Resumo: Direito do Trabalho é ramo jurídico especializado, que se estruturou a partir de meados do século XIX com vistas a reger as relações jurídicas entre empregados e empregadores, quer no plano dos contratos de trabalho individualmente considerados, quer no plano dos vínculos grupais formados entre estes seres e suas organizações representativas. Embora seja um ramo jurídico especial e unitário, o Direito do Trabalho integra-se de dois segmentos diferenciados, o individual e o coletivo. Tais segmentos estruturam-se a partir de relações sócio-jurídicas distintas (a relação jurídica compõe o núcleo do direito, como se sabe). No primeiro caso, a relação de emprego, envolvendo empregador e empregado. No segundo caso, as relações laborais coletivas, envolvendo os seres coletivos trabalhistas. Estes são, de um lado, o empregador (sozinho ou através de suas entidades representativas) e, de outro lado, os trabalhadores, através de seus entes representativos.
II - PRINCÍPIOS ESPECIAIS DO DIREITO COLETIVO. TIPOLOGIA
O Direito Coletivo do Trabalho, enquanto segmento jurídico especializado, constitui um todo unitário, um sistema, composto de princípios, categorias e regras organicamente integradas entre si. Sua unidade - como em qualquer sistema - sela-se em função de um elemento básico, sem o qual seria impensável a existência do próprio sistema. Neste ramo jurídico a categoria básica centra-se na noção de ser coletivo, presente em qualquer dos pólos da relação jurídica nuclear deste direito. Ser coletivo empresarial (com ou sem representação pelo respectivo sindicato) e ser coletivo obreiro, mediante as organizações coletivas da classe trabalhadora - especialmente os sindicatos. Os princípios do Direito Coletivo do Trabalho constroem-se, desse modo, em tomo da noção de ser coletivo e das prerrogativas e papéis assumidos por tais sujeitos no contexto de suas relações recíprocas e em face dos interesses que representam.
1. Direito coletivo, autoritarismo e democracia
A tradição autoritária da história brasileira ao longo do século XX comprometeu, significativamente, o florescimento e maturação do Direito Coletivo no país. De fato, o modelo justrabalhista estruturado nas décadas de 1930 e 40 (e que permaneceu quase intocado nas fases históricas seguintes) não comportava a consagração de princípios essenciais à própria existência desse segmento jurídico. As noções jurídicas de liberdade de associação e sindical e de autonomia dos sindicatos obreiros foram cotidianamente constrangidas pela lei e pelas práticas jurídicas do Brasil durante quase todo esse extenso período histórico. Nesse quadro de eclipsamento de algumas das liberdades públicas mais essenciais falar-se em real Direito Coletivo do Trabalho era, efetivamente, quase um contrasenso. A particularidade da evolução histórica brasileira levou a que se chegasse a pensar (e até mesmo a teorizar) sobre a inexistência de princípios próprios ao Direito Coletivo. Esse viés teórico (compreensível em vista da longa cristalização autoritária no plano das relações coletivas no Brasil) não deve prejudicar, contudo, hoje, o desvelamento dos princípios informativos do ramo coletivo negociado, uma vez que, desde a Carta de 1988, essa pesquisa e revelação tornou-se crucial para o entendimento do novo Direito do Trabalho em construção no país. Mais: o desconhecimento sobre os princípios especiais do Direito Coletivo do Trabalho irá certamente comprometer o correto e democrático enfrentamento dos novos problemas propostos pela democratização do sistema trabalhista no Brasil. A não compreensão da essencialidade da noção de ser coletivo, da relevância de ser ele representativo e consistente para de fato assegurar condições de equivalência entre os sujeitos do ramo juscoletivo trabalhista, simplesmente dilapida toda a noção de Direito Coletivo do Trabalho e de agentes coletivos atuando em nome dos trabalhadores.
2. Tipologia de princípios
Os princípios do Direito Coletivo do Trabalho podem ser classificados em três grandes grupos, segundo a matéria e objetivos neles enfocados. Em primeiro lugar, o rol de princípios assecuratórios das condições de emergência e afirmação da figura do ser coletivo obreiro. Trata-se de princípios cuja observância viabiliza o florescimento das organizações coletivas dos trabalhadores, a partir das quais serão tecidas as relações grupais que caracterizam esse segmento jurídico específico. Neste rol estão os princípios da liberdade associativa e sindical e da autonomia sindical. Logo a seguir destacam-se os princípios que tratam das relações entre os seres coletivos obreiros e empresariais, no contexto da negociação coletiva. São princípios que regem as relações grupais características do Direito Coletivo, iluminando o status, poderes e parâmetros de conduta dos seres coletivos trabalhistas. Citam-se neste segmento o princípio da interveniência sindical na normatização coletiva, o da equivalência dos contratantes coletivos e, finalmente, o da lealdade e transparência nas negociações coletivas. Há, por fim, o conjunto de princípios que tratam das relações e efeitos perante o universo e comunidade jurídicas das normas produzidas pelos contratantes coletivos. Este grupo de princípios ilumina, em síntese, as relações e efeitos entre as normas produzidas pelo Direito Coletivo, através da negociação coletiva, e as normas heterônomas tradicionais do próprio Direito Individual do Trabalho. Neste rol encontram-se princípios como da criatividade jurídica da negociação coletiva e o princípio da adequação setorial negociada.
Conclusão: É comum pensarmos nesse ramo do direito apenas como uma luta de trabalhadores sindicalizados. Contudo, o direito coletivo do trabalho é fruto de lutas históricas e conquistas de direitos tanto por parte dos empregados como dos empregadores. O direito coletivo é muito mais amplo e abarca também os empregadores que, por meio de negociações coletivas, contam com a possibilidade de relativizar certas exigências legais ou conciliá-las com os seus interesses de crescimento e rentabilidade da empresa. Uma característica interessante do direito coletivo do trabalho está, justamente, no fato de haver total igualdade entre as partes que, aqui, estão no mesmo nível e podem negociar aberta e livremente sempre buscando um meio-termo para a satisfação de seus interesses. É preciso ceder de um lado para ganhar de outro. O direito coletivo do trabalho é constituído por relações privadas, mas que exercem uma função pública essencial: a efetivação dos direitos protegidos pelo Estado e a busca pela justiça social. Cabe então, a todas as partes conhecer e lutar para que esses objetivos sejam alcançados e para que o ambiente de trabalho seja um lugar de harmonia, bem-estar e cooperação mútua.