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Pé de galinha romantizada como alimento. Entre poder e não poder

Agenda 17/10/2021 às 11:03

É possível romanizar, não é possível aceitar fome e subnutrição diante dos vastos tipos de alimentos produzidos em um país enquanto há milhões sobrevivendo na insegurança alimentar

Redações no corpo da CRFB de 1988:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III - a dignidade da pessoa humana;

 Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.             (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015)

Infraconstitucional:

LEI Nº 11.346, DE 15 DE SETEMBRO DE 2006

Art. 1º Esta Lei estabelece as definições, princípios, diretrizes, objetivos e composição do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN, por meio do qual o poder público, com a participação da sociedade civil organizada, formulará e implementará políticas, planos, programas e ações com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada.

Art. 2º A alimentação adequada é direito fundamental do ser humano, inerente à dignidade da pessoa humana e indispensável à realização dos direitos consagrados na Constituição Federal, devendo o poder público adotar as políticas e ações que se façam necessárias para promover e garantir a segurança alimentar e nutricional da população.

§ 1º A adoção dessas políticas e ações deverá levar em conta as dimensões ambientais, culturais, econômicas, regionais e sociais.

§ 2º É dever do poder público respeitar, proteger, promover, prover, informar, monitorar, fiscalizar e avaliar a realização do direito humano à alimentação adequada, bem como garantir os mecanismos para sua exigibilidade.

Art. 3º A segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis.

Art. 4º A segurança alimentar e nutricional abrange:

III – a promoção da saúde, da nutrição e da alimentação da população, incluindo-se grupos populacionais específicos e populações em situação de vulnerabilidade social;

Existe diferença em querer e poder.

Quer peito de frango, não pode.

Não quer pé de galinha, mas é a única coisa que se pode comprar.

Num país como o Brasil, sempre com desigualdades sociais e insegurança alimentar, criou-se, no inconsciente coletivo, uma narrativa de "gosto para tudo" e nenhum problema de indignidade humana.

É como uma tortura, após sofrer muito, a vítima aceita qualquer situação que não cause mais dor. Entre a dor da fome, e a felicidade de comer alguma coisa, pelo poder econômico que possuí, o mínimo é o máximo.

Enquanto isso, poucos comem de tudo e usam remédios para não passarem mal pela gula.

Os escravos brasileiros comiam, mas não os mesmos alimentos de seus senhores. Os reis comiam alimentos impossíveis para os súditos.

Querer não é poder.

A Síndrome de Estocolmo na alimentação. Claro que em cada região há um tipo de alimentação pelas condições mesológicas.

Um náufrago numa ilha, como no filme "Náufrago", estrelado por Tom Hanks, não comerá carne bovina, suína, não terá vegetais etc. Os frutos do mar, não em sua variedade, servirá para sobreviver. Circunstância.

Com a globalização na Idade Média, sim, antes do século XX, os alimentos eram transnacionais. Mesmo assim, "meritocracia alimentar" era para pouquíssimos.

Industrialização. Processados e ultraprocessados. Não existiria mais insegurança alimentar no mundo. O problema, tais alimentos eram, e ainda são, pobres em nutrientes e saturados de sal, açúcar e gordura, somando com conservantes, corantes etc.

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Se eram alimentos para "classes altas", como média alta e alta, esses alimentos perderam atratividade para essas classes. As "classes baixas" consumiram mais, pelos preços acessíveis e a preparação rápida. Claro, há alimentos processados caros.

Até 1970, a humanidade não sofria com a obesidade, muito menos mórbida.

Querer e poder são bem diferentes. É possível romantizar o prato com pé de galinha como uma iguaria "dos deuses". Valem fogos de artifícios etc.

Querer não é poder.

E tudo continua na "normose alimentar". O pé de galinha pode ser gostoso para alguns, como comer lagartixa como único alimento disponível; não há nada demais. À questão, como fulcro do artigo, é querer além do pé de galinha, e não poder.

Às vezes, o pé de galinha se assemelha ao biscoito de água e sal. Tem várias marcas, algumas melhores, no sabor, na crocância, no entanto, o poder de compra do consumidor é decisivo para escolher de acordo com o seu poder de compra.

Pode-se comprar o biscoito pelo preço, não pelo sabor, ainda assim pode ser gostoso o sabor quando com algum complemento. Pronto, a mistura feita torna o biscoito maravilhoso.

Por algum destino dos deuses, a pessoa come o biscoito de outra marca. Nada para completar, o gosto, a crocância, textura etc. são ótimos. Os deuses proporcionaram, mas o capital não permite comprar o mesmo biscoito.

Água no feijão para render mais tempo. Vida que se segue na insegurança alimentar em meio a tantos alimentos nas prateleiras, outros alimentos jogados nos lixos pela fartura de alguns poucos com o poder do poder.

Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

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