INTRODUÇÃO
Hodiernamente, muito se tem discutido, no âmbito do direito sucessório, acerca do planejamento sucessório por meio da formação de uma holding familiar.
Por isso, o objetivo deste trabalho é discutir a holding familiar enquanto instrumento jurídico capaz de garantir a continuidade dos negócios de uma determinada família, evitando o processo de inventário e, muitas vezes, discussões familiares sobre os bens.
Nesse sentido, a criação de uma holding familiar tem como objetivo primário a garantia e a proteção patrimonial de seu fundador, tendo reflexos tanto na seara do direito empresarial quanto na seara do direito tributário.
Isso porque, a holding é o instrumento jurídico utilizado com o objetivo de administrar determinado patrimônio, ou seja, trata-se de uma empresa constituída que detém participações societárias tanto em outras empresas quanto em quaisquer outros ativos financeiros.
Dessa forma, o capítulo primeiro discorrerá sobre o conceito de holding familiar, sua finalidade e a razões por detrás de sua constituição.
Nesse tópico, a holding familiar será abordada enquanto instrumento jurídico empregado no planejamento sucessório, incluindo aspectos primários nos âmbitos fiscal e societário.
Além disso, serão trazidos elementos que caracterizam a holding, visando, sobretudo, a sucessão patrimonial por meio de um planejamento eficaz, trazendo benefícios à continuidade do negócio.
No capítulo segundo serão abordados os conceitos e distinções entre as holdings de natureza pura e mista.
Nesse contexto, a holding pura será abordada enquanto uma sociedade de participações, não tendo, portanto, uma atividade operacional, mas sim a obtenção de receita por meio da participação em outras entidades, recebendo a distribuição de lucros e juros sobre o capital próprio.
Já a holding mista será discutida não só no âmbito de sua participação acionária em outras empresas, mas também por meio de seu próprio objeto social em outras atividades, sejam na prestação de serviços, no comércio, ou em outras atividades.
No capítulo terceiro será abordada a natureza jurídica de uma holding familiar, levando-se em consideração a finalidade de sua criação.
Nesse diapasão, serão discutidos os diferentes tipos sociais e suas respectivas relações no âmbito do planejamento sucessório.
Assim sendo, serão apresentados os diferentes tipos de sociedade, dentre os quais estão: sociedade simples, sociedade limitada, sociedade anônima e a empresa individual de responsabilidade limitada (“EIRELI”).
O quarto capítulo será destinado a um panorama sobre o planejamento sucessório.
Assim sendo, serão discutidos temas importantes sobre o assunto, tais como a doação de cotas com reserva de usufruto, a possibilidade de ingresso de herdeiros nesta relação jurídica e a situação fática da holding perante sócios, terceiros e empregados.
Além desses temas tratados neste capítulo, o capítulo quinto será destinado à discussão dos reflexos tributários principalmente no que tange ao Imposto de Transmissão de Bens e Imóveis (“ITBI”).
Por último, o sexto capítulo foi reservado para discorrer sobre as vantagens da holding familiar no inventário.
Diante do que foi aqui exposto, portanto, inferir-se- á que a holding familiar é um instrumento jurídico capaz de proporcionar um planejamento sucessório eficaz tanto do ponto de vista jurídico quanto do ponto de vista da continuidade do negócio.
A holding familiar tem reflexos tanto no direito empresarial quanto no direito tributário, tendo como amparo diversos benefícios para a proteção patrimonial de uma determinada família.
1. CONCEITO
Iniciamos o conceito de holding pelo seu significado e tradução, pois tem origem na língua inglesa e quer dizer “seguro”, “manter seguro”, o que traduz fielmente os objetivos e anseios de uma holding, que é manter seguro o patrimônio e deter o seu controle.
Diversos autores defendem que a holding surgiu no Brasil com a promulgação da Lei 6.404/1976, Lei das Sociedades Anônimas, a qual possibilitou que pessoas jurídicas participassem de outras empresas, podendo, assim, serem titulares de grande diversificação de bens, seja imóvel, móvel, participação em quadros societários, bem como deter o controle acionário.
Outras leis acrescentaram as diretrizes da holding, por exemplo, o regulamento do Imposto de Renda, a Lei 9.430/1996 e a Lei 10.833/2002. O funcionamento se dá da seguinte forma: os bens e direitos pertencentes à holding, inclusive cotas sociais, formam o patrimônio da sociedade, neste caso sendo a holding sócia das empresas controladas, podendo, assim, exercer seu direito de voto.
Assim, o conjunto de bens, seja imóvel ou móvel, não compõe precipuamente o patrimônio pessoal dos sócios, mas os sócios da holding são proprietários de participações societárias, dispondo a holding de patrimônio próprio.
O patrimônio da holding deve ser por ela administrado, pois se trata de uma nova pessoa jurídica, não se confundindo com um simples negócio entre sócios.
Os sócios da sociedade controlada transferem suas participações societárias para essa nova sociedade, a qual caberá a administração.
O intuito da constituição da holding é o execício de uma administração mais profissional e plena, reunindo pessoas capacitadas para a sua atividade.
2. HOLDING FAMILIAR: PURA E MISTA
A holding familiar traz, em sua essência, as mesmas caraterísticas de uma holding tradicional.
No entanto, a diferença marcante é a composição dos seus membros, pois na holding familiar o grupo integrante é composto por familiares no controle, com o objetivo de obterem vantagens, seja na administração, benefícios fiscais, facilidades no momento da sucessão, redução de custos diversos, bem como na preservação do grupo familiar.
O crescimento do número de constituição de holding familiar deve-se a simplificação do processo sucessório, dos benefícios fiscais e, principalmente, da concentração como sócios da família a perdurar no tempo por gerações, além da possibilidade de administrar outros bens dentro da holding familiar.
A constituiçao de uma holding familiar possibilida a perpetuação que os bens sejam mantidos em família por gerações, pois, havendo a morte de um sócio, será transferido aos seus herdeiros somente a participação societária e não a repartição do patrimonio da sociedade, preservando, assim, o poder decisório.
2.1. HOLDING FAMILIAR PURA
Como o próprio nome sugere, a holding considera pura, ou sociedade de participação, é aquela na qual a sua destinação é exclusivamente para participar de outra sociedade.
Neste caso, não exercendo qualquer atividade negocial, limitando a sua fonte de renda exclusivamente a divisão e distribuição dos lucros e juros sobre o capital pela participação societária.
Importante referenciar que a propriedade das participaçoes societárias dão o poder para a holding de decisão sobre a adminstração e as atividades das sociedades que compõem a holding.n.este tipo de holding existe as de controle e as de participaçao, sendo aquelas as que dão direito ao controle sobre a sociedade em que participa, geralmente devido a quantidade de quotas que são de sua propriedade, as de participação não dispõem de participação societária com capacidade suficiente para controlar as sociedades, porém, são de suma importância para seus sócios.
2.2. HOLDING FAMILIAR MISTA
Diferente da holding familiar pura, a holding familiar mista não exerce sua atividade somente na participação societária e acionária, pois exerce também outras atividades como de industrialização, serviços, comércio ou financeira.
A holding familiar mista, geralmente, executa atividades ligadas à holding a qual tem participação, porém podem ser incluídas outras atividades.
No entanto, consequências negativas podem refletir na atividade empresarial, pois não se distingue a pessoa jurídica.
3. TIPOS DE SOCIEDADE
Como visto em capítulo anterior, holding é um tipo de empresa que concentra participações societárias, controlando tanto outras empresas quanto patrimônios com o objetivo de diminuir custos e tributos e, sobretudo, desenvolver planejamentos financeiros.
Ou seja, holding é uma estratégia empresarial que permite que uma empresa e seus diretores controlem empresas subsidiárias.
Importante ressaltar que a terminologia holding não diz respeito a um tipo societário determinado, mas sim ao controle e à administração da sociedade a qual possuir predomínio nas ações ou quotas.
A holding poderá, portanto, ser constituída na forma de sociedade simples, anônima limitada ou, ainda, na modalidade de empresa individual de responsabilidade limitada (“EIRELI”), desde que respeitados os requisitos legais impostos a cada uma destas espécies societárias.
3.1 SOCIEDADE SIMPLES
A sociedade simples denota uma sociedade como mero mecanismo de gestão de relações societárias em âmbito interno, sem agir como empresária, mas sim como sócia, direcionando suas atividades não ao mercado, mas para o âmbito interno caracterizado pelas relações societárias (SHARP JR., 2003).
O enquadramento da holding pura como sociedade simples resulta na sua inscrição no cartório do registro civil de pessoas jurídicas (artigo 1.150 do Código Civil) e na insubmissão à falência, ou seja, a holding como sociedade simples não estará sujeita à lei de falência ou recuperação judicial.
3.2. SOCIEDADE LIMITADA
O objetivo de uma holding familiar como sociedade limitada é manter-se apenas os membros da família como sócios, buscando a proteção do patrimônio – aqui, nesta sociedade de pessoas, por conta de seu caráter subjetivo, surge a affectio societatis, quer dizer, vontade de união entre os sócios para constituir e manter uma sociedade, por conta de um mútuo interesse e motivados por um propósito comum, obedecendo o seu objeto social e sempre visando o sucesso.
Para se criar uma holding familiar em formato de sociedade limitada deve-se de pronto criar a empresa na Junta Comercial Estadual, regularizar a empresa e os imóveis na Prefeitura e regularizar e nos respectivos cartórios de Registros de Imóveis.
A holding familiar integralizará o rol de bens pessoais em seu patrimônio, permitindo que os seus titulares entreguem aos seus herdeiros cotas (ou ações) na forma que mais lhes convier.
As estipulações determinadas no Código Civil para a composição de uma sociedade limitada são as mesmas para a constituição de uma holding familiar sociedade limitada.
Inclusive, estas estipulações são fundamentais e devem estar relatadas em seu contrato social, uma vez que um dos desideratos de sua constituição representa a composição e perpetuação do patrimônio da família e o resguardo da entrada de terceiros em seu quadro social, bem como a prevenção de eles assumirem a sua administração, principalmente em razão de penhora, herança, direitos adquiridos pelo casamento, união estável, dentre outras.
Os principais atributos de uma sociedade limitada estão descritos no Código Civil (“CC”) e são:
a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas cotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social (1.052 CC);
o capital social é dividido em cotas, iguais ou não, podendo o sócio ter uma ou muitas cotas do capital social;
todos os sócios respondem pelo prazo de até cinco anos da data de registro da sociedade, pela exata estimação de bens conferidos ao capital social (1.055, §1º, CC);
é regida pelo Código Civil;
pode ser instituído conselho fiscal, desde que previsto, com um número mínimo de três membros, sendo eles sócios ou não (1. 066 CC); 6) caso seja instituído um conselho fiscal, é assegurado aos sócios minoritários, representando um quinto do capital social, o direito de eleger um de seus membros;
não é permitida a integralização do capital social com contribuição com prestação de serviços;
pode prever no contrato social restrições à entrada de pessoas estranhas à sociedade;
seus atos constitutivos são arquivados na Junta Comercial da sua sede.
Claro está, portanto, a noção de que a sociedade limitada é adequada para os propósitos do planejamento societário a partir da constituição de uma holding familiar, considerando ainda a sua limitação de responsabilidade, a proteção de entrada de terceiros estranhos, menor complexidade se comparada à sociedade anônima, menos custo de manutenção, opção pelo lucro presumido e a liberdade de estipulações constantes no contrato social.
Ainda, após a holding constituída, já está determinado a divisão do patrimônio da família, evita a dilapidação dos bens após a morte do casal, além de permitir redução dos custos tributários e os desgastes comuns do processo de inventário.
É de suma relevância ressaltar, ainda, que, após a doação, o patriarca continua no controle total de seu patrimônio, como usufruto vitalício.
Apesar de não ser sócio, ele é instituído como administrador, sempre se necessitando de sua outorga/autorização para a sociedade gerir seus negócios.
Por fim, para que a partilha ocorra e a sucessão seja reconhecida, devem-se respeitar os requisitos legais do Direito Sucessório.
Os herdeiros devem participar da sociedade de forma imparcial e a parte legítima deve ser respeitada quando da distribuição de cotas sociais aos herdeiros.
3.3. SOCIEDADES ANÔNIMAS
As sociedades anônimas constituem-se principalmente em função do capital a ser investido (intuitu pecuniae) e caracterizam-se pela facilidade de transações com suas ações, razão pela qual atualmente têm sido escolhidas como tipo societário de sociedades familiares, sendo indicado, necessariamente, a opção por uma sociedade anônima de capital fechado, pois, nestas, suas ações não estão disponíveis no mercado de capitais.
Em razão da constituição de sociedades anônimas de capital fechado ser composta no total, ou em sua maioria, por membros de uma mesma família, estando uns obrigados perante os outros, na jurisprudência se reconhece a existência da característica da affectio societatis, conforme entendimento da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça: É inquestionável que as sociedades anônimas são sociedades de capital (intuitu pecuniae), próprio às grandes empresas, em que a pessoa dos sócios não têm papel preponderante.
Contudo, a realidade da economia brasileira revela a existência, em sua grande maioria, de sociedades anônimas de médio e pequeno porte, em regra, de capital fechado, que concentram na pessoa de seus sócios um de seus elementos preponderantes, como sói acontecer com as sociedades ditas familiares, cujas ações circulam entre os seus membros, e que são, por isso, constituídas intuito personae.
Nelas, o fator dominante em sua formação é a afinidade e identificação pessoal entre os acionistas, marcadas pela confiança mútua.
Em tais circunstâncias, muitas vezes, o que se tem, na prática, é uma sociedade limitada travestida de sociedade anônima, sendo, por conseguinte, equivocado querer generalizar as sociedades anônimas em um único grupo, com características rígidas e bem definidas.
A regra geral das sociedades limitadas é ser constituída intuitu personae, ao passo que a regra geral das sociedades anônimas é a constituição intuito pecuniae.
As sociedades limitadas ensejam um vínculo instável entre os sócios, enquanto as sociedades anônimas, um vínculo estável.
A aplicação do princípio da autonomia da vontade, no entanto, permite que, por meio de cláusulas dispostas no estatuto social, acabe por tornar intuitu personae uma sociedade por ações.
Dessa forma, para que a sociedade anônima de capital fechado exerça sua função como holding familiar, os sócios deverão estabelecer algumas regras específicas que retirem a essência das sociedades anônimas, qual seja, de que a cessão de ações seja livre.
Ainda que as ações da sociedade anônima de capital fechado sejam indisponíveis no mercado de capitais, faz-se necessário outras restrições, como a transferência de ações a terceiros, a fim de manter o poder de controle.
Essa característica da livre transferência de ações pode ser contornada mediante um pacto parassocial, instrumento jurídico que será visto a seguir.
As sociedades anônimas são sociedades constituídas por meio de um estatuto social, que é composto por um conjunto de normas que orientam a existência e o funcionamento da sociedade e, ao contrário de um contrato social, não indica os sócios que fazem parte da sociedade, mas sim as suas regras.
Nas sociedades anônimas, a cessão das ações, regra geral, independe da anuência dos demais sócios, e a transferência das ações não exige a alteração do estatuto social.
É, portanto, um processo bem mais simples.
No caso de holding familiar, não obstante tratar-se de companhia fechada, essa livre transferência de ações poderá sofrer limitações, desde que prevista no estatuto social ou em acordo parassocial, sendo a solução mais comum a previsão do direito de preferência na compra das ações pelos acionistas e o direito de oposição à alienação de participação societária a terceiros.
O pacto parassocial é um contrato juridicamente possível em que dois, alguns ou todos os sócios contratam entre si regras extraordinárias ao ato constitutivo, colocando assuntos que regulem suas atuações societárias, como o direito de voto.
É conhecido como acordo de quotistas na sociedade limitada e acordo de acionistas na sociedade anônima.
O acordo de acionistas/quotistas, sendo um instrumento particular, é mais sigiloso e pode ser mais específico quanto a questões de interesse comum dos sócios, entrando em detalhes que fogem ao desígnio de um Estatuto/Contrato Social da sociedade, conforme o caso.
Na Lei das Sociedades Anônimas, o pacto parassocial é previsto no art. 118 e dispõe que “os acordos de acionistas, sobre a compra e venda de suas ações, preferência para adquiri-las, exercício do direito a voto, ou do poder de controle deverão ser observados pela companhia quando arquivados na sua sede“.
Quanto à eficácia do pacto parassocial, especificamente no que toca às sociedades por ações, conforme consta no art. 118 da Lei das Sociedades Anônimas, terá eficácia o acordo de acionistas que for arquivado na sede da companhia.
A eficácia do acordo obriga a própria empresa a observar o ajuste.
Assim, o presidente da assembleia da companhia não poderá computar o voto proferido com infração ao acordo devidamente arquivado.
3.4. EIRELI
Em 17/01/2012, entrou em vigor a Lei 12.441/2011, que criou o novo artigo 980-A do Código Civil, que estabelece o seguinte: A empresa individual de responsabilidade limitada será constituída por uma única pessoa titular da totalidade do capital social, devidamente integralizado, que não será inferior a 100 (cem) vezes o maior salário-mínimo vigente no País.
A nova espécie de empresa, cuja natureza jurídica é a mesma das sociedades, é uma pessoa jurídica.
Essa espécie de empresa possibilita ao empresário que quer explorar formalmente uma atividade empreendedora, a limitação da sua responsabilidade por dívidas sociais, sem necessitar de um sócio compondo o corpo societário.
Aliás, a EIRELI não deve ser definida como uma “sociedade de um sócio só”, mas sim uma empresa “com um único componente”.
Por isso, a partir de 17/01/2012, tem sido possível que holdings familiares sejam constituídas na modalidade de EIRELI´s, contendo apenas um componente em seu quadro.
No entanto, a EIRELI, por ser atividade empresarial exercida por um único indivíduo, perde o sentido para fins de sucessão familiar quando há vários herdeiros.