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Povos indígenas têm direito à defesa sindical? para o Supremo Tribunal Federal do Brasil, não.

Agenda 15/01/2022 às 14:46

Resumo: O presente artigo reporta a situação da proteção do trabalho dos povos indígenas ao passo que analisa a decisão do Supremo Tribunal Federal involucrada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5794, em 2018, que rechaçou a questão do financiamento das organizações sociais no Brasil. Para averiguação, foi invocada a matéria atinente às garantias constitucionais, que não foram observadas. Em sede de conclusão, definiu-se que com a decisão e as novas políticas neoliberais adotadas, os povos indígenas ficarão de fora da proteção sindical.

Palavras-chave: Indígenas. Trabalho. Proteção Sindical. Decisão. Supremo Tribunal Federal. Garantias Constitucionais. Neoliberalismo.

Resumen: El presente artículo reporta la situación de la protección del trabajo de los pueblos indígenas mientras que analiza la decisión del Supremo Tribunal Federal involucrada en la Acción Directa de Inconstitucionalidad (ADI) 5794, en 2018, que rechazó la cuestión del financiamiento de las organizaciones sociales en Brasil. Para averiguación, se invocó la materia relativa a las garantías constitucionales, que no se observaron. En conclusión, se definió que con la decisión y las nuevas políticas neoliberales adoptadas, los pueblos indígenas quedarán fuera de la protección sindical.

Palabras clave: Indígenas. Trabajo. Protección Sindical. Decisión. Supremo Tribunal Federal. Garantías Constitucionales. Neoliberalismo.

  1. Introdução

A proteção sindical aos trabalhadores nasceu contemporaneamente ao próprio surgimento da classe trabalhadora, com o nascedouro do sistema de produção capitalista. Com a Revolução Industrial, houve aumento significativo de produtividade humana. Contudo, a classe operária viu-se massacrada quando chegou ao nível de subsistência em relação aos seus ganhos salariais, com o padrão de vida caindo assustadoramente. Os operários perderam o acesso aos seus meios de produção, que passaram a ficar exclusivamente nas mãos da recente formada classe dos capitalistas.

O sindicato, como instrumento de reivindicação e organização de suas demandas e o sindicalismo como forma de atuação, são forças políticas atuantes a favor das necessidades obreiras de se garantir a resistência diante de um sistema opressor e excludente. Não se pode olvidar que as conquistas sindicais são numerosas desde o seu nascedouro, como garantia de salário mínimo, redução de jornadas de trabalho, proibição do trabalho infantil, negociação coletiva, férias anuais remuneradas, dentre tantas outras.

As lutas de classes na realidade, sempre foram (e continuam) contrárias às lutas pela riqueza. No caso dos aborígenes americanos, foi (e continua) sendo a luta de povos nativos contra o sistema de produção capitalista.

Quando a América foi invadida pelos portugueses e espanhóis no final do século XV e início do século XVI, o capitalismo mercantilista estava nascendo e com ele a busca desenfreada por ouro e prata (minerais representantes da moeda valor de troca). Resultado da invasão foi o maior genocídio da história da humanidade.

Protetor dos índios, o frei Bartolomé de Las Casas foi o primeiro a se posicionar de forma concreta contra o sistema capitalista exterminador. Em seu famoso debate com Guinés de Sepúlveda, em Valladolid, Espanha, o que estava sendo debatido, na realidade, era se a escravidão dos índios era legítima. Com base nas teorias aristotélicas da servidão natural, Sepúlveda defendia a tese de que os índios, por não terem alma, seriam escravos naturais e portanto, legítimas as formas de dominações investidas contra os mesmos, numa premissa jusnaturalista.

Apesar do trabalho incansável do frei Las Casas e a Igreja Católica ter aceito que os índios eram seres humanos, posto que tinham alma, os aniquilamentos das nações indígenas continuaram. Comunidades indígenas inteiras foram dizimadas pela mão invisível do mercado financeiro, na expressão cunhada por Adam Smith. O extermínio dos povos indígenas, deu-se inclusive por epidemias, trazidas pelos europeus (mineradores, extrativistas, garimpeiros, etc.). Como exemplo, além das civilizações incas, maias e astecas, podemos citar os povos fueguinos, como os Yámanas, os seres humanos mais austrais do mundo.

Por algum tempo os yamanas e os alakalufs tiveram mais sorte, porque os europeus não tinham interesse em acampamentos de pesca no litoral árido. Mas em 1884 o governo argentino despachou 20 homens para o recém-criado posto oficial em território yamana. Os índios subiram ao navio para dar as boas-vindas aos brancos e, em poucas horas, contraíram sarampo. Quando retornaram às tendas, passaram a doença para uma população desprovida de imunidade. Calcula-se que essa primeira epidemia de sarampo tenha matado mais da metade da população yamana[1].

Os historiadores argentinos Luís Abel Orquera y Ernesto Luís Piana, fizeram um retrato fiel sobre os Yámanas. Em termos da extinção desses povos fazendo cronologia e com base nos estudos de Ortiz Troncoso, deixaram registrado que

En 1973 murió en Ushuaia la última persona que tuviera un 50% de ascendencia yámana y que viviera en territorio argentino; hoy quedan otras con esa ascendencia en proporción aún menor. Ese año quedaban en Navarino ocho yaganes puros, unos cuarenta mestizados (con ascendientes alacalufes, europeos o ambos) y diez alacalufes también mestizados (pero no con yaganes) (Ortiz Troncoso 1973:86)[2].

Nem mesmo a Convenção nº 169, de 1989 e que dispõe sobre povos indígenas e tribais, adotada na 76ª Conferência da Organização Internacional do Trabalho (OIT), consolidou-se (apesar de sua força vinculante) como instrumento hábil capaz de detê-lo, apesar dos países envolvidos terem aderido à mesma e ratificado seus termos[3].

Vozes como as do frei Las Casas continuam a ecoar no mundo atual e globalizado, como a do ativista social Maldonado Santiago, ferrenho defensor dos povos indígenas da Argentina e que foi morto em 2017, vítima da doutrina neoliberal instalada pelo governo de Maurício Macri[4].

Ao fazer a apresentação do livro Desafios do Trabalho: Capital e Luta de Classes no Século XXI e nos seus comentários especificamente sobre a tese 2, o doutor pela Unicamp em Ciências Sociais, Giovanni Alves resume a questão acerca do modo de produção e reprodução do capital como sendo um complexo societário perpétuo que articula:

1)Expropriação, como lastro histórico-genético da sociabilidade estranha e fetichizada, 2) apropriação objetiva e subjetiva das forças sociais do trabalho; e 3) acumulação de valor como finalidade sem fim do processo de trabalho como processo de valoração[5].

Há que se entender que o movimento sindical é antes de qualquer coisa (inclusive para aqueles que o rechaçam) uma luta social, que envolve os setores da sociedade que precisam de proteção. É a luta contra as desigualdades sociais, contra o arbítrio e à opressão, num sistema onde o trabalhador é colocado em uma condição de subordinação no processo de produção de riqueza.

Mas não tendo as comunidades indígenas que ainda resistem ao sistema (capital), como os yanomanis (norte do Estado de Roraima/Brasil), ou seja, ainda vivem em seus territórios, por que se falar em proteção sindical para os mesmos? É o que tentarei responder no decorrer do presente trabalho.

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  1. A proteção sindical às comunidades indígenas positivada

Em um ciclo de negação e violação, há autores que reconhecem que ultimamente os direitos dos povos indígenas tem reconhecimento diferenciado do resto da sociedade. Coadunando com a assertiva, Rachel Sieder assim se posiciona, em seu artigo Pueblos indígenas y derecho(s) en América Latina. Para a pesquisadora,

Los pueblos indígenas de América Latina se encuentran entre los sectores cuyos derechos han sido más sistemáticamente negados y violados. Al mismo tiempo, en los últimos veinte años, a través de innovaciones legales sin precedentes en el ámbito internacional, continental y nacional, se han convertido en sujetos colectivos de derechos. En términos legales ya no son reconocidos solamente como ciudadanos individuales, sino como colectivos específicos con derechos diferenciados respecto del resto de la ciudadanía. Sus derechos reconocidos a seguir viviendo de una forma distinta de la dominante implican, a la vez, ámbitos de gobierno autónomo y jurisdicción propia. En el plano internacional, estos derechos de autonomía se fundamentan en el principio de la libre determinación, principio de soberanía que subyace al sistema internacional[6].

Contudo, com o avanço do neoliberalismo na região da América do Sul, ataques às comunidades indígenas têm-se intensificado e o horizonte aberto com os governos progressistas iniciados na década de 90 do século passado e na primeira década do século XXI, está sendo encoberto pela neblina do lucro.

A Convenção nº 169 (OIT) em diversos momentos refere-se sobre a proteção das populações indígenas no mundo do trabalho. Em seu artigo 20, determina que os governos devem adotar, no âmbito das leis e das regulações nacionais e em cooperação com os povos interessados, medidas especiais para garantir uma proteção efetiva a trabalhadores pertencentes a esses povos no seu processo de contratação e condições de emprego, caso não estejam efetivamente protegidos pela legislação aplicável aos trabalhadores em geral. E especificamente na alínea d do item 2 do mesmo dispositivo refere-se ao direito de associação sindical e liberdade de participação em qualquer atividade sindical lícita e ao direito de assinar acordos coletivos com empregadores ou organizações de empregadores.

A Constituição Federal de 1988/Brasil, dedica todo seu artigo 8º ao tema, asseverando no caput que é livre a associação profissional ou sindical e expressamente afiançando no inciso III do dispositivo que: ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas. Vale registrar que o parágrafo único faz a ressalva de que as disposições deste artigo aplicam-se à organização de sindicatos rurais e de colônias de pescadores, atendidas as condições que a lei estabelecer[7].

Importante destacar que o direito à livre associação está inserido no rol dos direitos fundamentais, (artigo 5º, inciso XVII). É, portanto, um direito inalienável e irrepreensível, não podendo sofrer reformas constitucionais e nem leis infraconstitucionais desproverem sua eficácia.

Apesar de ser considerada como Constituição Cidadã, a Carta Republicana de 1988 dedicou míseros dois artigos às questões indígenas, sendo que o artigo 231 trata das questões relativas à propriedade de seus territórios e o artigo 232 sobre o acesso à justiça: Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.

  1. O caso concreto decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI 5794

A ampla garantia do acesso à justiça pelos povos indígenas, esbarra na burocracia estatal e legislação de regência. No Brasil, até a edição do novo Código Civil em 2002, os índios não eram dotados de personalidade plena, considerados incapazes relativos, nos termos do art. 6º, inciso III, do Código Civil de 1916, que no parágrafo único do dispositivo proclamava que os silvícolas ficarão sujeitos ao regime tutelar, estabelecido em leis e regulamentos especiais, o qual cessará à medida que se forem adaptando à civilização do País (redação dada pela Lei nº 4.121, de 1962).

Apesar do dispositivo ter sido expressamente revogado, a sua representação nos dias atuais ainda compete à Fundação Nacional do Índio (Funai), órgão governamental criado por meio da Lei nº 5.371, de 1967 e vinculado ao Ministério da Justiça e que substituiu o antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI), criado em 1910. A Funai, contudo, não tem realizado a missão para a qual foi instituída. Neste diapasão, Gilles Perrault faz contundentes críticas:

A Funai substituiu o SPI, mas logo se revelou impotente para realizar sua missão. Mais ainda, foi acusada de subordinar as necessidades do povo índio aos objetivos da expansão nacional e do desenvolvimento capitalista. Acordos da Funai com companhias privadas foram frequentemente denunciados por vozes respeitadas. Além do mais, o orçamento da Funai é insuficiente. A Funai e a legislação sobre os índios do Brasil visam sobretudo a promover a integração dos índios na comunidade nacional[8].

Com frágil representatividade, como efetivamente falar em acesso à justiça? Cappelletti e Garth, acentuam que o conceito de acesso à justiça (de forma universal) tem sofrido importante transformação no sistema do laissez-faire e a sua efetividade como igualdade de armas, seria utópica. Para eles o acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental o mais básico dos direitos humanos de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar o direito dos outros. (CAPPELLETTI e GARTH, 1988:12).

Então, não se cuidando apenas de positivação normativa e com a carência de representatividade por parte do Estado, como seria o pleno acesso à justiça e conseguintemente defesa dos seus direitos, por parte dos povos originários? Logicamente através de entidades associativas. Contudo, recentemente houve uma importante decisão no âmbito do Supremo Tribunal Federal do Brasil (STF) que relativizou a proteção e defesa, não apenas em relação aos indígenas, mas de todos os trabalhadores do Brasil.

Em 29 de junho do corrente ano, o STF declarou a constitucionalidade do fim da contribuição sindical obrigatória (que era prevista antes da Reforma Trabalhista Lei nº 13.467/2017 e que modificou vários dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho CLT). O julgamento histórico foi norteado pela análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5794[9] (com várias ações apensadas), ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aquaviário e Aéreo, na Pesca e nos Portos (CONTTMAF). Nela e nos demais processos, o objeto de contestação foi o artigo 1º da Lei 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), que deu nova redação aos artigos 545, 578, 579, 582, 583, 587 e 602 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para condicionar o recolhimento da contribuição sindical à expressa autorização dos trabalhadores.[10]

Entendo, contudo, que a decisão exarada pelo STF enfraqueceu o movimento sindical, além de ser uma decisão política e não estritamente jurídica. A norma julgada constitucional é uma lei ordinária (Reforma Trabalhista) que na pirâmide kelseniana brasileira não pode se sobrepor à uma lei complementar (Código Tributário que trata de matéria relacionada à impostos). A renúncia de receitas tributárias não poderia ser ventilada em sede de lei ordinária. O Ministro Relator Edson Fachin foi mais adiante, dizendo que o modelo proposto para financiamento dos sindicatos somente poderia ser reformado via reforma constitucional.

Vale dizer que antes do início do início do julgamento, o Ministro Fachin exarou longo despacho[11] com farta literatura jurídica, cujas argumentações são irretocáveis e que teve o condão de fortalecer o movimento sindical. Contudo, No entanto, não serviu de balizamento para a decisão final, cujo reflexo imediato é modificar a estrutura sindical brasileira. Via transversa, durante o julgamento, a narrativa majoritária adotada foi pela construção de parâmetros neoliberais para o sindicalismo, o que acaba por influenciar o pensamento dos constituintes para o desmoronamento do tripé da organização sindical brasileira, assim formado: i) pela unicidade; ii) pelo efeito erga omnes (para todos) da negociação coletiva; e iii) pela contribuição sindical descontada de todos os trabalhadores. Ao se retirar um dos pilares, o sistema tende a ruir como um todo.

Dentre as argumentações a favor da constitucionalidade, releve-se às esposadas pelo Ministro Luiz Fux, que levou em consideração as decisões da suprema corte estadunidense, onde os sindicatos somente representam seus associados. Fux ainda se utilizou de dados estatísticos para justificar uma extinção de entidades consideradas supérfluas ao se comprar com outros países. Os votos vencedores deixaram claro a natureza de representatividade dos filiados.

Com certeza depois da decisão, aqueles que não forem filiados, terão tratamento diferenciado, com negociação individual e perspectivas reduzidas de manutenção e alcance de direitos. Ao contrário do que realmente deve ser - sindicatos como instrumentos de luta, acabam por se tornarem ferramentas de fortalecimento político, numa inversão total de valores e com interesses ligados mais a partidos políticos do que a luta dos trabalhadores.

O posicionamento do STF, em linhas gerais, reconheceu o direito, mas contrariamente, não o garantiu. Em outras palavras, negou a garantia constitucional à proteção sindical. Um direito previsto, sem ser certificado, não pode ser efetivado. No contexto, nos esclarece Ramiro Ávila Santamaria, que

A la garantía, en la visión tradicional, se la entiende ligada fundamentalmente a la acción judicial y se la confunde con los derechos. En este sentido, la concepción de la garantía es restrictiva. Desde el constitucionalismo contemporáneo, la garantía está profundamente vinculada al Estado y separada de los derechos. Todo el Estado tiene sentido y fundamento en la protección de derechos y es entendida como un mecanismo a través del cual se hacen efectivos. Pero la comprensión no termina ni se agota con el Estado[12].

A garantia, como valor supremo e inserto no rol dos direitos fundamentais, foi abrandada pela decisão e os reflexos já são sentidos. Vários sindicatos tiveram que optar por encerrar suas atividades. Não se atentou por garantir um direito constitucionalmente previsto. Olvidou-se que a garantia é a ferramenta para efetivação desse direito. Corroborando com as assertivas e entendendo as garantias constitucionais como parte do rol dos direitos fundamentais e que têm como principal função dar efetividade aos direitos O professor constitucionalista argentino Raúl Gustavo Ferreyra é coerente e sensato ao proclamar que

Las garantías constitucionales son un mecanismo cabal, es decir: procesos previstos por el propio sistema para perseguir la instrumentación de su autodefensa, la concreta posibilidad de su realización integral. Defender, tutelar, guardar, en fin, mantener indemne a la constitución consiste en protegerla contra las transgresiones o tentativas de quebrantamiento, por actos u omisiones que paradoja o no, especialmente pueden provenir de las autoridades a cargo de los poderes constituidos del Estado designadas para hacer cumplir sus normas. Cuando se produce una violación del orden estipulado por el sistema de la constitución, por regla general, serán las garantías constitucionales las herramientas específicas que pueden ser empleadas para intentar restaurar y desarrollar su fuerza normativa[13]

Com base no exposto, temos que em matéria de garantias constitucionais, não houve cumprimento, por parte do Colendo Tribunal Superior o exercício de suas finalidades fulcrais: i) proteção de um direito fundamental; e ii) satisfação desse direito. A afirmativa parte do pressuposto de que a partir da decisão consignada, parte dos trabalhadores ficarão de fora da proteção sindical, posto que somente os filiados se beneficiarão das atividades. Diferentemente, antes do julgamento, todos os trabalhadores eram beneficiados.

  1. Conclusão: a influência da decisão para as comunidades indígenas

Um dos propósitos do modelo neoliberal instaurado na região, é o desapossamento integral dos povos indígenas de seus territórios naturais. Com a expulsão, os nativos que antes viviam exclusivamente do seu trabalho na terra, migram para o trabalho assalariado, ou seja, não lhes restam alternativa senão a integrarem-se à civilização e sem a posse dos seus meios de produção, na terra comunal, passam a trabalhar para o homem branco, sujeitando-se às normas trabalhistas vigentes no país de origem.

Ocorre que, a integralização, como pretensão do Estado, além de ferir a soberania dos povos originários, não tem cunho humanitário e sim econômico. Visando sempre ao lucro, o sistema de produção capitalista precisa dos recursos minerais que estão nos territórios indígenas. E conforme vemos hoje, países sul-americanos, através de governos neoliberais, estão se curvando frente à mão invisível e consequentemente utilizando o aparato estatal a serviço do mercado financeiro. Não temos estado mínimo, mas um estado legiferante em prol de pecuaristas, agricultores, extrativistas e donos de companhias que usam dos recursos naturais de forma desenfreada.

Desapossados dos seus territórios e entregues ao mundo civilizado, são vítimas de discriminação e assediados em seu ambiente de trabalho. Como aconteceu com os fueguinos. Não é falacioso afirmar que em futuro próximo, não mais restará um só índio legítimo no Brasil, se a onda neoliberal não for contida.

Hoje os autóctones brasileiros já não gozam de proteção fortificada a Funai não atende de forma satisfatória os seus anseios, tendo em vista que o presidente do órgão federal é de indicação política do Presidente da República e as decisões são limitadas e os recursos financeiros escassos. Sem representação institucional e trabalhando para o sistema capitalista, como ficará então a defesa e proteção dos seus direitos?

Ora, o que poderia ser atribuído a sindicato, com a decisão consignada pelo STF, não mais será possível. Com a reforma trabalhista no Brasil ainda ficou evidenciada a constitucionalidade do trabalho intermitente e informal. Sem apoio, os indígenas estão fadados a terem empregos temporários, que não garantem direitos trabalhistas e sociais. E tendo em vista que os sindicatos somente representarão seus filiados (aqueles que poderão pagar pela filiação), não resta a menor dúvida de que o Supremo Tribunal Federal, de forma indireta e reflexa, disse não aos povos indígenas no que se refere ao direito à defesa sindical de suas pretensões.

E agora, com a nova linha política a ser adotada pelo presidente eleito em 2018 as políticas sociais públicas voltadas para os índios brasileiros, bem como as disposições contidas na Constituição Federal de 1988, estão sendo mais duramente desvinculadas de suas naturezas protetivas e defensivas. É lamentável!

BIBLIOGRAFIA

ARNT, Ricardo: Os índios do fim do mundo. Revista Eletrônica Planeta, Brasil, edição nº 481, 2012. Disponível no portal https://www.revistaplaneta.com.br/os-indios-do-fim-do-mundo/

ÁVILA, Ramiro Santamaria: Las Garantias Constitucionales, Perspectiva Andina. IUS, Revista del Instituto de Ciências Jurídicas de Puebla A. C.. Instituto de Ciencias Jurídicas de Puebla A. C., México, 2010.

BATISTA, Roberto Leme e ARAÚJO, Renan (Organizadores): Desafios do Trabalho, Capital e Luta de Classes no Século XXI. Praxis, Londrina, 2003.

CAPPELLETTI, Mauro e GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre, Sérgio Antônio Fabris Editor, 1988.

CARVALHO, Joaquim de: Quem matou Santiago Maldonado, líder das causas indígenas na Argentina? A civilização exige resposta. Revista eletrônica Diário do Centro do Mundo, Brasil, 2017. Disponível através do link https://www.diariodocentrodomundo.com.br/santiago-maldonado-pode-ser-o-primeiro/.

FERREYRA, Raúl Gustavo: Fundamentos Constitucionales. Ediar, Ciudad Autónoma de Buenos Aires, 2015.

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ORQUERA, Luís Abel y PIANA, Ernesto Luís: La vida material y social de los Yámana. Ediciones Monte Olivia, Ushuaia, 2015, p. 91.

____________ Convenção nº 169 (OIT). Disponível no link http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Convencao_169_OIT.pdf

___________ Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e alterações posteriores. Disponível no link http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm.

PERRAULT, Gilles: O Livro Negro do Capitalismo. Record, Rio de Janeiro, 1999.

____________ ADI 5497. Portal do STF. Disponível através do link http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5288954.

___________Despacho sobre a Contribuição Sindical do Ministro Edson Fachin. Disponível no link https://www.conjur.com.br/dl/fachin-fim-contribuicao-sindical-acabar.pdf.

NOTAS DE RODAPÉ

  1. ARNT, Ricardo: Os índios do fim do mundo. Revista Eletrônica Planeta, Brasil, edição nº 481, 2012. Disponível no portal https://www.revistaplaneta.com.br/os-indios-do-fim-do-mundo/

  2. ORQUERA, Luís Abel y PIANA, Ernesto Luís: La vida material y social de los Yámana. Ediciones Monte Olivia, Ushuaia, 2015, p. 91.

  3. A Convenção nº 169 (OIT) pode ser vista na sua integralidade no portal http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Convencao_169_OIT.pdf

  4. Carvalho, Joaquim de: Quem matou Santiago Maldonado, líder das causas indígenas na Argentina? A civilização exige resposta. Revista eletrônica Diário do Centro do Mundo, Brasil, 2017. Disponível através do link https://www.diariodocentrodomundo.com.br/santiago-maldonado-pode-ser-o-primeiro/.

  5. BATISTA, Roberto Leme e ARAÚJO, Renan (Organizadores): Desafios do Trabalho, Capital e Luta de Classes no Século XXI. Praxis, Londrina, 2003, p. 9.

  6. GARAVITO, César Rodríguez (coordenador): El derecho en América Latina Un mapa para el pensamiento jurídico del siglo XXI. Siglo Veintiuno Editores, Buenos Aires, 2011, p. 303.

  7. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e alterações posteriores. O texto integral pode ser visto através do link http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm.

  8. PERRAULT, Gilles: O Livro Negro do Capitalismo. Record, Rio de Janeiro, 1999, p. 386.

  9. A decisão completa exarada na ADI 5497, com todas suas peças pode ser visualizada no portal do STF através do link http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5288954.

  10. Cfr. no portal de notícias do STF, cujo conteúdo pode ser acessado através do link http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=382819.

  11. O despacho sobre a Contribuição Sindical do Ministro Edson Fachin pode ser lido na integra através do link https://www.conjur.com.br/dl/fachin-fim-contribuicao-sindical-acabar.pdf.

  12. ÁVILA SANTAMARIA, Ramiro: Las Garantias Constitucionales, Perspectiva Andina. IUS, Revista del Instituto de Ciências Jurídicas de Puebla A. C.. Instituto de Ciencias Jurídicas de Puebla A. C., México, 2010, p. 81.

  13. FERREYRA, Raúl Gustavo: Fundamentos Constitucionales. Ediar, Ciudad Autónoma de Buenos Aires, 2015, pp. 244-245.

Sobre a autora
Rosana Colen Moreno

Rosana Cólen Moreno. Procuradora do Estado de Alagoas. Membro da Confederação Latino-americana de trabalhadores estatais (CLATE). Especialista em previdência pública pela Damásio Educacional e em direitos humanos pela PUC/RS (em finalização). Autora do livro Manual de Gestão dos Regimes Próprios de Previdência Social: foco na prevenção e combate à corrupção, publicado pela LTr. Coordenadora da Comissão Internacional Avaliadora instituída pelo Conselho Latino-americano de Ciências Sociais (CLACSO-UNESCO) e denominada “Desigualdades, Exclusão e Crises de Sustentabilidade dos Sistemas Previdenciários da América Latina e Caribe. Educadora, Professora, Instrutora, Palestrante, Consultora. Participante do programa de doutorado em Direito Constitucional pela Universidad de Buenos Aires – UBA. Especialista em Regimes Próprios de Previdência (Damásio Educacional). Autora do livro: Manual de Gestão dos Regimes Próprios de Previdência Social: foco na prevenção e combate à corrupção.

Informações sobre o texto

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