1. princípio da autonomia das autarquias locais
Acerca das competências normativas e regulamentares em matéria de ordenamento dos espaços urbanos, convém recordar lição de Fernanda Paula Oliveira, para quem, em nome do princípio da autonomia das autarquias locais constitucionalmente consagrado, deve-se reconhecer, nestes domínios, competências próprias aos municípios, de modo a se exigir do legislador, em nome desta autonomia, a identificação, no conjunto das tarefas atinentes ao ordenamento do território e ao urbanismo, daquelas que, por terem repercussões eminentes, ou preferencialmente locais, devam caber em exclusivo aos municípios (isto é, no âmbito de sua decisão autônoma), sob pena de, a não ser assim, transformar-se o princípio da autonomia local num princípio vazio de sentido[1].
Para o efeito, recorda a supra referida autora, o legislador deve lançar mão de critérios que conciliem ou proceda a equilíbrio eficiente entre os princípios da descentralização (favorável a uma esfera de autonomia municipal mais ampla) e da unidade de ação do Estado (que apela para um entendimento mais restrito desta), do qual decorre caber ao legislador a identificação daqueles interesses que se consideram mais eficientemente prosseguidos pelos municípios (atribuindo a sua gestão a estes, isto é, ao seu espaço de decisão autônoma) e aqueles cuja maior eficácia se alcança com a sua atribuição ao nível estatal da organização administrativa[2].
2. concertação de interesses públicos e de interesses públicos e privados
Esse novo modelo de Administração Pública (sugerindo uma nova postura estatal), que sugere a concertação de interesses públicos e de interesses públicos e privados com vistas a uma melhor funcionalidade que permita a concretização de tarefas fundamentais tem ganhado fôlego em diversos Estados do mundo ocidental. Não se deve esperar resultados satisfatórios, em termos de execução de políticas públicas de ordenamento urbano e do território, em um modelo administrativo concentrador e que não viabilize a comunicação entre seus órgãos e instâncias administrativas.
Nessa direção, Fernanda Paula Oliveira, ressalta que esta nova lógica (de concertações administrativas), com vistas a alcançar políticas territoriais articuladas entre si e, como consequência, maior eficácia (ou eficiência) do agir administrativo, passa, necessariamente, pela potencialização de fórmulas conjuntas ou mistas de elaboração de instrumentos de planejamento do território através das ideias força de coordenação de interesses em conflito, de cooperação entre as distintas entidades titulares daqueles e de concertação ou contratualização entre elas (ou entre estas e os particulares)[3].
3. técnicas de coordenação normativa
No que tange às técnicas de coordenação normativa, vale asseverar que estas consistem na aprovação, pela entidade coordenadora, de normas imperativas, na maior parte das vezes de carácter setorial (isto é, relativas a atribuições públicas específicas) que estabelecem limitações a respeitar pelos demais instrumentos de planejamento. Tais técnicas, assentes no princípio da hierarquia, servem como tem sido apontado, essencialmente, para assegurar a supremacia dos interesses setoriais, cuja satisfação incumbe às entidades que elaboram estas normas, sobre os interesses mais abrangentes prosseguidos por qualquer outro instrumento territorial[4].
Uma análise cuidada do nosso ordenamento jurídico, atendendo, em especial, a algumas alterações legislativas mais recentes introduzidas em matéria de planejamento, permite concluir ser já uma realidade inegável a tentativa de institucionalização (e de regulamentação) de novas formas de relacionamento entre entidades públicas no domínio do planejamento municipal (com clara repercussão no tipo de relacionamento entre instrumentos de gestão territorial), as quais assentam em relações de coordenação, de cooperação e de concertação[5].
Essas competências normativas e regulamentares em matéria de ordenamento dos espaços urbanos são imprescindíveis já que toda intervenção a ser feita pelo Estado no domínio econômico e no domínio do planejamento público (urbano e ambiental, por exemplo) precisa estar lastreado em algum texto de lei, em face do princípio da legalidade. Ademais, um planejamento com respaldo normativo é muito mais seguro, quando às suas realizações. Em resumo, todos os níveis do governo, em todas as instâncias governativas, devem atuar no sentido de aprovar e aplicar o conteúdo das normativas de ordenamento dos espaços urbanos e territoriais, do modo que os direitos constitucionalmente previstos para os habitantes das cidades e de seu entorno ganhem concretude.
Referências
Centro de Estudos de Direito do Ordenamento, do Urbanismo e do Ambiente - CEDOUA; Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra - FDUC; Inspeção-Geral da Administração do Território - IGAT. Direito do urbanismo e autarquias locais: realidade atual e perspectivas de evolução. Coimbra: Almedina, 2006, pág. 25.
OLIVEIRA, Fernanda Paula. Novas tendências do direito do urbanismo: de um urbanismo de expansão e de segregação a um urbanismo de contenção, de reabilitação e de coesão social. Coimbra: Almedina, 2011.
[1] OLIVEIRA, Fernanda Paula. Novas tendências do direito do urbanismo: de um urbanismo de expansão e de segregação a um urbanismo de contenção, de reabilitação e de coesão social. Coimbra: Almedina, 2011, pág. 14.
[2] OLIVEIRA, Fernanda Paula. Novas tendências do direito do urbanismo: de um urbanismo de expansão e de segregação a um urbanismo de contenção, de reabilitação e de coesão social. Coimbra: Almedina, 2011, pág. 15.
[3] OLIVEIRA, Fernanda Paula. Novas tendências do direito do urbanismo: de um urbanismo de expansão e de segregação a um urbanismo de contenção, de reabilitação e de coesão social. Coimbra: Almedina, 2011, pág. 16.
[4] Centro de Estudos de Direito do Ordenamento, do Urbanismo e do Ambiente - CEDOUA; Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra - FDUC; Inspeção-Geral da Administração do Território - IGAT. Direito do urbanismo e autarquias locais: realidade atual e perspectivas de evolução. Coimbra: Almedina, 2006, pág. 25.
[5] OLIVEIRA, Fernanda Paula. Novas tendências do direito do urbanismo: de um urbanismo de expansão e de segregação a um urbanismo de contenção, de reabilitação e de coesão social. Coimbra: Almedina, 2011, pág. 17.