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Arrendamento mercantil. Sale and lease-back.

Aspectos relativos ao ICMS

1.Incidência do ICMS nas operações de arrendamento mercantil

            Para fins de incidência do ICMS nas operações de arrendamento mercantil, temos que destacar duas situações distintas:

            I- Circulação física da mercadoria decorrente de contrato de arrendamento mercantil;

            II-Transferência da propriedade da mercadoria ao final do referido contrato.

            Nesse conceito, vejamos o que dispõe a Lei Complementar n° 87/96, que rege atualmente os conceitos e regras gerais aplicáveis ao ICMS:

            Art. 3° - O imposto não incide:

            (...)

            VIII – operações de arrendamento mercantil, não compreendida a venda do bem arrendado ao arrendatário;

            Com isso, podemos delimitar que na circulação da mercadoria decorrente do contrato de arrendamento mercantil não incide o ICMS, enquanto a venda do bem ao final do contrato, que denominamos como "valor residual", está no campo de incidência do ICMS.

            Atualmente, apesar de ser alvo de debates doutrinários e jurisprudenciais, que não abordaremos nesse trabalho, o campo de incidência da operação de arrendamento mercantil está inserido na legislação que rege o Imposto Sobre Serviços, conforme dispõe o item 15.09 da Lista de Serviços anexa a Lei Complementar n° 116/03.


2.Possibilidade de aproveitamento de crédito de ICMS pelo arrendatário.

            O Convênio ICMS n° 4/97, autoriza os Estados e o Distrito Federal a conceder ao arrendatário, o crédito do ICMS da operação de aquisição do bem pela empresa arrendadora. Ou seja, o normativo prevê a possibilidade de transferência do crédito ao arrendatário do imposto destacado na aquisição do bem pela empresa arrendadora.

            Vejamos as disposições do Convênio n° 4, de 03 de fevereiro de 1997:

            "Cláusula primeira

Na operação de arrendamento mercantil, ficam os Estados e o Distrito Federal autorizados a conceder ao estabelecimento arrendatário do bem o crédito do imposto pago quando da aquisição do referido bem pela empresa arrendadora.

            § 1° Para fruição deste benefício a empresa arrendadora deverá possuir inscrição no Cadastro de Contribuintes do ICMS da unidade federada de localização do arrendatário, através da qual promoverá a aquisição do respectivo bem.

            § 2° A apropriação do crédito far-se-á nos termos da legislação da unidade federada de localização do arrendatário.

            § 3° Na nota fiscal de aquisição do bem por parte da empresa arrendadora, deverá constar a identificação do estabelecimento arrendatário.

            Cláusula segunda O imposto creditado deverá ser integralmente estornado, atualizado monetariamente, através de débito nos livros fiscais próprios, no mesmo período de apuração em que, por qualquer motivo, o arrendatário efetuar a restituição do bem.

            Cláusula terceira O estabelecimento que venha a se creditar do ICMS na forma prevista neste Convênio sujeita-se, ainda, ao cumprimento das demais normas estabelecidas na legislação da unidade federada de seu domicílio, especialmente aquelas previstas no art. 21, §§ 4° a 7°, da Lei Complementar 87/96

            Cláusula quarta Ficam os Estados e o Distrito Federal autorizados a conceder isenção do ICMS na operação de venda do bem arrendado ao arrendatário, desde que este seja contribuinte do imposto."

            Como podemos observar no §1° da cláusula primeira desse normativo, para fruição do crédito, a empresa arrendadora deve ser inscrita no cadastro de contribuintes na Unidade Federada de localização do arrendatário.

            Nesse ponto, diferente de outros Estados que também inseriram as normas do Convênio n° 4/97, o Estado de São Paulo permite a transferência do crédito de ICMS ao arrendatário, sem a necessidade de inscrição no Cadastro de Contribuintes das empresas arrendadoras.

            Em São Paulo, com base no artigo 63, VIII, § 5° do Decreto n° 45.490/00 – RICMS/SP, o arrendatário pode usufruir o crédito do ICMS, por meio de via adicional ou cópia autenticada da 1ª via da Nota Fiscal relativa à aquisição do bem pela empresa arrendadora, onde deverão constar os dados do arrendatário e observadas as regras relativas ao crédito do imposto referente à bem do ativo permanente.

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            Em relação à incidência do ICMS sobre a venda do bem ao final do contrato de arrendamento mercantil, destacamos também a cláusula quarta do referido Convênio, que prevê a autorização aos Estados para a concessão de isenção sobre esse fato gerador. Com base nisso, Estados como São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, entre outros, não cobram o ICMS na operação de venda do bem objeto de arrendamento mercantil, em decorrência de opção de compra.

            Por fim, cabe ressaltar que o Convênio supracitado é "autorizativo", ou seja, a sua eficácia fica condicionada à recepção de seus efeitos pela legislação de cada Unidade Federada.


3.Operação de Sale and Lease-Back

            A operação de Sale and Lease-back é uma espécie de contrato de arrendamento mercantil financeiro, pelo qual a pessoa jurídica vende bens do seu ativo imobilizado a uma empresa de arrendamento mercantil e, simultaneamente, os arrenda de volta com a opção de compra exercitável após o termino do contrato.

            Tal operação tem sua previsão legal, conforme estabelece o artigo 9° da Lei n° 6.099/74, com redação dada pela Lei n° 7.132/83, conforme citamos:

            "Art. 9º - As operações de arrendamento mercantil contratadas com o próprio vendedor do bem ou com pessoas jurídicas a ele vinculadas, mediante quaisquer das relações previstas no art. 2º desta Lei, poderão também ser realizadas por instituições financeiras expressamente autorizadas pelo Conselho Monetário Nacional, que estabelecerá as condições para a realização das operações previstas neste artigo."

            Destaca-se que nesse tipo de operação não há qualquer circulação física dos bens, que permanecem sendo utilizados no estabelecimento do fornecedor/arrendatário da mesma forma em que foram anteriormente destinados.

            A operação tem especialmente dois objetivos centrais para as empresas: (i) possibilidade de redução de imobilizado em excesso e/ou; (ii) obter recursos financeiros para capital de giro.

            3.1.Não incidência do ICMS na operação de Sale and Lease-back

            Defendemos o entendimento da não incidência do ICMS na operação de venda do bem do ativo imobilizado na operação de lease-back, especialmente pelos seguintes fundamentos:

            a)Não incidência do ICMS nas operações de venda de ativo imobilizado – geralmente as operações de lease-back são realizadas a partir da venda do ativo imobilizado do fornecedor/arrendatário. Apesar desse entendimento não ser unificado entre os Estados, temos o entendimento que não há incidência do ICMS nas vendas do ativo imobilizado.

            b)Não há circulação física de mercadoria – a circulação física é requisito para a configuração da incidência do ICMS.

            3.2.Possibilidade da continuidade do aproveitamento do crédito do ICMS

            Matéria controvertida é a questão da possibilidade da empresa continuar o aproveitamento do crédito do ICMS sobre o ativo imobilizado após a concretização da operação de lease-back.

            A questão que se coloca é: ainda que, utilizando o bem para as mesmas finalidades, a empresa em vender o ativo imobilizado em uma operação de lease-back, perderá a possibilidade de usufruir do saldo remanescente do ICMS até completar o quadriênio?

            Vamos analisar o que dispõe a lei Complementar n° 87/96 sobre crédito de ativo imobilizado.

            Segundo a regra do artigo 20 do referido diploma legal, a empresa que adquirir bens destinados ao ativo permanente, após 1° de janeiro de 2001, desde que relacionados à "atividade fim" do estabelecimento, poderá aproveitar o crédito do ICMS em 48 parcelas mensais e consecutivas.

            Por outro lado, o § 5°, V, do mesmo artigo 20, dispõe que na hipótese de alienação dos bens do ativo imobilizado, antes de completados o quadriênio, não será admitido, após essa data, o aproveitamento do crédito remanescente. Vejamos as disposições que citamos:

            "Art. 20....

            (...) 

            § 5o Para efeito do disposto no caput deste artigo, relativamente aos créditos decorrentes de entrada de mercadorias no estabelecimento destinadas ao ativo permanente, deverá ser observado:

            I – a apropriação será feita à razão de um quarenta e oito avos por mês, devendo a primeira fração ser apropriada no mês em que ocorrer a entrada no estabelecimento;

            (...)

            V – na hipótese de alienação dos bens do ativo permanente, antes de decorrido o prazo de quatro anos contado da data de sua aquisição, não será admitido, a partir da data da alienação, o creditamento de que trata este parágrafo em relação à fração que corresponderia ao restante do quadriênio;"

            A análise literal e individualizada dos textos acima podem precipitadamente levar à conclusão de que se a empresa realizar uma operação de arrendamento mercantil sob a modalidade de lease-back perderia a possibilidade de aproveitar o crédito remanescente do ICMS.

            Segundo nosso entendimento, existem bons argumentos jurídicos para defender a possibilidade de permanência do aproveitamento do crédito pelo arrendatário, pelos fundamentos que passamos a expor:

            1.Em leitura aos principais dicionários jurídicos, podemos observar que alienação é o termo jurídico, pelo qual se designa todo e qualquer ato que tem o efeito de transferir o domínio de uma coisa para outra pessoa, seja por venda, troca ou doação. Domínio, por sua vez, é o direito de propriedade em relação às coisas móveis matérias ou incorpóreas, sendo considerado a propriedade plena. O dicionário De Plácido e Silva ainda ensina que "a alienação somente se torna perfeita após a tradição da coisa, quando bem móvel".

            2.No direito brasileiro, a transmissão da propriedade de bens móveis é causal, pois depende do ato-fato de transmissão da posse. Negócio jurídico para a transmissão de bem móvel não pode ocorrer sem a tradição, no sentido de entrega da posse do bem. Somente com a transferência da posse da coisa cumpre-se a transmissão da propriedade.

            3.O Código Civil Brasileiro de 2002 traduz os elementos de aquisição da propriedade móvel pela tradição no texto do seu artigo 1.267:

            "Art. 1.267. A propriedade das coisas não se transfere pelos negócios jurídicos antes da tradição."

            4.Ao mesmo passo dos conceitos a de legislação civil que colocamos acima, abstraindo o verdadeiro espírito do texto do artigo 20 da Lei Complementar n° 87/96, o Regulamento do ICMS de São Paulo, em seu artigo 66, § 2º, veda o aproveitamento do crédito do ativo permanente apenas nas seguintes hipóteses: (i) se previsivelmente, sua utilização relacionar-se com mercadorias isentas ou não tributadas; (ii) em qualquer hipótese em que o bem deixar de ser utilizado no estabelecimento para o fim que se destinar antes de decorridos o quadriênio.

            Vejamos o texto do artigo 66, § 2°, itens 1 e 2:

            "Artigo

66 - Salvo disposição em contrário, é vedado o crédito relativo à mercadoria entrada ou adquirida, bem como ao serviço tomado:

            § 2º - Além da aplicação, no que couber, das hipóteses previstas no "caput", é também vedado o crédito relativo à mercadoria destinado a integração no ativo permanente:

            1 - se previsivelmente, sua utilização relacionar-se exclusivamente com mercadoria ou serviço objeto de operações ou prestações isentas ou não tributadas;

            2 - em qualquer hipótese em que o bem deixar de ser utilizado no estabelecimento para o fim a que se destinar antes de decorridos os prazos previstos no § 10 do artigo 61, a partir da data da ocorrência do fato, em relação à parcela restante do crédito."

            Ora, somente se ocorrer a transferência perfeita da propriedade, transmissão do domínio ou posse da coisa, o contribuinte deverá deixar de aproveitar o crédito remanescente até completar o quadriênio, pois nesse caso, realmente, o bem deixará de ser utilizado, pelo vendedor, para o fim que se destinava.

            Conclusão: entendemos que existem bons subsídios jurídicos para defender a permanência do aproveitamento do crédito do ICMS relativo ao ativo permanente do vendedor/arrendatário na operação de arrendamento mercantil sob a modalidade de lease-beck, especialmente pelos seguintes motivos: (i) a operação de lease-beck deve ser considerada apenas uma operação financeira, não-mercantil, onde não há qualquer circulação de mercadoria ou fato gerador imponível ao ICMS; (ii) não aplicação do artigo 20, § 5°, V, da Lei Complementar Federal n° 87/96, tendo em vista a não ocorrência de alienação perfeita do bem – tradição da coisa; (iii) Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo que veda o aproveitamento do crédito somente se o bem deixar de ser utilizado ao fim que se destinava.


Referências Bibliográficas:

            Adriano Blatt, "Leasing – uma abordagem prática";

            Eduardo Fortuna, "Mercado Financeiro";

            De Plácido e Silva, "Dicionário Jurídico";

            Pontes de Miranda, "Tratado de Direito Privado, Tomo VX, 4ª ed., São Paulo, RT.1983;

Sobre os autores
Sergio Gordon

advogado da consultoria tributária do Unibanco em São Paulo (SP)

Adriano Keith Yjichi Haga

advogado da consultoria tributária do Unibanco em São Paulo (SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GORDON, Sergio; HAGA, Adriano Keith Yjichi. Arrendamento mercantil. Sale and lease-back.: Aspectos relativos ao ICMS. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1255, 8 dez. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9253. Acesso em: 26 nov. 2024.

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