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O princípio da razoável duração do processo e os prazos para a emissão dos pronuncimentos do juiz

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Agenda 11/08/2006 às 00:00

Resumo

            A excessiva morosidade dos processos, que prejudica tanto as partes quanto a administração pública, foi um dos temas tratados na Emenda Constitucional nº 45. A Reforma do Judiciário incluiu o princípio da razoável duração dos processos no rol dos direitos fundamentais e, em função disso, criou algumas formas de agilizar o trâmite processual. Uma das mais relevantes modificações consistiu na vinculação da duração razoável do processo aos prazos para a manifestação dos magistrados. A emenda, através desse mecanismo, passou a determinar que os juizes que realizarem dilações indevidas nos litígios não poderão ser promovidos.

            PALAVRAS-CHAVE: Emenda Constitucional nº 45; razoável duração dos processos; prazos para a manifestação do juiz.


1 Introdução

            Atualmente, tem crescido entre os juristas a preocupação com a morosidade processual. Buscam-se alternativas para agilizar a solução dos litígios sem que, para isso, seja preciso reduzir a atividade cognitiva do juiz.

            Dentre outras causas – como por exemplo: o aumento do número de processos; a falta de recursos financeiros do Estado; a precariedade das sedes onde se instalaram os prédios da Justiça; a falta de recursos tecnológicos e a carência de capital humano adequado para o trabalho forense – destaca-se a concessão de prazos impróprios para a manifestação do juiz, como um dos motivos da demora na resolução das lides.

            Em função da necessidade de que o Estado seja capaz de prestar uma tutela jurisdicional tempestiva, é que a Emenda Constitucional nº 45, conhecida como a Reforma do Judiciário, dispensou especial tratamento à questão da duração das lides. A citada emenda incluiu o "princípio da razoável duração dos processos" no rol dos direitos constitucionais fundamentais e adotou alguns mecanismos que visam imprimir agilidade ao trâmite processual.

            Um dos meios encontrados pelo Legislador da Reforma para reduzir a morosidade dos feitos judiciais foi vincular a duração razoável do processo aos prazos para a emissão dos pronunciamentos do juiz. Eis o tema sobre o qual se debruça o presente artigo. Tentar-se-á, aqui, analisar o significado da inclusão do princípio da "razoável duração do processo" no âmbito constitucional; a forma através da qual o legislador atrelou a duração do trâmite processual aos prazos impróprios dos magistrados; e a eficácia, ou ineficácia, das mudanças implementadas pela Reforma do Judiciário.


2 O EXERCÍCIO DA MAGISTRATURA

            2.1 DA FUNÇÃO DOS MAGISTRADOS

            Sabe-se que, por muito tempo, o juiz de Direito foi visto como "boca da lei", aquele que aplicava, de forma fria e literal, as normas postas no Ordenamento Jurídico. No entanto, o passar dos anos transformou a forma de vida e a organização da sociedade. Por conta disso, o Direito – que pretende acompanhar pari passu a realidade social – também passou por modificações.

            A evolução da Ciência do Direito alterou a visão que se tinha sobre a atuação dos juizes; o exercício da magistratura deixou de ser encarado como uma função mecânica e passou a exigir criatividade, sensibilidade e dedicação, para que seja possível alcançar a justiça através da atividade hermenêutica desempenhada pelos magistrados.

            Na atualidade, desempenhar o papel de juiz é algo extremamente complexo. Atribui-se ao magistrado o dever de tratar as partes com igualdade; o dever de coibir os atos que atentem contra a noção justiça; o dever de impedir o conluio fraudulento – concílio entre partes visando a um fim ilícito com a instauração do processo – ; o dever de tentar, a qualquer tempo, a conciliação entre os litigantes; o dever de aplicar a lei e, nos casos de lacuna, recorrer à analogia, aos costumes e aos princípios gerais do Direito; o dever de buscar a eqüidade – justiça no caso concreto – ainda que para tanto se faça necessário atenuar a austeridade de uma lei; o dever de instruir o processo devidamente, podendo determinar a confecção de provas não solicitadas pelas partes ou a repetição de prova já obtida; o dever de motivar todas as suas decisões ainda que concisamente; o dever de pronunciar-se sobre todo e qualquer pedido formulado em juízo e o dever de zelar pela rápida solução dos litígios.

            Especial importância deve ser dada ao último dos deveres do magistrado acima elencados; o dever de prestar uma tutela jurisdicional célere é essencial para que o processo chegue a um fim justo e útil para as partes. De nada adianta aplicar a norma, respeitar o princípio da isonomia ou alcançar uma decisão equânime, se a sentença for intempestiva. Muito provavelmente, processos judiciais que se alongam demasiadamente produzirão sentenças vazias, inúteis para as partes que, na realidade, não podem esperar a via legal para solucionar seus problemas cotidianos.

            É preciso ter em mente que o autor que propõe uma demanda possui expectativas em torno da decisão do juiz, constrói planos contando com a solução daquele litígio dentro de um tempo razoável. Deferindo ou indeferindo o pedido, a manifestação do magistrado é sempre ansiosamente aguardada pelo requerente e pelo requerido. Inúmeras vezes se vêm casos onde toda a vida de um cidadão é organizada em torno de um processo, e, em função do mesmo, se criam expectativas psicológicas e patrimoniais que depende diretamente da decisão judicial. Assim,

            Se o tempo é a dimensão fundamental da vida humana e se o bem perseguido no processo interfere na felicidade do litigante que o reivindica, é certo que a demora no processo gera, no mínimo, infelicidade pessoal e angústia e reduz as expectativas de uma vida mais feliz (ou menos infeliz). Não é possível desconsiderar o que se passa na vida das partes que estão em juízo. O cidadão concreto, o homem das ruas, não pode ter os seus sentimentos, as suas angústias e as suas decepções desprezadas pelos responsáveis pela administração das justiça.

            Isto para não falar dos danos econômicos, freqüentemente graves, que podem ser impostos à parte autora pela demora do processo e pela conseqüente imobilização de bens e capitais. [01]

            Em suma, "a prestação jurisdicional tardia, [...] pode ser considerada, no mais das vezes, uma tutela jurisdicional VAZIA, sem conteúdo." [02] Por isso, é função do magistrado buscar a solução dos litígios que couberem em sua competência da forma mais rápida possível, sob pena de produzir sentenças sem significado e sem reflexos nas vidas do autor e do réu, ou ainda, de decidir algo que, na realidade, resta a muito decidido.

            2.2 DOS PRAZOS IMPRÓPRIOS PARA EMITIR PRONUNCIAMENTOS

            A Constituição Federal, no art. 5º XXXV, assegura que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito." [03] Tal dispositivo legal prevê o princípio da inafastabilidade da jurisdição: uma vez que a demanda é proposta, por nenhum motivo, poderá o Judiciário eximir-se de decidi-la. No Ordenamento Jurídico brasileiro é vedada a auto-tutela, ou seja, é defeso ao cidadão solucionar seus conflitos por outra via que não a Judicial. Assim sendo, é possível dizer que o Estado avocou para si a responsabilidade de julgar toda e qualquer lide que lhe for apresentada. [04]

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            A concretização do direito fundamental de postular em juízo só é possível se se compreende o dever que dele decorre: posto que todo cidadão tem o direito de recorrer ao Judiciário para ver solucionada uma lide, recai sobre o Estado o dever de prestar a tutela jurisdicional. A partir do que foi dito, é possível concluir que "também o juiz [ou o Estado-juiz] deve ser entendido como destinatário daquele princípio [o da inafastabilidade da jurisdição]". [05] Isto porque, na prática, a prestação da tutela jurisdicional é realizada por meio dos pronunciamentos do magistrado e, finalmente, pela sentença judicial. [06]

            Em função da inafastabilidade da jurisdição, ou seja, porque não poderá haver processo para o qual não se produza uma sentença, se faz necessário conceder prazos impróprios para alguns dos atores do processo: juízes e auxiliares da justiça. [07]

            Destarte se faz pontuar o que vêm a ser os prazos impróprios. "Prazo, pois, é o espaço de tempo em que a lei impõe, permite ou veta a prática de um ato." [08] Tal lapso temporal pode ser classificado de acordo com vários critérios, sendo um deles o que trata da ocorrência ou não de preclusão temporal: prazos próprios são aqueles que estão sujeitos à preclusão por decurso de tempo e, impróprios, são aqueles que não extinguem a possibilidade de praticar o ato processual, ainda que de forma tardia.

            Diante do exposto, é possível concluir que um dos motivos da lentidão no curso dos processos é, justamente, o fato de se atribuírem prazos impróprios para a emissão de pronunciamentos do magistrado. Já que não há, de fato, termo final para expedir despachos, interlocutórias ou sentenças, e, "permitir que os atos processuais se pratiquem sem prazo marcado será correr o risco de eternizar os litígios". [09]

            2.3 DA RESPONSABILIZAÇÃO DO JUIZ ATÉ A IMPLANTAÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45

            Até a implantação da Emenda Constitucional nº 45, em 30 de dezembro de 2004, a forma de responsabilizar os magistrados pela demora excessiva no curso dos processos consistia, basicamente, na aplicação da redação dos artigos 198 e 199 do Código de Processo Civil, que assim dispõem:

            Art. 198 Qualquer das partes ou o órgão do Ministério Público poderá representar ao presidente do Tribunal de Justiça contra o juiz que excedeu os prazos previstos em lei. Distribuída a representação ao órgão competente, instaurar-se-á procedimento para apuração da responsabilidade. O relator, conforme as circunstâncias, poderá avocar os autos em que ocorreu excesso de prazo, designando outro juiz para decidir a causa.

            Art. 199 A disposição do artigo anterior aplicar-se-á aos tribunais superiores na forma que dispuser seu regime interno. [10]

            No entanto, os dois citados dispositivos nunca se mostraram suficientes para garantir o empenho dos juízes em concretizar uma tutela jurisdicional tempestiva. Eis algumas das razões para tal ineficácia: dificilmente os advogados comunicavam ao Tribunal competente as falhas do juiz, posto que temiam ser alvo de rechaço do julgador, tanto na decisão em trâmite quanto em outros processos; o corporativismo inegável que existe entre os magistrados, reforçava o receio da advocacia com relação à possibilidade de futuras represálias; o cansaço que recaía sobre autor e réu, como conseqüência da extensão prolongada do processo e até mesmo de sua natureza litigiosa, levava-os a querer distância dos prédios do Judiciário, restando poucos com disposição para ir aos Tribunais de Justiça representar contra o juiz; o Ministério Público, sempre sobrecarregado, dispunha de ínfimo tempo para prestar tais reclamações, [11] dentre outros motivos.

            Tem-se, portanto, que antes da Emenda Constitucional nº 45, as possibilidades de responsabilização dos magistrados pela dilação excessiva no curso dos processos eram escassas. Além disso, ainda que as partes ou o Ministério Público viessem a reclamar com os Tribunais competentes, as punições cabíveis aos juízes tardinheiros [12] mostravam-se pouco efetivas.


3 A RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO

            3.1. DA VAGUEZA SEMÂNTICA DA EXPRESSÃO

            Uma das alterações trazidas pela Emenda Constitucional nº 45 foi a inclusão do inciso LXXVIII ao art. 5º, com a seguinte redação: "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantem a celeridade de sua tramitação." [13]

            A partir da referida alteração, a razoável duração do processo passou a constar no rol dos direitos e garantias constitucionais fundamentais e, por conta disso, tem se tornado tema cada vez mais abordado em debates entre os profissionais de toda a seara jurídica e, em especial, entre os processualistas. Uma das críticas que se tem feito ao novel inciso, funda-se no fato de a expressão "razoável duração" apresentar uma vagueza de sentido.

            No entanto, o fato de poderem haver várias interpretações acerca do mencionado inciso, não faz a alteração constitucional ser defeituosa. Pelo contrário, tendo em vista que "em qualquer processo civil há uma situação concreta, uma luta por um bem da vida, que incide de modo radicalmente oposto sobre as posições das partes (...)" [14], não há como traçar um período único de duração para cada um deles.

            Como a maior parte dos princípios jurídicos, o princípio da razoável duração é flexível, é adaptável a qualquer dos litígios que se encontre sob sua égide e, por isso mesmo, deve ser positivado através de cláusula geral que permita sua aplicação a todo e qualquer processo. "A duração razoável do processo, assim, será aquela em que melhor se puder encontrar o meio-termo entre a definição segura da existência do direito e a realização rápida do direito cuja existência foi reconhecida pelo juiz." [15]

            Por último, é preciso dizer que não se pretendia resolver a questão da morosidade dos processos com a simples inclusão do citado dispositivo no texto constitucional, na verdade, o legislador de reforma buscava dar relevo especial a tal problema, para que, a partir de então, os juristas passassem a procurar, ainda mais, meios de acelerar o procedimento sem reduzir a atividade cognitiva do processo.

            3.2 DA ATUAL DURAÇÃO DOS PROCESSOS

            Não apenas no Brasil, mas em todo o mundo, um dos maiores problemas enfrentados pelo Direito é o da excessiva morosidade dos processos. O Estado, que veda a autotutela, é incapaz de solucionar os conflitos pela via judicial dentro de um tempo razoável.

            Na Itália, os processos em primeira instância, entre 1991 e 1997, duravam em média quatro anos. No Japão, antes da implantação do novo código (1998) para chegar à Suprema Corte os processos não levavam menos do que uma década. [16] Um levantamento feito em Portugal, em 2002, revelou que uma ação de despejo leva aproximadamente onze anos para chegar ao fim no primeiro grau de jurisdição. [17] Apesar de não haver estatísticas precisas, a situação não é diferente no Brasil: os litígios que, ressalvados os imprevistos, deveriam durar em média 131 dias, [18] raramente chegam a termo antes de completarem o primeiro ano.

            A lentidão no trâmite dos processos prejudica não só à administração pública, mas também, e principalmente, aos litigantes. Segundo HERKENHOFF,

            A demora dos processos, os processos que contam tempo, não por anos, mas por qüinqüênios, como já verberava Rui Barbosa, não atentam apenas contra a cidadania e uma boa política judiciária. Ferem também a pessoa, na sua estrutura de vida, de pensamentos e de emoções.

            Eu não me refiro aos grandes litigantes, às empresas. Nestas, o litígio não tem dimensão Pessoal. Eu me refiro aos litigantes de um processo só, às pessoas que acidentalmente têm uma questão nos tribunais. Questão em torno de um bem às vezes vital. Quantas vezes o processo, em vez de conduzir à Justiça e à libertação existencial, conduz, pela lentidão de seus caminhos, à doença e à morte.

            Não se pode pretender humanizar a Justiça sem enfrentar e vencer essa tragédia e essa violência que é a lerdeza dos processos. [19]

            3.3 DO EQUILÍBRIO ENTRE A CELERIDADE PROCESSUAL E A SEGURANÇA JURÍDICA

            Apesar da preocupação global com relação à lentidão dos processos, é preciso dizer que a tão buscada celeridade não pode vir a comprometer a atividade cognitiva do juiz. De nada adianta imprimir presteza ao trâmite se, ao final, o processo apresentar para os litigantes uma solução injusta ou superficial.

            Quando se propõe uma demanda não há, num primeiro plano, a preocupação com a rapidez em obter a resposta, o que se busca, de fato, é a solução daquele conflito de interesses. Como já foi dito, a pior das conseqüências da morosidade na prestação da tutela jurisdicional é, exatamente, a perda do objeto do processo, a negação da sua natureza instrumental e do seu caráter de caminho para a concretização de direitos materiais. Verdadeiramente, "de nada adianta a prestação tardia; o direito pode ter perecido, na prática, ou perdido muito de seu significado para o seu detentor." [20]

            Infere-se, assim, que ao primar pela celeridade – e só pela celeridade – um juiz pode vir a cometer outros erros que são, no mínimo, tão prejudiciais quanto a demora para proferir sua decisão final. Neste contexto, tem-se que a tutela prestada em tempo curto não é, necessariamente, a garantia de uma solução adequada para a lide. Tanto quanto a morosidade traz a angústia e a sensação de insegurança para os litigantes, a sentença superficial ou injusta gera o descrédito e a insatisfação social. Ainda, é preciso ponderar que o descontentamento em relação aos pronunciamentos emitidos gera crescimento tanto na proposição de recursos quanto na de novas demandas. De acordo com o irretocável BARBOSA MOREIRA,

            Se uma Justiça lenta demais é decerto uma Justiça má, daí não se segue que uma Justiça muito rápida seja necessariamente uma Justiça boa. O que todos devemos querer é que a prestação jurisdicional venha a ser melhor do que é. Se para torná-la melhor é preciso acelerá-la, muito bem: não, contudo, a qualquer preço. [21]

            Diante do exposto, conclui-se que apenas o fato de tornar o processo mais rápido, não garante a satisfação de seus sujeitos. É preciso sim aperfeiçoar os mecanismos e minorar a burocracia processual, [22] sem deixar, no entanto, que a celeridade prevaleça sobre a segurança jurídica das decisões.


4.MUDANÇAS IMPLEMENTADAS PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45 COM RELAÇÃO OS PRAZOS PROCESSUAIS

            4.1 DA VINCULAÇÃO DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO AOS PRAZOS PARA MANIFESTAÇÃO DO JUIZ

            A implementação da Emenda Constitucional nº 45, trouxe consigo a possibilidade de vincular a duração razoável dos processos à atividade dos magistrados. A partir desta alteração, tornou-se possível responsabilizar os juizes por dilações indevidas no trâmite processual. Entendem-se aqui "dilações indevidas" como:

            os atrasos ou delongas que se produzem no processo por inobservância dos prazos estabelecidos, por injustificados prolongamentos das etapas mortas que separam a realização de um ato processual e outro, sem subordinação a um lapso temporal previamente fixado, e, sempre, sem que aludidas dilações dependam da vontade das partes ou de seus mandatários. [23]

            Mas qual a forma encontrada pelo legislador da reforma, para atrelar o período de tempo que o processo leva para chegar a termo e o prazo para os pronunciamentos do magistrado? Quais foram as alterações constitucionais que viabilizaram essa mudança?

            A mencionada vinculação só foi possível devido à inclusão, já citada, do inciso LXXVIII ao artigo 5º, à alteração da redação da alínea "c" do art. 93, II e à inclusão, nos mesmos artigo e inciso, da alínea "e". Desta forma, a Carta Magna passou a determinar que:

            Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

            (...)

            II- promoção de entrância para entrância, alternadamente, por antiguidade e merecimento, atendidas as seguintes normas:

            (...)

            c) aferição do merecimento conforme o desempenho e pelos critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição e pela freqüência e aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de aperfeiçoamento; [alteração da redação]

            (...)

            e) não será promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão. [inclusão] [24]

            Decorre de tais mudanças o fato de que, doravante, os juizes somente serão promovidos se atenderem a critérios objetivos: produtividade e presteza. Significa dizer que aquele magistrado, que por culpa exclusiva atrasar o trâmite dos processos ou que não for ágil na solução dos mesmos, não receberá promoção. Além disso, os juizes que não forem produtivos, ou seja, aqueles que praticarem menos atos processuais do que poderiam e deveriam ter praticado – logicamente levando-se em conta a complexidade dos processos que estão sob sua responsabilidade –, estarão impossibilitados de acessar às instâncias superiores. Enfim, o desrespeito aos prazos por desídia do magistrado se tornou causa impeditiva de promoção.

            Portanto, o mecanismo criado pela Emenda atrelou a razoável duração do processo aos interesses pessoais dos magistrados, pretendendo, com isso, despertar neles verdadeiro interesse e empenho na prestação de uma tutela jurisdicional dentro do menor tempo possível.

            4.2 DO CONTROLE EXERCIDO PELO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

            A Emenda Constitucional nº 45 tratou de incluir no rol dos órgãos do Poder Judiciário, mais especificamente no art. 92, I-A, o Conselho Nacional de Justiça. Ao mais novo órgão judicial brasileiro foram atribuídas várias funções, que se encontram elencadas no art. 103-B, §4º, incisos I ao VII. Resumidamente, "o Conselho Nacional de Justiça é um órgão centralizador de fiscalização de natureza externa e superior aos demais órgãos integrantes do Poder Judiciário". [25]

            Antes de prosseguir, é preciso dizer que nesta parte do presente artigo não se pretendem exaurir as considerações que devem ser feitas acerca da criação do Conselho Nacional de Justiça, nem sequer tratar-se-ão das mais básicas questões a que o polêmico tema remete. Aqui, apenas se pretende apontar como a atuação do novo órgão do Poder Judiciário pode contribuir para a razoável duração do processo.

            A redação do artigo 103-B da Constituição Federal determina que:

            § 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura: (...)

            III - receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou oficializados, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa; (...)

            § 5º O Ministro do Superior Tribunal de Justiça exercerá a função de Ministro-Corregedor e ficará excluído da distribuição de processos no Tribunal, competindo-lhe, além das atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura, as seguintes:

            I receber as reclamações e denúncias, de qualquer interessado, relativas aos magistrados e aos serviços judiciários; (...) [26]

            Resta claro, diante do que a Magna Carta passou a dispor, que a implantação do supracitado Conselho reforça a possibilidade de responsabilização dos magistrados por dilações indevidas nos processos. Isto porque, ao novo órgão foi concedido o poder de instaurar processos administrativos contra os juizes que, por culpa exclusiva, alongarem o trâmite processual, podendo os mesmos serem removidos, dispostos ou aposentados por determinação daquele órgão.

            É preciso salientar ainda, que não só os prazos para a emissão de pronunciamentos do juiz, mas também todas as atividades vinculadas ao Poder Judiciário, como por exemplo a serventia cartorária, os serviços da contadoria e da distribuição e a atividade dos Oficiais de Justiça, estarão submetidas ao controle do Conselho Nacional de Justiça.

            Portanto, a existência de um órgão capaz de impor sanção a qualquer membro do Poder Judiciário que venha a executar suas funções de forma inadequada, mediante provocação de qualquer interessado, é, sem dúvida, uma inovação que amplia as possibilidades de concretização do princípio da razoável duração do processo. Assim, sem pretender concluir o debate que cerca a implantação do Conselho Nacional de Justiça, é possível afirmar que tal órgão pode vir a ser de grande utilidade no que diz respeito à necessidade de que o Estado consiga prestar uma tutela jurisdicional útil e tempestiva.

            4.3 DAS DEMAIS MODIFICAÇÕES QUE VISAM IMPRIMIR CELERIDADE AO TRÂMITE PROCESSUAL

            Além de vincular a duração razoável do processo aos prazos para emissão dos pronunciamentos do juiz, a Emenda Constitucional nº 45 também trouxe várias outras modificações que visam imprimir celeridade ao trâmite processual.

            Dentre outras, podem ser citadas as seguintes mudanças: a eliminação das férias coletivas nos juízos de primeiro e de segundo graus (inclusão do inciso XII ao art. 93); a proporcionalidade entre o número de juizes e o número de pleitos judiciais de cada comarca (inclusão do inciso XIII ao art. 93) e a delegação aos servidores judiciários da prática de "atos de administração e atos de mero expediente" [27] (inclusão do inciso XIV ao art. 93).

            A vedação das férias coletivas parece ser, a priori, uma medida eficaz na redução da morosidade processual. Anteriormente, durante o alongado recesso paralisavam-se todas as atividades do Judiciário e suspendiam-se os prazos processuais, o que prejudicava, irreparavelmente, os interesses de toda a sociedade. De fato,

            Nem se pode conceber a idéia de que os direitos possam ficar sobrestados em determinada época do ano, como se naquele período houvesse verdadeiro período de hibernação da ordem jurídica e da vida social. Assim, parece mais que razoável a extinção dessa prática, ainda mais tratando-se de atividade na esfera pública. [28]

            Com relação às outras duas mudanças citadas – a proporcionalidade entre o número de magistrados e a demanda judicial das comarcas, e também a delegação de algumas funções, que até então só podiam ser exercidas pelos magistrados, aos serventuários – poucas são as chances de que venham a contribuir, realmente, para a agilidade dos processos. Isso porque, tais medidas dependem tanto de melhorias orçamentárias quanto de profissionais capacitados.

            A questão da má gestão financeira sequer precisa ser aqui esmiuçada, é da ciência de todos que no Brasil, a muito, os serviços que dependem da gestão estatal não recebem os investimentos nem a atenção devidos por parte dos governantes. Vale dizer ainda, que, como reflexo da falta de capital, freqüentemente vêem-se prédios da Justiça com instalações precárias, condições insalubres de trabalho, falta de tecnologia adequada, e outros problemas conhecidos da prática forense.

            A ausência de profissionais qualificados também é um fator que se pode relacionar à falta de recursos: não são oferecidos cursos de capacitação ou reciclagem aos servidores do Poder Judiciário, o que culmina com o desempenho insatisfatório de suas funções. Além disso, as altas taxas de reprovação nos concursos da magistratura reforçam o descrédito das medidas aqui comentadas, pois os concursos públicos são, agora, a única forma de ingresso na carreira e, conseqüentemente, a única forma de aumentar o número de juizes nas cidades brasileiras.

            Enfim, a alteração da legislação não é suficiente para agilizar a solução dos litígios. Para alcançar tal objetivo é preciso alterar as estruturas do Poder Judiciário, tanto no que diz respeito à questão institucional quanto no que trata da atuação de seus operadores. No entanto, não se devem desprezar as aludidas modificações, pois, ainda que tímidas, elas demonstram o crescimento da preocupação com a morosidade processual e lastreiam, assim, a adoção de medidas capazes de agilizar a decisão dos litígios.

Sobre a autora
Katharina Maria Marcondes Ferrari

bacharelando do curso de Direito em Vitória(ES)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERRARI, Katharina Maria Marcondes. O princípio da razoável duração do processo e os prazos para a emissão dos pronuncimentos do juiz. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1136, 11 ago. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8778. Acesso em: 23 nov. 2024.

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