A Certidão de Dívida Ativa (CDA) da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, é um título executivo extrajudicial referente a créditos inscritos na forma da lei.
A CDA revela a existência de uma dívida ativa, constituída por débitos de natureza tributária ou não tributária, de acordo com a Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal – LEF)[1] e segundo os parâmetros da Lei nº 4.320/1964, que congrega as Normas Gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal[2].
As quantias cuja cobrança, de acordo com a lei, deva ser realizada pelas pessoas jurídicas de direito público indicadas acima, serão reputados dívida ativa da Fazenda Pública. Com relação às regras procedimentais, cumpre notar que a execução judicial para cobrança da dívida ativa das pessoas jurídicas de Direito Público (União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias), é disciplinada, basicamente, pela LEF e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil[3].
Por ser título executivo extrajudicial a CDA deve representar um crédito certo, líquido e exigível, sob pena de não ser instrumento executivo suficientemente válido para sustentar a pretensão executiva da Fazenda Pública. Convém lembrar que pelo procedimento de inscrição o órgão responsável pela avaliação da certeza e liquidez do crédito, exerce controle administrativo da legalidade da dívida ativa. Cada ente federado terá órgão próprio para desempenho dessas funções. No caso da União a dívida será apurada e inscrita pela Procuradoria da Fazenda Nacional.
No que se refere à modificação do título, considerando que em certas ocasiões pode ser verificada a existência de vícios sanáveis, para garantir a adequação da CDA aos parâmetros legais, principalmente de certeza e liquidez, é conveniente, dentro de limites razoáveis, que seja autorizada a correção de erros formais ou materiais, mesmo que no decorrer do processo executivo. Essa possibilidade favorece a celeridade e eficiência do processo executivo, na medida que permite a desenvolvimento do procedimento pela supressão de vícios sanáveis, sem necessidade da propositura de novas demandas.
Com base nessa lógica, em algumas hipóteses, mesmo havendo desarranjos formais, não será necessária sequer a alteração da CDA. É o que se passa, por exemplo, nos casos em que o excesso dos valores cobrados pode ser apurado por meio de simples operações matemáticas.
Seguindo esse entendimento, o Superior Tribunal de Justiça concluiu corretamente ser possível o prosseguimento da execução fiscal sem a necessidade de emenda ou substituição da Certidão da Dívida Ativa, quando, mediante simples cálculo aritmético, puder ser verificado o excesso da cobrança, mesmo originado de lançamento fundado em lei posteriormente declarada inconstitucional. Este entendimento foi firmado em julgamento que tramitou sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 (Tema 249).
O posicionamento pode ser reconhecido no recente julgado:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. EXIGIBILIDADE DA CDA. EXCESSO DE EXAÇÃO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DOS ART. 151, V, DO CPC/2015. ART. 3º DA LEI N. 6.830/1990. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SEM EMBARGOS DECLARATÓRIOS. INCIDÊNCIA DOS ENUNCIADOS SUMULARES N. 282 E 356/STF. ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL DE ORIGEM EM CONFORMIDADE COM TEMA REPETITIVO. RESP N. 1.115.501/SP. PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL. VALOR REMANESCENTE DO LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO. LEGISLAÇÃO POSTERIORMENTE DECLARADA INCONSTITUCIONAL. CONTROLE DIFUSO. AUSÊNCIA DE LIQUIDAÇÃO DO TÍTULO EXECUTIVO. EXCESSO COBRADO PELO FISCO. HIGIDEZ DO ATO DE CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DISPENSA A EMENDA OU SUBSTITUIÇÃO DA CDA.
I - Na origem, foi ajuizada ação ordinária em desfavor da Fazenda Pública do Estado de São Paulo, tendo como objetivo a declaração de inexigibilidade e o cancelamento do protesto da CDA indicada na inicial, em razão do excesso de exação com a aplicação da Lei Estadual n. 13.918/09. Após sentença que julgou parcialmente procedente para determinar a readequação da CDA, em razão do excesso de exação, foi interposta apelação, que teve seu provimento parcialmente negado pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ficando consignado o cancelamento do protesto, mantida a exigibilidade da CDA.
II - Interposto recurso especial, apontando violação dos arts. 151, V do CPC/2015 e 3º da Lei n. 6.830/1990. Sustenta, em síntese, que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo apenas determinou o cancelamento do protesto realizado, sem, no entanto, suspender a exigibilidade dos créditos discutidos. Aduz que, uma vez declarada inconstitucional a aplicação dos juros acima da SELIC, está o mesmo a reconhecer que o crédito é ilíquido e, portanto, tem o condão de afastar a liquidez de tais títulos, e, consequentemente, a suspensão da sua exigibilidade.
III - Após decisum que inadmitiu o recurso especial, com base na ocorrência de ausência de violação/negativa de vigência/contrariedade e na aplicação do entendimento sufragado no recurso repetitivo REsp n. 1.115.501/SP ou tema do 249 do STJ, foi interposto agravo, tendo a parte recorrente apresentado argumentos visando rebater os fundamentos da decisão agravada. Esta Corte conheceu do agravo para conhecer parcialmente do recurso especial e, nessa parte, negar-lhe provimento. Interposto agravo interno. Sem razão a parte agravante.
IV - Sobre a alegada violação do art. 151, V do CPC/2015, no qual prevê, como causa de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial, verifica-se que, nem no acórdão recorrido, nem nos embargos, foi analisado o conteúdo do dispositivo legal, pelo que carece o recurso do indispensável requisito do prequestionamento. Incidência dos Enunciados Sumulares n. 282 e 356 do STF.
V - Não constando do acórdão recorrido análise sobre a matéria referida no dispositivo legal indicado no recurso especial, restava ao recorrente pleitear seu exame por meio de embargos de declaração, a fim de buscar o suprimento da suposta omissão e provocar o prequestionamento, o que não ocorreu na hipótese dos autos.
VI - Quanto à alegada violação dos arts. 2º e 3º da Lei n. 6.830/1990, nota-se que o entendimento do Tribunal a quo está em conformidade com a tese firmada no REsp n. 1.115.501/SP, julgado sob a sistemática dos recursos repetitivos no sentido de que o prosseguimento da execução fiscal (pelo valor remanescente daquele constante do lançamento tributário ou do ato de formalização do contribuinte fundado em legislação posteriormente declarada inconstitucional em controle difuso) revela-se forçoso em face da suficiência da liquidação do título executivo, consubstanciado na sentença proferida nos embargos à execução, que reconheceu o excesso cobrado pelo fisco, sobressaindo a higidez do ato de constituição do crédito tributário, o que, a fortiori, dispensa a emenda ou substituição da Certidão de Dívida Ativa (CDA), correspondente ao Tema n. 249 do STJ . Confira-se: REsp n. 1.115.501/SP, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 10/11/2010, DJe 30/11/2010.
VII - Estando o entendimento do acórdão recorrido em consonância com julgado desta Corte de Justiça sob o rito dos recursos repetitivos, o improvimento do recurso é medida que se impõe.
VIII - Agravo interno improvido.
(AgInt no AREsp 1652930/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/11/2020, DJe 18/11/2020)
[1] Art. 2º da LEF. Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320/4964.
[2] Art. 39. Os créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária, serão escriturados como receita do exercício em que forem arrecadados, nas respectivas rubricas orçamentárias. § 1º - Os créditos de que trata este artigo, exigíveis pelo transcurso do prazo para pagamento, serão inscritos, na forma da legislação própria, como Dívida Ativa, em registro próprio, após apurada a sua liquidez e certeza, e a respectiva receita será escriturada a esse título. § 2º - Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais.
[3] Art. 1º da LEF