Redes sociais nada mais são do que clubes que criam suas regras, porém, ao contrário dos clubes nas redes sociais, as pessoas não votam, não escolhem diretores, são apenas usuários que em troca do uso das ferramentas dessa plataforma (rede social), organizam seus contatos (amigos), postam fotos, vídeos, notícias e artigos e são assim, produtores e consumidores de conteúdo de boa e de má qualidade, é claro. Dessa forma, quando o número de usuários cresce qualquer nicho dentro dele passa a ser um grupo considerável, ao ponto de poderem criar sua própria rede social.
Evidentemente que isso já vem ocorrendo para aqueles que entendem que a rede social é um local que não deve ter limites ao direito de se expressar. De uma forma geral, as redes criam suas regras visando a não proliferação do discurso do ódio.
Assim as ferramentas para conter o tão falado “discurso de ódio” aumentam, pois o ódio parece não ser um bom negócio para as redes, principalmente quando se quer manter grandes marcas como anunciantes.
Desde Junho, o YouTube (da Google) baniu seis canais de supremacistas brancos e retirou a monetização do canal do popular comediante norte-americano Shane Dawson (que chegou a ter 23,1 milhões de subscritores), depois de perceber que o youtuber, na plataforma há mais de uma década, tinha usado humor com conotações racistas em vídeos antigos.
Em que pese o uso automatizado de algoritmos, a tarefa para retirar todos os exemplos de ódio e preconceito se parece como enxugar gelo. Em 2019, o YouTube chegou a eliminar vários vídeos de professores de história que incluíam imagens de Hitler, resultado de um algoritmo mal calibrado.
Não existe um padrão legal claro em que as empresas possam basear as suas políticas, bem como a importância do contexto para determinar se uma publicação constitui ou não discurso de ódio, o que acaba por gerar muita confusão e por vezes barulho desnecessário.
Não existe uma definição global para o chamado “discurso de ódio”. Vejamos as definições previstas nas redes sociais:
Facebook:
“Não permitimos discurso que incentiva o ódio porque cria um ambiente de intimidação e exclusão e, em alguns casos, pode promover violência no mundo real.”
“Definimos discurso que incentiva o ódio como um ataque direto a pessoas com base na: raça, etnia, nacionalidade, afiliação religiosa, orientação sexual, casta, sexo, gênero, identidade de género e doença ou deficiência grave.”
“Por vezes, as pessoas partilham conteúdos que incluem discurso que incentiva o ódio de outra pessoa para sensibilizar para um determinado assunto ou para educar as pessoas. “
Instagram:
“O Instagram não é um local para apoiar ou elogiar grupos de ódio, terrorismo ou crime organizado”;
“Eliminamos conteúdos que contenham ameaças credíveis ou discurso de incentivo ao ódio, conteúdos que tenham como alvo indivíduos com a intenção de os humilhar ou envergonhar”;
“Quando o discurso de incentivo ao ódio é partilhado com o propósito de o desafiar ou para apelar à consciencialização, podemos permiti-lo.”
YouTube:
“Não é permitida incitação ao ódio no YouTube. Removemos conteúdo que promove a violência ou o ódio contra pessoas ou grupos com base em qualquer um dos seguintes atributos: idade, classe social, deficiência, etnia, identidade e expressão de género, nacionalidade, raça, estatuto de imigrante, religião, sexo/gênero, orientação sexual, vítimas de um grande evento violento e respectivos familiares, estatuto de veterano”
Twitter:
“Não pode promover violência contra ou atacar diretamente ou ameaçar outras pessoas com base na raça, etnia, origem nacional, casta, orientação sexual, gênero, identidade de género, filiação religiosa, idade, deficiência, ou doença grave. Também não permitimos publicações cujo objetivo principal seja promover a violência contra outras pessoas com base nestas categorias.”
Defin imagens odiosas como “logótipos, símbolos, ou imagens cujo objetivo é promover a hostilidade e a maldade contra outros com base na sua raça, religião, deficiência, orientação sexual, identidade de gênero ou origem étnica/nacional.” Incluindo “manipular imagens de indivíduos para incluir características animalísticas.”
Não creio que o projeto de lei 2630/2020, aprovado no Senado, possa resolver essa questão, além de criar muito mais confusão. É fundamental proteger direitos fundamentais e civilizatórios sim, como a liberdade de expressão e a privacidade, mas sem deixar de lado a presunção de inocência, e delegar isso as plataformas não parece ser o melhor caminho. Me parece evidente que o Marco Civil da Internet, ao lado dos demais diplomas normativos já existentes, mais do que supre a necessária formalização de eventual propositura de ação.
Sempre é bom lembrar a frase “Eu discordo do que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo” atribuída originalmente a Voltaire, cuja verdadeira autoria seria de sua biógrafa, Evelyn Beatrice Hall, que o fez para sintetizar o pensamento do autor. Mas qual seria o limite legal para que isso fosse possível em uma rede social nos tempos atuais?
Por certo imagino que até os fascistas também amam, ainda que poucos saibam, mas com certeza eles não amam a todos e isso já dá espaço para uma outra discussão.