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Instrumentos da Carta Magna para a nossa Democracia

Agenda 20/11/2020 às 16:28

Trata de princípios e diretrizes da Constituição da República para o regime democrático. Evidencia caber a própria sociedade construir e implementar medidas para aprimorar o País

Instrumentos da Carta Magna para a nossa Democracia*

 

 

Não de hoje que se debate o regime democrático, as contradições e a insuficiente efetividade para beneficiar de forma mais homogênea a todos, constituem desafios passíveis de superação por meio da participação ativa dos cidadãos, conforme preceitua a nossa própria Carta Magna, a Constituição Cidadã.

Numa referência histórica, observa-se a gênese na antiga Grécia. Naquela época os cidadãos passaram a gerir o Estado para atender às demandas da sociedade e se atingiu o apogeu sob governo de Péricles, com grande desenvolvimento econômico e cultural, inspiração às sociedades modernas de vários movimentos para alçar os representantes do povo ao poder, a exemplo da Independência Americana e a respectiva Constituição, bem assim a Revolução Francesa.

De sublinhar que na atualidade a maioria das nações com maior qualidade de vida, como a Alemanha, Canadá, Austrália, Países Nórdicos e Estados Unidos, tem o regime de governo calcado na democracia com significativos avanços socioeconômicos ao longo do tempo.

No Brasil, com o advento da promulgação da Carta Política de 1988, restaurou-se o regime participativo. Já no primeiro artigo se institui o Estado Democrático de Direito, todos submetidos às disposições da ordem legal emanada de representantes do povo, e no mesmo artigo, parágrafo único, preconiza-se o princípio democrático: "todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos". Estatui também no artigo 14: “A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei…”

A democracia representativa brasileira, que conta com mais de 150 milhões de eleitores, consiste, em compêndio, no regime de governo em que a população escolhe os políticos que exercerão o poder em benefício da sociedade. Elegem-se os chefes de governo dos Municípios, Estados, Distrito Federal e União, que nesse Ente também será o chefe de estado, vez que representa o País nas relações internacionais no exercício de soberania; bem como os parlamentares, que no Poder Legislativo terão o papel de elaborar leis, aprovar orçamento e de fiscalização do Executivo. Vale citar as ponderações do jurista Tavares (2018, p. 107):

 

“Aqui, a centralidade e a consubstancialidade da dignidade humana na estrutura do Estado encontram-se proclamadas solenemente, no primeiro dos artigos constitucionais. Como inovações, o direito ao meio ambiente sadio, a tutela do consumidor (com a aprovação do Código de Defesa do Consumidor), o habeas data (devidamente regulamentado pelo Congresso Nacional, cf. Lei n. 9.507/97), o mandado de injunção e a ampliação da ação popular, a proteção da propriedade privada submetida à necessária função social. Ademais, a Constituição de 1988 foi pródiga com os direitos sociais. Posteriormente incluídos, tem-se, ainda, o direito à moradia e o direito a uma duração razoável do processo.”

 

Na democracia, vale frisar, os governos prestam contas à sociedade, vigora o postulado da publicidade e transparência. Há expressas disposições na nossa Constituição da República, artigos 5º, incisos XXXIII, XXXIV e LXXII e 37, tão caros para evidenciar as medidas adotadas e onde se aplica os recursos do povo, submetendo os governantes da coisa pública, com mandatos com prazos limitados, ao controle da sociedade em geral ao mesmo tempo que os cidadãos podem avaliar e questionar políticos que elegeram, bem assim instituições públicas de controle podem atuar de forma plena.

Caso não atuem com a efetividade necessária para melhorar as condições socioeconômicas, cidadãos também podem mudar a opção política, promovendo a salutar alternância de poder.

Ainda há expressa previsão da Carta Magna, artigos 85 e 86, de impedimento do presidente da República em casos de graves crimes de responsabilidade, após processo no Congresso Nacional, De enaltecer que tal instrumento constiutcional já ocorreu em duas oportunidades após a redemocratização.

De todo modo, se permanecem graves problemas no Brasil, por exemplo, a endêmica corrupção, advindas quer de governos autoritários ou democráticos, há um plexo de normas, bem como entidades com a capacidade de combater tal chaga e contribuir para se punir infratores, além de se conferir direito a cada indivíduo de exercer de modo direto o controle dos atos administrativos.

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Não se pode deslembrar o recente exemplo de punibilidade pode ocorrer a todos com o funcionamento regular dos órgãos de persecução penal, a título ilustrativo possível indicar os resultados da operação lava jato, que, embora caibam muitas críticas por procedimentos sem respeito ao devido processo legal, evidenciou, por fartas provas e confissões de criminosos, entre outros elementos, a prática reiterada e organizada de crimes por diversas pessoas, inclusive eminentes políticos e empresários.

Pode-se mencionar ainda na nossa democracia o largo emprego de ouvidorias, o poder dos cidadãos de denunciarem possíveis ilícitos e ingressarem com ação popular (CR, artigos 5º, LXXIII, e 74, parágrafo 2º). Ademais, inúmeros Órgãos e Poderes investigam de modo permanente a Administração Pública por dever constitucional e que também podem e devem se aperfeiçoar na dinâmica sociedade atual. Além disso, há possibilidade de aprimorar o ordenamento jurídico.

Em outro ponto, concedem-se aos cidadãos, na nossa jovem democracia, participação ativa na construção do País. Podem propor Leis - Carta Magna, artigo 161, § 2º. Isso traduz um importante respeito à vontade popular e participação ativa de todos. Por exemplo, a convergência de vontades no campo da moralidade pública resultou na Lei da Ficha Limpa a partir de projeto de lei apresentado por milhões de cidadãos.

Ademais, os cidadãos, em alguns entes que alteraram respetivas normas, podem indicar diretamente onde se deve aplicar recursos por meio de orçamentos participativos. A própria comunidade delibera em audiências abertas ao público em quais setores e a localidade se deve priorizar a destinação do sempre limitado dinheiro do povo.

Pode-se estruturar em nossa democracia um ciclo virtuoso à medida que se instruir de modo adequado os cidadãos, instituições se aprimoram - a exemplo da imprensa, organizações independentes, como o Contas Abertas e Transparência Brasil, e Poderes Constituídos, como o Judiciário, Ministério Público e Tribunais de Contas -, e passarem a escolher racionalmente melhores políticos, bem assim exigirem dos gestores que adotem as medidas necessárias para fomentar o progresso do país, mormente com investimentos em setores vitais, a exemplo de infra estrutura - saneamento, transporte, fontes de energia renováveis etc -, preservação do meio ambiente, saúde, educação e segurança pública.

Pelos termos da Constituição da República, há de se observar ainda que se protege tanto o direito da maioria, quando essa consegue eleger maior parte dos políticos, quanto da minoria. Isso porque a tolerância e respeito às diferenças consistem em postulados primaciais do regimes participativos. Tutelam-se as pessoas e relações sociais sem distinções de qualquer natureza, quer étnicas, religiosas ou dos agnósticos, sexuais, eleitorais, entre outros. Isso também por erigir a dignidade do ser humano como direito fundamental e como pedra angular da nosso Lei Maior, artigo 3º. Salutar menção ao entendimento do STF:

 

“1. A Democracia não existirá e a livre participação política não florescerá onde a liberdade de expressão for ceifada, pois esta constitui condição essencial ao pluralismo de ideias, que por sua vez é um valor estruturante para o salutar funcionamento do sistema democrático. 2. A livre discussão, a ampla participação política e o princípio democrático estão interligados com a liberdade de expressão, tendo por objeto não somente a proteção de pensamentos e ideias, mas também opiniões, crenças, realização de juízo de valor e críticas a agentes públicos, no sentido de garantir a real participação dos cidadãos na vida coletiva. ... 4. Tanto a liberdade de expressão quanto a participação política em uma Democracia representativa somente se fortalecem em um ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das mais variadas opiniões sobre os governantes. ” (ADI 4451)

 

Também se encontra a humanidade em meio a revolução tecnológica, o que possibilita mais possibilidades de avanços. A formalidade no Brasil para os eleitores se alistarem e ativamente participar das escolhas representa um óbice a muitos e desestimula o engajamento nas eleições e vida política. Necessário, por exemplo, estudar a hipótese de meio virtual de registro e até de votação para simplificar as eleições como a adoção de voto pela internet por criptografia e assinatura eletrônica.

Essas e outras nuances do regime participativo revelam um outro fundamento imanente, a responsabilidade. O cidadão ao longo da vida pode perceber que as escolhas políticas que livremente realiza traz consequências para toda a sociedade. Caso o político seja comprometido em desenvolver trabalhos para o povo, o voto fomentou esse benefício. De outro lado, se a escolha não resultou de uma análise racional do político e propostas de governo, observará quando esse no poder o quanto deletéria a deficiente reflexão resultou e mudar o voto na eleição seguinte.

Por outro ângulo, há de se notar que o exercício do poder deve respeitar as balizas constitucionais. Se algum poder excede, os outros, por serem independentes e harmônicos, devem o conter no que se denomina de sistema de freios e contrapesos, nos termos da Carta Magna, artigo 2º. As possíveis crises das mais variadas esferas - política, econômica, de saúde, ambiental, social, entre outras - devem ser enfrentadas pelos poderes e instituições constituídos mediante os diversos princípios e institutos previstos na própria Carta Política de 88.

A despeito de inúmeras nuances do regime democrático, não se trata de um modelo hermético, e sim que precisa se aperfeiçoado continuamente por meio da autonomia das instituições públicas e privadas e de cada indivíduo, que decidem sobre a política, contribuindo de forma compartilhada para haver uma sinergia e avanços mais uniformes para toda a população. Eleitores devem refletir e escolher o governantes baseados no histórico na vida pública e em planos de governo para que atuem no sentido a que se comprometeram.

Cabe sublinhar assim que a Democracia brasileira se constitui num regime de governo participativo com os cidadãos, que têm o direito de escolher quem os governa; esses, o dever de liderar para o bem comum e prestar contas à população. Buscar implementar esse necessário ciclo virtuoso consiste numa responsabilidade mútua de todo o povo, governantes e instituições. Onde houve a médio e longo prazo o comprometimento responsável da maioria com o regime democrático, a qualidade de vida em geral melhorou pelo processo de enfrentamento em conjunto das dificuldades, promovendo-se uma educação universal de qualidade e aprimoramento contínuo das instituições públicas e privadas para se construir, mediante a democracia, uma sociedade mais desenvolvida e justa.

 

Referências:

 

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1998. Brasil, Congresso Nacional, [1988]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso 08 11. 2020.

 

TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. – 16. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

 

STF. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ADI 4451.  Relator Min. Alexandre de Moraes. DJE 06/03/2019. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur398459/false>. Acesso em 12.11.2020.Instrumentos da Carta Magna para a nossa Democracia*

 

 

* Alcindo Antonio A. B. Belo (Graduação em Administração e em Direito, ambos pela UFPE, Advogado licenciado OAB, Pós-Graduação em Administração Pública e Controle Externo - FCAP/UPE e Auditor de Controle Externo do TCE-PE)

 

 

Sobre o autor
Alcindo Antonio Amorim Batista Belo

Bacharel em Direito e Administração pela UFPE. Pós-graduação em Administração Pública e Controle Externo pela FCAP/UPE. Advogado OAB-PE licenciado. Auditor de Controle Externo do TCE-PE.

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