Militar - Volume Único, 4ª Edição, Salvador: JusPodivm, 2020;

LIMA, Renato Brasileiro de Manual de processo penal: volume único / Renato Brasileiro de Lima – 8. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2020:

MIGUEL, Cláudio Amin , COLDIBILLI, Nelson. Elementos de Direito Processual Penal Militar - 4ª Edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2020.

TÁVORA, Nestor, Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016;

Sobre o autor
Rodrigo Santana de Souza e Silva

Sou graduado em Direito pela UFPE e pós graduado em Direito Público pela UNIVERSO (especialização), cujo tema foi a Competência da Justiça Militar Estou na segunda especialização em Direito Penal Militar pela Verbo Jurídico. Fui técnico judiciário da Auditoria da 7ª CJM por 12 anos, dos quais 05 anos foram na função de assessor jurídico. Atualmente sou Oficial de Justiça Avaliador Federal pelo TJDFT

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Ajudar a difundir temas importantes no Direito Processual Penal Militar, bem como estabelecer a devida diferenciação dele em relação do Direito Processual Penal comum.

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