Muito se escreve sobre os direitos humanos. É bom que seja assim. Um antropocentrismo jurídico elevando ao máximo axiológico a dignidade da pessoa humana.
Se o Direito pertence ao mundo cultural, é por conseqüência obra humana. E como tal volta-se para o homem regrando a vida em sociedade, que é a dimensão coletiva da pessoa humana.
Assim sendo, não deveria causar espanto a relevância temática dos direitos humanos. E, por conseguinte, não deveria ocorrer pensamentos restritivos da máxima efetividade destes direitos. Mas, num mundo onde o Nazismo e o Fascismo fincaram raízes, encontramos fundamento histórico para visualizar aí um quê de autoritarismo na condução dos assuntos de um tipo de Estado que não se conforma em se ver limitado pela legalidade valorativa da dignidade da pessoa humana.
No contexto das dimensões dos direitos humanos fundamentais, pode-se dizer que há um pequeno erro de perspectiva. Como diz a boa doutrina especializada, os direitos humanos são imemoriais. Surgem com a pessoa, independentemente do status jurídico. O escravo não perdia a condição de pessoa. Juridicamente era tratado como coisa. Mas, o jurídico, tipicamente cultural, não tem a força suficiente para alterar as verdades naturais, razão porque o jusnaturalismo tem sua forte fundamentação lógica e argumentativa. Assim sendo, desde a Magna Carta, onde se diz surgiu a primeira dimensão dos direitos humanos, ocorreu a origem da primeira dimensão de limitação do poder do Estado. Em razão disto, pode-se defender a tese de que existem dimensões de limitação do poder do Estado em face dos direitos humanos imemoriais.
Note-se que o Estado resulta de um contrato social para aqueles que entendem haver um pacto político entre os homens para viver em sociedade. O titular do poder é o povo. A pessoa humana compõe o povo. Logo, o titular do poder é a pessoa humana. Por conclusão lógica, as dimensões dos direitos humanos são imanentes à pessoa, em que tempo for. Sob este argumento, a conformação da atuação do Estado segundo a dignidade da pessoa humana é que vem sofrendo uma evolução dimensional ou geracional.
Desta forma, a primeira dimensão dos limites do poder do Estado resulta nas liberdades públicas, impondo-se um dever de abstenção dos agentes do Estado. Na segunda dimensão dos limites do poder do Estado, temos os direitos coletivos, culturais e econômicos, havendo uma restrição da atuação do Estado na intervenção da economia e na capacidade de organização dos entes não estatais. Por sua vez, a terceira dimensão dos limites do poder do Estado surge com a imposição de condutas pró-ativas onde as políticas públicas dão concretude e efetividade aos direitos de solidariedade. Assim também com a quarta dimensão dos limites do poder do Estado em face dos vários e relevantes aspectos jurídicos, morais, econômicos, religiosos e científicos dos avanços da biogenética.
Por tudo que foi exposto, a noção de dimensão dos direitos humanos ou gerações desses direitos encobre a verdadeira dimensão e o real destinatário desta evolução jurídica: o Estado.
Foi a necessidade de controlar o poder que fez surgir a sua tríplice divisão. Não bastando isto, veio a divisão na forma de descentralização e desconcentração da Administração. Ainda não sendo suficiente, surgiram os vários tipos de controles internos e externos. Não contido o arbítrio do Estado, máxime nos períodos entre as guerras mundiais, optou-se por normatizar expressamente as garantias e direitos individuais. Mas, esta opção política juridicizada através das constituições sociais do Welfare State não alterou a natureza das coisas. A razão de tudo está na necessidade de controlar o exercício abusivo do poder do Estado, num flagrante desvio de finalidade em razão do real titular do poder que é o povo e por decorrência lógica a pessoa humana.
Não é por outra razão que o preâmbulo da Constituição da República Federativa do Brasil diz que os direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça são valores supremos. Esta orientação política preambular dirigia-se ao constituinte originário direcionando os seus trabalhos na linha do pensamento de limitação do exercício do poder do Estado.
Todos os valores supremos citados no preâmbulo da Constituição Federal, sem ordem de hierarquia entre eles, são as mais variadas dimensões da pessoa humana. É por causa deles que são criados os limites de atuação do poder do Estado, este sim dimensionado em quatro gerações, o que a história do direito nos dá prova incontestável.
Com esta abordagem, procurou-se focar a questão dos direitos humanos sob a sua ótica mais importante: a imposição de limites negativos e positivos para o exercício do poder do Estado. Sem a noção exata de que os direitos humanos não são fragmentados, perde-se muito do seu conteúdo valorativo. Por conta desta perda de energia valorativa, perdem-se alguns operadores do direto em pesquisas estéreis sistemáticas tentando a qualquer custo afirmar ou negar um direito social ou individual como direito fundamental da pessoa humana, quando fora do artigo 5º da Constituição Federal. Se o foco da exegese for a limitação do exercício do poder do Estado, o resultado será uma interpretação aberta e compatível com a real natureza dos direitos humanos: inatos, imemoriais, totais e não fragmentados. A resultante será a máxima efetividade das normas constitucionais de limitação do exercício do poder do Estado em face dos direitos humanos fundamentais.
BIBLIOGRAFIA:
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