COMENTÁRIOS A CERCA DO CASO LULA E A ANULAÇÃO DE UMA SENTENÇA ANUNCIADA
Dobjenski, Sandra Mara. [1]
Dobjenski, Silmara Marcela.[2]
Nesta terça feira, 08 de março de 2021, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu anular as condenações proferidas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela extinta Operação Lava Jato. Na decisão, o ministro entendeu que a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha competência legal para julgar as acusações.
Pela decisão, ficam anuladas as condenações nos casos do triplex do Guarujá (SP), com pena de 8 anos e 10 meses de prisão, e do sítio em Atibaia, na qual Lula recebeu pena de 17 anos de prisão. Os processos deverão ser remetidos para a Justiça Federal em Brasília para nova análise do caso.
A anulação ocorreu porque Fachin reconheceu que as acusações da força-tarefa da Lava Jato contra Lula não estavam conexas com os desvios na Petrobras. Dessa forma, seguido precedentes da Corte, o ministro remeteu os processos para a Justiça Federal em Brasília, cabendo dessa forma uma análise com fundamentos legais a cerca do tema.
Cabe salientar que as regras de competência previstas na lei, ao concretizarem o princípio do juiz natural, servem para garantir a imparcialidade da atuação jurisdicional: respostas análogas a casos análogos. Com as recentes decisões proferidas no âmbito do STF, não há como sustentar que apenas o caso do ora paciente deva ter a jurisdição prestada pela 13ª Vara Federal de Curitiba. No contexto da macrocorrupção política, tão importante quanto ser imparcial é ser apartidário, disse o ministro Edson Fachin na decisão ao proferir a anulação das condenações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. BRASIL. Embargos de declaração. HABEAS CORPUS 193.726. Paraná. Ministro relator:
Edson Fachin. Superior Tribunal de Justiça. [3]
De acordo com PRONER etc. e tal. (2017, p.10)[4] o caráter inédito da condenação criminal de um ex-presidente da República em circunstâncias políticas em tese não comparáveis às das ditaduras brasileiras do século passado, a sentença, que em larga medida era aguardada como desfecho não surpreendente do processo criminal, provocou imediata reação entre os que a leram comprometidos unicamente com o propósito de tentar entender os motivos pelos quais Luiz Inácio Lula da Silva estaria sendo punido pela prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de ativos de origem ilícita.
A certeza da condenação era fato. Admiradores e opositores do ex-presidente sabiam que não haveria outro veredicto. A dúvida residia em conhecer as razões da condenação, exigência normativa da Constituição de 1988.
Pelo sistema Processual Penal Brasileiro, a ampliação da competência de foro ou juízo pressupõe a existência de conexão entre as infrações, a fim de que haja unidade de processo e julgamento. São questões jurídicas e que estão tratadas expressamente no Código de Processo Penal (CPP).
Direito não é para leigos, normalmente são jornalistas a serviço de um trágico punitivismo, a imprensa é a cada dia, mais midiática e assume o papel de juiz, investigador, condenando e absolvendo a sua revelia, que transformam informações em notícias ao seu bel prazer. O jornalismo investigativo é hoje a maior fonte de honorários para as redes de televisão.
No entanto, cabe a ressalva de que a motivação das decisões e a publicidade dos julgamentos são as armas pacíficas do Estado de Direito contra arbítrios e abusos, além de proporcionarem aos tribunais a oportunidade de uma maior qualidade e eficiência na tarefa de corrigir sentenças consideradas injustas, malgrado proferidas com apoio em sincera crença de que o Direito foi aplicado ao caso concreto.
Desta forma, cabe realçar que, para que o então juiz Sergio Moro tivesse competência para julgar os três processos em que o ex-presidente Lula figura como réu se faria necessário que os supostos crimes ocorridos no estado de São Paulo fossem conexos com o "crime-mãe", ou seja, tivessem ocorrido simultaneamente; afim de que a competência do então juiz Sergio Moro fosse reconhecida pelos preceitos legais, dessa forma o delito poderia atrair para a sua competência os demais crimes conexos, consumados em locais diversos.
O crime conexo nada mais é do que aquele delito relacionado a outro quando praticado para a realização ou ocultação do segundo, porque estão em relação de causa e efeito, ou porque um é cometido durante a execução do outro. Modalidade unida à outra por um ponto comum. Dessa forma um crime de homicídio, executado para eliminar a testemunha de um roubo.
De acordo com o artigo 76 do CPP ocorre conexão quando os motivos que ensejam em alteração ou modificação da competência processual, e não podem ser confundidas com critérios de fixação de competência. Assim prescritos:
Art. 76. A competência será determinada pela conexão: (na verdade, trata-se de modificação por prorrogação de competência)
I - se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas, ou por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar, ou por várias pessoas, umas contra as outras;
II - se, no mesmo caso, houverem sido umas praticadas para facilitar ou ocultar as outras, ou para conseguir impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas;
III - quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração. BRASIL (2016, p.18)[5]
A conexão e continência não são critério de fixação de competência, mas sim de motivos que ensejam a modificação/alteração de competência de maneira que ocorre quando há fatores que indicam que os processos devem ser julgados por um único juízo, para evitar julgamentos colidentes e para prezar pelo Princípio da Celeridade e Economia Processual.
Para tanto, quando se fala em conexão, esta nada mais é do que um liame entre dois fatos tipificados como crime e neste diapasão, a existência de duas ou mais infrações é essencial à existência da conexão ou, em alguns casos, também entre dois ou mais agentes maiores de dezoito anos.
Diante de tais apontamentos, é notório de que, o trabalho dos juízes, como expressão de atividade republicana regulada por um conjunto escrupuloso de regras jurídicas materiais e processuais, está sujeito a ser conhecido e avaliado não somente pelas partes destinatárias diretas da sentença. Cada pessoa, interessada na sorte de seu semelhante submetido a um processo criminal, dispõe de meios e recursos para promover uma verdadeira arqueologia das razões pelas quais alguém é condenado ou absolvido.
No que tange ao caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o então juiz da 13ª região Moro o condenou a 12 anos e 01 mês por corrupção e lavagem de dinheiro, no caso do triplex no Guarujá.
Em sentido lato sensu, o crime de lavagem de dinheiro foi Influenciado pelo compromisso assumido na Convenção de Viena, em 1988, sendo que o Brasil editou a Lei nº. 9.613/98, que: tipifica os crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; dispõe sobre a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos na lei e cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF.
Sendo que o crime de lavagem de dinheiro reclama um processo complexo e bem estruturado, envolvendo várias operações até a sua consumação. Nesse sentido, a ação que analisará especificamente o crime não depende da conclusão de outros procedimentos fiscais ou inquisitórios, como ocorre nos processos envolvendo o crime de sonegação fiscal em que deve ser respeitada a súmula vinculante 24 do STF.
No que tange a competência para julgamento, salienta-se que o processo penal que apura o crime de lavagem de dinheiro nem sempre será julgado pela Justiça Federal, até porque só será de competência Federal quando houver um prejuízo à União, como determina a Constituição. Logo, serão analisadas sempre pela Justiça Estadual as ações penais de branqueamento de capitais quando a prática criminosa ocorrer no território nacional, sem se beneficiar da utilização de instituições financeiras. Dessa forma, quando a polícia civil desarticula uma quadrilha de tráfico de drogas e apreende inúmeros bens que supostamente foram adquiridos com o dinheiro do tráfico de drogas, a ação penal de lavagem de dinheiro será de competência da Justiça Estadual.
Já no caso do sítio de Atibaia, no interior paulista, a juíza substituta Gabriela Hardt, que estava no lugar de Moro, condenou Lula a 12 anos e 11 meses de prisão. Sendo que em segunda instância, Lula teve a pena ampliada para mais de 17 anos de prisão pelos desembargadores do TRF-4.O ex-presidente foi acusado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Apesar de condenado, o ex-presidente está solto em razão de decisão do STF que barrou a prisão após condenação em segunda instância.
O processo do sítio foi conduzido em quase sua totalidade pelo ex-juiz federal Sergio Moro, que deixou a magistratura às vésperas do interrogatório do petista para integrar o governo de Jair Bolsonaro.
O interrogatório é uma das últimas etapas de um processo antes de uma sentença ser proferida. Os advogados do ex-presidente aguardam que o STF julgue uma ação que, acusa Moro de ser parcial. Eles esperam que o Supremo anule tanto a sentença do sítio quanto a do processo do tríplex, também conduzido por Moro. A expectativa era de que a ação no Supremo seja favorável a Lula.
E a decisão foi proferida pelo Ministro Fachin, anulando as condenações do ex presidente e se estendendo para outros processos que ainda tramitam contra Lula na 13ª Vara Federal de Curitiba.
O entendimento monocrático do ministro Edson Fachin foi de que, diante do que está disposto na lei processual, não basta que um suposto crime tenha alguma "ligação com os crimes contra a Petrobras". Para que seja subtraída a competência do foro de São Paulo, se faz absolutamente necessária à presença de uma das hipóteses de conexão transcritas no Art. 76 do CPP.
Entretanto, o ministro do STF Marco Aurélio Mello avalia que a decisão de Edson Fachin, seu colega de Corte, possa ser anulada, visto que contém brechas que podem ser derrubadas em caso de análise no plenário.
O ministro, após ler a decisão de Fachin, disse que a decisão “potencializou” o princípio da territorialidade, conceito jurídico segundo o qual um crime deve ser julgado onde foi cometido. Fachin considerou que a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha competência para julgar os processos de Lula porque os fatos não se referem unicamente à Petrobras.
Para PRONER e STROZAKE (2017, p. 14)[6] a fragilidade da técnica jurídica empregada no decisório revela a insegurança, incerteza e maleabilidade que permeiam os atos praticados nos processos promovidos contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para os autores as conquistas decorrentes do princípio do devido processo legal são ainda mais fundamentais, são irrenunciáveis garantias das quais decorrem o estado de inocência, a imparcialidade do juiz, a motivação das decisões, a proibição da prova ilícita, a isonomia, a publicidade dos atos processuais, a inafastabilidade da jurisdição, a ampla defesa e a assistência jurídica.
A decisão individual do ministro Fachin foi tomada com base na ação apresentada pela defesa do ex-presidente Lula em novembro do ano passado que questionou a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba para processar e julgar a ação do triplex do Guarujá e pediu a anulação das decisões tomadas no âmbito desse processo.
O argumento foi o de que não há relação entre os "desvios praticados na Petrobras", investigados no âmbito da extinta Operação Lava Jato, e o custeio da construção e reforma do tríplex, que a acusação diz terem sido feitas em benefício de Lula.
Cabe a ressalva de que os "primitivos" delitos já foram objeto de julgamento de mérito, não sendo cabível subtrair a competência do foro de Curitiba no que tange ao julgamento de tais institutos, abrindo sérios precedentes jurisprudenciais a cerca do fato.
Dessa forma, o também ministro Marco Aurélio aponta dois pontos que serão explorados por aqueles que discordam da decisão no caso de ida ao plenário: a continência que leva em conta ter-se mais de um réu no processo. Há diversos outros réus que podem ter atuado em outras regiões nas ações que envolvem Lula e a conexão probatória que trata-se da conexão entre fatos diferentes. No caso de Lula, as ações sobre o sítio de Atibaia, o tríplex do Guarujá, a compra de um terreno para o Instituto Lula e as doações à mesma entidade se conectam pelo fato de que a propina teria saído de contratos da Petrobras,
É fato que a corrupção é um fenômeno social, político, econômico e, jurídico que afeta a todos, mina as instituições democráticas, retarda o desenvolvimento econômico e fragiliza a justiça plena que necessita a qualquer custo combater a corrupção, em todas as esferas, de forma a respeitar os direitos fundamentais, tão duramente conquistados em anos de luta contra a opressão e o arbítrio.
O ministro disse seguir precedentes (decisões anteriores) do STF que já determinaram que, na Lava Jato, cabem à 13ª Vara Federal de Curitiba processos relacionados a crimes praticados "direta e exclusivamente" contra a Petrobras.
Em um dos pontos, lembrou que as acusações contra Lula tinham muito mais envolvimento de outras empresas do que da Petrobras.
Segundo Fachin, a partir das delações premiadas, foram descobertas novas informações e, aos poucos, através de recursos, os casos foram chegando ao STF, o que permitiu que a Corte tomasse essa posição apenas após diversas discussões em casos semelhantes.
É bom lembrar que na chamada Operação Lava Jato, muitas vezes não se levou em conta as consequências da interrupção ou suspensão de atividades de empresas investigadas, sua imagem e inserção nos setores produtivos do país, tudo isso produzido em juízo de primeiro grau de jurisdição.
O excesso de punitivismo promovido por setores dentro do Sistema de Justiça, praticado livremente e sem a devida correição, sem a leitura consequencial de suas ações para o Brasil como um todo, coloca em risco outras instituições e poderes democráticos, pois, sendo praticado pelo próprio Judiciário, será inevitavelmente tomado como exemplo de impunidade, de que nada acontecerá com a atuação que suspende a aplicação da lei, de forma a desrespeitar os precedentes do Estado Democrático de Direito, com consequências gravíssimas para a justiça e para o país.
Na concepção de Fachin nenhum órgão jurisdicional pode-se arvorar de juízo universal de todo e qualquer crime relacionado a desvio de verbas para fins político-partidários, à revelia das regras de competência. A mesma razão (inexistência de conexão) que motivou o não reconhecimento da prevenção do Ministro da Suprema Corte que supervisiona a investigação de crimes relacionados à Petrobras estende-se ao juízo de primeiro grau.
Neste sentido importa sustentar que o critério constitucional para a fixação da competência da Justiça Federal é a titularidade do bem jurídico tutelado pela norma penal incriminadora. A Petrobras é uma sociedade empresária de direito privado (sociedade de economia mista). Dessa forma o Art. 109 da Constituição Federal dispõe que aos juízes competes processar e julgar os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral. BRASIL (2015, p.75)[7]
Dessa forma, não prospera a assertiva do ex-juiz Sergio Moro, em sua sentença condenatória, de que o réu Lula exercia o relevante cargo de presidente da República. Primeiro porque, quando do evento do apartamento tríplex, ele já não era presidente há muito tempo; segundo, porque o critério da Constituição não é “intuito personae”, vale dizer, não está relacionado com o cargo ou função do suposto autor ou partícipe do delito.
Vale a pena repetir, nenhuma das imputações feitas ao ex-presidente se enquadra nas hipóteses do já mencionado art.109 da CR/1988 e, de qualquer forma, a alegada conexão, prevista no CPP, não poderia ampliar a competência prevista em Lei Maior. Ademais, não havendo mais possibilidade de unidade de processo e julgamento, não mais se justificaria a modificação da competência de foro e juízo,
Enfim, além do suposto crime atribuído ao ex-presidente Lula não ter ligação com os crimes praticados por empresários, diretores e gerentes da Petrobras, em face dos quais não há qualquer participação do ex-presidente com relevância jurídica, efetivamente não está presente nenhuma das hipóteses legais de conexão.
Cabe ainda ressaltar a atuação da mídia hegemônica, tanto televisiva como escrita, com a pretensão de reforçar e justificar o uso de métodos excepcionais no sistema de Justiça, com o fim de convencer a opinião pública sobre a necessidade de uma “justiça justicialista” contra um “inimigo comum”, fato este que ataca o cerne da democracia.
Para essa mídia concentrada nas mãos de poucas famílias proprietárias, claramente compromissada com setores econômicos dentro e fora do Brasil, a corrupção é tratada como sendo método adotado por políticos e partidos escolhidos seletivamente, normalmente do campo da esquerda, evidenciando a aliança de setores da mídia com outros políticos visando às eleições e a governabilidade para atender aos interesses privados.
Há que se repudiar o jornalismo praticado por empresas de telecomunicação e jornalismo que, igualmente corrompidas e corruptoras, mentem, enganam, violam o direito à informação e à verdade dos fatos, sendo corresponsáveis pela instabilidade institucional e política do Brasil, coniventes com o aumento do autoritarismo, com os retrocessos sociais e com a violência, não sendo desarrazoado falar em corrupção da mídia no Brasil.
Nesse sentido é importante frisar que Luís Inácio Lula da Silva não será considerado inocente com a referida anulação da sentença pelo ministro Fachin, como apontado em diversos meios de comunicação, visto que ser necessário o entendimento que ninguém será considerado culpado antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, o que só ocorre quando não cabe mais recurso ou quando um tribunal, como STF, der a última palavra no processo, tal como sustentado na Constituição.
Dessa forma a decisão não entra no mérito de cada um dos casos julgados por Moro em que o ex-presidente foi condenado e não significa culpa ou inocência.
A anulação dos processos aponta apenas que a forma como as decisões ocorreram foi considerada irregular e inválida. Por isso, as condenações e as penas impostas pelo então juiz Sérgio Moro, como a inelegibilidade, não existem mais para Lula.
Independentemente das concepções políticas ou ideológicas da cada um, é preciso que os operadores jurídicos tenham boa-fé na interpretação e aplicação do Direito, bem como não se afastem da indispensável honestidade intelectual.
Fachin salientou que a defesa de Lula questionava há muito tempo "a competência para o processo e julgamento" dos casos perante a Vara de Curitiba, sendo que de agora para frente a 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba, responsável no Paraná pelos processos da extinta Operação Lava Jato, passará a encaminhar os processos ao Distrito Federal.
Os processos contra o ex Presidente serão, então, entregues a um novo juiz, para que ele faça a análise. Essa redistribuição é feita por sorteio. Esse juiz ou juízes, vão poder decidir se os atos realizados nos três processos (triplex, Instituto Lula e sítio de Atibaia) são válidos ou se terão de ser refeitos.
Em razão da decisão, o ministro Fachin declarou a "perda do objeto" e extinguiu 14 processos que tramitavam no STF apontando suposta parcialidade do ex-juiz Sérgio Moro ao condenar Lula, de forma que a perda do objeto significa que não há mais motivo para que seja julgado o caso que avaliaria se houve imparcialidade do ex-juiz nos processos em que ele condenou Lula.
Cabe ainda a ressalva que a decisão do ministro é terminativa e encerra o caso, tanto que ele já determinou a remessa dos processos para que sejam reiniciados na Justiça Federal do Distrito Federal, ou seja, a decisão não necessita de referendo da turma ou do plenário do STF, a não ser que o próprio ministro decida remeter o caso para julgamento dos demais ministros.
Diante de tal fundamentação e com respaldo no princípio da eventualidade, salienta-se que o ex-juiz Sérgio Moro não seria competente para processar e julgar o ex-presidente Lula no caso do “Triplex”, mesmo que houvesse a conexão que o juiz aponta em sua sentença, de forma que não existia motivo para que tivesse ocorrido a ampliação de sua competência, ocorrendo nesse sentido a violação ao princípio constitucional do “juiz natural”, pois a carta Magna dispõe expressamente que “Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”, (art.5º., inc. LIV, Constituição Federal), BRASIL (2015,p.16)[8] de maneira a se configurar uma garantia individual , fundamental e de nulidade absoluta.
Não se pode negar, entretanto, que a incompetência territorial ora reconhecida pelo Ministro Fachin, poderia ter sido declarada desde a primeira instância de Curitiba.
Todavia, o artigo 41, da Lei Complementar nº 35/79 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN) prevê, que o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir. BRASIL (1979)[9]
Portanto, mesmo sendo mantida a incompetência da justiça de Curitiba, as provas contra o ex-presidente poderão ser consideradas contundentes e inquestionáveis no juízo do DF e ele não seria beneficiado com a elegibilidade, em decorrência da confirmação das condenações.
Ao contrário, após os julgamentos em duas instâncias, se consumados, até a eleição de 2022, o ex-presidente Lula poderá sair enfraquecido politicamente, em razão de julgamentos prolatados por juiz independente, sem que fosse possível qualificá-los de parciais.
Em consequência, do certame é correto salientar que Luiz Inácio Lula da Silva não disputaria a eleição de 2022, por inelegibilidade, com base na Lei da Ficha Limpa e se disputar poderá ser afastado durante o mandato, caso condenado em duas instâncias. Evidentemente, posição desconfortável para um candidato.
O certo é que é preciso punir de outro modo: eliminar essa confrontação física entre soberano e condenado; esse conflito frontal entre a vingança do príncipe e a cólera contida do povo, por intermédio do supliciado e do carrasco.
Em pleno século XXI, diante da necessidade estatal de manutenção da ordem jurídica, é nítido o modelo ancestral de justiça criminal, onde o estado-juiz empreende a coisificação do jurisdicionado, arrebatando-lhe direitos e garantias constitucionais, reinaugurando uma inquisição há muito adormecida.
È necessário que os tribunais superiores possam resgatar a tradição brasileira de uma justiça democrática, restabelecendo o primado constitucional de garantia dos direitos e princípios que lançam o ser humano na centralidade da ordem jurídica, bem como a mídia sensacionalista passe a exercer seu papel de informar e não de se tornarem juízes, promotores, investigadores manipulando as informações por elas veiculadas, informações estas que podem alternar entre posicionamentos políticos, opiniões críticas ou até mesmo desavenças de concorrência. É nesse ponto que o poder de influência dos meios de comunicação fica exposto e são desenvolvidos.
No que se refere ao caso do ex-presidente Lula, percebeu-se uma série de inclinações nos diversos meios de comunicação e no conjunto como um todo, e pela complexidade e importância do tema, essas inclinações geraram fragilidades que acabaram por envolver o íntimo do processo penal, de forma a melindrar os princípios de todo Direito Penal, sendo que o princípio da presunção da inocência foi o mais ultrajado no caso, juntamente com a proteção do direito da personalidade, já que existiu uma desarmonia entre o recorte temporal e os verdadeiros efeitos da Justiça.
[1] Especialista em Direito Penal e Criminologia – UNINTER. Bacharela em Direito – FAC. Especialista em Direito Educacional – UNINTER.Licenciada em Pedagogia – Faculdade Bagozzi. Idealizadora e criadora da @Sd JurisAdvogando.
[2] Bacharelanda em Direito – FAC. Especialista em Neuropsicologia – Bagozzi. Licenciada em Pedagogia – Bagozzi. Prêmio José Marello.
[3] . BRASIL. Embargos de declaração. HABEAS CORPUS 193.726. Paraná. Ministro relator:
Edson Fachin. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: https://www.otempo.com.br/politica/leia-a-decisao-do-ministro-fachin-que-anulou-as-condenacoes-de-lula-1.2456877. Acesso em: 08/03/2021.
[4] PRONER, Carol etc. e tal. Comentários a uma sentença anunciada. O processo Lula. Canal 6 editora. Bauru. São Paulo. 2017. Disponível em: http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/BibliotecaDigital/BibDigitalLivros/TodosOsLivros/Comentarios-a-uma-Sentenca-Anunciada.pdf. Acesso em: 08/03/2021.
[5] BRASIL. Código de Processo Penal. Decreto Lei 3689 de 03 de outubro de 1941. Manole. Barueri. São Paulo. 2016.
[6] PRONER, Carol etc. e tal. Comentários a uma sentença anunciada. O processo Lula. Canal 6 editora. Bauru. São Paulo. 2017. Disponível em: http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/BibliotecaDigital/BibDigitalLivros/TodosOsLivros/Comentarios-a-uma-Sentenca-Anunciada.pdf. Acesso em: 08/03/2021.
[7] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Senado Federal – Secretaria de Editoração e Publicações. Brasília. 2015,
[8] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Senado Federal – Secretaria de Editoração e Publicações. Brasília. 2015,
[9] BRASIL. Lei Complementar nº 35 de 14 de março de 1979. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia de assuntos jurídicos. Brasília. 1979. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp35.htm. Acesso em: 09/03/2021.