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Stalking é Crime

Agenda 07/05/2022 às 15:35

Este artigo aborda o Stalking recentemente incluído no Código Penal, pela Lei 14.132/21 que inseriu o art. 147-A.

No dia 1º de abril de 2021, entrou em vigor a Lei nº 14.132, tipificou o delito stalking, acrescentando o art. 147-A ao Código Penal. Stalking vem do inglês cuja tradução seria perseguição insistente. Sendo possível que homens e mulheres figurem como vítimas, porém a maior incidência são as mulheres. Neste sentido, artigo 147-A do Código Penal tem como objetivo prevenção e repressão à violência contra a mulher. Neste sentido, antes do surgimento desta lei, nos Juizados Especializados de Violência Contra a Mulher, era considerado utilizada a contravenção penal de perturbação da tranquilidade para coibir a conduta de perseguição. A lei de Contravenções Penais não foi criada proteção à mulher, de forma específica. O método de abordagem utilizado é hipotético dedutivo, a coleta de dados será por documentação indireta como livros, artigos científicos, jurisprudência e legislação específica.

 

1. STALKING

1.1. Conceito e Tipificação

Apesar da palavra stalking ser associada ao ato de perseguir as atividades de determinada pessoa nas redes sociais, normalmente fruto de curiosidade, ciúmes ou interesse romântico o real significado da palavra se refere a uma conduta muito mais severa. (SOUSA, p. 9, 2020).

Stalking, palavra de origem inglesa, é a conduta que tem definição léxica de caçar á espreita, ou seja, assemelha ao modus operandi de um animal que se esconde, estuda e age sorrateiramente, sem ser notado por sua presa. (SYDOW, P. 548, 2020).

O conceito de stalking difere de acordo com diferentes autores, de modo geral, entende se por stalking o ato de perseguir uma pessoa, de forma deliberada e reiterada, utilizando-se de varias táticas de perseguição e abordagem, como ligações telefônicas, envio de mensagens por SMS ou e-mail, cartas, ou mesmo a presença em locais frequentados pela vítima, como seu local de estudo, trabalho e residência. (SOUSA, p. 10, 2020).

A Lei 14.132/21 inseriu no Código Penal o art. 147-A, o denominado Stalking. Sua finalidade é a tutela da liberdade individual, abalada por condutas que constrangem alguém a ponto de invadir severamente sua privacidade e de impedir sua livre determinação e o exercício de liberdades básicas. (Cunha, 2021).

O tipo penal surgiu com a justificativa de preencher uma lacuna e de tornar proporcional a pena para uma conduta que, embora muitas vezes tratada como algo de menor importância, pode ter efeitos danosos principalmente psicológicos na vida de quem passa por esta situação. (Cunha, 2021).

Antes da implantação deste crime, a maior parte dos atos de perseguição se inseriam no art. 65 do Decreto-lei 3.688/41, cuja pena de prisão simples variando de quinze dias a dois meses sendo considerada insuficiente. Com a Lei 14.132/21, a contravenção foi revogada e a perseguição passou a ser punida com reclusão de seis meses a dois anos. (Cunha, 2021).

O art. 65 do decreto - Lei nº 3688/41, Lei das Contravenções Penais, tinha a seguinte redação:

Art. 65. Molestar alguém ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou por motivo reprovável: Pena prisão simples, de quinze dias a dois meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis.

O verbo perseguir não tem apenas a conotação de ir ao encalço de alguém. Há também um sentido de importunar, transtornar, provocar incômodo e tormento, inclusive com violência ou ameaça. É principalmente com essa conotação que se tipifica a conduta de perseguir no art. 147-A. (CUNHA, 2021).

O sujeito pode agir através de ligações telefônicas, de mensagens por meios variados (SMS, WhatsApp, Telegram, Skype etc.), de e-mails, pode permanecer próximo da residência da vítima ou de locais que ela frequenta. A conduta pode consistir no envio de presentes ou de mensagens supostamente carinhosas. (CUNHA, 2021).

 

1.2. Cyberstalking

O conceito de stalking envolve perseguições e importunações físicas, o chamado cyberstalking também tem sido reconhecido como uma forma de stalking, capaz de causar temor e dano psicológico em uma vítima, apesar de ser exercido somente no meio virtual. (SOUSA, p. 11, 2020).

Com o advento da tecnologia, a internet e as redes sociais tornaram-se cada vez mais populares e usuais, sendo o seu funcionamento realizado por meio dos provedores de Internet. (CARVALHO, p. 11, 2017).

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O cyberstalking é um problema crescente, pois há uma quantidade imensa de pessoas que mantêm perfis em várias redes sociais, nas quais publicam imagens e informações de sua vida pessoal sem nenhum tipo de moderação, com isso os instrumentos tecnológicos tendem a favorecem a perseguição. As informações obtidas em ambientes virtuais permitem que os atos do perseguidor tenham tanta eficácia quanto teriam se fossem presenciais. (CUNHA, 2021).

Através do livre acesso à internet, qualquer pessoa consegue utilizar as redes sociais, por intermédio dos aparelhos celulares. Dentre as redes sociais mais populares, aquelas ligadas ao compartilhamento de imagens e mensagens são as mais utilizadas: Facebook, Whatsapp, Instagram e Messenger. (CARVALHO, 2017).

No Cyberstalking nem sempre há uma comunicação direta com a vítima, o que faz com que muitas pessoas não percebam que estão sendo monitoradas. Muitos agentes utilizam as informações obtidas através do cyberstalking para a prática de outros crimes, por exemplo, como a falsidade ideológica. (SOUSA, 2020).

 

2. STALKING COMO VIOLÊNCIA DE GÊNERO

A violência contra as mulheres é um assunto antigo há séculos, o machismo em diversos países contribuiu para a colocação da mulher, na sociedade, em uma posição de subordinação, como alguém de menor importância e relevância no

contexto social e, principalmente, como um ser carente de proteção estatal. (FERREIRA e MORAES, 2021).

Para compreender como e por que a violência de gênero existe em grande proporção e continua a se propagar em sociedade, é importante fazer uma analise profunda dos aspectos ideológicos, culturais, sociais, religiosos e como estes se relacionam com a violência. (SOUSA, 2020).

O stalking compartilha de muitas das características vistas nos tipos de violência de gênero, motivo pelo qual o mesmo pode ser classificado como tal, e sua criminalização vista como um modo de combater a referida violência. (SOUSA, 2020).

Em sua maioria, praticantes do stalking são homens, consequentemente vítimas mulheres. A incidência de stalking se dá, em sua maioria, entre casais pós-término de relacionamento. (SOUSA, 2020).

As mulheres, devem estar atentas pois estão dentre as maiores vítimas. O stalking é cometido muitas vezes por ex-namorados e companheiros não conformados com o fim do relacionamento, os quais possivelmente praticam ou já praticaram outras modalidades de violência tipificadas na Lei Maria da Penha. (BENDÔ e SOUZA, 2021).

Stalking crime em que qualquer pessoa pode figurar como vítima, porém a mulher é o principal alvo, neste sentido a criminalização desta conduta era uma das prioridades da bancada feminina da Câmara dos Deputados. (FERREIRA e MORAES, 2021).

Em uma pesquisa feita nos Estados demonstraram que 76% das mulheres vítimas de feminicídio haviam sofrido stalking no ano anterior à sua morte, assim como 85% das mulheres que sobreviveram uma tentativa de feminicídio. (SOUSA, p.39, 2020).

Ainda de acordo com Sousa (p. 39, 2020):

89% das vítimas de feminicídio que haviam sido agredidas fisicamente também sofreram stalking nos doze meses anteriores à suas mortes, 79% das que sofreram outros tipos de abuso previamente também sofreram stalking, e 54% das que sofreram stalking no total chegaram a denunciar o crime para a polícia antes de serem assassinadas por seus stalkers.

Portanto, esta nova lei surge como um mecanismo de proteção as vítima que sofrem qualquer tipo de perseguição, conduta que necessita ser combatida, pois pode desencadear em crimes de outras proporções gravíssimas e irreversíveis. (BENDÔ e SOUZA, 2021).

Neste sentido, o legislador definiu um rol para as causas de aumento de pena, estendendo a proteção àqueles que mais precisam de proteção, como as vítimas mulheres que sofrem a violência domestica e familiar. (BENDÔ e SOUZA, 2021).

Portanto, a necessidade de ficar atentos a qualquer conduta insistente e contumaz que causa transtorno, perturbação ou ameaça de alguma forma a sua integridade física ou psicológica. (BENDÔ e SOUZA, 2021).

 

3. ABOLITIO CRIMINIS

A revogação do artigo 65 da LCP não significa, no entanto, que tenha havido abolitio criminis para todas as situações que estavam previstas na contravenção penal. A abolitio criminis não está necessariamente ligado ao fato de ter havido a revogação de um dispositivo penal. Sendo necessário analisar se há ausência de continuidade do tipo de ilícito no ordenamento jurídico-penal. (ÁVILA E Bianchini, 2021).

Ou seja, se uma conduta estava prevista no tipo A e este é revogado, mas no mesmo momento (sem solução de continuidade) ela segue tipificada no novo tipo B, não houve abolitio criminis, mas continuidade normativo-típica. (ÁVILA E Bianchini, 2021).

Ao analisar os fatos, alguns fatores devem ser observados, há uma importante distinção entre os dois delitos, na nova lei, trás em seu artigo a reiteração de condutas. Tem similaridade entre os dois delitos, a prática continuada e reiterada dos fatos é o que, os diferencia. (SIMÕES, 2021).

Sendo a conduta do agente, praticada sob a égide do art. 65 da LCP, de forma reiterada e ameaçadora contra a vítima, se amoldar ao novo tipo penal de stalking, não há que se falar de abolitio criminis, mas sim do princípio da continuidade normativo-típica. (SIMÕES, 2021).

De certo, que a resposta a tais argumentos dependerá do caso concreto, que permitirá uma observação dos fatos, de forma a enquadrá-los, ou não, na hipótese de reiteração. Neste sentido, poderemos verificar a existência de uma conexão de atos, inclusive com proximidade de tempo, lugar, modo de agir etc. que permita uma análise mais segura de um ato contínuo em desfavor da vítima. (SIMÕES, 2021).

 

Conclusão

O stalking, era tratado como descaso, seja pelas autoridades policiais, ou por familiares e amigos das vítimas, com dificuldade para conseguir amparo, muitas vezes com consequências que poderiam ter sido evitadas. Com a nova lei vítimas se sentiram mais seguras para denunciar conforme dados do G1 no Estado de São Paulo foi registrada 686 comunicações deste crime, no primeiro mês após perseguição ter sido considerada crime.

 

Referências

ÁVILA, Thiago Pierobom de; BIANCHINI, Alice. A revogação do artigo 65 da LCP pela Lei 14.132 criou uma abolitio criminis? Disponível em:

https://www.conjur.com.br/2021-abr-05/opiniao-revogacao-artigo-65-lcp-criou-abolitio-criminis#_ftn1. Acessado em: 23 de julho 2021.

ARAS, Vladimir. O crime de stalking do art. 147-A do Código Penal. Disponível em: https://vladimiraras.blog/2021/04/01/o-crime-de-stalking-do-art-147-a-do-codigo-penal/. Acessado em: 27 de junho de 2021.

BENDÔ, Iris; SOUZA, Dynair de. O crime de stalking e a violência contra a mulher. Disponível em: https://www.olharjuridico.com.br/artigos/exibir.asp?id=1019&artigo=o-crime-de-stalking-e-a-violencia-contra-a-mulher. Acessado em: 18 de junho de 2021.

CARVALHO, ISABELA MEDEIROS DE. Cyberstalking: hipótese de ocorrência e aplicação sob a ótica civil. 2017, 78 fls. Bacharel em direito, Monografia, Universidade do Sul de Santa Catarina. Disponível em: https://1library.org/document/yd92p8gz-cyberstalking-hipotese-de-ocorrencia-aplicacao-sob-otica-civil.html. Acessado em 23 de julho de 2021.

CUNHA, Rogerio sanches. Lei 14.132/21: Insere no Código Penal o art. 147-A para tipificar o crime de perseguição. Disponível em: https://meusitejuridico.editorajuspodivm.com.br/2021/04/01/lei-14-13221-insere-no-codigo-penal-o-art-147-para-tipificar-o-crime-de-perseguicao/. Acessado em: 22 de junho de 2021.

LEITE, Isabela; OLIVEIRA, Anderson de. Estado de São Paulo registra 686 queixas de stalking no primeiro mês após perseguição ter sido considerada crime. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2021/05/23/estado-de-sao-paulo-registra-686-queixas-de-stalking-no-primeiro-mes-apos-perseguicao-ter-sido-considerada-crime.ghtml. Acessado em 23 de julho de 2021.

MORAIS, Gabriela Reston Pinto; FERREIRA, Maria Carolina de Moraes. A criminalização do stalking e a proteção da mulher no contexto jurídico-social brasileiro. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/345548/a-criminalizacao-do-stalking-e-a-protecao-da-mulher-no-juridico. Acessado em: 23 de julho de 2021.

ROCHA, Eliana Catarina da Silva. Stalking sob o olhar das vítimas: conceções e perceções sobre o crime. 2020, 37 fls. Universidade do Porto Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação. Pós-graduação: Dissertação de Mestrado. Disponível em: https://sigarra.up.pt/fpceup/pt/pub_geral.pub_view?pi_pub_base_id=433755. Acessado em: 15 de junho de 2021.

SOUSA, Camila Santana de. Stalking e violência de gênero: a criminalização do stalking como medida preventiva ao feminicídio. 2020, 48 fls. Centro Universitário de Brasília UniCEUB. Bacharel em direito. Disponível em: https://repositorio.uniceub.br/jspui/bitstream/prefix/14199/1/Camila%20Sousa%2021550297.pdf. Acessado em: 13 de maio de 2021.

Sobre a autora
Vilma da Silva Lima

Graduada em direito - Universidade Nove de Julho. Pós-graduada em Advocacia Extrajudicial Pós-graduação em Ciências Criminais Pós-graduação em Direito de Trânsito Pós graduação em Advocacia Feminista e Direito da Mulher Pós graduação em direito previdenciário Pós graduação em tribunal do júri Mestra em estudos juridicos com ênfase em direito Internacional

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo escrito para obtenção do título Especialista em Ciências criminais pela Universidade Nove de Julho.

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