Interpretação razoável de texto de lei sobre a definição de “emprego formal ativo”. Falta de notificação da CAIXA ao empregado para a devolução do valor – Necessidade. Improbidade administrativa não configurada com a devolução do valor antes da conclusão de processo administrativo. Justa Causa trabalhista não caracterizada.
É de causar aflição e revolta os rumos que tem tomado os julgamentos da CAIXA nos processos administrativos instaurados para apurar a solicitação de auxílio emergencial por empregados afastados para Licença para tratar de Interesse Particular – LIP.
Tomou-se um caminho jurídico desarrazoado, avesso a princípios de humanidade e apartado da legalidade. Com lastro em uma manifestação meramente sugestiva da Controladoria Geral da União, a CAIXA atropelou procedimentos prévios indispensáveis, sem oportunizar a correção interpretativa dos empregados, impingiu processo administrativo e bateu carimbo de dispensa por justa causa em quase todos os casos que houve requerimento espontâneo.
Olvidou que este grupo de empregados, que integram o patrimônio humano da CAIXA, jamais agiu com dolo e não possuem nem de longe o perfil de pessoas ímprobas.
A dispensa por justa causa, decidida pela CAIXA ao arrepio da legislação trabalhista, assemelha-se ao triste episódio de dispensa no ano de 1990 de milhares de empregados admitidos através concurso público. O então empossado presidente Fernando Collor de Melo, sob o manto do falso discurso da economia e austeridade, em associação com o presidente da CAIXA Lafaiete Coutinho, de triste lembrança, demitiu milhares de empregados recém empossados.
Na ocasião, judiciário e sindicatos travaram intensa batalha que culminou no restabelecimento dos empregos a todos os empregados.
A realidade mudou. Com o enfraquecimento imposto aos sindicatos, caberá irremediavelmente ao judiciário restabelecer o estado de direito e o emprego dos jovens empregados, ora dispensados injustamente e alcunhados de ímprobos pela instituição empregadora. O paradoxo nesta história é que a própria CAIXA tinha dúvidas interpretativas sobre o texto legal, tanto que solicitou parecer da Controladoria mesmo após a concessão do benefício aos licenciados.
O ponto central do debate se concentra assim, na dispensa por justa causa dos empregados da CAIXA, em LIP, que solicitaram auxílio emergencial e foram aprovados no filtro de análise e não tiveram recusa pelo sistema integrado estatal. E isto se deu devido à interpretação dada à expressão “contrato de trabalho ativo“ do agente público para fins de recebimento do auxílio emergencial instituído pela Lei 13.982/2020. Os contratos de trabalho deste grupo de empregados se encontrava suspenso, nos termos normativos da CAIXA.
A CAIXA taxou de dolosos os atos dos empregados, apesar de terem:
(a) Requerido o Auxílio em aplicativo digital disponibilizado para toda a população brasileira;
(b) Informado com absoluta fidelidade todos os seus dados;
(c) Aguardado a análise que se acreditava criteriosa dos órgãos dos sistemas integrados dos diversos órgãos federais:
(e) Recebido a informação de análise e deferimento do pedido, lhes dando certeza de que eram elegíveis.
Tem-se, ainda, que era de conhecimento público e constava do próprio aplicativo disponibilizado que os requerimentos seriam submetidos à análise; além do usual e esperado cruzamento de dados que atualmente é feito pelos órgãos públicos, o que serviu de convicção para os pretendentes de que não estariam cometendo nenhuma irregularidade ao “solicitar” o Auxílio.
É sabido que nenhuma lei está isenta de ambiguidades, dado que nem sempre as palavras estão aptas a expressar com clareza a intenção do legislador e assim, será necessário submeter as dispensas ao poder judiciário para aferir a legalidade da motivação da dispensa imposta.
Tanto foi razoável a interpretação dada pelos empregados de que os contratos de trabalho não se encontravam ativos, em vista da Licença não remunerada, que até o judiciário federal corroborou com o este entendimento, conforme se verifica do julgado abaixo, proferido no MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Nº 5003435-95.2020.4.03.6103 / 3ª Vara Federal de São José dos Campos, que resumidamente se transcreve abaixo:
“Narra a impetrante que, no dia 07/04/2020, por atender os requisitos previstos na Lei 13.982/2020, formulou via aplicativo próprio, o requerimento do auxílio emergencial. Afirma que seu pedido foi indeferido em 27/04/2020, sob o fundamento “Auxílio Emergencial não aprovado: você não atende todas as condições para receber o auxílio emergencial. MOTIVO: – cidadão com emprego formal – Vinculado ao RPPS; – Cidadão com emprego formal – vinculado ao RAIS”.
A decisão foi no seguinte sentido:
A concessão da licença sem remuneração é equivalente, em termos práticos, à inexistência de “emprego formal ativo”, termo fixado na lei instituidora do auxílio. De fato, a teleologia legal do auxílio emergencial é de amparar as pessoas que se encontrem em situação de desamparo, decorrente das vicissitudes inerentes à pandemia. No caso dos autos, estando bem demonstrada a ausência de qualquer remuneração, deve-se concluir que, a despeito da manutenção do vínculo estatutário, não se trata de vínculo “ativo”. Assim, a objeção manifestada pela autoridade administrativa não poderá prevalecer. Comprovado o ato ilegal praticado, o pedido é procedente.
Em face do exposto, julgo procedente o pedido, para ratificar a liminar e conceder a segurança, determinando à autoridade impetrada que adote as providências necessárias à implantação do auxílio emergencial, mantendo-o em todas as parcelas previstas, afastando o óbice relativo à existência de vínculo com o regime próprio de previdência social. (destaques acrescidos).
Assim, a controvérsia instalada acerca da lei afasta por completo o dolo atribuído ao leigo, que deu interpretação razoável ao texto legal.
Útil debater ainda sobre as parcelas recebidas e devolvidas pelos empregados, afastando qualquer tipo de prejuízo à CAIXA e qualquer outra entidade.
A justa causa carimbada pela CAIXA na vida profissional dos empregados deverá e será revista pelo judiciário. A decisão, como se sabe, traz consequências materiais e psicológicas à vida do trabalhador, capaz de comprometer seu futuro profissional e a reinserção no mercado de trabalho.
Não houve na conduta da CAIXA nem proporcionalidade e tampouco razoabilidade.
Tem-se, assim, a partir de toda a reflexão escandida neste trabalho, que a decisão será revista pelos tribunais do trabalho, com a decisão de reintegração e inclusive com a condenação da CAIXA em danos morais.