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A isenção e o princípio da isonomia tributária

Agenda 02/05/2022 às 12:10

Palavras chaves: Isenção. Isonomia. Comodato. Incentivos fiscais.

O princípio da generalidade da tributação pode ser excepcionado por meio da isenção que respeite o princípio da isonomia.

O que é inconstitucional é a lei isentiva que estabelece situação de desigualdade jurídica formal como, por exemplo, a Lei municipal 10.698/88, que instituiu a isenção do imposto predial para determinados imóveis. Vejamos.

A Lei 8.494, de 05.12.1976, instituiu, corretamente, a isenção de imposto predial relativamente a imóveis recebidos em comodato pelas instituições de educação em geral, durante a vigência do contrato, e desde que utilizados para fins institucionais. Essa isenção especial, porém não específica, foi revogada pela Lei 10.211, de 11.12.1986, e parcialmente restabelecida em 1988, por meio da Lei especial e específica de n. 10.698, de 09.12.1988, a qual, limitou a isenção aos prédios utilizados em regime de comodato pelo Instituto Mackenzie. A sua inconstitucionalidade, por afronta ao princípio da isonomia tributária, é manifesta. Além do mais, essa lei é inútil porque, conforme verificamos, o Instituto Mackenzie já estava amparado por coisa julgada, reconhecendo a imunidade tributária relativamente aos prédios por ele ocupados, porque a posse que deriva do comodato se insere no conteúdo patrimonial do Instituto, conforme acórdão do então 1º Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo (Embargos Infringentes 226.161/SP, Rel. Juiz Oliveira Lima, j. em 09.02.1978).

Outrossim, é indiscrepante a doutrina no sentido de que a isenção está vinculada ao princípio da isonomia tributária [1].

Por isso, no dizer de Carlos Adrogué, só se pode isentar com a razoabilidade presumida em qualquer ato legislativo [2].

Independentemente do princípio da isonomia, enunciado pela segunda vez na Carta atual, com referência específica aos tributos, toda isenção que implicar o estabelecimento de tratamento desigual de pessoas que se encontram sob os mesmos pressupostos fáticos é inconstitucional. E mais, o § 6º do art. 150 da CF subordinou a concessão de qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito resumido, anistia ou remissão relativos a impostos, taxas e contribuições à elaboração de lei específica, ressalvado o disposto no art. 155, § 2º, XII, g (isenção do ICMS por convênios).

O que o legislador constituinte fez foi atender o clamor do povo, proibindo aquelas isenções subjetivas. O objetivo perseguido não foi, obviamente, o acréscimo da receita com supressão de privilégios de poucos, mas a preservação da justiça fiscal, ínsita no princípio da isonomia. Se aqueles que consentem na tributação e aqueles que aplicam a lei tributária não estivessem sujeitos ao gravame tributário, não poderiam sentir nem avaliar o peso dessa carga tributária que recai sobre os contribuintes em geral. Leis tributárias justas induzem ao cumprimento voluntário, contribuindo para o desafogamento da atividade judiciária, sobrecarregada com um número infindável de processos envolvendo questões tributárias. Leis injustas, ao contrário, tendem a ser rejeitadas pela sociedade em geral.

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Conclui-se do exposto que são inconstitucionais as centenas de incentivos ficais subjetivas que ofendem, às escâncaras, o princípio da isonomia e interferem no princípio basilar do regime de economia privada à medida que afastam do mercado de concorrência os agentes econômicos não favorecidos por incentivos fiscais, muitas vezes, patrocinadas por meio de medidas provisórias encomendadas. Esses incentivos fiscais direcionados representam a evasão de bilhões em termos de arrecadação tributária que são compensados com o aumento da carga tributária em geral. É assim que o nível de imposição que se situava em torno de 26% do PIB na década de 90 passou para 36% nos últimos anos.


[1] MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1967. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1974. v. 4, p. 702; DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Princípios constitucionais tributários e a cláusula due process of law. Rio de Janeiro: Forense, 1986. p. 408; BORGES, José Souto Maior. Isenções..., cit., p. 55; NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de direito tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 120; BECKER, AlfredoAugusto. Teoria geral do direito tributário. São Paulo: Saraiva, 1972. p. 117.

[2] Poderes impositivos federal y provincial sobre los instrumentos de gobierno. Buenos Aires: G. Kraft, 1943. p. 74.

Sobre o autor
Kiyoshi Harada

Jurista, com 26 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

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