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Considerações acerca do estudo sobre distribuição etária de impostos, taxas e benefícios fiscais do economista alemão Martin Beznoska

Agenda 24/02/2022 às 14:12

Quem financia o Estado na forma de impostos, taxas e até que ponto, bem como quem se beneficia de seus serviços? Muito embora seja de outro país, o que podemos aprender com o estudo do economista alemão Martin Beznoska?

Paulo Caliendo assevera que: "A promoção da seguridade social (saúde, assistência social e previdência) representa um capítulo fundamental na distribuição de renda, visto que tendem a se dirigir especialmente aos setores mais necessitados da população. Desse modo, a busca de formas de financiamento da seguridade social está entre os objetivos principais da consolidação de um Estado Social de Direito"[1].

Em fevereiro deste ano, publicado o estudo "A distribuição etária de impostos, taxas e benefícios fiscais"[2] pelo economista alemão Dr. Martin Beznoska.

Beznoska combinou informações de várias fontes e desenvolveu um instrumento que pode ser usado para compreender a distribuição etária dos impostos, contribuições para a seguridade social, transferências e benefícios estatais na Alemanha, em 2021.

Conquanto o estudo tenha sido realizado na Alemanha, com a população alemã, não deixa de trazer informações importantes, que podem ser comparadas com a população brasileira, tendo em vista partir de um país importante em termos de competitividade e riqueza.

Na Alemanha, o imposto de renda é progressivo, como no Brasil. Mas no Brasil, a progressividade é menor. No Brasil, a classe C já paga o imposto máximo, e a classe A, que tem o maior poder aquisitivo e é onde está o 1% mais rico, paga igual, diz Marcus Vinicius Gonçalves, sócio-líder para impostos da consultoria KPMG no Brasil[3]. A Alemanha tem uma tributação de até 45% sobre o salário, ao contrário do Brasil que é de 27,5%.

No estudo elaborado por Beznoska, desde jovem até os 24 anos, os benefícios recebidos do Estado superam os impostos e contribuições previdenciárias pagas.

Pelo princípio de estado do bem-estar social, os impostos são pagos pelas pessoas com idade laboral ativa para manter os mais velhos.

Quanto às rendas e pensões, na Alemanha, aplica-se na maior parte dos casos o princípio da equivalência, de maneira que as aposentadorias são os direitos provenientes da prestação paga pelo aposentado enquanto fazia parte do mercado de trabalho.

Perceba que nestes quesitos, o sistema alemão é parecido com o nosso. O interessante é que na análise por nível, há indicação de que a dependência das transferências sociais ao longo da vida é muito mais acentuada entre as pessoas sem formação profissional.

O estudo, reitere-se, realizado na Alemanha, igualmente concluiu que as pensões recebidas por este grupo são também as mais baixas, devido ao menor rendimento ao longo da vida em comparação com as pessoas com formação profissional ou diploma universitário.

A mesma situação ocorre no Brasil, visto que os vulneráveis não têm acesso à educação, como já relatado no artigo sobre a meritocracia que escrevi anteriormente, com dados extraídos de institutos de pesquisas. Além disso, maior parte das aposentadorias pagas no Brasil são de até um salário-mínimo.

Estudo do TCU aponta que a maior proporção de concessões do BPC encontra-se distribuída pelos estados das regiões Norte e Nordeste. Entre as dez maiores proporções da população que recebem o benefício estão os estados de Alagoas (3,36%), Pernambuco (3,26%), Amapá (3,08), Mato Grosso do Sul (3,04%), Bahia (3,03%), Ceará (3,02%), Acre (2,91%), Paraíba (2,90%), Sergipe (2,70%) e Maranhão (2,59%). Destes, são sete os estados encontram-se na região Nordeste, dois na região Norte e apenas um na região Centro-Oeste.

Com exceção de Mato Grosso do Sul, todos os nove estados citados possuem elevados índices da população em situação de pobreza, como apontam os dados do IBGE (2019). Esse fato pode ser justificado pelo que afirma Jaccoud, Mesquita e Pava (2017) quando afirmam que o BPC atende a um contingente expressivo de beneficiários extremamente pobres, tratando-se ainda de [...] um mecanismo de proteção social garantido àqueles que estão submetidos a uma dupla condição de grave vulnerabilidade: situação de miséria e idade avançada e/ou presença de uma deficiência física ou mental.

A exceção de Minas Gerais (2,19%), todos os estados das regiões Sul e Sudeste possuem menos de dois por cento de sua população com acesso ao BPC. O estado de Santa Catarina possui o menor percentual (1,09%), seguido de São Paulo (1,62), Rio Grande do Sul (1,76%), Espírito Santo (1,80%), Paraná (1,85%) e Rio de Janeiro (1,95%). [4]

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Consoante Portal IBGE, a Região Nordeste apresentou a maior taxa de analfabetismo (13,9%). Isto representa uma taxa aproximadamente, quatro vezes maior do que as taxas estimadas para as Regiões Sudeste e Sul (ambas com 3,3%). Na Região Norte essa taxa foi 7,6 % e no Centro-Oeste, 4,9%. A taxa de analfabetismo para os homens de 15 anos ou mais de idade foi 6,9% e para as mulheres, 6,3%. Para as pessoas pretas ou pardas (8,9%), a taxa de analfabetismo foi mais que o dobro da observada entre as pessoas brancas (3,6%)[5].

Tal como a Alemanha, no Brasil, quem mais recebe o BPC é a população que tem menos qualificação.

Da explanação realizada por Beznoska parte a indicação de que um objetivo político para a sustentabilidade das finanças públicas poderia visar a redução da proporção de pessoas sem formação profissional na população.

De acordo com o estudo, no início do ciclo de vida, há benefícios proporcionados pelo Estado, como acesso gratuito às escolas. Todavia, a partir do momento em que ocorre o ingresso no mercado de trabalho, mais taxas e impostos são pagos do que transferências de renda recebidas.

Isso também se aplica no Brasil, visto que se há trabalho formal disponível, além do pagamento do imposto de renda descontado do salário (caso não se encontre na faixa de isenção), há também gasto em consumo. Dependendo da faixa de renda, boa parte do salário é direcionada para compra de gêneros alimentícios.

Levando em consideração a alta carga tributária paga pelos mais pobres no que se refere ao consumo, há mais vantagens do que desvantagens para o governo a manutenção de uma economia saudável com oferta de empregos formais ao invés da informalidade representada pelos empresários uberizados, ou postos de trabalho precários exercidos através da pejotização.

O parecer também traz a questão dos impostos indiretos, que igualmente são pagos no Brasil, sobretudo em gêneros alimentícios. Isso ocorre quando um membro da família que não exerce atividade remunerada, ao consumir, paga imposto de forma indireta.

O nível de escolaridade influencia no rendimento ao longo da vida e por isso, no estudo, é um indicador relevante para a distribuição etária dos impostos, taxas e transferências de renda.

O relatório pontua que embora existam apenas pequenas diferenças na quantidade de transferências ao longo da vida para pessoas com qualificação profissional ou diploma universitário, as transferências para pessoas sem formação profissional são significativamente maiores. Em média, as pessoas sem formação profissional recebem subsídio de desemprego muito mais elevado dos que possuem diploma universitário ou qualificação profissional.

Na Alemanha, pessoas sem formação profissional tendem a se aposentar mais cedo e receberem pensão por invalidez. No Brasil, é concedido o BPC (Benefício de Prestação Continuada) a quem tenha idade igual ou superior a 65 anos ou à pessoa com deficiência de qualquer idade.

O estudo alemão aponta que no geral, o grupo de pessoas com diploma universitário gera o maior plus para o estado. Nessa faixa, são gerados de impostos, mais de 355 bilhões de euros, ao passo que os gastos com transferências, pensões e benefícios são de 220 bilhões de euros.

Já no grupo com formação profissional, gera 450 bilhões de euros em receitas do Estado e recebe 435 bilhões de euros.

Por sua vez, o grupo sem formação profissional e sem curso superior paga quase 80 bilhões de euros ao Estado e recebem 125 bilhões euros, à título de benefícios, transferências e pensões.

O cálculo feito na exposição leva em conta apenas pessoas maiores de 18 anos, o que significa que falta a parte dos gastos do governo com relação aos menores de 18 anos.

A análise por nível de ensino deixa claro que a dependência das transferências sociais ao longo da vida é muito mais acentuada entre as pessoas sem formação profissional.

A contribuição líquida para os pagamentos ao Estado é também mais baixa, em média, na idade ativa laboral, deste grupo.

As pensões recebidas são também as mais baixas deste grupo devido ao menor rendimento ao longo da vida em comparação com as pessoas com formação profissional ou diploma universitário.

O estudo conclui que um objetivo político para a sustentabilidade das finanças públicas poderia/deveria visar a redução da proporção de pessoas sem formação profissional na população.

Certamente o mesmo objetivo poderia ser buscado no Brasil, através de melhores políticas públicas, juntamente com uma reforma tributária justa e progressiva.

  1. CALIENDO, Paulo. Direito Tributário e Análise Econômica do Direito. Rio de Janeiro: Elsevier Editora, 2009, p. 162

  2. Institut der Deutschen Wirtschaft. Die Altersverteilung von Steuern, Abgaben und staatlichen Leistungen. Disponível em: <https://www.iwkoeln.de/studien/martin-beznoska-die-altersverteilung-von-steuern-abgaben-und-staatlichen-leistungen.html>

  3. ELIAS, Juliana. CNN Brasil Business, Ricos no Brasil pagam Imposto de Renda mais baixo que em 85 países, São Paulo, 09 de agosto de 2021. Disponível em: <https://www.cnnbrasil.com.br/business/ricos-no-brasil-pagam-imposto-de-renda-mais-baixo-que-em-65-paises/#:~:text=Como%20em%20todo%20o%20resto,conforme%20crescem%20tamb%C3%A9m%20os%20ganhos.>

  4. PHELIPPE, Ariskelma Carvalho. Intituto Serzedello Corrêa: Escola Superior do Tribunal de Contas da União, O benefício de prestação continuada no Brasil - TCU, p. 42. Disponível em: < https://portal.tcu.gov.br

  5. Portal IBGE. Conheça o Brasil - População EDUCAÇÃO. Disponível em: <https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca--brasil/populacao/18317-educacao.html>

Sobre a autora
Ana Carolina Rosalino Garcia

Advogada graduada em Direito pela Universidade Paulista (2008). Membro da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção São Paulo desde 2009. Pós-graduada em Direito Civil e Processo Civil pela Escola Paulista de Direito (EPD). Possui MBA em Administração de Empresas com Ênfase em Gestão pela Fundação Getúlio Vargas - FGV / EAESP - Escola de Administração de Empresas de São Paulo. Pós-graduada em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).

Informações sobre o texto

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