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Como o Neoconstitucionalismo contribuiu para a consagração do sistema multiportas no Código de Processo Civil Brasileiro

Agenda 14/04/2022 às 11:46

O escopo do presente artigo firma em demonstrar a influência do Neoconstitucionalismo na evolução dos institutos do Direito Processual Civil, sobretudo os métodos alternativos de solução de conflito.

Introdução

A evolução dos institutos do Direito Processual Civil se deu, apesar de um hiato de quarenta e dois anos entre os Códigos de Processo Civil de 1973 e 2015. Dentro do modelo adotado, o Direito como um todo está aberto a sofrer interferências tanto externas, de outros sistemas sociais quanto interno, entre os ramos que tornam complexa a ciência jurídica.

O Neoconstitucionalismo trouxe ao Direito uma interpretação axiológica, mais pautada nos valores, influenciando as leis infraconstitucionais serem interpretadas e aplicadas dentro dessa ótica. Em outras palavras, o Neoprocessualismo e o movimento de constitucionalização do Direito propôs ao aplicador da lei uma interpretação conforme a constituição. Isso significa que os demais ramos do direto devem não apenas prestarem obediência aconstitucional, mas deve observar toda a carga axiológica da lei maior. Filosoficamente, dessa maneira, o Magistrado irá extrair da norma processual de maneira mais acertada e mais justa possível.

Além disso, em face da problemática de sobrecarga do sistema jurisdicional, os princípios constitucionais, tais como o Princípio do Devido Processo Lega, da Cooperação e da Razoável Duração do Processo irão iluminar os operadores do Direito a fim de constituir métodos alternativos de solução de conflitos.

1. O Neoconstitucionalismo

Na efevercência dos acontecimentos históricos no Século XX, sobretudo no período pós segunda guerra, na perspectiva de Cambi (2009), ascendeu na Europa a necessidade da criação de catálogos de direitos fundamentais visando proteger o cidadão em face de eventuais abusos cometidos pelo Estado. Essa era a tônica do Estado Social de Direito que em meio a crise do Estado absenteísta ganhava corpo. O Estado Social inovou ao elevar ao status constitucional a garantia de valores e princípios com que escudar e proteger as instituições (BONAVIDES, 2005 p.565).

A valorização das normas que ostentam elevada carga axiológica se traduz a essência do protagonismo dos princípios no ordenamento Jurídico. Bonavides (2005 p.565) se reporta ao Estado Social como um modelo que constrói uma realidade muito mais rica e aberta a participação criativa. Podemos notar, portanto, que princípios basilares do Direito Constitucional, em especial a dignidade da pessoa humana ganha cores no Estado Social a partir do momento que a democracia é abraçada por este modelo.

1.1 Breve histórico: A construção do Neoconstitucionalismo

Para entender a concepção do novo constitucionalismo, é necessária uma breve digressão sobre o fenômeno denominado como constitucionalismo. Para Canotilho (2003), trata-se de um movimento jurídico-político que acarretou acarretou, sobretudo, a limitação do poder estatal.

Este fenômeno que culminou com o triunfo dos movimentos iluministas do final do Século XVII fora construído ao longo da história por meio de cartas que tinham por objetivo a limitação do poder absolutista, prevalecenente até a ocorrência das revoluções burguesas. Dentre estes diplomas, destacam-se a Magna Carta Inglesa de 1215, a Petition of Rights de 1628,o Habeas Cospus Act de 1679 e o Bill of Rights de 1689.

Para a Bonavides (2006), o novo constitucionalismo trata de uma nova abordagem ao Direito Constiucional com maior consonancia às normas dotadas de alta carga axiológica, trazendo em seu texto um rol de Direitos Fundamentais que regulam não apenas a omissão do Estado mas também prestações estatais relevantes ao convívio social.

Entretanto, Bonavides (2005) faz um alerta salientando que os Estados anteriores à Segunda Guerra Mundial já careciam de um rol de direitos fundamentais e normas que disciplinassem a ordem econômica e social, resultando na limitação de um poder central.

Porém, por decorrência do positivismo, corente dominante até a primeira metade do Século XX, marcado pelo alto apego aos ditames legais, assevera Bonavides (2005), que eventuais normas que expressavam direitos fundamentais ostentavam o status de meros programas. Estes comandos seriam concretizados apenas quando houvesse lei que os instrumentalizassem.

A mudança de perspectiva em meados do Século XX, aponta Barroso (2007) que, estabeleceu de definitivamente o fracasso do positivismo. Era de certa forma inevitável. Ora, enquanto no absolutismo o exercício de poder se dava pelo alvedrio de um soberano, tão ou mais tirana poderia ser no Estado de Direito, em um cenário positivista clássico, o direito exercido por uma lei ilimitada que nem sempre estava conectada aos valores humanos.

Com o efeito, na lição do (Vigo, 2008), o sistema-político positivista, o qual colocava a supremacia do poder legislativo como expressão máxima da soberania popular, caía por terra, cedendo o protagonismo à constituição. Tal movimento, portanto, representa uma nova abordagem ao Direito Constitucional. Permanecia a ideia da constituição como manifestação máxima da soberania popular e abria a oportunidade para elevava a outoro patamar as normas dotadas de elevada carga axiológica.

Calha destacar que o este novo paradigma acarretou ainda transformações em de hordem hermenêutica. Ferraz Junior (1990) explica que o no Estado liberal não há grande margem para interpretações, uma vez que impera-se a exegese da lei enquanto o Estado Social permite um esforço maior para adequar a lei aos mandos constitucionais.

Em um plano internacional, os textos constitucionais do pós-guerra, pioneiros em trazer em seu bojo um rol de direitos fundamentais, foi a Constituição da República Federal Alemã de 1949 e a Constituição da República Italiana de 1947. Barroso (2007) atenta que tais Estados representam um marco que serviu de inspiração para outros países sobre a constituicionalização de Direitos Fundamentais e sobre o modelo de um Tribunal Constitucional desempenhando o controle constitucional desses Direitos.

No Estado Brasileiro, este movimento foi tardio, devido ao regime ditatorial que se estendeu até final da década de 1980. Deste modo, aponta Barroso (2006) o momento em que o neoconstitucionalismo foi introduzido no Brasil foi com a promulgação da Constituilçao Cidadã de 1988.

A Constituição Federal de 1988, por sinal, inaugurou um longevo período de estabilidade institucional. Estabilidade esta, na visão de Barroso (2006), compreendida pelo apego a democracia e a concreção dos princípios que servem de base à Constituição Federal em que pese os desafios enfrentados desde então

Diante o exposto, podemos perceber a evolução do constitucionalismo como um movimento que visa a limitação do poder absoluto, seguido de um momento em que o texto da norma é hipervalorizado ao ponto de ser entendido como a expressão da vontade da soberania popular e posteriormente o momento do neoconstitucionalismo, que encerra a predominância de uma corrente juspositivista e inaugura um momento em que há inserta na contituição um rol de direitos fundamentais que regulam o exercício do poder soberano popular, controlado por um Tribunal Constitucional ao invés de ficar a cargo do Poder Legislativo ou mesmo do Chefe do Poder Executivo.

1.2 O Neoconstitucionalismo em conceito

Como demonstrado pelo destaque na obra de Ferraz Junior (1990), o Neoconstitucionalismo faz estrear um novo momento para a hermenêutica constitucional. O intérprete e aplicador do Direito se empenha a extrair do conteúdo legal um significado consonante aos ideais cultivados, resultantes das transformações históricas do Século XX. Tais valores prezam pela soberania popular materializada na constituição.

Nestes termos, o Neoconstitucionalismo. Nas palavras de Barroso (2017, p. 15) é definido como:

O Neoconstitucionalismo ou novo direito constitucional, na acepção aqui   desenvolvida, identifica um conjunto amplo de transformações ocorridas no Estado  e  no direito constitucional, em meio às quais podem ser assinalados, (i) como marco histórico, a formação do Estado constitucional de direito, cuja consolidação se deu ao longo das décadas finais do século XX; (ii) como marco filosófico, o pós-positivismo,  com   a   centralidade dos direitos fundamentais e a reaproximação entre Direito e ética; e (iii) como marco teórico, o conjunto de mudanças que incluem a força normativa da Constituição, a expansão da jurisdição constitucional e o  desenvolvimento de uma nova dogmática da interpretação constitucional. Desse conjunto de fenômenos resultou um processo extenso e profundo de constitucionalização do Direito.

Ocorre em parte da doutrina uma recorrente associação entre princípios de direito e jusnaturalismo. Entretanto, a Doutrina prevalecente não coaduna com as considerações, por exemplo, de Ferrajoli como uma forma de convergir a descrição do Neoconstitucionalismo fundamentada umbilicalmente ao modelo jusnaturalista, encarado por uma maneira mais abastecida de detalhes, como se profere a seguir:

A tese segundo a qual o constitucionalismo, com sua pretensão de submeter as leis a normas superiores estipuladas como inderrogáveis, exprime uma instância clássica do jusnaturalismo é uma ideia recorrente, sustentada desde quando a expressão constitucionalismo passou a integrar o léxico filosófico-jurídico. O constitucionalismo, segundo esta tese, equivaleria à superação ou, pior, a uma negação do positivismo jurídico, que não é mais idôneo para dar conta da nova natureza das atuais democracias constitucionais. Com a incorporação nas Constituições de princípios de justiça de caráter ético-político, como a igualdade, a dignidade das pessoas e os direitos fundamentais, desaparece o principal traço distintivo do positivismo jurídico: a separação entre direito e moral, ou seja, entre validade e justiça. Segundo esta tese, a moral, que no velho paradigma juspositivista correspondia a um ponto de vista externo ao direito, agora faria parte do seu ponto de vista interno (FERRAJOLI, 2010, p.43.)

Na análise das perspectivas doutrinárias de Barroso (2006), o Neoconstitucionalismo não representa um retrocesso ao jusnaturalismo, ao contrário. Trata-se de uma evolução do positivismo, com uma abordagem mais direcionada às normas com um viés mais principiológico, o que resulta mandos ostentando elevada carga axiológica superando de forma definitiva o formalismo exacerbado na interpretação e aplicação do Direito. A cerca desse movimento contemporâneo em atribuir normas valorativas ao Direito Constitucional, leciona Gomes (2012, p. 96):

Por fim, o Neoconstitucionalismo como teoria do direito emerge como um instrumento alternativo ao positivismo, o qual se denota obsoleto por seu característico formalismo interpretativo, sendo mister que se implantasse uma técnica de ponderação de princípios, já que, à luz dessa vertente, o direito não é composto apenas por regras, mas também por princípios.

Diante do exposto, conclui-se que o Neoconstitucionalismo se define por permitir ultrapassar a rigidez constitucional figurante no topo do ordenamento jurídico, conquista do formalismo positivista, (BARROSO, 2017) para uma adoção com abordagem principiológico e valorativo às normas constitucionais.

2. Princípios aplicáveis ao Código de Processo Civil

Além do princípio da cooperação, que será trabalhado nos tópicos seguintes, destacam-se entre os princípios próprios do Processo Civil de 2015 o Princípio Democrático e os Princípios da Boa-fé processual e do autorregramento da vontade, além do Princípio da primazia da decisão do Mérito e o Princípio da efetividade do Processo.

Já sabemos que os princípios estão presentes no Neoprocessualismo e no Neoconstitucionalismo, o que torna os mandos mais amplas quanto ao alcance, ainda que a segurança jurídica seja reduzida por esta modalidade normativa.

Pelo elevado grau de abstratividade, este trabalho não vai conseguir esgotar à exaustão todos os princípios que orbitam e influenciam o Processo Civil, mas destacará os princípios mais presentes na perspectiva do neoprocessualismo fundamentando a consagração do sistema multiportas no Brasil.

Rocha (2005) traz as funções dos princípios no Direito em Geral. É importante esse destaque, pois antes de conhecer quais princípios interagem com o Processo é necessário entender ao que eles se propõem. Neste sentido, o autor leciona:

Os princípios desenvolvem também a função mais importante de qualificar, juridicamente, a própria realidade a que se referem, indicando qual a posição que os agentes jurídicos devem tomar em relação a ela, ou sejam apontando o rumo que deve seguir a regulamentação da realidade, de modo a não contravir aos valores contidos no princípio.

Assim, o autor leciona que os princípios desempenham a função de fundamentação na interpretação e aplicação da norma de acordo com os valores embutidos neles.

Dentre os princípios constitucionais que se aplicam ao Direito Processual Civil, podemos destacar:

2.1 Princípio do Juiz natural

Previsto nos incisos XXXVII e LII do art. 5º, CF, o Princípio do Juiz Natural é disposto nestes termos:

XXXVII não haverá juízo ou tribunal de exceção;

LIII ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;

Para Rocha (2005 p.46), este princípio pode se manifestar em três diferentes acepções: i) que a instituição compreendida pelos órgãos jurisdicionais deve ser anterior ao fato motivador de sua atuação; ii) que regra geral deve determinar as regras de competência. E, iii) que a designação e atuação do magistrado deve ser feita com base nos preceitos legais.

  1. Princípio da Duração Razoável do Processo

Este Princípio está consubstanciado no art. 5º, LXXVIII, CF e no art. 4º, Novo CPC. Nestes termos:

LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Art. 4o As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.

Neves (2008) traduz estes dispositivos, explanando que a Emenda Constitucional número 45 de 2004, que elevou o direito de ter uma prestação jurisdicional em prazo razoável ao patamar de um direito fundamental. Salienta o autor que uma razoável duração do processo não significa um processo célere, uma vez que a avidez de ter um processo resolvido de forma rápida pode comprometer a qualidade do julgado.

2.2 Princípio do Devido Processo Legal

O Princípio do Devido Processo Legal, disposto no inciso LIV do artigo 5º, CF é na Doutrina majoritária, de acordo com Neves (2018), um supraprincípio que fundamenta todos os demais princípios aplicáveis no Processo Civil. Assim se lê:

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LIV ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

O princípio-base para os demais princípios possui um conceito indeterminado, ainda na lição de Neves (2018, p.174) possui duas acepções, dois sentidos:

i) sentido substancial, no qual diz respeito ao campo de elaboração e interpretação das normas jurídicas, evitando-se a atividade legislativa abusiva e irrazoável e ditando uma interpretação razoável quando da aplicação concreta das normas jurídicas)

i) sentido formal, que relaciona-se com o processo em si. Vincula o Juiz a conduzir o processo com vista de observar na prestação jurisdicional o emprego de valores como a justiça, a probidade, e a ampla participação das partes empenhados em uma efetiva proteção dos seus interesses.

2.3 Isonomia ou igualdade de tratamento

Este princípio deflui diretamente do Princípio do Devido Processo Legal. Trata-se da igualdade formal como se vê no Artigo 5º, caput da Constituição Federal e do Artigo 7º do Código de Processo Civil, como se vê

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]

Art. 7º É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório.

Nota-se, portanto, que no processo aplica-se a igualdade formal. Para Rocha (2005), então, todos são iguais perante a lei, com maior razão permite o juiz é concretizador da lei.

2.4 Princípio da Publicidade

Previso no art. 5º, inciso LX, CF, postula o Princípio da Publicidade nestes termos:

LX a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;

De mesmo modo, o Artigo 93, IX, CF determina:

IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;

Na lição de Rocha (2005, p.48), este princípio além de atribuir segurança a ampla defesa, possibilita ao julgador posterior conhecer de novo a questão e pronunciando novo julgamento sobre a mesma.

2.5 Contraditório e ampla defesa

Ambos os princípios se encontram no mesmo dispositivo, inciso LV, artigo 5º da Constituição Federal de 1988. Cabe a Doutrina fazer a separação entre os conceitos.

Para Rocha (2005), enquanto o Princípio do Contraditório refere-se à estrutura dialética do processo no qual as partes sobrepõem suas teses, o Princípio da Ampla Defesa está ligada a faculdade que as partes tem de reagir de modo direto e eficaz contra atos dos demais atores do processo que podem prejudicar os seus interesses.

LV Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

Também, nesse sentido, o Princípio da ampla defesa se manifesta no Código de Processo Civil, disposto nos Artigos. 9º e 10º, que se lê:

Art. 9o Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida.

Parágrafo único.  O disposto no caput não se aplica: à tutela provisória de urgência; às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III; à decisão prevista no art. 701.

Art. 10.  O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.

Donizetti (2012), no empenho de analisar o evoluir do direito processual, sob a principiologia da corrente do constitucionalismo do direito processual salienta:

Compreendida a autonomia processual, os processualistas - ao mesmo tempo em que os constitucionalistas se movimentavam para buscar a eficácia da Constituição (Neoconstitucionalismo) - conscientizaram-se da necessidade de direcionar o processo para resultados substancialmente justos, superando o exagerado tecnicismo reinante até então, o que deu origem ao período de instrumentalismo (ou teleologia) do processo.

É necessário, contudo, sopesar no caso concreto, cada princípio a ser aplicado nos atos processuais. Desta forma, leciona Amaral (2015, p.47)

É intrínseco a toda norma processual um conflito entre efetividade e segurança. Esse é um dado com que deve trabalhar o legislador, ao criá-la, e o magistrado ao aplicá-la ou mesmo ao concebê-la diante da omissão do legislador. (...) Dessa forma, a leitura do art. 1º do CPC não pode superestimar a primeira parte - "ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais" - e subestimar a segunda "observando-se as disposições deste Código"-, que, claramente, contém uma mensagem de reforço e observância às regras processuais, não como uma obediência cega à legislação, fruto de um formalismo pernicioso, mas, sim, como reconhecimento de que o respeito às normas estabelecidas pelo legislador é uma decorrência lógica do valor segurança.

A partir dos destaques neste ponto, sobretudo na ilustrativa lista dos princípios constitucionais aplicáveis ao Direito Processual Civil, tendo por base a presença massiva das normas principiológicas no pós positivismo, resta aferir que o Código Civil de 2015 sofreu influência do Neoconstitucionalismo e por consequência do Neoprocessualismo.

Contudo, a Doutrina predominante não habilita a aplicação de qualquer princípio de modo deliberado durante o processo de interpretação da lei processual. É necessário antes de tudo um sopesamento a fim de encaixar de modo preciso o valor, conteúdo do princípio, ao caso concreto.

3. O modelo Sistema Multiportas: Conceito e desenvolvimento

Em uma sociedade com relações humanas cada vez mais complexas, chegou um momento em que o Direito teve que se adaptar para desempenhar a missão constitucional de prestar acesso à justiça. A evolução do Processo Civil é resultado de tentativas sistemáticas de Juristas com o ímpeto de driblar o desafiador alto volume de demanda sem prejudicar a qualidade dos julgados.

Com esta necessidade de adaptação, o meio judicial-processual fora ampliado para vias alternativas que não comprometa a jurisdição nem a lisura do processo. Sobre este movimento também denominado como justiça coexistencial, assevera Mancuso (2009, p.149):

Interessa é que os danos temidos ou sofridos sejam prevenidos ou compostos com justiça, em tempo razoável, e com bom equilíbrio no custo-benefício, não importando os meios e as instâncias utilizados para esse desiderato, desde que idôneos e eficazes.

Desde a concepção da linha alternativa à via judicial processual, coube a quem aplicasse tais possibilidades a ciência de que as referidas vias se relacionam sem uma sobrepor a outra. De acordo com Oteiza (online), a aplicação de Alternative Dispute Resolutions (ADRs) não pode abandonar a via oficial visando uma resposta eficiente e eficiente aos jurisdicionados.

Tartuce (2016, p.148-149) aponta que a ADRs, não é o único meio de reportar ao fenômeno paralelo a via oficial do processo. Ao longo da história do Direito, surgiram várias outras expressões que traduzissem vias extrajudiciais. Indica a autora as expressões sinônimas que mais repercutiram na literatura foram: Resolução Alternativa de Disputas (RAD) e Meios Alternativos de Resolução de Disputa (MASCs). Tal pluralidade de conceitos permaneceram difusos até a consagração da desprocessualização, enquanto instituto pela corte norte-americana, na década de 1970. Acerca disso, a atora revela que:

A desprocessualização de controvérsias no direito moderno representa uma retomada de uma longa tradição jurídica em que a solução dos litígios se dava pelos particulares sem vinculação com o Estado, embora esse estivesse disponível para prestar a tutela jurisdicional.

Assim, o Professor da Universidade de Havard Frank Sander, em 1976 cunhou o termo Multi-door Courthouse, inspirado na atuação dos tribunais em face dos desafios com o crescente volume de demanda e a consequente insatisfação popular com o Poder Judiciário. Em apertada síntese, Cunha (2017, p. 637) leciona a cerca desse instituto:

A expressão multiportas decorre de uma metáfora: seria como se houvesse, no átrio do fórum, várias portas; a depender do problema apresentado, as partes seriam encaminhadas para a porta da mediação, ou da conciliação, ou da arbitragem, ou da própria justiça estatal

A ideia de multiportas é mais explanada em LORENCINI, Marco Antônio apud GONÇALVES, Vinícius José Corrêa, 2011, p. 162:

A metáfora das portas remete a que todos os meios alternativos estejam disponíveis em um só lugar. Em geral, depois de apresentado um formulário pelo requerente, o requerido é também chamado e igualmente preenche um formulário igual. Esses formulários são encaminhados pelo funcionário ao julgador que, então, designa uma audiência para as partes para dar-lhes conhecimento acerca do meio indicado. [...] Dois pontos são centrais: quem exerce a triagem e o meio trilhado. [...] A escolha do meio pode, assim, dependendo do programa, ser feita pelo autor, pelo réu, ou por ambos, de forma consensual. Pode, ainda, ser mecanicamente feita por um funcionário do tribunal, por um perito externo ou, ainda, pelo próprio julgador. No caso de pluralidade de autores, prevalece o critério da maioria. Nas hipóteses em questionário detalhado que, entre outras coisas, discrimina (i) a quantidade de partes envolvidas, (ii) os fatos e as possíveis questões daí advindas, (iii) pedidos (iv) relacionamento entre as partes, (v) a natureza das questões a resolver e sua natureza. Essa análise objetiva é seguida de um outro formulário no qual a parte expõe o seu objetivo, respondendo sua expectativa com relação à (i) celeridade, (ii) confidencialidade, (iii) o interesse em preservar o relacionamento com a parte contrária, (iv) disposição em negociar com a parte contrária.

Na mesma esteira, Gonçalves (2011) indica que o modelo desenvolvido por Sander é, a bem da verdade, uma organização judiciária multifacetada que se que se ocupa em encontrar à lide a melhor solução, afastando a necessidade de as partes utilizarem o meio tradicional de resolução de conflito.

3.1 O neoprocessualismo no Brasil


Gajardoni (2016) aponta que o Neoconstitucionalismo decorre de um movimento denominado pela doutrina como Constitucionalização do Direito, que é em apertada síntese a prática das normas de diversas áreas do Direito interpretadas de acordo com os parâmetros da Constituição vigente.

Tal acepção deflui da construção positivista kelseniana, que assenta a constituição no topo do ordenamento jurídico, servindo de fundamentação para todo ele. Vê-se, portanto, que essa ideia não é de todo inédita. A bem da verdade, representa a essência sido esquematizada desde o surgimento do Direito Constitucional Contemporâneo. O ineditismo encontra-se no fato de que antes de 2015 no Brasil não havia um dispositivo no código de processo civil que concretizasse o mandamento de interpretação conforme.

Outra característica marcante do neoprocessualismo é a possibilidade de construir um processo democrático. Isso significa o protagonismo das partes efetivado pela participação, materialização do princípio da cooperação. Disposto no 6º do NCPC (todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva), o princípio da cooperação busca alcançar uma relação legítima e equânime entre todos os atores do processo.

Com o advento do Código de Processo Civil, em 2015, ocorreu um afastamento dos modelos tradicionais adversarial e inquisitorial e uma para um modelo cooperativo. Neste sentido, leciona Didier Jr (2011, p.208): O modelo adversarial assume a forma de competição ou disputa, desenvolvendo-se como um conflito entre dois adversários diante de um órgão jurisdicional relativamente passivo, cuja principal função é decidir. E continua:

Dierle José Coelho Nunes, que fala em modelo coparticipativo de processo como técnica de construção de um processo como técnica de construção de um processo civil democrático em conformidade com a constituição, afirma que a comunidade de trabalho deve ser revista em perspectiva policêntrica e coparticipativa, afastando qualquer protagonismo e se estruturando a partir do modelo constitucional do processo. (DIDIER JR, 2011, p.212)

Materializado pelo Código de Processo Civil de 2015, o modelo coparticipativo efetiva o fim substancial do processo de assegurar às partes a paz social com base na autonomia das partes envolvidas, o que torna além de célere, uma decisão mais efetiva e próximo das vontades e necessidades que motivaram a litigância.

Com visto, os princípios dão a tônica no Neoconstitucionalismo que uma vez inseridos no texto constitucional inspiram a construção e interpretação das normas todos os demais ramos do Direito. O Processo Civil, na concepção neoprocessualista, não sofre apenas a interferência dos princípios constitucionais, mas também seu código possui em seu arcabouço princípios próprios que regulam o regulam.

Diante do exposto, o fenômeno de Neoprocessualismo como sinônimo de constitucionalismo do processo causa em especial uma aplicação mais próxima dos meios de ponderação ente princípios, sobretudo os presentes no texto constitucional, devendo prezar acima de tudo pela prevalência de normas que visam garantir a segurança jurídica.

A prática de interpretação conforme a Constituição, marca do neoprocessualismo, expõe não apenas a atualidade do Código de 2015 alinhada às necessidades da sociedade pela justiça e igualdade, alcançado por um processo democrático e que permite maior liberdade às partes

O novo código de Processo Civil brasileiro, concretizado no ano de 2015, sobretudo, representa conformidade ao sistema processual pátrio com a Constituição Federal de 1988, no sentido de alinhar todos os atos afetos ao deslinde processual aos princípios da constituição cidadã, em especial o princípio da razoável duração do processo e princípio do amplo acesso à Justiça.

Ademais, o Neoprocessualismo acentua sua atenção ao escopo social, no sentido de exercer uma função pacificadora visando a paz social, assim apresentado por Viana (2003, p.17)

O processo não é apenas este instrumento técnico de aplicação de casos concretos do Direito substancial, mas também de um poderoso instrumento ético voltado a servir à sociedade e ao Estado.

Esta direção de interpretação entre normas processuais e constitucionais é o que está disposto no artigo que inaugura do Código de Processo Civil Brasileiro. Vejamos:

Art. 1º O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.

Sobe o artigo inaugural, Donizetti (2012), comentava quando o Código de Processo Civil estava ainda em estágio de projeto legislativo:

Vale ressaltar que esse dispositivo consiste na materialização das características do neoconstitucionalismo: normatividade da constituição (força normativa), superioridade (material) da constituição, centralidade da constituição (a constituição está no centro do ordenamento jurídico), rematerialização da constituição (constituições mais prolixas, já que tratam de diversas matérias), ubiqüidade da constituição (onipresença da constituição em todos os ramos do Direito), constelação plural de valores (adoção de diversos princípios não homogêneos), onipotência judicial (no lugar da autonomia do legislador ordinário), valoração dos princípios (utilização maior da ponderação)

O autor traz em sua doutrina para este fenômeno o conceito de totalitarismo constitucional. Apesar da terminologia, tal ideia não deve ser interpretada de forma negativa, pois trata tão somente do cuidado que o legislador empregou para que o Código, então em construção, fosse no futuro uma ferramenta de concretização de direitos fundamentais, colocando o a constituição no centro da legislação, como o neoprocessualismo propõe.

3.2 O Sistema Multiportas no Brasil

O artigo inaugural do Código de Processo Civil não pode ser entendido como uma simples delonga na abertura do Código. O dispositivo traz uma norma prática, como aduz Wambier (2015, p. 58):

Vale de garantia eficaz contra qualquer dispositivo que contrarie a Constituição, bem como é fator de interpretação para a aplicação dos dispositivos processuais. Aqui, a lei processual e a própria atividade jurisdicional em si, submetem-se às normas e aos valores constitucionais, os quais lhes servem de fonte e legitimam o seu exercício, ao tempo em que impedem o autoritarismo e o abuso.

Como se vê, o Código de Processo Civil de 2015 adota o modelo multiportas quanto as alternativas de resolução de conflito. Aliados a via tradicional do processo judicial, o código dispõe expressamente os institutos da conciliação e mediação e ainda deixa abertas as outros métodos que eventualmente venham a ser albergados pelo Direito, é o que se extrai da leitura do parágrafo 3º do artigo 3º do Código de Processo Civil de 2015, conforme se vê:

A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.

As vias extraoficiais de solução de conflitos que vão além do tradicional meio litigante processualista acessíveis a comunidade de jurisdicionados auxiliam na efetividade do modelo multiportas, refletindo em última análise na desjudicialização das contendas.

A legislação processual reconhece uma variedade modalidades alternativas para a resolução de conflitos, quais sejam: a mediação, a conciliação e a arbitragem. Estas modalidades visam não apenas a celeridade, mas também a qualidade da prestação jurisdicional dentro do escopo social do processo. Nessa perspectiva, leciona Figueira Júnior (2002 p. 169-181):

Os meios ou formas alternativas de solução de conflito não visam o enfraquecimento do Poder Judiciário. A escolha entre a solução do conflito através da tutela estatal ou paraestatal não significa que uma é melhor ou pior, mas duas formas distintas colocadas à disposição dos jurisdicionados para a solução de seus conflitos.

Os institutos da conciliação e da mediação trazidos pelo Código de Processo Civil preveem a participação de uma terceira pessoa. Além disso, o Artigo 3º, parágrafo 3º expressamente determina que:

A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.

Haverá, entretanto, a diferença entre um instituto ou outro a partir do grau de envolvimento atuação desse terceiro agente neutro e imparcial. De acordo com o Artigo 165, parágrafos 2º e 3º do Código de Processo Civil, o conciliador atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes.. Enquanto na mediação, o mediador atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes.

Na conciliação, as partes juntamente com o conciliador buscarão resolver o conflito por meio da transação, submissão ou renúncia. O conciliador atuará no sentido de indicar propostas possíveis para a questão. A vantagem dessa modalidade é uma restauração efetiva da relação social entre os envolvidos.

A mediação, por sua vez, é uma forma de solução de conflitos em que a terceira pessoa natural e imparcial conduz as tratativas a fim de que sejam construídos de forma livre e solidária a melhor solução para o conflito. O mediador poderá intervir no sentido de propor alternativas, porém sempre respeitando a autonomia das partes. A mediação na lição de Sales (2004, p. 23) se constitui como:

Um procedimento em que através do qual uma terceira pessoa age no sentido de encorajar e facilitar a resolução de uma disputa, evitando antagonismos, porém sem prescrever a solução.

Conceito complementado por Braga Neto (2008, p.76):

A mediação é parte de uma premissa de devolução às partes do poder de gerir e resolver ou transformar o conflito, no sentido de que são elas as mais indicadas para solucionar suas questões.

É dever do mediador zelar pela ética. Durante as declarações públicas e atos que por ventura careçam de uma certa publicidade, o mediador tem por obrigação limitar-se aos assuntos pertinentes ao caso em questão devendo esclarecer o público por meio que favoreça o entendimento de todos os interessados, evitando ambiguidade no discurso e diversas interpretações. Preferencialmente para casos mais complexos, sem prazo predeterminado de duração, que pode findar ou não em um acordo, uma vez que as partes possuem autonomia para atuarem na defesa de seus interesses.

O Código de Processo Civil de 2015 previu não apenas a legitimidade dos meios de conciliação e mediação, mas também, visando a efetivação aos desses institutos, determinou a criação de um sistema de centros judiciários de solução consensual vinculado aos poderes judiciários dos Estados e da União.

Art. 165. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.

§ 1º A composição e a organização dos centros serão definidas pelo respectivo tribunal, observadas as normas do Conselho Nacional de Justiça.

§ 2º O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.


§ 3º O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.

Este sistema foi concretizado o pela Resolução número 125 do Conselho Nacional de Justiça, momento em que foi criado o Sistema de Mediação Digital, possibilitando entre outras coisas, a realização de mediação de forma virtual, podendo estes acordes serem homologados pelo Judiciário. Assim, foi regulada a criação dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCS).

É certo que a edição do Código de Processo Civil de 2015 consagrou de forma definitiva o neoprocessualismo no Estado Brasileiro. É necessário salientar que este avanço é fruto de uma construção. Como mencionado, o modelo multiportas fora desenvolvido na década de 1970. A única influência desse movimento, certamente não haveria de ser o Código de Processo Civil em 2015. A primeira lei brasileira, ainda sob égide do Código de Processo Civil anterior, que permitia as partes a dispensarem o modelo tradicional processualista foi a lei de arbitragem, lei número 9307/96.

A arbitragem trata de um meio alternativo de solução de conflitos a que se dá de forma extrajudicial e voluntária, fora da tutela do Poder Judiciário. Consiste em uma terceira pessoa nomeada pelas partes, denominado de Juiz Arbitral, que atuará de forma neutra e imparcial. Ele intervirá na controvérsia a fim de solucionar o conflito. De acordo com o conceito de Carmona (2008, p.76), a arbitragem é:

Uma técnica para solução de controvérsias através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nesta convenção, sem intervenção do Estado, sendo a decisão destinada a assumir eficácia de sentença judicial.

Enquanto o Artigo 1º da lei 9307/96 permite que as pessoas capazes irão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis, o Artigo 852 do Código Civil Brasileiro de 2002 disciplina as vedações a convenção arbitral. Aqui se lê é vedado compromisso para solução de questões de estado, de direito pessoal de família e de outras que não tenham caráter estritamente patrimonial.

Como se vê, foi paulatina a evolução do Ordenamento Jurídico pátrio até adotar definitivamente o modelo multiportas. Em 2010, cinco anos antes da edição do Código de Processo Civil, o Conselho Nacional de Justiça CNJ publicou a Resolução número 125 a fim de regular no Poder Judiciário, dentre outros assuntos o modelo multiportas

A Resolução cria os Núcleos permanentes de Métodos consensuais visando desenvolver a Política Judiciária de tratamento adequado dos conflitos de interesses no sentido de concentrar em cada centro a realização de conciliações e mediações designados aos conciliadores e mediadores capacitados pelo próprio Núcleo.

Além de atribuir maior efetividade aos comandos do Código de Processo Civil, a Resolução 125 também tem por finalidade dirimir a demanda excessiva de processos, que agravada pela falta de pessoal, acarreta a morosidade da prestação jurisdicional (STORCH, 2017).

A Resolução acabou por influenciar o Código de Processo Civil, sobretudo no artigo 3° que passa a dar uma atenção maior aos métodos alternativos de solução de conflito, inclusive deixando em aberta a possibilidade para outros métodos de solução que o Direito venha a reconhecer. Aqui se lê:

 Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.

§ 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei.

§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.

§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial. (Grifos nossos)

Outra inovação relacionada a portaria 125, o artigo 165 do Código de Processo Civil de 2015 prevê que:

Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.

A partir desse exposto, vê-se que a inovação do ordenamento jurídico relacionado a tratativa de litígios busca flexibilizar os métodos aplicados em cada caso, tornando a prestação jurisdicional mais eficiente e democrático, além de reduzir o volume de demandas no Poder Judiciário.

4. Considerações finais

Conforme foi demonstrado, a construção desse sistema inspirada nos princípios constitucionais, prezando pela cooperação e pela autocomposição representando um significativo protagonismo entre as partes. Resta aferir que o Sistema multiportas trata de um modelo que é fruto do Neoprocessualismo e por consequência do Neoconstitucionalismo.

Neste trabalho abordamos o Neoconstitucionalismo desde o seu surgimento como uma resposta da sociedade frente as incertezas do Pós-Guerra, o que ascendeu uma tendência das constituições ao redor do mundo adotarem para cada Estado um rol de Direitos Fundamentais. Vimos também que isso acarretou um avanço sobre a relevância dos valores e dos princípios dentro desse novo modelo.

Observamos que no Brasil houve um Neoconstitucionalismo tardio devido o regime de exceção que durou de 1964 a 1985, e a Constituição Cidadã de 1988 finalmente trouxe em seu arcabouço Direitos Fundamentais, que não são encarados como direito meramente retórico, mas uma série direito potestativo que o Estado pode ser cobrado.

Observamos também que mesmo antes da edição do Código Civil de 2015, o Direito Processual paulatinamente foi se abrindo, por influência do Neoconstitucionalismo, às novas tendências de interpretação e consequentemente na aderência de novos modelos de resolução de conflitos.

Por fim, constatamos que o Código de Processo Civil de 2015 consagra de forma definitiva os métodos alternativos de solução de conflito pautados na autocomposição e na autonomia de vontade das partes. A partir de então, o Modelo Multiportas, concebidas décadas antes da edição de um novo Código de Processo Civil tornou-se uma realidade, devendo a conciliação e a mediação bem como os outros métodos serem estimulados por todos atores do processo, independente da instancia em que se encontra a lide.

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Sobre o autor
André Jales Falcão Silva

Advogado (OAB/CE: 29.591). Possui uma ampla formação acadêmica incluindo Bacharelado em Direito e Licenciatura em Sociologia e diversas especializações nos campos do Direito e da Educação. Atua profissionalmente como Professor de disciplinas do eixo das ciências sociais e aplicadas e como Perito Judicial, em diversos tribunais, com ênfoques em Documentoscopia e Grafoscopia. É Psicanalista vinculado ao Instituto Brasileiro de Psicanálise Clínica.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho de conclusão de curso de Pós-Graduação (lato sensu) em Direito Civil e Direito processual Civil, pela Faculdade Legale.

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