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APONTAMENTOS SOBRE O PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR

Agenda 22/08/2021 às 13:31

O ARTIGO APRESENTA DOUTRINA BRASILEIRA E ESTRANGEIRA COM RELAÇÃO AO TEMA AMBIENTAL.

APONTAMENTOS SOBRE O PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR

Rogério Tadeu Romano 

Segundo o site do jornal O Globo, em 5 de maio de 2021, grandes redes de supermercados, lojas de departamentos e produtores de alimentos europeus ameaçaram nesta quarta-feira boicotar produtos e commodities agrícolas do Brasil, caso o Congresso aprove um projeto de lei que, segundo afirmam, levaria a um desmatamento ainda maior da Floresta Amazônica.

Ainda se noticia o que segue:

“Em uma carta aberta aos congressistas de Brasília, os grupos afirmam que consideram “extremamente preocupante” a apresentação no mês passado do projeto de lei 510/21, que altera regras de regularização fundiária em terras da União e do Incra.

Esta medida apresenta “ameaças potencialmente ainda maiores para a Amazônia que antes”, afirmam os 38 signatários da carta, que incluem as grandes redes de supermercados britânicos como Tesco, J Sainsbury, Marks & Spencer, assim como a alemã Aldi.

Também assinam a carta empresas de produção de alimentos, como a National Pig Association, o fundo público de previdência sueco AP7 e outros gestores de investimentos.”

Consoante o Brasilagro, em 16 de julho de 2020, o Ministério Público Federal e especialistas em meio ambiente criticaram o plano do governo Bolsonaro de fazer a regularização fundiária de 97 mil propriedades na Amazônia, baseado apenas em sistemas de informação e vistoria a distância. A bancada do agronegócio defende a medida e querem ampliar o uso do recurso para áreas maiores.

Pelos dados do governo, esse volume equivale a 40% de toda a área passível de ser regularizada na região da Amazônia Legal. A lei que embasa a regulação que será feita pelo decreto é de 2009 e foi publicada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas nunca havia sido efetivamente aplicada em massa, dadas as dificuldades de integração de bancos de dados diferentes e as limitações do serviços centralizados no Incra, órgão do Ministério da Agricultura.”

Para o tema louvo-me da aplicação do princípio do poluidor-pagador:

Em 1972, a Declaração de Estocolmo, em seu Preâmbulo nº 7 da referida Declaração fez constar: “Atingir tal fim, em relação ao meio ambiente, exigirá a aceitação de responsabilidades por parte de cidadãos e comunidade, e por empresas e instituições, em todos os níveis, participando de maneira justa nos esforços comuns.”

Pioneiramente, no Brasil, ainda antes da democratização, a Lei 6.938/81, de 31 de agosto de 1981, também adotou o referido princípio, ao apontar como uma das finalidades da Política Nacional do Meio Ambiente “a imposição ao usuário, da contribuição pela utilização dos recursos ambientais com fins econômicos e da imposição ao poluidor e ao predador da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados.”

Belíssima lição trazida por essa lei pioneira que, verdadeiramente, deu ao Direito Positivo Ambiental no Brasil a sua grande relevância.

A Constituição de 1988 recepcionou o princípio no artigo 225, parágrafo terceiro, onde se lê:

“As atividades e condutas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, às sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.”

A Declaração do Rio de Janeiro adotou, em seu Princípio nº 16, o Princípio do Poluidor-Pagador, ao afirmar que:

“As autoridades nacionais devem procurar assegurar a internalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, levando em conta o critério de quem contamina, deve, em princípio, arcar com os custos da contaminação, levando-se em conta o interesse público e sem distorcer o comércio e os investimentos internacionais.”

Ensinou Silvana Raquel Brendler Colombo (O princípio do poluidor-pagador, in Âmbito Jurídico) o que segue:

“No plano internacional, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), por meio da Recomendação C (72), 128, de 28 de maio de 1972 incorporou formalmente o Princípio do Poluidor-Pagador. Mais tarde, por força do Ato Único Europeu, os ordenamentos jurídicos de todos países da comunidade européia e também o Conselho da Europa aceitaram o Princípio do Poluidor-Pagador.

No entanto, quando da sua formação em 1957, a Comunidade Europeia não tinha como preocupação às questões ambientais. Tanto que o Tratado de Roma (1957) não fez nenhuma referência ao meio ambiente; somente em 1987, quando o Ato Único Europeu entrou em vigor, o tratado reconheceu formalmente o ambiente.”

Ensinou Erika Bechara (Princípio do Poluidor Pagador, in Enciclopédia Jurídica da PUC – SP):

“O princípio do poluidor pagador preconiza que os custos decorrentes da prevenção da poluição e controle do uso dos recursos naturais assim como os custos da reparação dos danos ambientais não evitados (“custos da poluição”) sejam suportados integralmente pelo condutor da atividade econômica potencial ou efetivamente degradadora, que, portanto, internalizará os custos da poluição ao invés de externalizá-los para o Estado e, consequentemente, para a sociedade.

Cabe ao Estado, amparado no princípio do poluidor pagador, conduzir esse processo de internalização das externalidades ambientais, mediante a elaboração e aplicação concreta de normas que determinem aos agentes econômicos a obrigação de adotar, as suas expensas, as medidas de prevenção e reparação de danos ambientais.

A Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, subscrita em junho de 1992 por ocasião da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Eco 92), encampa o princípio do poluidor pagador e reforça o papel do Estado na implementação deste princípio nos seguintes termos:

“As autoridades nacionais devem procurar promover a internalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais” (Princípio 16).

Segundo Maria Alexandra de Sousa Aragão (O princípio do poluidor-pagador: pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito – Universidade de Coimbra, p. 146), a efetiva internalização das externalidades ambientais pela intervenção estatal advém de uma definição (pelas autoridades públicas) do que pode ser considerado “um estado aceitável do ambiente”; de medidas ou instrumentos criados para atingir esse estado aceitável do ambiente e, finalmente, da imposição do custeamento das medidas e instrumentos criados aos poluidores. “

Diz-nos, ainda, Silvana Raquel Brendler Colombo (O princípio do poluidor-pagador):

“O Princípio do Poluidor-Pagador é um princípio normativo de caráter econômico, porque imputa ao poluidor os custos decorrentes da atividade poluente. Porém, para a otimização dos resultados positivos na proteção do meio ambiente é preciso uma nova formulação desse princípio, ou seja, ele deve ser considerado “uma regra de bom senso econômico, jurídico e político”, como disse Maria Alexandra de Souza Aragão ( O princípio do poluidor-pagador. Pedra angular da política comunitária do ambiente. São Paulo: Coimbra, 1997).

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A indeterminação em relação ao conteúdo normativo do PPP e também de seu alcance é um fator que torna a aplicação deste princípio obscura e vulnerável no que tange a sua eficácia. Por isso, sendo os poderes públicos os destinatários do direito do PPP e os poluidores apenas seus destinatários indiretos, a intervenção concretizadora do legislador deve servir para definir o âmbito subjetivo, a saber: o conteúdo, a extensão e os limites das obrigações dos poluidores (Maria Alexandra de Souza., obra citada).

O princípio que usa para afetar os custos das medidas de prevenção e controle da poluição, para estimular a utilização racional dos recursos ambientais escassos e para evitar distorções ao comércio e aos investimentos internacionais, é o designado Princípio do Poluidor-Pagador (Recomendação C1288, de maio de 1972). Portanto, o poluidor deve arcar com os custos das medidas necessárias para assegurar que o ambiente esteja num estado aceitável.

Importante mencionar que, o PPP não é exclusivamente um princípio de responsabilidade civil, pois abrange, ou, pelo menos foca outras dimensões não enquadráveis neste último (Igualmente, não é um princípio que “autoriza” a poluição ou que permita a “compra do direito de poluir”, porque ele envolve o cálculo dos custos de reparação do dano ambiental (dimensão econômica) a identificação do poluidor para que o mesmo seja responsabilizado (dimensão jurídica), e por fim, é um principio orientador da política ambiental preventiva.” .

Disse ainda Silvana Raquel Blender Colombo (obra citada):

“Da mesma forma que o Poder Público, a coletividade (indivíduo, associações civis, pessoas jurídicas, grupos) também pode ser responsabilizada pela omissão ambiental. Todavia, não será toda a coletividade responsável pelo dano, mas sim o integrante da coletividade responsável pelo descumprimento das normas ambientais.

Agora, se a poluição for desencadeada por uma atividade produtiva, a produção pode voltar-se tanto para o consumo, quanto para o mercado. Na primeira hipótese teremos apenas o poluidor direto, enquanto que no segundo caso, verifica-se a existência de um poluidor direto e um poluidor indireto.

Mas, quem é o poluidor indireto? É aquele que se beneficia da atividade poluente, consumindo o produto que é proveniente de uma atividade considerada poluente, ou quem cria os elementos necessários para que a poluição ocorra, permitindo que o bem a ser consumido seja poluente.

Desta forma, a utilização inadequada dos bens por parte dos consumidores ou o seu uso além dos limites fixados pela lei não pode ser desconsiderado pelos operadores do direito e nem pela legislação ambiental, sob pena de obstar a aplicação do Princípio do Poluidor-Pagador.”

O princípio do poluidor-pagador tem relação direta com outros princípios.

Disse ainda sobre isso Erika Bechara (obra citada):

“Alguns doutrinadores reduzem o princípio do poluidor pagador à responsabilização civil do causador de danos ambientais, outros o restringem à prevenção e controle de danos.

Em nosso sentir, o princípio tem as duas facetas já que se observa externalidades ambientais negativas tanto no dano potencial (a ser evitado) como no dano concreto (a ser remediado). Assim, o empreendimento potencialmente poluidor deve internalizar os custos de prevenção da poluição tanto quanto o empreendimento efetivamente poluidor deve internalizar os custos da reparação.

Partilhando desse mesmo entendimento, Danielle de Andrade Moreira (ver Maria Alexandra de Sousa. O princípio do poluidor-pagador: pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito – Universidade de Coimbra, p. 105) professa que é indubitável que o princípio do poluidor pagador tem uma natureza preventiva. Mas sendo o dano ambiental uma forma de externalidade negativa, que afeta diretamente terceiros independentemente de sua participação na cadeia de produção e consumo da qual partiu a conduta danosa, “não parece lógico pensar que, nesses casos, havendo a imposição ao responsável da obrigação de reparar o dano, não se esteja falando do princípio do poluidor -pagador (mesmo que a orientação de outros princípios também seja identificada na mesma hipótese)”.

No entanto, o princípio do poluidor pagador não se confunde com os princípios da prevenção e da precaução nem com o princípio da reparação ou responsabilidade, embora, como mencionado acima, tenha com eles uma relação bastante estreita.

Enquanto os princípios da prevenção e da precaução impõem às atividades potencialmente poluidoras a adoção da mais avançada tecnologia e dos melhores esforços e procedimentos para evitar a ocorrência de danos ambientais, o princípio do poluidor pagador determina que os custos dessas medidas de prudência sejam suportados pelo próprio empreendedor, impedindo que o ônus preventivo recaia sobre o Estado e sobre a sociedade. E enquanto o princípio da reparação determina que aquele que causar danos seja obrigado a repará-los, o princípio do poluidor pagador obriga que os custos da reparação sejam bancados integralmente pelo autor do dano, sem compartilhamento da obrigação com o Poder Público ou coletividade (o que por vezes pode ocorrer se alguns danos forem “deixados de fora” da reparação pois, em casos tais, o Poder Público acabará intervindo para “socorrer as vítimas” – melhor dizendo: para recuperar o ambiente lesado para o bem da coletividade).”

Aliás, Maria Alexandra de Sousa Aragão cita em sua clássica obra sobre o princípio do poluidor pagador diversos autores que associam este princípio ao princípio da responsabilidade civil, mas ela mesma não comunga dessa visão, sustentando que o PPP tem por fim a precaução e a prevenção da poluição (O princípio do poluidor-pagador: pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito – Universidade de Coimbra, pp. 109-118).

A doutrina, na matéria, ainda tem trazido aos estudiosos a questão quanto ao repasse dos custos da poluição para o consumidor dos produtos e serviços.

Aqui trago a lição de Érica Bechara (obra citada):

“É fato que as atividades econômicas existem para atender a demanda dos cidadãos que reclamam por bens de consumo e os consomem com tamanha avidez que toda a rede de indústrias e empresas destinadas a prover tais necessidades só faz crescer. Esse quadro, todavia, não pode redundar na mitigação da internalização dos custos ambientais do processo produtivo muito menos forçar uma repartição de parcela dos custos com toda a sociedade. Mas deve, sim, gerar um repasse proporcional do custo ambiental internalizado pela empresa para os produtos e serviços por ela disponibilizados aos parceiros comerciais e consumidores finais, como já ocorre com todos os demais custos trabalhistas, tributários, de matéria-prima, infraestrutura etc.

Trata-se do fenômeno econômico da repercussão, próprio de uma economia de mercado, pelo qual os pagamentos efetuados pelo poluidor para controle da poluição são embutidos no preço final dos bens e serviços, de sorte a onerar reflexamente seus adquirentes”(in Maria Alexandra de Sousa Aragão. O princípio do poluidor-pagador: pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito – Universidade de Coimbra, p. 187).

Como defende Cristiane Derani ( Direito ambiental econômico, p. 158), o causador da poluição arca com os custos necessários à diminuição, eliminação ou neutralização de tais danos e pode, “desde que isso seja compatível com as condições da concorrência no mercado, transferir esses custos para o preço do seu produto final”. O cômputo proporcional dos custos de prevenção e reparação no preço final do produto ou serviço até pode sobrecarregar o mercado e encarecer os bens consumidos. Mas há um custo para se evitar poluição ou para se corrigir seus efeitos deletérios, que pode muito bem ser compartilhado com o consumidor que motiva a existência do empreendimento poluidor e que, por conta disso, é chamado por Maria Alexandra de Sousa Aragão (obra citada) de poluidor indireto – afinal, é o consumidor que estimula, com a sua procura, a produção do bem que é em si poluente ou que o foi por sua produção.

Disse Cristiane Derami (Direito ambiental econômico. São Paulo: Max Limonad, 1997), aliás: “Para que se distribua de forma justa os ônus da poluição e ao mesmo tempo se desestimule atividades e produtos degradadores, é necessário que as externalidades ambientais negativas sejam internalizadas pelo agente econômico, de forma que o empreendimento assuma os custos da prevenção e reparação da poluição associados a sua atividade, liberando o Estado e a sociedade desse ônus. E é justamente esse o propósito do princípio de poluidor pagador: corrigir o custo adicionado à sociedade (pelas externalidades negativas) “impondo-se sua internalização”.

Ensinou ainda Érica Bechara (obra citada):

“No cenário das externalidades ambientais, o custo ambiental da poluição é suportado por toda a sociedade (pela via direta ou via Estado), aí incluídas não só as pessoas beneficiadas pela existência do empreendimento (porque consumidoras dos bens fornecidos) como as não beneficiadas (porque não consumidoras dos bens oferecidos). No cenário em que as externalidades são internalizadas, conforme determinado pelo princípio do poluidor pagador, o custo ambiental é suportado apenas pela cadeia de consumidores intermediários e finais dos bens e serviços responsáveis pela poluição.

Nesse sentido, nota-se equidade no sistema em que o consumidor de produtos e serviços potencial ou efetivamente degradadores “pague”, de forma diluída e proporcional ao volume consumido, pelos custos de prevenção e reparação do meio ambiente. Por isso que Maria Alexandra de Sousa Aragão (O princípio do poluidor-pagador: pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito – Universidade de Coimbra, p. 193. entende que a repercussão do custo de controle da poluição sobre os beneficiários do bem ou atividade poluidora não afasta a justiça do princípio do poluidor pagador sendo, inclusive, perfeitamente compreensível, porque “é justo que pague quem cria, controla, lucra, ou beneficia diretamente de uma atividade, que é prejudicial para outrem” (g.n.).

Um outro aspecto que merece atenção no sistema de repasse (de parte) do custo da poluição para os consumidores intermediários e finais é a influência do encarecimento da mercadoria sobre a decisão de consumo. Preços mais altos podem desestimular o sobreconsumo ou o consumo de bens e serviços cujos processos produtivos sejam potencial ou efetivamente mais impactantes que os demais (e, portanto, com custos de prevenção e remediação da poluição mais elevados). Nesse diapasão, nota Maria Alexandra de Sousa Aragão que a repercussão do custo da poluição nos preços tem benefícios ecológicos, “já que o aumento dos preços provavelmente provocará uma desejável contração da procura de um produto que é, em si mesmo, poluente ou cuja produção ou consumo são geradores de poluição”(Maria Alexandra de Sousa Aragão, in O princípio do poluidor-pagador: pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito – Universidade de Coimbra, p. 193).”

A matéria tem chamado a atenção dos agentes econômicos.

Em matéria do Estadão, em 14 de abril do corrente ano, tem-se:

“Em carta enviada ao governo, o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) pede metas mais ambiciosas relacionadas ao clima e um esforço maior para a construção de uma agenda de retomada sustentável para a economia brasileira. Ao todo, 33 empresas e bancos assinaram o documento, incluindo Bradesco, Braskem, Itaú, Shell, Microsoft e Suzano.

De acordo com o documento, o País precisa buscar a neutralidade climática – ou seja, emissão líquida zerada de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera – até 2050. Em dezembro, em um documento de diretrizes sobre assuntos do clima – Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC) –, o Ministério do Meio Ambiente traçou planos para atingir esse objetivo até 2060.

A NDC brasileira foi feita na esteira do Acordo de Paris, que estabeleceu metas sobre o clima para o mundo. A primeira versão foi entregue em 2015 e a atualização saiu no fim do ano passado. Um dos principais objetivos do acordo é limitar o aumento na temperatura global até o fim do século a 2 graus Celsius, no máximo.”

O Brasil tem o dever de se adequar a princípios e normas ambientais, que são objeto de diversas Convenções Internacionais, se quiser integrar a OCDE.

Como explicou Paulo Affonso Leme Machado (Direito Ambiental Brasileiro, 12ª edição, pág. 53), o princípio usuário-pagador contém também o princípio poluidor-pagador, isto é, aquele que obriga o poluidor a pagar a poluição que pode ser causada ou que já foi causada.

Disse ainda Leme Machado (obra citada, pág. 53):

“O uso gratuito dos recursos naturais assim tem representado um enriquecimento ilegítimo do usuário, pois a comunidade que não usa do recurso o que o utiliza em menor escala fica onerada. O poluidor que usa gratuitamente o meio ambiente para nele lançar os poluentes invade a propriedade pessoal de todos os outros que não poluem, confiscando o direito de propriedade alheia.”

Guilherme Cano (Introdución al tema de los aspectos juridicos del principio contaminador pagador, pág.191) ensinou que “quem causa a deterioração paga os custos exigidos para prevenir ou corrigir. É óbvio que quem assim é onerado redistribuirá esses custos entre os compradores de seus produtos (se é uma indústria, onerando-a nos preços), ou os usuários de seus serviços (por exemplo, uma Municipalidade, em relação a seus serviços de rede de esgotos, aumentando suas tarifas). A equidade dessa alternativa reside em que não pagam aqueles que não contribuíram para a deterioração ou não se beneficiaram dessa deterioração”.

Por sua vez, Ludwig Krämer (Le príncipe du polluer-payers, 1991, pág. 3-13), comentando a inclusão do princípio no Tratado da Comunidade Europeia, disse que “a coletividade não deve suportar o custo das medidas necessárias para assegurar o respeito da regulamentação ambiental em vigor ou para evitar os atentados contra o meio ambiente”. Acrescenta que esse custo deve ser um ônus do fabricante ou do utilizador do produto poluente que poderá repassá-lo aos utilizadores posteriores.

Deve-se ter em mente que o princípio usuário-pagador não é uma punição, pois mesmo não existindo qualquer ilicitude no comportamento do pagador ele pode ser implementado. Assim, para tornar obrigatório o pagamento pelo uso do recurso ou pela poluição não há necessidade de ser provado que o usuário e o poluidor estão cometendo faltas ou infrações. O órgão que pretenda receber o pagamento deve provar o efetivo uso do recurso ambiental ou a sua poluição. A existência de autorização administrativa para poluir, segundo as normas de emissão regularmente fixadas, não isenta o poluidor de pagar pela poluição por ele efetuada, como ensinou Paulo Affonso Leme Machado (obra citada, pág. 54).

Ainda ensinou Paulo Affonso Leme Machado (obra citada) que “temos que diferenciar dois momentos de aplicação do princípio “poluidor-pagador” ou “predador-pagador”: um momento é o da fixação das tarifas ou preços e/ou da exigência de investimento na prevenção do uso do recurso natural, e outro momento é o da responsabilização residual ou integral do poluidor”. O custo a ser imputado ao poluidor não está exclusivamente vinculado à imediata reparação do dano. O verdadeiro custo está numa atuação preventiva, como revelou Cristiane Derani (Direito Ambiental Econômico, 1997, pág. 297), “o custo a ser imputado ao poluidor não está exclusivamente vinculado à imediata reparação do dano. O verdadeiro custo está numa atuação preventiva”. O pagamento efetuado pelo poluidor ou pelo predador não lhes confere qualquer tipo de direito a poluir. Senão seria um verdadeiro absurdo.

Mas o investimento efetuado para prevenir o dano ou o pagamento do tributo, da tarifa ou do preço público, não isentam o poluidor ou predador de ter examinada e aferida sua responsabilidade residual para reparar o dano.

Salientou Maria Alexandra de Souza Aragão (O Princípio do Poluidor Pagador, 1997, pág. 139) que “o poluidor-que-deve-pagar é aquele que tem o poder de controle (inclusive poder tecnológico e econômico) sobre as condições que levam à ocorrência da poluição, podendo, portanto, preveni-las ou tomar precauções para evitar que ocorram”. Assim no caso de um consumo de um produto, havendo poluidor direto e poluidor indireto, afirma a jurista portuguesa que, tendo sido a produção poluente, “o poluidor-que-deve-pagar é quem efetivamente cria e controla as condições em que a poluição se produz, que nesse caso é o produtor”, como bem acentuou Paulo Affonso Leme Machado.

Como disse ainda Paulo Affonso Leme Machado, um dos maiores ambientalistas do Brasil, “a aplicação do princípio-poluidor-pagador pressupõe a conscientização do público, que tem sido o grande prejudicado pela “internalização dos lucros e externalização dos custos”, pois, como acentua Olivier Godard as empresas são incentivadas pelo mecanismo da concorrência a escapar, tanto quanto possível, da assunção dos ônus associados às suas atividades, sendo esses ônus transferidos para outros agentes, para o Poder Público ou para o meio ambiente.”(Environnement et Dévéloppement Durable, Estrasburgo, Séminaire du Centre Nacional de la Recherche Scientifique, 1991, documento interno, mencionado por Paulo Affonso Leme, obra citada, pág. 461).

Kloepfer (lembrado por Paulo Affonso Leme em sua obra citada – pág. 461) especificou que o que chama de quatro dimensões do princípio do poluidor-pagador. A dimensão objetiva-racional—econômica, a social-ética-normativa, a político-ambiental e a jurídico-normativa (Cristiane Derani, Direito Ambiental Econômico, 1997).

Na linha de Guilhermo Cano (citado anda por Paulo Affonso Leme, obra citada, páginas 460 a 461) “quem causa a deterioração paga os custos exigidos para prevenir e corrigir”. Correto.

Aplica-se o Princípio 16 da Declaração do Rio de Janeiro:

“Princípio 16: As autoridades nacionais deveriam fomentar a internalização dos custos ambientais pelo poluidor ou degradador, e o uso de instrumentos econômicos que impliquem que o poluidor deve, em princípio, arcar com os custos da degradação ambiental.”

 

Trata-se de grave ameaça trazida à economia brasileira por agentes estrangeiros, que mostram o quanto o atual governo brasileiro está em descumprimento dos princípios e normas ambientais.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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