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O caso concreto de usucapião de bem móvel financiado

Poderá um veículo automotor financiado por meio de um contrato de arrendamento mercantil ser objeto de Usucapião?

Pouco conhecida dentre a população e de pequena habitualidade no Poder Judiciário, a possibilidade de usucapir bem móvel existe e possui previsão no ordenamento jurídico brasileiro, mais especificamente no Código Civil.

Prevê a lei que ‘’Aquele que possuir coisa móvel como sua, contínua e incontestadamente durante três anos, com justo título e boa-fé, adquirir-lhe-á a propriedade.” (artigo 1.260 Código Civil).

Portanto, basta ter a posse de qualquer bem móvel pelo período de 3 anos que a propriedade do mesmo se transfere para seu possuidor, com a condição de que não haja sobre este bem móvel litígio ou má-fé do possuidor.

No entanto, o requisito de justo título e boa-fé deixa de existir se a posse do bem móvel se prolongar por 5 anos, ocasião no qual opera-se a usucapião, como modo originário de aquisição de propriedade (artigo 1.261 Código Civil).

Deparamo-nos com um caso singular no qual a pessoa que nos procurou tinha a posse de um veículo automotor há 23 anos e tinha interesse em conseguir a propriedade do mesmo.

No caso concreto, o Autor adquiriu o veículo, na data de 26/03/1998, por meio de um contrato de arrendamento mercantil firmado com o antigo Banco ABN AMRO Arrendamento Mercantil S. A., atualmente incorporado ao Banco Santander S. A.

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A partir do ano de 1999, o Autor passando por sérias dificuldades financeiras, não conseguiu mais arcar com o pagamento de diversas parcelas do arrendamento mercantil e, após a incorporação do Banco ABN AMRO pelo Banco Santander, ocorrida em meados do ano de 2009, nunca mais o Autor fora procurado para a resolução da questão.

Embora a existência do contrato de arrendamento mercantil do veículo fosse fator impeditivo para a sua aquisição mediante a usucapião, tendo em vista que trata-se de um financiamento bancário, sendo o próprio bem móvel a garantia de seu pagamento, comprovamos no processo que não houve por parte da instituição financeira, dentro do período de 23 anos, a interposição de ações judiciais em objeto de cobrança sobre o contrato de arrendamento mercantil do veículo, estando esta dívida PRESCRITA, desde meados dos anos de 2003/2004.

É o que prevê o artigo 206, parágrafo 5º, inciso I, do Código Civil, no sentido de que a cobrança de dívida líquida constante de instrumento público ou particular prescreve no prazo de 5 (cinco) anos.

Diante da inércia do credor, que não ajuizou processo judicial e não solicitou a busca e apreensão do bem, acrescido do transcurso do prazo de 5 (cinco) anos, consumou-se a prescrição, não havendo, então, óbice para a aquisição do bem móvel pelo Autor por meio da Ação de Usucapião

Ainda, comprovamos nos autos que o autor tinha a posse do carro de forma mansa e pacífica por meio da demonstração dos comprovantes de pagamentos de IPVA e licenciamento do veículo dos últimos anos, demonstrando que é ele quem porta os documentos de circulação do veículo.

Prescrita a dívida que recaia sobre o veículo, sendo a posse sobre o bem móvel mansa, pacífica, de boa-fé e existindo o ânimo do Autor em ser dono do veículo, restaram comprovados os requisitos legais para a usucapião do veículo, pelo que a Juíza do caso julgou PROCEDENTE a ação para reconhecer o direito do autor e, por consequência, a ocorrência da usucapião sobre bem móvel, declarando o domínio sobre veículo usucapiendo, por meio de expedição de ofício ao Detran/SP para a transferência de propriedade em favor do Autor por meio de expedição de nova documentação.

O processo em questão tramita na 4ª Vara Cível de Piracicaba/SP sob o nº 1001547-34.2021.8.26.0451.

Sobre os autores
Edson Luís de Campos Bicudo Junior

Advogado inscrito na OAB/SP sob o nº 375.053. Graduado na Pontifícia Universidade Católica de Campinas e com pós-graduação em Direito Processual Civil no Damásio Educacional. Sócio Fundador do Escritório Christofoletti & Campos Bicudo Sociedade de Advogados, com atuação nas áreas do Direito Civil, Consumidor, Empresarial, Imobiliário e do Trabalho. E-mail: edson@cecbadvogados.com.br

Renan Bonsi Christofoletti

Advogado inscrito na OAB/SP sob o nº 347.910. Graduado na Universidade Metodista de Piracicaba/SP (Unimep) e com pós-graduação em Direito Civil e Empresarial no Damásio Educacional. Sócio do escritório Christofoletti & Campos Bicudo, com atuação nas áreas do Direito Civil, Consumidor, Empresarial, Imobiliário e do Trabalho. E-mail: renan@cecbadvogados.com.br.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Informativo jurídico publicado no site www.cecbadvogados.com.br em 19/04/2021.

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