Temos, em nosso Ordenamento, a primazia do princípio da dignidade da pessoa humana, como pilar mestre de todo o arcabouço legal, jurisprudencial e doutrinário, no que tange à garantia do pleno desenvolvimento do ser humano, sob a responsabilidade da família, da sociedade e do Estado.
Neste sentido, diversos diplomas legais foram elaborados e sancionados, visando a proteção da pessoa humana, nas diversas etapas da vida, seja durante a infância e a adolescência, seja na velhice, outorgando àqueles sob a sua tutela garantias e prerrogativas específicas, na garantia de seu bem-estar, pleno desenvolvimento e equilíbrio psicoemocional.
Temos, assim, as leis especiais dirigidas a parcela da população a qual, em razão da idade, possui vulnerabilidades específicas relativas à saúde e ao patrimônio.
No caso, os idosos compõem expressiva parcela da população, a qual, em muitos casos, mesmo após uma vida de intenso trabalho, se vê economicamente vulnerável, carecendo da assistência dos filhos ou de outros parentes, para a sua subsistência condigna.
Contudo, mesmo amparados financeiramente pela família, há casos nos quais os idosos se vêm postos em uma forma de isolamento, pelo parente guardião, em detrimento dos outros familiares. Em muitas das vezes, temos a utilização irregular dos recursos de aposentadoria, destes, por aquele que com ele reside, privando-o do mínimo necessário à vida digna, apropriando-se do numerário em proveito próprio.
Embora absurda a imagem que se mostra, esta possui lastro na degradação moral pela qual passa o Ocidente, já trada seja por Eva Illouz, quando aborda os efeitos deletérios do capitalismo sobre o amor, seja, por Zygmunt Bauman, ao tratar do esfacelamento das relações humanas, na modernidade líquida, em que se vê mergulhada a humanidade.
A falta de respeito aos idosos é, desgraçadamente, clara! Estes somente mantêm a sua independência, na hipótese de possuírem saúde e recursos financeiros suficientes para decidir sobre a própria vida. Caso contrário, se vêm enredados em uma trama de interesses escusos e obscuros, criada por filhos, netos, irmãos mais novos, e outros, que deveriam, por dever legal e moral, deles cuidar.
O Estatuto do Idoso, embora seja um diploma legal que garanta a proteção desta parcela da população, encontra-se omisso no que tange à figura da alienação familiar que pode ser aplicada àquele que, em razão da idade, não disponha de grande desenvoltura na manifestação da sua vontade.
De fato, os Tribunais ainda não possuem um entendimento harmonioso quanto à possibilidade de aplicação, por analogia, do instituto da alienação parental, ao idoso, tal qual é feito em favor das crianças e dos adolescentes. Contudo, a fragilidade trazida com a idade, como já reconhecido pelo legislador ao elaborar o Estatuto do Idoso, permite, ao analisar-se o caso concreto, identificar elementos fáticos semelhantes àqueles encontrados na figura da alienação parental.
Por sua vez, a Doutrina ainda não explorou o tema com a profundidade e a quantidade suficientes a ponto de afirmarmos sobre a existência, ou não, de um discurso a favor de tal possibilidade.
Mas, nada disso nos impede de trazer o tema à baila, a fim de provocar a sua discussão como forma de fomento do debate doutrinário e jurisprudencial, com o fim de chamar a atenção do legislador para tal lacuna da lei.
Temos, é verdade, o Projeto de Lei nº 9.446 de 2017, que se destina a trazer alterações ao Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003), e que, propõe a inserção da figura da alienação parental, neste Diploma, contudo, este se encontra parado, desde fevereiro de 2018, para apreciação pelo plenário da Câmara dos Deputados, embora a matéria seja de extrema relevância.
O idoso é pessoa frágil e, como cidadão, carece de proteção do Estado, quando omissas ou agressivas forem as atitudes da família e da sociedade. No caso da alienação de idosos há um duplo bem jurídico a ser protegido, quais sejam, a integridade da dignidade da pessoa humana do idoso, na manutenção de seus laços afetivos com todos os familiares, e a garantia da boa gestão de seu patrimônio, a fim de que este, amealhado por toda a sua vida, seja efetivamente destinado ao custeio de suas necessidades pessoais.
Assim, aplicar-se o instituto da Alienação Parental à figura do idoso que se vê isolado dos demais familiares, pelo seu guardião, parente ou não, se apresenta como ferramenta de suma importância na garantia da manutenção de sua saúde psicoemocional e fisiológica. Ainda, o combate à alienação, neste contexto, visa, também, a proteção de seu patrimônio.
Não raros são os casos nos quais vemos pessoas idosas sendo mantidas por um dos familiares, em verdadeira condição de cárcere privado, seja na residência do guardião, seja internado em uma instituição pública ou privada, e impedido de contato.
Estas são as situações nas quais a aplicação análoga do instituto da alienação parental deve ser feita, até que o legislador venha a produzir um dispositivo legal próprio que proteja, especificamente, a pessoa idosa, de toda e qualquer atitude de isolamento, ante as graves consequências à sua saúde mental, emocional e fisiológica, em grave afronta à dignidade de sua pessoa, como titular de direitos a uma existência plena e livre de quaisquer amarras, com todos os seus familiares.