A ADPF é uma das formas de controle de constitucionalidade concentrado, de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal, para apreciação de atos que atentem contra preceito fundamental (ALEXANDRINO; PAULO, 2016).
Tal conceituação decorre do art. 102, §1º, CF : “A arguição de descumprimento de preceito fundamental decorrente desta Constituição será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma de lei“.
O objeto e os efeitos da ADPF ficaram esclarecido pelo art. 1º da lei 9.882/99:
Art. 1o A argüição prevista no § 1o do art. 102 da Constituição Federal será proposta perante o Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público.
Parágrafo único. Caberá também argüição de descumprimento de preceito fundamental:
I - quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição.
De acordo com Alexandrino e Paulo (2016), as ADPF tem eficácia erga omnes e efeito vinculante, tendo em vista que a decisão adotada pelo STF vai nortear o juízo no que tange a legitimidade e ilegitimidade de atos que possuam teor idêntico. Por este motivo a ADPF tem natureza de ação excepcional, subsidiária e residual, já que só é usada em caráter extremo, onde não couber a utilização de outro meio, devido seu caráter vinculante.
De acordo com Arenhart, Marinoni, Mitidiero (2015), o controle de constitucionalide exercido pela via Direta, realizado em relação a leis ou atos normativos federais ou estaduais, só podem ser contestados em face da CF/88, pelo STF, em conformidade com art. 102, I, a:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente:
a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal;
O STF, em face de sua legitimidade para julgamento da ADPF, poderá, por decisão de maioria absoluta de seus membros (art. 5º, da lei nº 9.882/99), deferir o pedido de medida liminar na arguição da ADPF. Bem como o pedido poderá ser concedido, no prazo comum de cinco dias, em caso de extrema urgência, perigo de lesão grave ou em período de recesso poderá o relator conceder a liminar (ad referendum), após ouvir os questionadores do ato, bem como Advogado Geral da União ou o Procurador Geral da República (ALEXANDRINO; PAULO, 2016).
Ainda que seja em medida liminar, os casos de ADPF uma vez concedidos tem efeito vinculante e eficácia geral, se o STF assim determinar, podendo determinar que magistrados de primeira e segunda instância suspendam o andamento de processos ou efeitos de decisões judiciais que tenham tal arguição como objeto de matéria de acordo com art. 21, da Lei 9.868/99(ALEXANDRINO; PAULO, 2016):
Art. 21. O Supremo Tribunal Federal, por decisão da maioria absoluta de seus membros, poderá deferir pedido de medida cautelar na ação declaratória de constitucionalidade, consistente na determinação de que os juízes e os Tribunais suspendam o julgamento dos processos que envolvam a aplicação da lei ou do ato normativo objeto da ação até seu julgamento definitivo.
Parágrafo único. Concedida a medida cautelar, o Supremo Tribunal Federal fará publicar em seção especial do Diário Oficial da União a parte dispositiva da decisão, no prazo de dez dias, devendo o Tribunal proceder ao julgamento da ação no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de perda de sua eficácia.
Diante do exposto indaga-se o seguinte questionamento a respeito do tema: O Código de Processo Civil de 2015 revogou o pedido de limiar na lei da ADPF?
De acordo com Didier Júnior (2014), em relação a suspensão do processo diante da concessão de medida liminar em ADPF, os magistrados condutores do processo devem suspender o processo até que o STD decida definitivamente esta questão, de acordo com art. 265 CPC/73:
Art. 265. Suspende-se o processo:
IV - quando a sentença de mérito:
c) tiver por pressuposto o julgamento de questão de estado, requerido como declaração incidente;
Enquanto que no CPC/15 o rol taxativo de causas de suspensão processual elencados no art. 313, não traz nenhuma referência no que tange a revogação de pedido de liminar em face de ADPF (ARENHART; MARINONI; MITIDIERO, 2015).
Entende-se, portanto, que houve omissão pelo NCPC no pedido de liminar na lei 9.882/99. Surgindo um segundo questionamento: O NCPC pode revogar a lei especial da ADPF? Nesta abordagem estamos diante de um dilema constitucional de conflito de normas, sanado pelo ordenamento jurídico brasileiro, onde a Lei geral (NCPC), ainda que posterior a lei especial (9.882/99), não revoga lei especial.
A jurisprudência corrobora com este entendimento:
Ementa: APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. PRELIMINAR DE NULIDADE. INOCORRÊNCIA. INVERSÃO NA ORDEM DE INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS. PREVALÊNCIA DA LEI ESPECIAL SOBRE A LEI GERAL. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. PRELIMINAR REJEITADA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO. IMPOSSIBILIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE EVIDENCIADAS. CONJUNTO PROBATÓRIO HARMÔNICO E COERENTE. PALAVRA DOS POLICIAIS. CREDIBILIDADE. CONSONÂNCIA COM OS DEMAIS ELEMENTOS DE PROVA. TRAFICÂNCIA COMPROVADA. INCIDÊNCIA DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO ART. 33 , § 4º , DA LEI Nº 11.343 /06. IMPOSSIBILIDADE. RÉU REINCIDENTE. INCONSTITUCIONALIDADE DA REINCIDÊNCIA. INOCORRÊNCIA. NECESSIDADE DE PUNIR COM MAIS RIGOR O AGENTE QUE NÃO SE RECUPEROU PARA O CONVÍVIO SOCIAL. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. ISENÇÃO DAS CUSTAS NA FORMA DA LEI Nº 14.939/2003. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO EM PARTE. - Nos delitos previstos na Lei de Tóxicos , não acarreta nulidade processual a inversão na ordem do interrogatório do acusado, com o indeferimento de aplicação do rito previsto no art. 400 do CPP , modificado pela Lei nº 11.719 /2008. A questão deve ser resolvida observando-se o conflito de normas, onde a lei especial deve prevalecer sobre a geral, de forma que, segundo as regras previstas na Lei nº 11.343 /06, especial em relação ao Código de Processo Penal , o interrogatório do réu deve ocorrer antes da oitiva das testemunhas. Portanto, a modificação introduzida pela Lei 11.719 /08, referente à ordem de inquirição das testemunhas e réus em audiência, em nada alterou o rito especial da Lei de Tóxicos . Ademais, não demonstrada a ocorrência prejuízo advindo ao recorrente, conforme o disposto no art. 563 do CPP , não há que se falar em nulidade. - Se as provas produzidas formam um conjunto probatório harmônico e desfavorável ao apelante, no sentido de que a substância apreendida destinava-se à comercialização, autorizando um juízo de certeza para o decreto condenatório pelo crime de tráfico de entorpecentes, não há (TJ-MG - Apelação Criminal APR 10024120529094001 MG (TJ-MG) .
Tal jurisprudência é consoante com a aplicabilidade do conflito de normas, afirmando a impossibilidade de revogação do pedido de liminar na lei especial da ADPF.