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Da assistência aos condenados e internados

Lei Nº 7.210/84 (Lei de Execução Penal)

Agenda 23/03/2021 às 12:27

O presente conteúdo jurídico tem o objetivo de comentar sobre a assistência que o condenado ou internado tem na execução penal baseado na lei 7.210/84. Veremos a seguir as assistências presentes no ordenamento jurídico.

Sumario: 1. Da generalidade. 2. Assistência material. 3. Assistência a saúde. 4. Assistência jurídica. 5. Assistência educacional. 6. Assistência social. 7. Assistência religiosa. 8. Da assistência.

  1. Da Generalidade

Conforme prevê o art. 10 da LEP, “a assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade”. Ademais, estabelece o parágrafo único “A assistência estende-se ao egresso”.

Este dispositivo, tem por objetivo evitar tratamento discriminatório e resguardar a dignidade da pessoa humana.

Por toda via, preso, evidentemente, é aquele que se encontra recolhido em estabelecimento prisional, sendo cautelarmente ou em razão de sentença penal condenatória com trânsito em julgado, em outras palavras, preso provisório ou definitivo. A lei não restringe a assistência apenas e tão somente aos condenados definitivamente (...).

Por outro lado, internado é o que se encontra submetido a medida de segurança consistente em internação em hospital de custódia e/ou tratamento psiquiátrico, em razão de decisão judicial. Ainda que recolhido em estabelecimento prisional, aguardando vaga para transferência ao hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, por razões óbvias também tem assegurados os mesmos direitos. Ora, seria o extremo absurdo suprimir direitos assistenciais daquele que, em razão da inércia e do descaso do Estado, que não disponibiliza hospitais e vagas suficientes para o atendimento da demanda, já sofre os efeitos decorrentes de tal omissão, com o inegável excesso na execução de sua conta. Seria puni-lo duas vezes.

Considera-se egresso, nos termos do art. 26 da Lei de Execução Penal:

  1.  O liberado definitivo, pelo prazo de um ano a contar da saída do estabelecimento;
  2.  O liberado condicional, durante o período de prova.

O objetivo da assistência, como se percebe, é prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade.

A assistência aos condenados e aos internados é exigência básica para conceber a pena e a medida de segurança como processo de diálogo entre os destinatários e a comunidade.

Portanto, a assistência ao egresso consiste em orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade e na concessão, se necessária, de alojamento e alimentação em estabelecimento adequado, por dois meses, prorrogável por uma única vez mediante comprovação idônea de esforço na obtenção de emprego. Valoriza-se o mérito do egresso na busca de meios para sua reinserção social.

Assim, a assistência a ser prestada, conforme prevê o art. 11 da Lei de Execução Penal, será:

  1. material;
  2. à saúde;
  3. jurídica;
  4. educacional;
  5. social;
  6. religiosa.

Sobre a matéria, consultar também a Resolução n. 96, de 27 de outubro de 2009, do Conselho Nacional de Justiça — CNJ, que dispõe sobre o Projeto Começar de Novo no âmbito do Poder Judiciário.

 

  1. Assistência material

A assistência material ao preso e ao internado consistirá no fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas.

De acordo com o art. 13 da LEP, “o estabelecimento disporá de instalações e serviços que atendam aos presos nas suas necessidades pessoais, além de locais destinados à venda de produtos e objetos permitidos e não fornecidos pela Administração”.

Como observa Julio F. Mirabete, com a regra do art. 13 se justifica em razão da “natural dificuldade de aquisição pelos presos e internados de objetos materiais, de consumo ou de uso pessoal”.

Como é podre, nesse tema o Estado só cumpre o que não pode evitar. Proporciona a alimentação ao preso e ao internado, nem sempre adequada. Os demais direitos assegurados e que envolvem a assistência material, como regra, não são respeitados.

  1. Assistência a saúde

Nos termos do art. 14, caput e § 2º, da Lei de Execução Penal, a assistência à saúde do preso e do internado, de caráter preventivo e curativo, compreenderá atendimento médico, farmacêutico e odontológico.

A Lei n. 11.942, de 27 de maio de 2009, acrescentou um § 3º ao art. 14 da LEP, dispondo que será assegurado acompanhamento médico à mulher, principalmente no pré-natal e no pós-parto, extensivo ao recém-nascido. Quando o estabelecimento penal não estiver aparelhado para prover a assistência médica necessária, esta será prestada em outro local, mediante autorização da direção do estabelecimento.

Entretanto, a realidade nos mostra que os estabelecimentos penais não dispõem de equipamentos e pessoal apropriados para os atendimentos médico, farmacêutico e odontológico. De tal sorte, resta aplicar o § 2º precitado:

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§ 2º Quando o estabelecimento penal não estiver aparelhado para prover a assistência médica necessária, esta será prestada em outro local, mediante autorização da direção do estabelecimento.

Contudo, ocorre que também a rede pública, que deveria prestar tais serviços, é carente e não dispõe de condições adequadas para dar atendimento de qualidade mesmo à camada ordeira da população que também necessita de tal assistência estatal, isto é, o Estado não conseguiu efetivar tais direitos, não os assegura, de fato, ainda hoje.

Estes atos desrespeita-se, impunemente, a Constituição Federal; a Lei de Execução Penal; Regras Mínimas da ONU para o Tratamento de Reclusos, adotadas em 31 de agosto de 1955, pelo Primeiro Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes; Regras Mínimas para o Tratamento do Preso no Brasil — Resolução n. 14, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), de 11 de novembro de1994 (DOU de 2-12-1994); Conjunto de Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão — Resolução n. 43/173 da Assembleia Geral das Nações Unidas — 76ª Sessão Plenária, de 9 de dezembro de 1988; Princípios Básicos Relativos ao Tratamento de Reclusos, ditados pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, visando a humanização da justiça penal e a proteção dos direitos do homem; Princípios Básicos Relativos ao Tratamento de Reclusos, ditados pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, visando a humanização da Justiça Penal e a proteção dos direitos do homem; Princípios de Ética Médica aplicáveis à função do pessoal de saúde, especialmente aos médicos, na proteção de prisioneiros ou detidos contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes; Resolução n. 37/194 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 18 de dezembro de 1982 etc.

Conforme vimos, tribunais têm decidido que, demonstrada “a necessidade de tratamento e acompanhamento médico do preso, face à doença que o acomete, e carecendo os hospitais do órgão de unidade de tratamento intensivo, autoriza-se a prisão domiciliar”, e que “o preso tem direito à assistência médica adequada, podendo permanecer em sua residência pelo tempo que se fizer necessário ao completo restabelecimento de sua saúde, nos termos do art. 14, § 2º, da Lei n. 7.210/84”. Aliás, vale observar que o art. 43 da LEP permite que o sentenciado contrate médico de sua confiança, sob sua responsabilidade.

Em acórdão, a decisão do Des. Egydio de Carvalho, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo concedeu licença especial domiciliar para tratamento médico, justificando: “Diante da pública e notória total falência das instituições prisionais em nosso País, não podem as autoridades responsáveis pelo acompanhamento das execuções penais deixarem de tomar certas atitudes humanitárias em prol dos sentenciados, sob pena de permitirem verdadeiras violações aos mais elementares direitos do ser humano”.

 

 

 

  1. Assistência jurídica

 

A assistência jurídica é destinada aos presos e aos internados sem recursos financeiros para constituir advogados. Pobres na acepção jurídica do termo, assim considerados aqueles que não reúnam condições de custear a contratação de advogado sem prejuízo do sustento próprio e de sua família.

O art. 41, IX, da LEP dispõe que constitui direito do preso a entrevista pessoal e reservada com o advogado. Tal previsão também se encontra no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (art. 7º, III, da Lei n. 8.906, de 4-7-1994).

Na dicção do art. 16 da lei, as unidades da Federação deverão ter serviços de assistência jurídica, integral e gratuita, pela Defensoria Pública, dentro e fora dos estabelecimentos penais.

A Lei Complementar n. 132, de 7 de outubro de 2009, que alterou dispositivos da Lei Complementar n. 80, de 12 de janeiro de 1994, que organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios, tal como prescreve normas gerais para sua organização nos Estados, tem regras a respeito da presença de defensores públicos nos estabelecimentos penais e prestação de assistência jurídica visando o exercício pleno de direito e garantias fundamentais.

Contudo, a assistência jurídica, muitas vezes não observada, é de fundamental importância para os destinos da execução da pena. Ademais, sua ausência no processo de execução acarreta flagrante violação aos princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal, que também devem ser observados em sede de execução.

  1. Assistência educacional

A assistência educacional compreende a instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado, sendo obrigatório o ensino de primeiro grau. O ensino profissional, conforme dispõe o art. 19 da LEP, será ministrado em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento. De acordo com as possibilidades, cada estabelecimento prisional deve conter uma biblioteca, provida de livros instrutivos, recreativos e didáticos.

De acordo com o art. 26 da Declaração Universal dos Direitos do Homem estabelece que: “Todo homem tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito”.

Em conformidade com o item 77 das Regras Mínimas da ONU para o Tratamento de Reclusos, adotadas em 31 de agosto de 1955, pelo Primeiro Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes: “Devem ser tomadas medidas no sentido de melhorar a educação de todos os reclusos que daí tirem proveito, incluindo instrução religiosa nos países em que tal for possível. A educação de analfabetos e jovens reclusos será obrigatória, prestando-lhe a administração especial atenção. Tanto quanto for possível, a educação dos reclusos deve estar integrada no sistema educacional do país, para que depois da sua libertação possam continuar, sem dificuldades, a sua educação”.

Portanto, a assistência educacional tem por escopo proporcionar ao executado melhores condições de readaptação social, preparando-o para o retorno à vida em liberdade de maneira mais ajustada, conhecendo ou aprimorando certos valores de interesse comum. É inegável, ainda, sua influência positiva na manutenção da disciplina do estabelecimento prisional.

A possibilidade de remição de pena pelo estudo formal passou a ser regulada na LEP em razão da Lei n. 12.403, de 29 de junho de 2011, tema tratado no capítulo específico.

  1. Assistência social

A execução penal tem como uma de suas finalidades a ressocialização do executado. Ademais, a assistência social tem por finalidade amparar o preso e o internado e prepará-los para o retorno à liberdade (art. 22, LEP)  

“Essa ressocialização, depois de longo afastamento e habituado a uma vida sem responsabilidade própria, traz, ao indivíduo, dificuldades psicológicas e materiais que impedem a sua rápida sintonização no meio social. Eis por que o motivo de se promover, sempre que possível, por etapas lentas, a sua aproximação com a liberdade definitiva” (Cícero Carvalho Lage, Ciência criminal e penitenciária, p. 65.)

Segundo Armida Bergamini Miotto, a assistência social tem fins paliativo, curativo, preventivo e construtivo. Ainda segundo a jurista, o fim paliativo visa “aliviar os sofrimentos provindos da situação de ‘delinquente, condenado, preso’ (status de condenado)”. O fim curativo busca “propiciar aos presos condições para viver equilibradamente (em todos os planos da pessoa: biológico, psicológico, social e espiritual), na situação de presos (com o status de condenado), a fim de que, recuperada a liberdade, não tornem a delinquir (reincidir), mas vivam normalmente (i. é, de acordo com as normas), honestamente, em todos aqueles planos”. O fim preventivo procura “obviar problemas e condições sociais que constituam estímulos para a delinquência, ou obstáculo para a reinserção dos liberados condicionalmente e dos egressos, no convívio familial, comunitário, social”. Em arremate, o fim construtivo almeja “melhorar as condições sociais e elevar o nível de vida, quer dentro das prisões (do que os presos vão aproveitar direta e imediatamente), quer fora das prisões (naquilo que há de se refletir sobre os presos, imediatamente ou no futuro, quando liberados ou egressos)”.

Portanto, a assistência social visa proteger e orientar o preso e o internado, ajustando-os ao convívio no estabelecimento penal em que se encontram, e preparando-os para o retorno à vida livre, mediante orientação e contato com os diversos setores da complexa atividade humana.

  1. Assistência religiosa

 

De acordo com Jason Albergaria, a assistência religiosa “É reconhecido que a religião é um dos fatores mais decisivos na ressocialização do recluso. Dizia Pio XII que o crime e a culpa não chegam a destruir no fundo humano do condenado o selo impresso pelo Criador. É este selo que ilumina a via da reabilitação. O Capelão Peiró afirmava que a missão da instituição penitenciária é despertar o senso de responsabilidade do recluso, abrir-lhe as portas dos sentimentos nobres, nos quais Deus mantém acesa a chama da fé e da bondade capaz de produzir o milagre da redenção do homem”.

 

Para Alexandre de Moraes e Gianpaolo Poggio Smanio, “O art. 24 da LEP prevê a liberdade de culto, permitindo a participação de todos os presos. O § 2º do art. 24 da LEP prevê a impossibilidade de obrigar-se o sentenciado a participar de atividades religiosas, com base na própria liberdade religiosa prevista na Constituição Federal, no art. 5º, inc. VI”.

De ressaltar, entretanto, que a Constituição Federal assegura em seu art. 5º, VI, a inviolabilidade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos.

  1. Da assistência ao Egresso

Considera-se egresso o liberado definitivo, pelo prazo de um ano, a contar da saída do estabelecimento penal, e o liberado condicionalmente, durante o período de prova.

Dispõe o art. 25 da LEP que a assistência ao egresso consiste: na orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade (inc. I); e na concessão, se necessário, de alojamento e alimentação, em estabelecimento adequado, pelo prazo de dois meses (inc. II).

O trabalho dignifica o homem, cabe ao serviço de assistência social colaborar com o egresso para a obtenção de trabalho, buscando, assim, provê-lo de recursos que o habilitem a suportar sua própria existência e a daqueles que dele dependem.

Ajustado ao trabalho, sua força produtiva irá não só contribuir para o avanço social, mas, principalmente, irá afastá-lo do ócio, companheiro inseparável das ideias e comportamentos marginais.

 São conhecidas as dificuldades que encontram os estigmatizados com a tatuagem indelével impressa pela sentença penal, no início ou mesmo na retomada de uma vida socialmente adequada e produtiva. A parcela ordeira da população, podendo escolher, no mais das vezes não faz a opção de contratar ou amparar um ex-condenado, seja qual for o delito cometido, até porque reconhece a falência do sistema carcerário na esperada recuperação, mas desconhece ou não assume sua parcela de responsabilidade na contribuição para a reincidência.

Não que com isso se pretenda que cada cidadão sacrifique sua tranquilidade com a contratação ou amparo de determinada pessoa, quando poderia contratar ou amparar outra. Apenas não se deve esquecer esse dado importante e agir, sempre, impulsionado por odioso preconceito.

Por fim, na doutrina de Henny Goulart, “a reeducação ou tratamento do condenado não esgota seu objetivo no momento em que este deixa a prisão, pelo cumprimento da pena ou por haver obtido um dos benefícios legais. Sua ação precisa ser complementada com a assistência material e espiritual efetivamente prestada tanto ao condenado em vias de liberação, o pré-liberto, como ao egresso, estendendo-se essa assistência, tanto quanto possível, até à família dos mesmos”.

Decerto, revela-se de extrema importância a assistência ao egresso, mas na prática, em regra, também não funcione!

 

REFERÊNCIA:

Nucci, Guilherme de Souza – Curso de Execução Penal, 2º ed. Editora Forense Universitária: https://amzn.to/39Imelo

 

Marcão, Renato – Curso de Execução Penal, 17º ed. Editora Saraiva: https://amzn.to/36yRWPQ

Sobre o autor
Jonathan Ferreira

Acadêmico de Direito pela universidade Estácio de Sá com foco em Dir. Penal, Dir. Proc. Penal, Dir. Constitucional Brasileiro. Administrador e fundador da página Âmbito Criminalista, no qual ajudo pessoas a entenderem o Direito Penal de forma simples e descomplicada. Amante da Sabedoria e estudante da psicanálise lacaniana em conjunto com a seara penal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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