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A mídia e o processo de estereotipação.

O artigo reflete sobre a contribuição negativa que a mídia exerce muitas vezes em relação a aumentar a cultura da estereotipação de determinadas classes socias.

É notória a forma como as pessoas que residem em comunidades carentes – locais denominados a grosso modo como favelas - sofrem com estereótipos, ante a realidade da existência de verdadeiros poderes paralelos ao Estado, devido a ausência do poder público com políticas sociais e de segurança pública visando o bem estar social digno para as pessoas que vivem nesses locais. Inicialmente, cabe salientar que estereótipo é um processo de categorização que tem função de simplificar e permitir a adoção de interpretação em relação ao ambiente social que aquele indivíduo está inserido. Se não bastasse o lado negativo do estereótipo que os moradores dessas comunidades suportam, o preconceito é algo que vem como consequência dessa interpretação social feita daquela pessoa, trazendo ainda a discriminação explícita nas mais variadas formas a tais indivíduos.

Devido a precariedade de políticas sociais de bem estar coletivo e a inefetividade estatal, tais localidades tornam-se alvo de matérias midiáticas negativas. Não raro, devido a grande influência que a mídia exerce na formação de opinião da sociedade, as comunidades passaram a ser vistas como verdadeiros focos de criminalidades. As regiões no entorno de tais localidades, por sua vez, também suportam apontamentos negativos em relação ao cometimento de crimes. Geralmente, é comum serem veiculadas matérias que se referem apenas a ações opressivas do Estado, fato que corrobora ainda mais com o preconceito relativo aos moradores dessas regiões, fazendo com que a condição de ser residente em determinados lugares seja fator determinante para que a pessoa seja julgada e rotulada como marginal. Criminalizar o cidadão implica em um processo de desumanização do ser, para que esta circunstância justifique a falta de serviços básicos garantidos pela Constituição às pessoas da classe pobre, as quais por não terem mínimas condições, submetem-se a verdadeiras leis paralelas visando apenas ter onde morar. Por sua vez, o Estado tenta culpar o pobre por sua condição social, como se os resultados obtidos no meio em que este reside fosse fruto das decisões tomadas por esta população, que por mais contraditório que seja, não tem escolha.

A favela, vista como ambiente, como o local, carrega uma série de estigmas que são criados pelo Estado, oriundos de sua própria ineficiência, pela mídia e pela sociedade, mais especificamente as classes dominantes. A mídia, além de seu papel informativo, exerce influência contumaz na formação de estereótipos e até mesmo valores morais. Discursos, reproduzido pela mídia, tenta correlacionar a todo tempo a criminalidade com a pobreza como se um fosse fator preponderante do outro. Os argumentos usados variam: desde a tentativa de estigmatizar as moradias dos favelados - afirmando que elas são imorais, poluidoras visualmente e perigosas, até as afirmações mais preconceituosas como “bandidos de nascença”, defendendo que estes indivíduos já nasceram para o crime e que vão praticá-lo de qualquer jeito. Esse postulado se baseia nas ações que poderiam vir a acontecer justificando os aspectos do meio social, tendo a educação e a cultura como índices definidores da personalidade do sujeito que de acordo com o argumento, nasce com o destino pré-determinado ao crime, fazendo relembrar até mesmo da escola criminológica de Cesare Lombroso – Escola Positiva – a qual tinha por fundamento a afirmação de que o indivíduo já nascia com características morfológicas que implicavam que seria um criminoso nato. No caso em questão, a característica principal reside em que aqui não é a morfologia tomada por base para o rótulo e sim o meio social apenas – morador da favela já nasce criminoso.

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Importante frisar que, em boa parte, a formação da identidade do indivíduo que mora nas comunidades, nos últimos anos teve a mídia como mais um fato de acumulação de experiências, mesmo sendo elas negativas em sua grande parte. Além de programas sensacionalistas que se aproveitam da pobreza e demais calamidades sociais experimentadas por tais pessoas, as operações policiais de caráter repressivo ocupam lugar de destaque nos programas televisivos. Tudo isso corrobora com a construção negativa em relação a todos os demais que ali habitam, ainda que nunca tenham tido qualquer tipo de contato com o poder paralelo ao Estado dominante naquela área. Todo esse sensacionalismo, além das mazelas já descritas, ainda colaboram com a impresão negativa que os agentes estatais ligados aos órgãos de Segurança Pública possuem ante a tal parcela da população. Tais pessoas, além de sofrerem tantas discriminações e preconceitos, são quase que obrigadas a negar suas origens, assumindo várias personalidades, cada uma para um cenário diferente, como se a sociedade fosse um teatro, e todos os outros atores. Tudo para serem aceitas no meio social sem o peso dos estereótipos que carregam.

Seria de bom grado, a mídia auxiliar o poder público no trabalho de diminuição do abismo de diferenças sociais existentes quando se fala na favela. É de conhecimento da população que tais em tais locais, devido a diversas circunstâncias, acolhe pessoas que vivem à margem das leis que regem o país, porém, nem todos que moram nesses lugares traem consigo atitudes criminosas em suas histórias de vida. Há a flagrante necessidade do reconhecimento da falha do poder estatal e a real intenção de amenizar tal ausência que é tão imperiosa nesse meio social. Urge que iniciativas públicas e privadas sejam implantadas nas favelas que assolam o país, de modo que à essa parcela da população que não é dada a possibilidade e a condição de estar em outros lugares, seja pelo menos concedido o mínimo de dignidade para serem quem são sem a necessidade de usarem “fantasias” para não serem julgadas pelo estereótipo negativo atribuído pela sociedade através do que se torna conhecido pelos meios midiáticos.

 

 

 

Sobre as autoras
Luciana Sardinha de Vasconcelos

Servidora Pública na SEPOL - RJ desde 2002. Bacharel em Direito formada pela Universidade Estácio de Sá. Pós-graduada em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Universidade Estácio de Sá. Acadêmica em Segurança Pública e Social pela UFF.

Informações sobre o texto

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