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Alguns apontamentos sobre os recursos hídricos

Agenda 21/09/2021 às 15:51

TRATA-SE DE TEXTO QUE APRESENTA APONTAMENTOS DIVERSOS SOBRE O TEMA DESDE O CÓDIGO DE ÁGUAS À LEI Nº 14.026/20.

I – A ÁGUA

O professor Luís Paulo Sirvinskas (Manual de Direito Ambiental. 11 Ed. São Paulo: Saraiva, 2013, pág. 395) assim ensinou:

“Art. 1º – A água faz parte do patrimônio do planeta. Cada continente, cada povo, cada nação, cada região, cada cidade, cada cidadão é plenamente responsável aos olhos de todos.

Art. 2º – A água é a seiva do nosso planeta. Ela é a condição essencial de vida de todo ser vegetal, animal ou humano. Sem ela não poderíamos conceber como são a atmosfera, o clima, a vegetação, a cultura ou a agricultura. O direito à água é um dos direitos fundamentais do ser humano: o direito à vida, tal qual é estipulado do Art. 3 º da Declaração dos Direitos do Homem.

Art. 3º – Os recursos naturais de transformação da água em água potável são lentos, frágeis e muito limitados. Assim sendo, a água deve ser manipulada com racionalidade, precaução e parcimônia.

Art. 4º – O equilíbrio e o futuro do nosso planeta dependem da preservação da água e de seus ciclos. Estes devem permanecer intactos e funcionando normalmente para garantir a continuidade da vida sobre a Terra. Este equilíbrio depende, em particular, da preservação dos mares e oceanos, por onde os ciclos começam.

Art. 5º – A água não é somente uma herança dos nossos predecessores; ela é, sobretudo, um empréstimo aos nossos sucessores. Sua proteção constitui uma necessidade vital, assim como uma obrigação moral do homem para com as gerações presentes e futuras.

Art. 6º – A água não é uma doação gratuita da natureza; ela tem um valor econômico: precisa-se saber que ela é, algumas vezes, rara e dispendiosa e que pode muito bem escassear em qualquer região do mundo.

Art. 7º – A água não deve ser desperdiçada, nem poluída, nem envenenada. De maneira geral, sua utilização deve ser feita com consciência e discernimento para que não se chegue a uma situação de esgotamento ou de deterioração da qualidade das reservas atualmente disponíveis.

Art. 8º – A utilização da água implica no respeito à lei. Sua proteção constitui uma obrigação jurídica para todo homem ou grupo social que a utiliza. Esta questão não deve ser ignorada nem pelo homem nem pelo Estado.

Art. 9º – A gestão da água impõe um equilíbrio entre os imperativos de sua proteção e as necessidades de ordem econômica, sanitária e social.

Art. 10º – O planejamento da gestão da água deve levar em conta a solidariedade e o consenso em razão de sua distribuição desigual sobre a Terra.”

A água não se destina apenas ao consumo humano e animal, ela é responsável a sobrevivência de todo um ecossistema, e também a economia, que logo trata de transformar, por exemplo, em energia.

As águas subterrâneas são os principais reservatórios de água doce disponíveis para os seres humanos (aproximadamente 60% da população mundial tem como principal fonte de água os lençóis freáticos ou subterrâneos).

À partida, sendo a água um recurso renovável estaria sempre disponível para o homem utilizar. No entanto, como o consumo tem excedido a renovação da mesma, atualmente verifica-se um stress hídrico, ou seja, falta de água doce principalmente junto aos grandes centros urbanos e também a diminuição da qualidade da água, sobretudo devido à poluição hídrica por esgotos domésticos e industriais.

A água pura (H2O) é um líquido formado por moléculas de hidrogênio e oxigênio. Na natureza, ela é composta por gases como oxigênio, dióxido de carbono e nitrogênio, dissolvidos entre as moléculas de água.

As águas poderão ser públicas ou privadas.

As águas públicas podem ser de uso comum ou dominicais.

        Art. 2º São águas públicas de uso comum:

        a) os mares territoriais, nos mesmos incluídos os golfos, bahias, enseadas e portos;

        b) as correntes, canais, lagos e lagoas navegáveis ou flutuáveis;

        c) as correntes de que se façam estas águas;

        d) as fontes e reservatórios públicos;

        e) as nascentes quando forem de tal modo consideráveis que, por si só, constituam o "caput fluminis";

        f) os braços de quaisquer correntes públicas, desde que os mesmos influam na navegabilidade ou flutuabilidade.

        § 1º Uma corrente navegável ou flutuável se diz feita por outra quando se torna navegável logo depois de receber essa outra.

        § 2º As correntes de que se fazem os lagos e lagoas navegáveis ou flutuáveis serão determinadas pelo exame de peritos.

        § 3º Não se compreendem na letra b) dêste artigo, os lagos ou lagoas situadas em um só prédio particular e por ele exclusivamente cercado, quando não sejam alimentados por alguma corrente de uso comum.

        Art. 3º A perenidade das águas é condição essencial para que elas se possam considerar públicas, nos termos do artigo precedente.

        Parágrafo único. Entretanto para os efeitos deste Código ainda serão consideradas perenes as águas que secarem em algum estio forte.

        Art. 4º Uma corrente considerada pública, nos termos da letra b) do art. 2º, não perde este caráter porque em algum ou alguns de seus trechos deixe de ser navegável ou flutuável.

        Art. 5º Ainda se consideram públicas, de uso comum todas as águas situadas nas zonas periodicamente assoladas pelas secas, nos termos e de acôrdo com a legislação especial sobre a matéria.

        Art. 6º São públicas dominicais todas as águas situadas em terrenos que também o sejam, quando as mesmas não forem do domínio público de uso comum, ou não forem comuns.

......

Art. 29. As águas públicas de uso comum, bem como o seu álveo, pertencem:

        I – A União:

        a) quando marítimas;

        b) quando situadas no Território do Acre, ou em qualquer outro território que a União venha a adquirir, enquanto o mesmo não se constituir em Estado, ou for incorporado a algum Estado;

        c) quando servem de limites da República com as nações vizinhas ou se extendam a território estrangeiro;

        d) quando situadas na zona de 100 kilometros contigua aos limites da República com estas nações;

        e) quando sirvam de limites entre dois ou mais Estados;

        f) quando percorram parte dos territórios de dois ou mais Estados.

        II – Aos Estados:

a) quando sirvam de limites a dois ou mais Municípios;

b) quando percorram parte dos territórios de dois ou mais Municípios.

        III – Aos Municípios:

        a) quando, exclusivamente, situados em seus territórios, respeitadas as restrições que possam ser impostas pela legislação dos Estados.

        § 1º Fica limitado o domínio dos Estados e Municípios sobre quaisquer correntes, pela servidão que a União se confere, para o aproveitamento industrial das águas e da energia hidráulica, e para navegação;

        § 2º Fica, ainda, limitado o domínio dos Estados e Municípios pela competência que se confere a União para legislar, de acordo com os Estados, em socorro das zonas periodicamente assoladas pelas secas.

        Art. 30. Pertencem a União os terrenos de marinha e os acrescidos natural ou artificialmente, conforme a legislação especial sobre o assunto.

        Art. 31. Pertencem aos Estados os terrenos reservados as margens das correntes e lagos navegáveis, si, por algum título, não forem do domínio federal, municipal ou particular.

        Parágrafo único. Esse domínio sofre idênticas limitações as de que trata o art. 29.

Tem-se, por outro, as águas particulares:

Art. 8º São particulares as nascentes e todas as águas situadas em terrenos que também o sejam, quando as mesmas não estiverem classificadas entre as águas comuns de todos, as águas públicas ou as águas comuns.

II – RECURSOS HÍDRICOS, BACIA HIDROGRÁFICA E POLÍTICA NACIONAL

Recursos hídricos são as águas superficiais ou subterrâneas disponíveis para qualquer tipo de uso de região ou bacias.

Esses recursos hídricos, como se sabe são finitos.

A Lei Política Nacional de Recursos Hídricos foi criada levando em consideração a sobrevivência do meio ambiente que consequentemente o alcance do objetivo maior, preservação e qualidade da vida humana.

A Política Nacional de Recursos Hídricos baseia-se nos seguintes fundamentos:

I - a água é um bem de domínio público;

II - a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico;

III - em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais;

IV - a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas;

V - a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;

VI - a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades.

O que é bacia hidrográfica? Bacia Hidrográfica é a área ou região de drenagem de um rio principal e seus afluentes. É a porção do espaço em que as águas das chuvas, das montanhas, subterrâneas ou de outros rios escoam em direção a um determinado curso d'água, abastecendo-o.

M. A.Oliveira; E. M. Barbosa e J. Dantas Neto (Gestão de Recursos Hídricos no Rio Grande do Norte: uma análise da implementação da Política Hídrica) em excelente abordagem ensinaram:

“Para Porto e Porto (2008), a questão central que deve nortear a gestão dos recursos hídricos é a integração dos vários aspectos que interferem no uso das águas e na sua proteção ambiental. Desse modo, "a bacia hidrográfica é o palco unitário de interação das águas com o meio físico, o meio biótico e o meio social, econômico e cultural". (YASSUDA, 1993, apud PORTO; PORTO, 2008, p. 43). A literatura especializada apresenta diversas definições para bacia hidrográfica, dentre as quais se destaca a definição de Tucci (2002, apud FERREIRA; SILVA; WERNECK, 2008, p. 38), segundo a qual, bacia hidrográfica é a:

Área de captação natural da água da precipitação que faz convergir os escoamentos para um único ponto de saída, seu exutório; compõe-se basicamente de um conjunto de superfícies vertentes e de uma rede de drenagem formada por cursos d’água que confluem até resultar um leito único no exutório.”

A Bacia Hidrográfica é uma unidade de planejamento e gestão.

III – OUTORGA

Para o seu direito de uso será necessário a outorga, ato do Poder Público.

Trago à colação o artigo 12 da Lei 9.433/97:

Art. 12. Estão sujeitos a outorga pelo Poder Público os direitos dos seguintes usos de recursos hídricos:

I - derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de água para consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo;

II - extração de água de aqüífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo;

III - lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final;

IV - aproveitamento dos potenciais hidrelétricos;

V - outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de água.

§ 1º Independem de outorga pelo Poder Público, conforme definido em regulamento:

I - o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural;

II - as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes;

III - as acumulações de volumes de água consideradas insignificantes.

§ 2º A outorga e a utilização de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica estará subordinada ao Plano Nacional de Recursos Hídricos, aprovado na forma do disposto no inciso VIII do art. 35 desta Lei, obedecida a disciplina da legislação setorial específica.

O que é outorga de recursos hídricos?

Disse Monize Karen Sant’ana Gonçalves (A Responsabilidade jurídica pela má utilização de água, in Âmbito Jurídico) que “a outorga é um instrumento do órgão gestor que concede com base em aspectos técnicos, econômicos, sociais e ambientais, a determinado usuário, o direito de captar uma quantidade de água (superficial ou subterrânea), não sendo necessário que seja para seu uso pessoal, podendo ser também para uso comercial, desde que apresente a outorga onerosa, com algumas condições. Isso será usada pelo Poder Público para preservação, de uma maneira que seja o mais pura e sustentável possível. Serão realizadas análises prévias do tipo de uso que será dado à água, com fim de minimizar conflitos e desperdícios, visando exercer um controle efetivo da qualidade e quantidade dos usos da água.”

A outorga de direito de uso de recursos hídricos nos termos da lei das águas é o ato administrativo mediante o qual o poder público outorgante faculta ao outorgado (pessoa física ou jurídica) o direito de uso de recurso hídrico por prazo determinado.

É ato administrativo, para muitos discricionário, cuja titularidade é do poder executivo, que objetiva assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos múltiplos da água, bem como o efetivo exercício dos direitos de acesso à água. Esse poder-dever de outorga é da Agência Nacional de Águas.

A Lei 9.433/97, art. 11, traz que: “O regime de outorga de direitos de uso de recursos hídricos tem como objetivos assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos direitos de acesso à água.”

A outorga de recursos hídricos é um dos instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos, estabelecidos no artigo 5º, III, da Lei 9 433, de 1997.

A teor do artigo 14 da Lei 9.433/97, a outorga efetivar-se-á por ato da autoridade competente do Poder Executivo Federal, dos Estados ou do Distrito Federal.

O regime de outorga de direitos de uso de recursos hídricos tem como objetivos assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos direitos de acesso à água.

Estão sujeitos a outorga pelo Poder Público os direitos dos seguintes usos de recursos hídricos:

I - derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de água para consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo;

II - extração de água de aqüífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo;

III - lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final;

IV - aproveitamento dos potenciais hidrelétricos;

V - outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de água.

§ 1º Independem de outorga pelo Poder Público, conforme definido em regulamento:

I - o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural;

II - as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes;

III - as acumulações de volumes de água consideradas insignificantes.

§ 2º A outorga e a utilização de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica estará subordinada ao Plano Nacional de Recursos Hídricos, aprovado na forma do disposto no inciso VIII do art. 35 desta Lei, obedecida a disciplina da legislação setorial específica.

Toda outorga estará condicionada às prioridades de uso estabelecidas nos Planos de Recursos Hídricos e deverá respeitar a classe em que o corpo de água estiver enquadrado e a manutenção de condições adequadas ao transporte aquaviário, quando for o caso.

A teor do artigo 13 daquele diploma legal, toda outorga estará condicionada às prioridades de uso estabelecidas nos Planos de Recursos Hídricos e deverá respeitar a classe em que o corpo de água estiver enquadrado e a manutenção de condições adequadas ao transporte aquaviário, quando for o caso.

. A outorga de uso dos recursos hídricos deverá preservar o uso múltiplo destes.

A teor do artigo 6º da Lei 9.984/2000, a ANA(Agência Nacional de Águas, autarquia especial) poderá emitir outorgas preventivas de uso de recursos hídricos, com a finalidade de declarar a disponibilidade de água para os usos requeridos, observado o disposto no art. 13 da Lei no 9.433, de 1997.

§ 1o A outorga preventiva não confere direito de uso de recursos hídricos e se destina a reservar a vazão passível de outorga, possibilitando, aos investidores, o planejamento de empreendimentos que necessitem desses recursos.

O prazo de validade da outorga preventiva será fixado levando-se em conta a complexidade do planejamento do empreendimento, limitando-se ao máximo de três anos, findo o qual será considerado o disposto nos incisos I e II do art. 5o.

Tanto pelo aqueles artigo 6º e 7º poder-se-á pedir a reserva de determinada quantidade de água.

A ANA não poderá ser obrigada a conceder a outorga de uso de recurso hídrico só pelo fato de o requerente ter obtido a outorga preventiva de “declaração de disponibilidade de água”.

A outorga preventiva deve ter seu pedido e sua autorização, publicados no Diário Oficial da União em jornais de grande circulação.

A licitação para concessão ou autorização de uso de potencial de energia hidráulica em corpo de água de domínio da União deve ser precedida de obtenção de declaração de reserva de disponibilidade hídrica, do que se lê do artigo 7, caput, da Lei 9.984/2000.

A ANA deverá obedecer o que diz o artigo 13 da Lei 9.433/87:Art 13. Toda outorga estará condicionada às prioridades de uso estabelecidas nos Planos de Recursos Hídricos e deverá respeitar a classe em que o corpo de água estiver enquadrado e a manutenção de condições adequadas ao transporte aquaviário, quando for o caso.

A outorga de uso dos recursos hídricos deverá preservar o uso múltiplo destes.

A outorga efetivar-se-á por ato da autoridade competente do Poder Executivo Federal, dos Estados ou do Distrito Federal.

Obtida a declaração de reserva de disponibilidade hídrica há uma consequência automática; a quem receber a concessão ou autorização de uso do potencial de energia hidráulica receberá a outorga de direito de uso de recursos hídricos (artigo 7º, § 2º, da Lei 9.984/2000). Como explicou Paulo Affonso Leme Machado (Direito Ambiental Brasileiro, 12ª edição, pág. 431), o pedido de declaração de reserva hídrica, que não acarreta automaticamente coisa alguma é situação posterior à obtenção da declaração da reserva, que faz surgir, nesse caso, o direito à outorga de uso do recurso hídrico”.

Determina o artigo 8º da Lei 9.984/2000:

Art  A ANA dará publicidade aos pedidos de outorga de direito de uso de recursos hídricos de domínio da União, bem como aos atos administrativos que deles resultarem, por meio de publicação na imprensa oficial e em pelo menos um jornal de grande circulação na respectiva região.

Mas há casos em que o Estudo Prévio de Impacto Ambiental é exigível. Caso o EPIA seja exigível e não tenha sido exigido pelo órgão público ambiental, caberá ao órgão público não conceder a outorga conquanto tal estudo não for devidamente apresentado, sob pena de responsabilização civil e criminal.

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São diversos a outorga de recursos hídricos e o licenciamento ambiental. A outorga de direitos de uso, além do concreto do pedido analisado, deve considerar primeiramente o Plano de Recursos Hídricos da bacia hidrográfica dos Estados e do País. Estando em desacordo com esses Planos o requerimento de outorga deve ser indeferido.

Observo, para tanto, o artigo 12, III, da lei 9.433/97:

Art. 12. Estão sujeitos a outorga pelo Poder Público os direitos dos seguintes usos de recursos hídricos:

III - lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final;

Para isso, deve haver o devido licenciamento ambiental.

O deferimento da outorga está condicionado às prioridades de uso estabelecidas em Planos de Recursos Hídricos, ao enquadramento do corpo de água, a manutenção de condições adequadas ao transporte aquática e a preservação do uso múltiplo dos recursos hídricos. Paulo Affonso Leme Machado (obra citada, pág. 453) vê assim um ato administrativo vinculado. Mas, por outro lado, vê discricionariedade, através de uma escolha baseada na maximização de um interesse público.

A ANA dará publicidade aos pedidos de outorga de direito de uso de recursos hídricos de domínio da União, bem como aos atos administrativos que deles resultarem, por meio de publicação na imprensa oficial e em pelo menos um jornal de grande circulação na respectiva região.

Observo o artigo 13 daquele diploma legal:

Art. 13. Toda outorga estará condicionada às prioridades de uso estabelecidas nos Planos de Recursos Hídricos e deverá respeitar a classe em que o corpo de água estiver enquadrado e a manutenção de condições adequadas ao transporte aquaviário, quando for o caso.

Parágrafo único. A outorga de uso dos recursos hídricos deverá preservar o uso múltiplo destes.

A outorga poderá ser suspensa:

Art. 15. A outorga de direito de uso de recursos hídricos poderá ser suspensa parcial ou totalmente, em definitivo ou por prazo determinado, nas seguintes circunstâncias:

I - não cumprimento pelo outorgado dos termos da outorga;

II - ausência de uso por três anos consecutivos;

III - necessidade premente de água para atender a situações de calamidade, inclusive as decorrentes de condições climáticas adversas;

IV - necessidade de se prevenir ou reverter grave degradação ambiental;

V - necessidade de se atender a usos prioritários, de interesse coletivo, para os quais não se disponha de fontes alternativas;

VI - necessidade de serem mantidas as características de navegabilidade do corpo de água.

Independem de outorga (artigo 12, § 1º, da Lei 9.433/97:

§ 1º Independem de outorga pelo Poder Público, conforme definido em regulamento:

I - o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural;

II - as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes;

III - as acumulações de volumes de água consideradas insignificantes.

Há um verdadeiro direito subjetivo do usuário de usar a água sem a intervenção prévia do Poder Público.

O artigo 49 daquele Lei 9.433/97 apresenta os casos de infração de outorga:

Art. 49. Constitui infração das normas de utilização de recursos hídricos superficiais ou subterrâneos:

I - derivar ou utilizar recursos hídricos para qualquer finalidade, sem a respectiva outorga de direito de uso;

II - iniciar a implantação ou implantar empreendimento relacionado com a derivação ou a utilização de recursos hídricos, superficiais ou subterrâneos, que implique alterações no regime, quantidade ou qualidade dos mesmos, sem autorização dos órgãos ou entidades competentes;

III - (VETADO)

IV - utilizar-se dos recursos hídricos ou executar obras ou serviços relacionados com os mesmos em desacordo com as condições estabelecidas na outorga;

V - perfurar poços para extração de água subterrânea ou operá-los sem a devida autorização;

VI - fraudar as medições dos volumes de água utilizados ou declarar valores diferentes dos medidos;

VII - infringir normas estabelecidas no regulamento desta Lei e nos regulamentos administrativos, compreendendo instruções e procedimentos fixados pelos órgãos ou entidades competentes;

VIII - obstar ou dificultar a ação fiscalizadora das autoridades competentes no exercício de suas funções.

A Lei 9.605/98, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, em seu artigo sexto:[…]

“Art. 6º Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:

I – a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas conseqüências para a saúde pública e para o meio ambiente;

II – os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;

III – a situação econômica do infrator, no caso de multa”.(BRASIL, Lei nº 9.605/98, 1998)

Porém, não se pode colocar em pé de igualdade o bem degradado, com qualquer que seja a reparação, pois será muito difícil que se traga integramente o que foi destruído.

A responsabilidade civil será objetiva por se tratar de infração ambiental.

A teor do artigo 14§ 1º, da Lei 9.433/97 prescreve:

Art. 14. A outorga efetivar-se-á por ato da autoridade competente do Poder Executivo Federal, dos Estados ou do Distrito Federal.

§ 1º O Poder Executivo Federal poderá delegar aos Estados e ao Distrito Federal competência para conceder outorga de direito de uso de recurso hídrico de domínio da União.

IV - A COBRANÇA DO USO DOS RECURSOS HÍDRICOS

Fala-se sobre a cobrança do uso de recursos hídricos.

Sobre a matéria trago à colação o artigo 19 da Lei 9.433/97:

Art. 19. A cobrança pelo uso de recursos hídricos objetiva:

I - reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor;

II - incentivar a racionalização do uso da água;

III - obter recursos financeiros para o financiamento dos programas e intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos.

Dita o artigo 20 da Lei 9.433/97:

Art. 20. Serão cobrados os usos de recursos hídricos sujeitos a outorga, nos termos do art. 12 desta Lei.

É claro que a cobrança fica sujeita à outorga.

A cobrança decorre do uso das águas, não sendo uma punição; e, portanto, não tem relação direta com a imposição de multas.

Determina, por sua vez, o artigo 21:

Art. 21. Na fixação dos valores a serem cobrados pelo uso dos recursos hídricos devem ser observados, dentre outros:

I - nas derivações, captações e extrações de água, o volume retirado e seu regime de variação;

II - nos lançamentos de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, o volume lançado e seu regime de variação e as características físico-químicas, biológicas e de toxidade do afluente.

Quanto a isso disse Paulo Affonso Machado Leme (obra citada, pág. 464):

“O volume e seu regime de variação é o primeiro dado a ser levado em conta tanto na utilização de águas superficiais e de águas subterrâneas como nos lançamentos de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos.

O segundo dado a ser ponderado na fixação dos valores diz respeito ao efluente, sua totalidade, e suas características físico-químicas e biológicas. Os lançamentos analisados na sua recepção no corpo de água são afluentes e os analisados no ponto de sua emissão são efluentes. “

O que é efluente?

Efluentes são despejos líquidos provenientes de atividades humanas e industriais. Para evitar estes problemas, no Brasil, os efluentes só devem ser lançados nos corpos receptores após receberem tratamento adequado e desde que obedeçam aos padrões, condições e exigências estipulados pela Resolução CONAMA Nº 430/2011.

A análise físico-química, biológica e a referente à toxidade do efluentes, procedidas na fixação dos valores, são interdependentes das normas de emissão dos efluentes determinadas pelos órgãos ambientais. Todos os lançamentos deverão ser cobrados, estejam ou não nos limites das normas de emissão, isto é, os lançamentos que observarem as normas de emissão pagarão, como também pagarão os lançamentos acima das normas de emissão, como disse Paulo Affonso Leme (obra citada, pág. 464).

Compete aos Comitês de Bacia Hidrográfica, no âmbito de sua área de atuação estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir os valores a serem cobrados.

Quanto às receitas de cobrança nos rios de domínio da União, aplica-se o artigo 21, caput, e incisos da Lei 9.984/2000:

Art. 21. As receitas provenientes da cobrança pelo uso de recursos hídricos de domínio da União serão mantidas à disposição da ANA, na Conta Única do Tesouro Nacional, enquanto não forem destinadas para as respectivas programações.

§ 1o A ANA manterá registros que permitam correlacionar as receitas com as bacias hidrográficas em que foram geradas, com o objetivo de cumprir o estabelecido no art. 22 da Lei no 9.433, de 1997.

§ 2o As disponibilidades de que trata o caput deste artigo poderão ser mantidas em aplicações financeiras, na forma regulamentada pelo Ministério da Fazenda.

§ 3o (VETADO)

§ 4o As prioridades de aplicação de recursos a que se refere o caput do art. 22 da Lei no 9.433, de 1997, serão definidas pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos, em articulação com os respectivos comitês de bacia hidrográfica

V – O  PRINCÍPIO DO POLUIDOR PAGADOR

De forma visionária, o Código de Águas, no Brasil, já disciplinava a matéria, à luz de um sistema de responsabilidade civil.

Ali se dizia:

Art. 109. A ninguém é lícito conspurcar ou contaminar as águas que não consome, com prejuízo de terceiros.

        Art. 110. Os trabalhos para a salubridade das águas serão executados à custa dos infratores, que, além da responsabilidade criminal, se houver, responderão pelas perdas e danos que causarem e pelas multas que lhes forem impostas nos regulamentos administrativo.

Falava-se em águas nocivas.

Já se antevia a aplicação do princípio do poluidor-pagador no Brasil.

Kloepfer (lembrado por Paulo Affonso Leme em sua obra citada – pág. 460) especificou que o que chama de quatro dimensões do princípio do poluidor-pagador. A dimensão objetiva-racional—econômica, a social-ética-normativa, a político-ambiental e a jurídico-normativa (Cristiane Derani, Direito Ambiental Econômico, 1997).

Na linha de Guilhermo Cano (citado anda por Paulo Affonso Leme, obra citada, páginas 460 a 461) “quem causa a deterioração paga os custos exigidos para prevenir e corrigir”.

Correto.

Diz-nos, ainda, Silvana Raquel Brendler Colombo (O princípio do poluidor-pagador):

“O Princípio do Poluidor-Pagador é um princípio normativo de caráter econômico, porque imputa ao poluidor os custos decorrentes da atividade poluente. Porém, para a otimização dos resultados positivos na proteção do meio ambiente é preciso uma nova formulação desse princípio, ou seja, ele deve ser considerado “uma regra de bom senso econômico, jurídico e político”, como disse Maria Alexandra de Souza Aragão (O princípio do poluidor-pagador. Pedra angular da política comunitária do ambiente. São Paulo: Coimbra, 1997).

A indeterminação em relação ao conteúdo normativo do PPP e também de seu alcance é um fator que torna a aplicação deste princípio obscura e vulnerável no que tange a sua eficácia. Por isso, sendo os poderes públicos os destinatários do direito do PPP e os poluidores apenas seus destinatários indiretos, a intervenção concretizadora do legislador deve servir para definir o âmbito subjetivo, a saber: o conteúdo, a extensão e os limites das obrigações dos poluidores (Maria Alexandra de Souza., obra citada).

O princípio que usa para afetar os custos das medidas de prevenção e controle da poluição, para estimular a utilização racional dos recursos ambientais escassos e para evitar distorções ao comércio e aos investimentos internacionais, é o designado Princípio do Poluidor-Pagador (Recomendação C1288, de maio de 1972). Portanto, o poluidor deve arcar com os custos das medidas necessárias para assegurar que o ambiente esteja num estado aceitável.

Importante mencionar que, o PPP não é exclusivamente um princípio de responsabilidade civil, pois abrange, ou, pelo menos foca outras dimensões não enquadráveis neste último (Igualmente, não é um princípio que “autoriza” a poluição ou que permita a “compra do direito de poluir”, porque ele envolve o cálculo dos custos de reparação do dano ambiental (dimensão econômica) a identificação do poluidor para que o mesmo seja responsabilizado (dimensão jurídica), e por fim, é um princípio.

Ensinou Erika Bechara (Princípio do Poluidor Pagador, in Enciclopédia Jurídica da PUC - SP):

“O princípio do poluidor pagador preconiza que os custos decorrentes da prevenção da poluição e controle do uso dos recursos naturais assim como os custos da reparação dos danos ambientais não evitados (“custos da poluição”) sejam suportados integralmente pelo condutor da atividade econômica potencial ou efetivamente degradadora, que, portanto, internalizará os custos da poluição ao invés de externalizá-los para o Estado e, consequentemente, para a sociedade.

Cabe ao Estado, amparado no princípio do poluidor pagador, conduzir esse processo de internalização das externalidades ambientais, mediante a elaboração e aplicação concreta de normas que determinem aos agentes econômicos a obrigação de adotar, as suas expensas, as medidas de prevenção e reparação de danos ambientais.

A Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, subscrita em junho de 1992 por ocasião da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Eco 92), encampa o princípio do poluidor pagador e reforça o papel do Estado na implementação deste princípio nos seguintes termos:

“As autoridades nacionais devem procurar promover a internalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais” (Princípio 16).

Segundo Maria Alexandra de Sousa Aragão (O princípio do poluidor-pagador: pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito – Universidade de Coimbra, p. 146), a efetiva internalização das externalidades ambientais pela intervenção estatal advém de uma definição (pelas autoridades públicas) do que pode ser considerado “um estado aceitável do ambiente”; de medidas ou instrumentos criados para atingir esse estado aceitável do ambiente e, finalmente, da imposição do custeamento das medidas e instrumentos criados aos poluidores. “

Segundo Maria Alexandra de Sousa Aragão (O princípio do poluidor-pagador: pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito – Universidade de Coimbra, p. 146), a efetiva internalização das externalidades ambientais pela intervenção estatal advém de uma definição (pelas autoridades públicas) do que pode ser considerado “um estado aceitável do ambiente”; de medidas ou instrumentos criados para atingir esse estado aceitável do ambiente e, finalmente, da imposição do custeamento das medidas e instrumentos criados aos poluidores. “

Diz-nos, ainda, Silvana Raquel Brendler Colombo (O princípio do poluidor-pagador):

“O Princípio do Poluidor-Pagador é um princípio normativo de caráter econômico, porque imputa ao poluidor os custos decorrentes da atividade poluente. Porém, para a otimização dos resultados positivos na proteção do meio ambiente é preciso uma nova formulação desse princípio, ou seja, ele deve ser considerado “uma regra de bom senso econômico, jurídico e político”, como disse Maria Alexandra de Souza Aragão ( O princípio do poluidor-pagador. Pedra angular da política comunitária do ambiente. São Paulo: Coimbra, 1997).

O Código de Águas foi criado a partir do Decreto Federal 24.643, de 10 de julho de 1934. Ainda em vigor, o Código das Águas determina que “são expressamente proibidas construções capazes de poluir ou inutilizar para o uso ordinário a água do poço ou nascente alheia a elas preexistentes”, devendo ser demolidas as obras irregulares. A lei 9.443, de 8 de janeiro de 1997, institui a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) e destaca a água como um bem de domínio público, de interesse comum, cuja conservação é essencial.

VI – A ADI 1.842/RJ

Fala-se da titularidade desses serviços.

Isso foi bem explicado por Vitor Amauri Antunes(A titularidade do serviço público de abastecimento de água) quando lembrou que a questão foi definitivamente pacificada quando da decisão, em 2012, pelo Supremo Tribunal Federal, da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 1.842/RJ. Na ocasião, decidiu-se que (i) a titularidade dos serviços de saneamento básico é, de fato, municipal (confirmando julgados anteriores do próprio Supremo), e (ii) somente no caso das Regiões Metropolitanas há o compartilhamento da titularidade entre o Estado e os Municípios, a ser exercida de forma "colegiada", em Assembleias que congreguem a participação de todos os Prefeitos e do Governador do Estado.

Ou seja, não se estando diante de Região Metropolitana, a atuação dos Estados no campo do abastecimento de água somente é possível mediante a delegação municipal destes serviços à Companhia Estadual (via "Contrato de Programa", figura jurídica equiparada a um Contrato de Concessão, mas possuindo entes públicos nos dois pólos).

Como bem resumiu André Luiz Freire(Saneamento básico, competências constitucionais para criar, organizar e prestar os serviços públicos, in Enciclopédia Jurídica da PUCSP) tem-se daquele julgamento:

‘O relator Min. Maurício Corrêa, em voto proferido 12 de abril de 2004, reputou que os dispositivos eram constitucionais. Em suma, o Ministro entendia que as questões relacionadas a saneamento básico extrapolavam os limites de interesse exclusivo dos Municípios. Ademais, havia ainda a competência supletiva dos Estados para legislar sobre águas situadas em seu território e sua responsabilidade constitucional com a saúde pública, proteção ao meio ambiente promoção de programas de saneamento básico e fiscalização da exploração de recursos hídricos. Logo, em vista do predominante interesse regional na utilização racional das águas pertencentes ao Estado, fazendo dele o gestor natural de seu uso coletivo, assim como da política de saneamento básico (cujo elemento principal era a água), também seria sua a competência para legislar acerca da política tarifária aplicável ao serviço de saneamento básico. 

A divergência foi aberta pelo Min. Joaquim Barbosa. Para ele, a transferência (direta ou indireta) de competências tipicamente locais (como as de saneamento básico) para o Estado em virtude da criação de uma região metropolitana não é compatível com a Constituição. A criação de uma região metropolitana não pode diminuir a autonomia política dos Municípios dela integrantes. É certo que as funções públicas de interesse comum passam à entidade metropolitana, mas, em contrapartida, o exercício das funções normativas, diretivas e administrativas do novo ente seja compartilhado com paridade entre o Estado e os Municípios envolvidos.

O Min. Nelson Jobim também divergiu do relator. Ele entendia que o interesse metropolitano era o conjunto dos interesses dos Municípios sob uma perspectiva intermunicipal. As funções administrativas e executivas da região metropolitana somente poderiam ser exercidas por órgão próprio ou por outro órgão a partir da autorização ou concessão dos Municípios dela formadores. Nesse sentido, a competência dos Estados é meramente “procedimental”, pois lhes caberia apenas instituir a região metropolitana e indicar seu funcionamento interno. No caso do saneamento básico (que ele restringiu aos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário), a instituição de região metropolitana demandava viabilidade técnica e econômica. A organização interna da região metropolitana deveria observar o princípio da igualdade municipal ou da representação proporcional entre os entes municipais, a depender das circunstâncias sociais e econômicas da região. Caberia, então, aos Municípios integrantes decidir, no âmbito do conselho deliberativo da região metropolitana, a forma de prestação dos serviços metropolitanos (se diretamente por cada Município, pelo Estado, por empresa estatal intermunicipal, por empresa estatal estadual ou por concessão). 

Os votos dos Ministros Joaquim Barbosa e Nelson Jobim foram exarados em 08 de março de 2006. Antes, portanto, da Lei 11.445/2007.

O Min. Gilmar Mendes também seguiu a divergência em 3 de abril de 2008, e acabou sendo o redator do acórdão. Na ementa do acórdão, os Municípios são o “Poder Concedente” do serviço público de saneamento básico. Contudo, devido ao alto custo, ao monopólio natural do serviço e às várias etapas do serviço (ex.: captação, tratamento, adução etc.) que comumente ultrapassam os limites territoriais de um Município, há interesse comum do serviço de saneamento básico que justifica a criação de região metropolitana, microrregião e aglomeração urbana, nos termos do art. 25, § 3º, da CF. A criação dessas aglomerações de Municípios pode ser dar de forma obrigatória (ao contrário do que ocorre nos consórcios públicos), com o objetivo de executar e planejar a função pública do saneamento básico. O Min. Gilmar Mendes também entendeu que a transferência de competências de “Poder Concedente” ao Estado seria inconstitucional. Convém transcrever o trecho da ementa:

“O estabelecimento de região metropolitana não significa simples transferência de competências para o estado. 

O interesse comum é muito mais que a soma de cada interesse local envolvido, pois a má condução da função de saneamento básico por apenas um município pode colocar em risco todo o esforço do conjunto, além das consequências para a saúde pública de toda a região. 

O parâmetro para aferição da constitucionalidade reside no respeito à divisão de responsabilidades entre municípios e estado. É necessário evitar que o poder decisório e o poder concedente se concentrem nas mãos de um único ente para preservação do autogoverno e da autoadministração dos municípios. 

Reconhecimento do poder concedente e da titularidade do serviço ao colegiado formado pelos municípios e pelo estado federado. A participação dos entes nesse colegiado não necessita de ser paritária, desde que apta a prevenir a concentração do poder decisório no âmbito de um único ente. A participação de cada Município e do Estado deve ser estipulada em cada região metropolitana de acordo com suas particularidades, sem que se permita que um ente tenha predomínio absoluto. 

Ação julgada parcialmente procedente para declara a inconstitucionalidade da expressão ‘a ser submetido à Assembleia Legislativa’ constante do art. 5º, I; e do § 2º do art. 4º; do parágrafo único do art. 5º; dos incisos I, II, IV e V do art. 6º; do art. 7º; do art. 10; e do § 2º do art. 11 da Lei Complementar n. 87/1997 do Estado do rio de Janeiro, bem como dos arts. 11 a 21 da Lei n. 2.869/1997 do Estado do Rio de Janeiro”.

Por fim, em 28 de fevereiro de 2013 (quase 9 anos depois do início do julgamento), depois dos votos dos demais ministros (em especial, do Min. Ricardo Lewandowski, do Min. Teori Zavaski e da Min. Rosa Weber, que não acrescentaram algo de novo ao exposto acima), finalmente a ADI 1.842/RJ foi julgada.”

Naquele julgamento disse o ministro Joaquim Barbosa:

"Assim, a criação de uma região metropolitana não pode, em hipótese alguma, significar o amesquinhamento da autonomia política dos municípios dela integrantes, materializando no controle e na gestão solitária pelo estado das funções públicas de interesse comum. Vale dizer, a titularidade do exercício das funções públicas de interesse comum passa para a nova entidade público-territorial-administrativa, de caráter intergovernamental, que nasce em consequência da criação da região metropolitana."

Na matéria tem-se a Lei Federal n° 11.445/2007 – que, em atendimento ao comando do art. 21, XX, da Carta Magna - fixou diretrizes sobre o saneamento básico, definindo-o nos seguintes termos:"Art. 3- Para os efeitos desta Lei, considera-se: I - saneamento básico: conjunto de serviços, infra-estruturas e instalações operacionais de:a) abastecimento de água potável: constituído pelas atividades, infra-estruturas e instalações necessáriasao abastecimento público de água potável, desde a captação até as ligações prediais e respectivosinstrumentos de medição;b) esgotamento sanitário: constituído pelas atividades, infra-estruturas e instalações operacionais de coleta, transporte, tratamento e disposição final adequados dos esgotos sanitários, desde as ligações prediais até o seu lançamento final no meio ambiente;c) limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos:conjunto de atividades, infra-estruturas e instalaçõesoperacionais de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destino final do lixo doméstico e do lixooriginário da varrição e limpeza de logradouros e vias públicas;d) drenagem e manejo das águas pluviais urbanas: conjunto de atividades, infra-estruturas e instalaçõesoperacionais de drenagem urbana de águas pluviais, de transporte, detenção ou retenção para o amortecimento de vazões de cheias, tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas nas áreas urbanas;"

O  serviço de saneamento básico constitui monopólio natural, pois os custos fixos de implantação e manutenção do sistema são tão elevados que uma única fornecedora pode atender a toda demanda com custo menor que múltiplas fornecedoras (COOTER & ULEN. Law and Economics. 5ª ed. Boston: Pearson, 2007. p. 35 e ss.POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law. 7ª ed. New York: Aspen,2007. p. 367 e ss.). 

A função pública do saneamento básico frequentemente extrapola o interesse local e passa a ter natureza de interesse comum, apta a ensejar a instituição de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, nos termos do art. 25, § 3º, da Constituição Federal.

Para o ministro Gilmar Mendes, em seu voto naquele julgamento citado, “de acordo com o ordenamento constitucional, não é razoável a manutenção do poder concedente em cada município participante, sob pena de esvaziar o conteúdo do art. 25, § 3º, da Constituição Federal e a própria instituição de região metropolitana, microrregião ou aglomeração urbana, além de inviabilizar a prestação integrada e o adequado atendimento do interesse comum.”

Daí a solução similar ao reconhecimento de sistema semelhante aos Kreise alemães, em que o Agrupamento de municípios junto com o estado federado detenha a titularidade e o poderconcedente, ou seja, o colegiado formado pelos municípios mais o estado federado decida como integrar e atender adequadamente à função de saneamento básico.

Sendo assim os municípios não poderão exercê-las de modo isolado, senão conjuntamente, numa espécie de cogestão entre eles e o Estado que tem a responsabilidade de organizá-las originariamente,mediante lei complementar.

A titularidade do serviço de saneamento básico, relativamente à distribuição de água e coleta de esgoto, é qualificada por interesse comum e deve ser concentrada na Região Metropolitana e na Microrregião, nos moldes do art. 25, § 3º, da Carta Magna, respeitando a condução de seu planejamento e execuçãopor decisões colegiadas dos municípios envolvidos e do Estado envolvido.

As providências quanto a esse sistema devem ser dirigidas a partir de decisão em que os municípios e o estado federado tenham participado conjuntamente. Essa a orientação dada pelo ministro Gilmar Mendes naquele voto.

A Lei nº 11.445/07 ampara cinco modalidades de prestação regionalizada de serviços públicos de saneamento básico11: - região metropolitana, aglomerações urbanas ou microrregiões: instituídas por lei complementar estadual e compostas de agrupamento de Municípios limítrofes; - unidade regional de saneamento básico: instituída por lei ordinária estadual e constituída pelo agrupamento de Municípios não necessariamente limítrofes; - bloco de referência: estabelecido por ato do Poder Executivo Federal, formalmente criado por meio de gestão associada voluntária dos titulares e composto pelo agrupamento de Municípios não necessariamente limítrofes; - regiões integradas de desenvolvimento (Ride): regiões administrativas que abrangem diferentes unidades da federação, instituídas por lei complementar federal até a data da entrada em vigor da Lei nº 13.089/15 (Estatuto da Metrópole); e - gestão associada: associação voluntária entre entes federativos por meio de consórcio público (instituído por contrato celebrado entre os entes consorciados ratificado mediante lei) ou convênio de cooperação (formalizado por meio da celebração de convênio entre os entes signatários). Os Estados terão o prazo de um ano, contado a partir da publicação da Lei nº 14.026/20, para instituir as unidades regionais de saneamento; não o fazendo, a União, de forma subsidiária, estabelecerá blocos de referência para a prestação regionalizada dos serviços públicos de saneamento básico

VII – A LEI 14.026/2020

Com a nova redação dada pela Lei nº 14.026/20 ao artigo 1º da Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000, a Agência Nacional de Águas (ANA) passa a denominar-se Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico e recebe competência para instituir normas de referência para a regulação dos serviços públicos de saneamento básico.

Paulo de Bessa Antunes e Rafael Daudt D’Oliveira assim falaram sobre a matéria: À Agência Nacional de Águas [ANA] foi atribuída a competência para regular a prestação do serviço de saneamento básico por meio da edição de normas de referência (arts. 1º e 3º da Lei nº 9.984/2000 e art. 25-A da Lei nº 11.445/2007), como, por exemplo, sobre padrões de qualidade e eficiência na prestação, na manutenção e na operação dos sistemas de saneamento básico, metas de universalização dos serviços, entre outros aspectos (art. 4-A, § 1º, da Lei nº 9.984/2000). O objetivo do legislador é estabelecer um ambiente de segurança jurídica e regulatória, com regras claras e uniformes em todo o país, a fim de que possa atrair investimentos para o setor e contribuir com a universalização dos serviços públicos. Aliás, a Lei contempla expressamente as ideias de uniformidade regulatória do setor e de segurança jurídica na prestação e na regulação dos serviços (art. 4º-A, § 7º, da Lei nº 9.984/2000 e art. 48, III, da Lei nº 11.445/2007). No entanto, a nova Lei não traz a definição do que sejam normas de referência. Sendo assim o TCSP(O novo marco legal de saneamento básico), em trabalho na matéria, entendeu apropriado estabelecer, como critério interpretativo, a adoção da analogia entre as normas de referência no âmbito da regulação com as normas gerais da União no exercício da competência legislativa concorrente prevista no art. 24 da CRFB. Desse modo, as normas de referência devem se ater ao estabelecimento de diretrizes nacionais que possam ser uniformemente aplicadas em todo o Brasil. Não podem descer a minúcias nem tratar de especificidades locais que remanescem inseridas na competência de Estados e Municípios, os quais podem e devem regular a prestação dos serviços de saneamento, observadas as normas de referência da ANA (art. 8º, § 5º, art. 9º, II, e arts. 21 e 23, da Lei 11.445/2007). Correta essa forma de ver a questão, pois à União Federal disciplinar a temática sobre normas gerais no âmbito federativo.

Em conformidade aos arts. 13 e 14 da Lei nº 14.026/20, procurou-se incentivar a prestação regionalizada dos serviços públicos de saneamento básico com apoio técnico e financeiro da União e cuidou também de estabelecer regras de transição para o novo sistema e para os casos de alienação de controle acionário de empresa pública ou sociedade de economia mista prestadora de serviços públicos de saneamento básico. A alocação de recursos públicos federais e os financiamentos com recursos da União serão feitos em conformidade com a política federal de saneamento básico e com os planos de saneamento básico, estando ainda condicionados, entre outros requisitos, ao alcance de índices mínimos de desempenho do prestador na gestão técnica, econômica e financeira dos serviços e eficiência e eficácia na prestação dos serviços públicos de saneamento básico.

A nova Lei sofreu vetos:

A Presidência da República vetou 14 (quatorze) dispositivos do texto aprovado pelo Congresso Nacional. Entre os dispositivos vetados estão o art. 16 e seu Parágrafo único, que possibilitavam a renovação, mediante acordo entre as partes, por até 30 (trinta) anos, dos contratos de programa vigentes ou com a vigência expirada e as situações de fato em que a prestação ocorria sem a assinatura de contrato de programa. O prazo para se operar essa renovação seria até 31 de março de 2022. Cab ao Congresso Nacional, nos termos do disposto no inciso IV do art. 57 da Constituição Federal, a apreciação do Veto Presidencial.

VIII   – A DERIVAÇÃO

Determina o artigo 43 do Código de Águas:

Art. 43. As águas públicas não podem ser derivadas para as aplicações da agricultura, da indústria e da higiene, sem a existência de concessão administrativa, no caso de utilidade pública e, não se verificando esta, de autorização administrativa, que será dispensada, todavia, na hipótese de derivações insignificantes.

        § 1º A autorização não confere, em hipótese alguma, delegação de poder público ao seu titular.

        § 2º Toda concessão ou autorização se fará por tempo fixo, e nunca excedente de trinta anos, determinando-se também um prazo razoável, não só para serem iniciadas, como para serem concluídas, sob pena de caducidade, as obras propostas pelo peticionário.

        § 3º Ficará sem efeito a concessão, desde que, durante três anos consecutivos, se deixe de fazer o uso privativo das águas.

Por sua vez, tem-se no artigo 44:

  Art. 44. A concessão para o aproveitamento das águas que se destinem a um serviço público será feita mediante concorrência pública, salvo os casos em que as leis ou regulamentos a dispensem.

        Parágrafo único. No caso de renovação será preferido o concessionário anterior, em igualdade de condições, apurada em concorrência.

Passo aos chamados serviços públicos concedidos.

O instituto da concessão está disciplinado, na esfera federal, pelas Leis nº 8.987/95 (concessão comum), nº 11.079/04 (concessão patrocinada e administrativa, concebidas na forma de parcerias público-privadas), nº 9.074/95 que “estabelece normas para outorga e prorrogações das concessões e permissões de serviços públicos e dá outras providências” e, ainda, por leis específicas que disciplinam a concessão de determinados serviços públicos.

Os contratos de concessão para prestação dos serviços públicos de saneamento básico deverão também conter, expressamente, sob pena de nulidade, as cláusulas essenciais previstas no art. 23 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Art. 23. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas: I - ao objeto, à área e ao prazo da concessão; II - ao modo, forma e condições de prestação do serviço; III - aos critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros definidores da qualidade do serviço; IV - ao preço do serviço e aos critérios e procedimentos para o reajuste e a revisão das tarifas; V - aos direitos, garantias e obrigações do poder concedente e da concessionária, inclusive os relacionados às previsíveis necessidades de futura alteração e expansão do serviço e consequente modernização, aperfeiçoamento e ampliação dos equipamentos e das instalações; VI - aos direitos e deveres dos usuários para obtenção e utilização do serviço; VII - à forma de fiscalização das instalações, dos equipamentos, dos métodos e práticas de execução do serviço, bem como a indicação dos órgãos competentes para exercê-la; VIII - às penalidades contratuais e administrativas a que se sujeita a concessionária e sua forma de aplicação; IX - aos casos de extinção da concessão; X - aos bens reversíveis; XI - aos critérios para o cálculo e a forma de pagamento das indenizações devidas à concessionária, quando for o caso; XII - às condições para prorrogação do contrato; XIII - à obrigatoriedade, forma e periodicidade da prestação de contas da concessionária ao poder concedente; XIV - à exigência da publicação de demonstrações financeiras periódicas da concessionária; e XV - ao foro e ao modo amigável de solução das divergências contratuais.

E ainda as seguintes disposições: I - metas de expansão dos serviços, de redução de perdas na distribuição de água tratada, de qualidade na prestação dos serviços, de eficiência e de uso racional da água, da energia e de outros recursos naturais, do reuso de efluentes sanitários e do aproveitamento de águas de chuva, em conformidade com os serviços a serem prestados; II - possíveis fontes de receitas alternativas, complementares ou acessórias, bem como as provenientes de projetos associados, incluindo, entre outras, a alienação e o uso de efluentes sanitários para a produção de água de reuso, com possibilidade de as receitas serem compartilhadas entre o contratante e o contratado, caso aplicável; III - metodologia de cálculo de eventual indenização relativa aos bens reversíveis não amortizados por ocasião da extinção do contrato; e IV - repartição dos riscos entre as partes, incluindo os referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária.

Os contratos deverão prever metas de universalização que garantam o atendimento de 99% da população com água potável e de 90% com coleta e tratamento de esgotos até 31 de dezembro de 2033. Contratos em vigor que não possuírem essas metas terão até 31 de março de 2022 para viabilizar a inclusão. Contratos resultantes de procedimentos licitatórios que possuam metas diversas permanecerão inalterados e o titular do serviço deverá buscar alternativas para atingir as metas de universalização mediante: a prestação direta da parcela remanescente; licitação complementar para atingimento da totalidade da meta; e aditamento de contratos já licitados, incluindo eventual reequilíbrio econômico-financeiro, desde que em comum acordo com a contratada.

Os titulares dos serviços públicos de saneamento básico elaborarão os respectivos planos abrangendo, no mínimo: I - diagnóstico da situação e de seus impactos nas condições de vida, utilizando sistema de indicadores sanitários, epidemiológicos, ambientais e socioeconômicos e apontando as causas das deficiências detectadas; II - objetivos e metas de curto, médio e longo prazos para a universalização, admitidas soluções graduais e progressivas, observando a compatibilidade com os demais planos setoriais; III - programas, projetos e ações necessárias para atingir os objetivos e as metas, de modo compatível com os respectivos planos plurianuais e com outros planos governamentais correlatos, identificando possíveis fontes de financiamento; IV - ações para emergências e contingências; V - mecanismos e procedimentos para a avaliação sistemática da eficiência e eficácia das ações programadas. Os planos de saneamento básico passam a ser revistos periodicamente, em prazo não superior a 10 anos.  Municípios com população inferior a 20.000 (vinte mil) habitantes poderão apresentar planos simplificados, com menor nível de detalhamento. No caso de serviço regionalizado de saneamento básico, haverá plano regional elaborado para o conjunto dos Municípios atendidos, que poderá contemplar um ou mais serviços de saneamento e prevalecerá sobre os planos municipais. Havendo plano regional, fica dispensada a elaboração de planos municipais.

Serviços públicos concedidos, como ensinou Hely Lopes Meirelles(Direito municipal brasileiro, 3ª edição, pág. 458) são todos aqueles que o particular executa em seu nome, por sua conta e risco, remunerado por tarifa, na forma regulamentar, mediante delegação contratual pelo Poder Público concedente. Serviço concedido é serviço do Poder Público, apenas executado por particulares em razão da concessão.

Assim concessão é delegação contratual da execução do serviço, na forma autorizada por lei e regulamentada pelo Executivo. O contrato de concessão é ajuste de direito administrativo, bilateral, oneroso, comutativo e realizado intuitu personae. É um acordo administrativo e não um ato unilateral da Administração.

A doutrina entende que o serviço, apesar de concedido, continua sendo público, pois o poder concedente não se despojaria do direito de exploração direta ou indireta, por seus órgãos, autarquias e entidades paraestatais.

A concessão de serviço público é o acordo de vontades entre a Administração Pública e um particular pelo qual a primeira transfere ao segundo a execução de um serviço público, para que este particular o exerça em seu próprio nome e por sua conta e risco, mediante a cobrança de tarifa, preço público, paga pelo usuário.

Há várias formas de extinção de uma concessão pública.

Essa extinção pode se dar por reversão, que é o retorno do serviço ao concedente, ao término do prazo contratual da concessão. Mas o contrato de direito público de concessão deverá prever quais os bens que, com a reversão serão transferidos ao concedente. A prática administrativa demonstra que são só os bens vinculados à prestação de serviço que se transferem ao concedente. Mas os bens não utilizados diretamente nessa contraprestação se constituem um patrimônio privado do concessionário.

A extinção do contrato poderá se dar pelo anulamento do ato administrativo desde que presentes suas razões com relação a defeitos que lhe são inerentes quanto ao sujeito, objeto, forma, motivo, fim, publicidade do ato.

Há ainda a caducidade do ato administrativo, prevista na Lei 8,.987/95. Ocorre com vigência de uma legislação superveniente, que acarreta a perda dos efeitos jurídicos da antiga norma que respaldava a prática daquele ato. Assim, assevera Diógenes Gasparini: “quando a retirada funda-se no advento de nova legislação que impede a permanência da situação anteriormente consentida.”

Findo o prazo da concessão, como ainda ensinou Hely Lopes Meirelles(obra citada, pág. 460), devem reverter ao poder concedente os direitos e bens vinculados à prestação do serviço, independentemente do pagamento ou indenização do concessionário, por se considerar recebido no decurso do contrato, o capital investido, bem como lucros e juros decorrentes.

Há serviços permitidos.

Serviços permitidos são todos aqueles para os quais a Administração estabelece os requisitos para sua prestação ao público e por ato unilateral(termo de permissão) comete a execução aos particulares que demonstrarem capacidade para o seu desempenho.

Disse ainda Hely Lopes Meirelles(obra citada, pág. 461) que a permissão é, em princípio, discricionária e precária, mas admite concessões e prazos para a exploração do serviço a fim de garantir rentabilidade e assegurar a recuperação do investimento do permissionário visando atrair a iniciativa privada. Afirma-se que a unilateralidade, a discricionariedade e a precariedade são atributos da permissão embora possam ser excepcionados em certos casos, diante do interesse administrativo ocorrente.

Mas a permissão presta-se ao cumprimento de atividades transitórias, ou mesmo permanentes, mas que exijam frequentes modificações para acompanhar a evolução da técnica ou as variações do interesse público. A permissão, diga-se, não gera privilégio, nem assegura exclusividade ao permissionário, salvo cláusula expressa nesse sentido(STF, RDA 54/114).

Na lição de Otto Mayer(Derecho Administrativo, tradução Depalma, 1951, III/238,4), embora unilateral e precário, a permissão é deferida intuitu personae e como tal não admite a substituição do permissionário, nem possibilita o transpasse do serviço ou do uso permitido a terceiros, sem prévio assentimento do permitente.

Os atos administrativos dos permissionários são de sua exclusiva responsabilidade, sem afetar a Administração permitente embora praticados por delegação do Poder Público e sob a sua fiscalização.

Há ainda os chamados serviços autorizados.

Ainda Hely Lopes Meirelles(obra citada, pág. 464) nos ensina que serviços autorizados são aqueles que o Poder Público, por ato unilateral, precário e discricionário, consente na sua execução por particular, para atender interesses coletivos instáveis ou emergências transitórias. São serviços delegados e controlados pela Administração autorizante, normalmente sem regulamentação especifica, e sujeitos, por índole, a constantes modificações no modo de sua prestação ao público e a supressão a qualquer momento, o que agrava a sua precariedade.

A prestação de tais serviços é tarifada pela Administração, como os demais da prestação ao público, dentro das possibilidades de medida para oferecimento aos usuários. A execução deve ser pessoal e intransferível a terceiros. Em princípio, não se exige licitação, podendo ser adotado, à luz dos princípios do artigo 37 da Constituição, para Administração, forma de seleção.

É o caso de serviços que não exigem execução pela própria Administração.

Tais serviços autorizados não se beneficiam das prerrogativas das atividades públicas, só auferindo as vantagens que lhes forem expressamente deferidas no ato de autorização, e sempre sujeitas à modificação ou supressão sumária, dada a sua inata precariedade.

É ato discricionário, pois o Poder Público irá analisar a conveniência e oportunidade da concessão da autorização.

É ato precário, pois não há direito subjetivo do particular à obtenção ou continuidade da autorização. Por isso, em regra não há direito à indenização em caso de cassação do alvará.

Observa-se, por sua vez, a aplicação dos princípios da igualdade, da supremacia do interesse público quando da concessão.

A teor do artigo 139 do Código de Águas, o aproveitamento industrial das quedas de águas e outras fontes de energia hidráulica, quer do domínio público, quer do domínio particular, far-se-á pelo regime de autorizações e concessões instituído naquele Código.

IX – A SERVIDÃO DE ÁGUAS

O Código de Águas, a frente de seu tempo, determinava quanto a servidão de aquedutos.

Art. 117. A todos é permitido canalizar pelo prédio de outrem as águas a que tenham direito, mediante prévia indenização ao dono deste prédio:

a) para as primeiras necessidades da vida;

b) para os serviços da agricultura ou da indústria;

c) para o escoamento das águas superabundantes;

d) para o enxugo ou bonificação dos terrenos.

        Art. 118. Não são passíveis desta servidão as casas de habitação e os pátios, jardins, alamedas, ou quintais, contiguos as casas.

        Parágrafo único. Esta restrição, porém, não prevalece no caso de concessão por utilidade pública, quando ficar demonstrada a impossibilidade material ou econômica de se executarem as obras sem a utilização dos referidos prédios.

Na definição de José Cretella Júnior(Tratado de direito administrativo, volume V, pág. 183) servidão pública é o direito público real constituído por pessoa jurídica de direito público sobre imóvel de domínio privado para que este, como prolongamento do domino público, possa atender os interesses coletivos.

As servidões públicas possuem um caráter permanente, afastando-se do que a doutrina administrativa chama de ocupação temporária, prevista no artigo 36 do Decreto-lei 3.365/41, onde se diz que é permitida a ocupação temporária, que será indenizada por ação própria, de terrenos não-edificados, vizinhos às obras e necessárias à sua realização.

Os donos dos prédios servientes têm, também, direito a indenização dos prejuízos que de futuro vierem a resultar da infiltração ou irrupção das águas, ou deterioração das obras feitas, para a condução destas. Para garantia deste direito eles poderão desde logo exigir que se lhes preste caução.

Se o aqueduto tiver de atravessar estradas, caminhos e vias públicas, sua construção fica sujeita aos regulamentos em vigor, no sentido de não se prejudicar o trânsito.

 A direção, natureza e forma do aqueduto devem atender ao menor prejuízo para o prédio serviente.

Hely Lopes Meirelles(Direito de Construir. 10 ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 69-70) ensinou que:

“A canalização das águas pelo vizinho, através dos prédios alheios, é permitida pelo Código Civil (art. 1.293) e pelo Código das Águas (arts. 117 a 138), desde que sejam previamente indenizados os proprietários prejudicados e podendo exigir que o aqueduto (canos, tubos, manilhas etc.) seja subterrâneo quando atravessar áreas edificadas, quintais, pátios, hortas, jardins, bem como casas de habitação e suas dependências. Esta canalização, entretanto, só se justifica quando para atender às primeiras necessidades da vida, para os serviços da agricultura ou da indústria, para o escoamento das águas superabundantes, ou para o enxugo e drenagem dos terrenos. Neste caso, o proprietário prejudicado tem direito ao ressarcimento pelos danos que de futuro lhe advenham da infiltração ou irrupção das águas, bem como da deterioração das obras destinadas a canalizá-las”

Sobre a matéria entendeu o STJ:

Ementa: Civil – Águas – Evasão. I – Não contraria os arts. 69, 70 e 109 do Código de Águas o acórdão que veda ao proprietário a retenção de água corrente, em detrimento de seu vizinho, a jusante. II – Recurso não conhecido.” (Superior Tribunal de Justiça – Terceira Turma/ REsp 100.419/RJ/ Relator: Ministro Waldemar Zveiter/ Julgado em 11.11.1996/ Publicado no DJ em 03.02.1997, p. 727).

A água, o álveo e as margens do aqueduto consideram-se como partes integrantes do prédio a que as águas servem.

É inerente a servidão de aqueduto o direito de trânsito por suas margens para seu exclusivo serviço(artigo 127 do Código de Águas).

Porém, o dono do aqueduto poderá consolidar suas margens com relvas, estacadas, paredes de pedras soltas.

Pertence ao dono do prédio serviente tudo que as margens produzem naturalmente.

X   - ENERGIA HIDRÁULICA E SEU APROVEITAMENTO

O aproveitamento industrial das quedas de águas e outras fontes de energia hidráulica, quer do domínio público, quer do domínio particular, far-se-á pelo regime de autorizações e concessões instituído no Código de Águas.

As quedas d’água e outras fontes de energia hidráulica são bens imóveis e tidas como coisas distintas e não integrantes das terras em que se encontrem.

Assim a propriedade superficial não abrange a água, o álveo do curso no trecho em que se acha a queda d’água, nem a respectiva energia hidráulica, para o efeito de seu aproveitamento industrial.

Que são álveos?

São leito de rio ou de regato.

Diversa é a acessão.

Para Eduardo Espínola (Posse, propriedade, condomínio e direitos autorais, pág. 221) diz-se que acessão, de modo geral, é tudo quanto constitui um aumento da coisa.

Clóvis Bevilácqua adota a definição que corresponde ao conceito, que prevaleceu no Código Civil, atribuindo à acessão a qualidade de modo de adquirir. Lafayettte, segundo a orientação dos romanistas só lhe reconhece o caráter de modo de adquirir, pelo qual o senhor da coisa principal adquiri de direito a propriedade das coisas acessórias (Direito das coisas, § 38).

Como já enunciado esse aumento pode resultar de um desenvolvimento natural da própria coisa como os frutos das árvores, as crias dos animais ou de um movimento externo, o acréscimo ou a união de uma coisa a outra.

Interessante que o aumento que se produz no primeiro caso (aumento de dentro para fora) é designado por alguns como acessão discreta, o que se verifica de fora para dentro (união de uma coisa a outra), é acessão continua, como se vê da conceituação de Gastán Tabñas (Derecho civil español e foral, volume segundo, 8º edição, pág. 213).

A acessão continua se subdivide em mobiária (união de coisa móvel a coia móvel) e imobiliária (união de coisa imóvel a coisa imóvel).

 As quedas d’água existentes em cursos cujas águas sejam comuns ou particulares, pertencem aos proprietários dos terrenos marginais, ou a quem for por título legítimo.

As quedas d’água e outras fontes de energia hidráulica existentes em águas públicas de uso comum ou dominicais são incorporadas ao patrimônio da Nação, como propriedade inalienável e imprescritível.

Ao proprietário da queda d’água é assegurada a preferência na autorização ou concessão para o aproveitamento industrial de sua energia ou coparticipação razoável, estipulada neste Código, nos lucros da exploração que por outrem for feita.

O serviço poderá ser executado por particular, seja por concessão ou por autorização.

Tem-se então do Código de Águas:

Art. 162. Nos contratos de concessão figurarão entres outras as seguintes cláusulas:

        a) ressalva de direitos de terceiros;

        b) prazos para início e execução das obras, prorrogáveis a juízo do Governo;

        c) tabelas de preços nos bornes da usina e a cobrar dos consumidores, com diferentes fatores de carga;

        d) obrigação de permitir ao funcionários encarregados da fiscalização livre acesso, em qualquer época, às obras e demais instalações compreendidas na concessão, bem como o exame de todos os assentamentos, gráficos, quadros e demais documentos preparados pelo concessionário para verificação das descargas, potências, medidas de rendimento das quantidades de energia utilizada na usina ou fornecida e dos preços e condições de venda aos consumidores;

        Art. 163. As tarifas de fornecimento da energia serão estabelecidas, exclusivamente, em moeda corrente no país e serão revistas de três em três anos. (Vide Decreto-Lei nº 2.676, de 1940)

Dispôs o Código de Àguas que a autorização será outorgada por um período máximo de trinta anos, podendo ser renovada por prazo igual ou inferior:

Toda cessão total ou parcial da autorização, toda mudança de permissionário, não sendo o caso de vendas judiciais, deve ser comunicada ao órgão competente da União que poderá se recusar a seu atendimento.

A Lei ainda faz menção a permissão que é o ato administrativo discricionário e precário mediante o qual é consentida ao particular alguma conduta em que exista interesse predominante da coletividade.

Lei 8.987/95, Art. 2º, IV - permissão de serviço público: a delegação, a título precário, mediante licitação, da prestação de serviços públicos, feita pelo poder concedente à pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco.

É formalizada por contrato de adesão (art. 40, Lei 8.987/95)

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

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