Primeiramente há de trazer à baila alguns conceitos. Antes de tudo, dano, em síntese, seria uma lesão de um bem jurídico tanto patrimonial como moral. Por sua vez, o dano moral resulta de um sofrimento que não é causado por uma perda tão somente pecuniária, mas abrange todo atentado à reputação da vítima.
O dano moral pode ser conceituado como o efeito ou resultado de uma lesão que repercute em forma de reação psicológica. Sob tal perspectiva o Ministro Carlos Alberto Menezes afirma:
“Ao analisar o pedido de indenização por danos morais, deve o julgador apreciar cuidadosamente o caso concreto, a fim de vedar o enriquecimento ilícito e o oportunismo com fatos que embora comprovados, não são capazes de causar sofrimentos morais, de ordem física ou psicológica, aos cidadãos. (Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 276.671-SP, 3ª Turma do STJ, Relator Min. Carlos Alberto Menezes Direito).
Pois bem. Direto ao ponto, o Código de Defesa do Consumidor traz a aplicação da responsabilidade civil para o âmbito das relações consumeristas. Ressalta-se que tal legislação deve sustentar-se em caráter preventivo. Isto é, no intuito de se evitar lesões aos consumidores, a legislação prevê a possibilidade de fixação de condenação, de cunho indenizatório, a ser arcada pelo fornecedor em montantes elevados.
Ocorre que, buscando evitar abalos morais na relação de consumidor e fornecedor, alterações no CDC abriram espaço para os consumidores se utilizarem de tal norma para se locupletar ilicitamente.
Sem embargo, para evitar esse tipo de tentativa, existem pressupostos primários para se concretizar um dano, de fato, moral, quais sejam: (i) ação ou omissão do fornecedor; (ii) a ocorrência de dano; (iii) a existência de culpa; e, por fim, mas certamente não menos importante, (iv) o nexo de causalidade.
Mesmo tratando-se de relação de consumo, a demonstração de uma conduta por parte do fornecedor para comprovar o nexo causal, entre o defeito na prestação de serviço e o acidente de consumo, é imprescindível. Sendo assim, inexistindo dano e relação de causa e efeito, inexiste o dever de indenizar.
De acordo com Humberto Theodoro Júnior, não há dúvidas de que, nas relações de consumo, o fornecedor responde pelos danos materiais, assim como morais. No entanto, o autor afirma ser essencial a observância rigorosa dos padrões adotados para concessão de indenizações, evitando, assim, que as ações de dano moral se tornem possíveis estratégias maliciosas.
Por óbvio, a ação de indenizações por danos morais devem ser resguardadas daqueles que a utilizam de modo incoerente para enriquecer em detrimento de algum fornecedor de produtos ou serviços. O Judiciário não pode ser utilizado como instrumento de vingança ou investimento!
A título de exemplo, a aquisição de produto impróprio, por si só, não significa lesão a qualquer direito inerente à personalidade que enseje repação. Reflete, apenas, meros dissabores decorrentes da relação entre fornecedor e consumidor. Conclui-se que, não comprovada a ocorrência de dano, não há o que se falar em reparação por danos morais, por, tão somente, causar mera situação desconfortável ao consumidor.
Um ponto importante que merece destaque é: saber quanto requerer a título de danos morais. A doutrina e a jurisprudência indicam que se deve observar critérios como proporcionalidade e razoabilidade. Frente a isso, é necessário cautela no momento da reparação. Valores exorbitantes podem levar o juíz à impressão de que o consumidor estaria aproveitando-se da situação, devendo ser valor moderado. Sobre isso, o professor Sérgio Cavalieri Filho afirma:
“Creio que na fixação do quantum debeatur da indenização, mormente tratando-se de lucro cessante e dano moral, deve o juiz ter em mente o princípio de que o dano não pode ser fonte de lucro. A indenização, não há dúvida, deve ser suficiente para reparar o dano, o mais completamente possível, e nada mais. Creio, também, que este é outro ponto onde o princípio da lógica do razoável deve ser a bússola norteadora do julgador. Razoável é aquilo que é sensato, comedido, moderado; que guarda uma certa proporcionalidade.”
Mesmo assim, infelizmente, parte das ações consumeristas ajuizadas pretendendo danos morais não passam de um mero aborrecimento, e não de um dano moral efetivo. Em outras palavras, tais tentativas não demonstram circunstância à ensejar dano moral. Para que hajam indenizações frente ao dano, esse precisa acarretar abalo psicológico que exceda a normalidade. Ou seja, pode haver um desconforto, mas o quantum pretendido pelos consumidores ultrapassam padrões.
Percebe-se, assim, que “a dita ‘indústria do dano moral’ seria a percepção equivocada dos fatos ocorridos em sociedade, que não lesam bens juridicamente protegidos, distorcidamente, com intuito de enxergar-se a lesão moral onde não há, com o objetivo de enriquecimento sem causa.”1
De toda sorte, a jurisprudência, ao contemplar tais demandas, está adotando maior atenção para determinar a concessão de indenizações. Isto é, as decisões, por sorte, estão mais rigorosas, a fim de evitar espertezas mal intencionadas.
Diante de todo exposto, percebe-se que, de fato, há necessidade da legislação proteger o consumidor por sua vulnerabilidade, responsabilizando o fornecedor por vícios na intenção de desestimular práticas maliciosas. No entanto, é fundamental atentar para as indenizações extrapolantes para impedir práticas de enriquecimento sem causa.
Bibliografia:
SILVA, Humberto Theodoro Jr. Alguns aspectos da Nova Ordem Constitucional sobre o Direito Civil, RT, 2001.
CAVALIERI FILHO, SÉRGIO. Programa de Direito do Consumidor. São Paulo: Editora Atlas, 2008.
REMÉDIO, JOSÉ ANTÔNIO, JOSÉ FERNANDO SEIFARTH e JOSÉ JÚLIO LOZANO JÚNIOR. Dano moral. Doutrina, jurisprudência e legislação. São Paulo: Editora Saraiva. 2000.
1 Palavras do Dr. Carlos Alexandre Pereira em entrevista ao caderno DIREITO E CIDADANIA do Jornal do Brasil de 15 de setembro de 2003.